O menino que joga deve ter liberdade
Apoiado por diretrizes que tenham permeabilidade
Dependendo da idade, se joga com mais espontaneidade
Mas nunca com descompromisso e falta de responsabilidade
O menino precisa formar jogando
Tomando decisões mesmo perdendo ou ganhando
Levando lições significativas para vida
Para que mesmo no sufoco sempre ache uma saída
INTRODUÇÃO
O Brasil é reconhecido como uma incubadora de jogadores de futebol, sendo sua prática disseminada em todas regiões do país (COYLE, 2010; MACHADO et al., 2019). As oportunidades de prática para crianças que iniciam no futebol são diversas nos mais distintos estados do território brasileiro, bem como a organização do processo de ensino-treino e especificamente da competição. Nesse sentido, se torna relevante nos debruçarmos sobre a organização da competição para as categorias iniciais, atentando-se para a disposição da estrutura, normas e funcionalidade do jogo para a atuação dos jogadores (GARGANTA et al., 2013), bem como para a participação no contexto competitivo (NEELY et al., 2017; ERICKSON et al., 2011).
A organização competitiva para as crianças em muitas situações é pensada na mesma perspectiva da competição para jogadores adultos e profissionais, sendo por vezes mais valorizado o produto (resultado competitivo) do que o processo (o ato de jogar). Ou seja, o pensamento linear de que a aproximação da criança com as condições do esporte adulto tende a facilitar a sua progressão ao esporte de elite e que os resultados precoces são indicadores para resultados posteriores contrastam com diversos estudos (BAKER; COBLEY; FRASER-THOMAS, 2009; BRIDGE; TOMS, 2013; CÔTÉ; BAKER; ABERNETHY, 2007; GÜLLICH et al., 2016; SURYA et al., 2012) que apontam para a diversificação de experiências, adequação das formas de jogar e para maior valorização das interações positivas do que para os resultados competitivos.
Tratando-se das condições do jogo, o tamanho do campo, da bola e das balizas, bem como o número de jogadores e as regras necessitam ser adequadas para a prática das crianças. Pensando na etapa de iniciação (9 anos - 11 anos) (BETTEGA et al., 2015), a estruturação do espaço é frequentemente direcionada pelo posicionamento da bola, logo, a utilização de um tamanho de campo apropriado auxilia na gestão das informações do jogo e no posicionamento. A comunicação na ação nessa etapa geralmente é condicionada pelo excesso de verbalização e necessita de linhas interativas próximas e a relação com a bola que comumente ainda não obtém certo refinamento e é direcionada mais pela visão central deve ser estabelecida a partir de menores unidades estruturais de jogo (GARGANTA, 1994).
O futebol como esporte mais disseminado e representativo do cenário brasileiro pode se constituir como um relevante ambiente para formação de crianças e jovens, mas precisa ser organizado respeitando as características e necessidades dos sujeitos. Em meio ao processo de ensino-treino, a competição é elemento essencial, constituinte do esporte e com potencial para promover relações que catalisem o poder educacional do fenômeno esportivo (GALATTI et al., 2018). A competição precisa ser pensada e estruturada para crianças e não para “mini adultos” (TORRES; HAGER, 2007), sendo fundamental ressaltar a responsabilidade de treinadores em organizar e sistematizar o processo de ensino-treino do futebol e suas competições com esse fim, estimulando jogadores e envolvendo pais e árbitros, mediadores também das partidas de futebol (PAES et al., 2009). Assim, o ensaio teórico de cunho descritivo-reflexivo tem como objetivo apresentar possibilidades para a competição no que tange a estrutura, normas e funcionalidade do jogo, bem como refletir sobre a participação no ambiente competitivo na etapa de iniciação ao futebol (9 anos - 11 anos).
A competição na iniciação ao futebol e os indicadores de jogo
A Fédération Internationale Football Association (FIFA) através do seu programa Grassroots (Programa de proposição do futebol para crianças entre 6 e 12 anos) reconhece a competição nas categorias de base como oportunidade de desenvolvimento de conceitos de jogo e diversão. Algumas diretrizes são consideradas, como, o equilíbrio entre as equipes no que tange o desempenho dos jogadores, o justo envolvimento dos participantes quanto ao tempo jogado, a duração das partidas, dependendo do número, faixa etária e nível dos jogadores, o nível de competitividade entre os adversários a cada rodada em função dos resultados anteriores, as regras do jogo limpo dentro e fora do campo e as características de cada etapa de desenvolvimento (GRASSROOTS, 2011). Desse modo, ressaltamos a necessidade da manipulação dos elementos estruturais e funcionais do jogo para estimular o desenvolvimento de demandas técnico-táticas, físicas e psicológicas dos jogadores (SERRA-OLIVARES; GARCIA-RUBIO, 2017).
O processo de formação de jogadores no futebol deve fomentar constantemente a tomada de decisão, diversificando as experiências e estimulando os jogadores a resolverem diferentes tipos de problemas, tanto no treino, quanto na competição (MARQUES; OLIVEIRA, 2010). Nesse caso, a organização do jogo no cenário competitivo deve estimular a transferência de capacidades cognitivas vinculadas ao conhecimento tático, pois é mais facilitada principalmente nas primeiras idades de prática (BAKER; CÔTÉ; ABERNETHY, 2003).
Na pesquisa de Pasquarelli (2017) realizada com uma equipe de futebol da categoria sub 11, participante do Campeonato Paulista de Futebol, foi evidenciado que o processo pedagógico baseado no ensino por meio do jogo impactou de forma evidente o comportamento individual e coletivo. Por exemplo, o número de “chutões” da equipe estudada foi 58,2% menor do que as equipes adversárias e o número de tentativas de passes foi 30,7% maior na competição. As métricas de análise de rede ressaltaram os comportamentos individuais e grupais dos jogadores em determinados setores do campo e funções na equipe. Assim, entende-se que a operacionalização dos conteúdos do processo de ensino-treino influencia na forma de jogo desenvolvido na competição, logo, devemos estimular um jogo organizado com base na busca de passes entre companheiros e não somente a partir de ações não intencionais e poucos colaborativas como os “chutões”.
A disposição do jogo necessita ser organizada considerando as etapas de formação dos jogadores, assim, buscando facilitar o desenvolvimento dos indicadores de jogo, como, a estruturação do espaço, a comunicação na ação e a relação com a bola (GARGANTA, 1994). A estruturação do espaço contempla a gestão das informações do jogo a partir de zonas próximas e afastadas do centro de jogo, bem como internas ao espaço efetivo de jogo e externas, que podem ou não ser limitadas pela regra do impedimento. A comunicação na ação é uma metacomunicação, que acontece à medida que os jogadores aprendem a “língua” do jogo e a relação com a bola que estabelece uma interdependência entre técnica (como se fazer) e tática (razões de fazer), caminhando da centralização nas primeiras etapas para uma descentralização, ou seja, configura quando os jogadores aprendem que jogar não resume a estar com a bola nos pés (SCAGLIA, 2014).
Na etapa de iniciação, as competições de futebol em muitos locais de prática ocorrem em condições para a competição no futebol profissional, apresentando o campo com dimensões entre 90 e 120 metros de comprimento (linha lateral) e 45 e 90 metros de largura (linha de meta), obtendo as balizas no tamanho de 7,32 metros de largura e 2,44 metros de altura e utilizando as regras formais do jogo de futebol para adultos (CBF, 2016). Nessa perspectiva, as condições inadequadas para a prática das crianças poderão dificultar a gestão do espaço de jogo, devido a ampla dimensão do campo, a comunicação na ação com linhas interativas mais afastadas e a relação com a bola, na perspectiva que as crianças tendem a tocar menos vezes na bola.
Na etapa de iniciação geralmente as crianças apresentam um nível básico e elementar de jogo, ou seja, exibindo uma relação com a bola pouco desenvolvida, com movimentação direcionada em elevada proporção pela trajetória da bola, assim, dificultando a organização posicional e funcional do jogo (GARGANTA et al., 2013). As referências posicionais e o desempenho dentre a funcionalidade do jogo ocorrem de modo simples e pouco dinâmico, obtendo uma compreensão mais individual do que coletiva do jogo. Na figura 1, a imagem apresenta um jogo da categoria sub 10 e mostra a ampla distância entre os jogadores, logo, possivelmente dificultando o desenvolvimento do indicador de jogo de comunicação na ação e também provavelmente proporcionando que os jogadores se relacionem menos vezes com a bola.
A organização da competição na iniciação deve compreender as características das crianças, sendo que em muitas situações estão desenvolvendo seus mecanismos de linguagem e assim transformando sua visualização e entendimento a partir de objetos isolados para situações contextualizadas (VIGOTSKY, 2007). González Víllora e colaboradores (2011) em pesquisa sobre o conhecimento tático e tomada de decisão de jogadores de futebol com dez anos de idade indicam que o processo de ensino-treino deve ser contextualizado, recomendando que o número de participantes no jogo não seja superior a “5x5” e que as regras oficiais da competição profissional sejam alteradas nessa etapa, pois a visão e operacionalização de ações em nível grupal ainda é limitada nessa idade, restringindo-se a relações em menores unidades de interação.
O tamanho do campo com medidas oficiais do futebol na iniciação restringe a intervenção constante dos jogadores no centro de jogo, podendo desmotivar a participação das crianças. A ampla dimensão do campo de jogo tende a aumentar a distância entre os jogadores, dificultando a percepção e a análise das situações, a orientação espacial e o estabelecimento das relações, assim, dificultando a ação dos jogadores mais afastados do centro do jogo e especificamente os que apresentem um nível mais baixo de compressão e atuação no jogo (CASÁIS; DOMÍNGUEZ; LAGO, 2009). Na figura 2, a imagem exibe doze jogadores (aproximadamente 54% dos jogadores participantes do jogo) ocupando o espaço da área penal e área de meta que possuem juntas aproximadamente 16% da área total de um campo com as menores medições preestabelecidas nas regras oficiais (90 metros de comprimento e 45 metros de largura) (CBF, 2016). Assim, se questiona se nessa etapa os jogadores conseguirão gerir o espaço de jogo de forma apropriada a partir das suas características e possibilidades.
A organização dos cenários competitivos no futebol necessita estabelecer condições adequadas para a prática e desenvolvimento de crianças e jovens jogadores. No contexto europeu, a European Club Association (2012, p.138) apresentou um relatório sobre diversas academias de futebol para jovens e em relação a competição (idade entre 5 e 21 anos) foi relatado que na etapa de iniciação (9 anos - 11 anos) a maioria dos jogos ocorrem com a estrutura de “7x7”, sendo nas categorias sub 10 e sub 11 (55% - 7x7; 23% - 8x8; 12% - 9x9; 5% - 6x6; 4% - 5x5; 1% - 11x11). Nas categorias sub 10 e sub 11 além da adaptação no número de jogadores e no tamanho do campo, o tempo do jogo também é adaptado e os jogos tem a ocorrência entre 50 e 60 minutos.
A adequação dos jogos a partir da relação entre o número de jogadores e o tamanho do campo necessita ser tratada com atenção pelos treinadores, tanto no ambiente de treino, quanto no contexto competitivo. Os treinadores precisam garantir que um nível apropriado de desafio seja fornecido e que seja compatível com o nível de habilidades do grupo de jogadores (CHOW et al., 2013). No caso da Federação Australiana de Futebol é utilizado um índice de intensidade de jogo que é estabelecido a partir da divisão do tamanho do campo em metros quadrados e o número de jogadores, logo, variando a partir dos objetivos propostos. Nas categorias sub 10 e sub 11 as competições contemplam uma estrutura de jogadores de “9x9” e os espaços de jogo variam entre “60 metros e 70 metros de comprimento e 40 metros e 50 metros de largura” (FFA, 2010, p. 2).
O jogo representa um relevante elemento no processo de ensino-treino e competição do futebol, mas desde que seja organizado e direcionado por objetivos que visem estimular o desenvolvendo dos jogadores. O treinador deve pensar a estrutura, as normas e a funcionalidade do jogo, mas além disso manter o desafio, a representação, a imprevisibilidade e o desequilíbrio no ato de jogar. Compreendendo que o jogo vai além da sua estrutura visível, contemplando um ambiente ecológico, que emana do e no jogo e passando pelo engajamento dos jogadores (estado de jogo), reitera-se que o aprendizado dos jogadores, tanto no treino, quanto na competição repousa na organização do jogo e na exploração de suas possibilidades (SCAGLIA, 2003; 2011; 2017). Assim, por parte do treinador, ensinar não se esgota no “tratamento” do conteúdo, mas se alonga à construção das condições em aprender de forma autônoma e crítica (FREIRE, 2011), bem como não se esgota no treino, mas se estende para a competição.
A competição esportiva na etapa de iniciação ao futebol
Os desdobramentos do esporte na infância e nesse caso o futebol, precisa estar conectado com as condições sociais, culturais, políticas, econômicas e históricas do local de prática. O contexto esportivo deve estimular a educação, a saúde, bem como prezar pela permanência das crianças em longo prazo, preparando-as para a participação continuada, no esporte de elite e também na vida em sociedade (CÔTÉ, STRACHAN; FRASER-THOMAS, 2008). O esporte não resolverá todos os problemas sociais, mas pode ser um relevante ambiente para auxiliar na resolução de problemas que afetam os jovens e se perpetuam até a vida adulta, mas desde que seja organizado, sistematizado, aplicado e avaliado de forma apropriada as disposições dos participantes e do cenário (GALATTI et al., 2014).
Pesquisadores têm realizado diversos estudos sobre o estresse na infância (CUPERTINO et al., 2006; KOVALENKO et al., 2014; MILER; CHEN; PARKER, 2011; SHAPERO; STEINBERG, 2013) e indicado possíveis consequências negativas que podem acarretar na vida adulta. A Organização Mundial da Saúde traz dados indicando que o transtorno depressivo é a principal causa de incapacidade na realização das tarefas do dia a dia entre jovens de 10 a 19 anos (OMS, 2015). O pensamento a partir de todo o processo de formação e ao longo do tempo possibilita visualizar que as ações realizadas no desenvolvimento do jogador de futebol na infância e adolescência podem trazer efeitos negativos momentâneos e posteriores e isso de fato necessita ser considerado e pensado para o processo de ensino-treino do futebol (BETTEGA, 2017).
O esporte para crianças e jovens e especialmente a competição necessita ser discutida e arquitetada com maior atenção, prezando pela construção de interações positivas. O trato pedagógico do esporte na infância pode ser um fator primordial para formação de jogadores de excelência, e além disso e mais importante, para formação de pessoas críticas e cidadãos que possam contribuir positivamente para a sociedade. Assim, ratificamos a preocupação com a organização do processo de formação de jogadores no futebol, tendo como tema central desse estudo a competição, que muitas vezes configura o ambiente de maior pressão e mais estressante para as crianças (CAPRANICA; MILLARD-STAFFORD, 2011).
Competir representa uma ação de desafio, entrega, busca por objetivos, circunstanciada por um ambiente de tensão, incerteza e por condicionantes que podem motivar ou desmotivar a participação dos envolvidos. No caso da competição para crianças, De Rose e Korsakas (2006) enfatizam que competir não deveria significar, ganhar ou perder, mas trazer a possibilidade de mostrar o quanto se evolui na participação em determinada modalidade esportiva e o quanto se aprende a resolver problemas e tomar decisões, mesmo que se equivocando em determinados momentos.
A competição esportiva na etapa de iniciação necessita ser organizada respeitando os gostos, as aspirações e as possibilidades das crianças e não para satisfazer a vontade dos adultos. A permanência da criança no esporte, bem como o percurso até o esporte de elite ou de participação são direcionados pela forma como o processo de formação esportiva é proposto durante a infância, logo, torna-se relevante a criação de um processo seguro, com uma abordagem de treino adequada, uma rede de relações interpessoais apropriadas e positivas (CÔTÉ et al., 2017) e uma competição condizente com as características dos indivíduos envolvidos (MONTAGNER; SCAGLIA, 2013).
A família, fundamental alicerce na formação das crianças, necessita estabelecer suporte para a participação esportiva. Esse suporte se constitui desde o investimento financeiro até o apoio psicossocial, sendo que os objetivos da família devem ser condizentes com os propósitos das crianças, gerando motivação para a prática continuada. Os responsáveis devem encorajar a participação de seus filhos no ambiente esportivo, mostrando comportamentos adequados, que respeitem as possibilidades das crianças, sem extrapolar nas cobranças e informações, promovendo a motivação para a prática e estimulando o desenvolvendo de habilidades para a vida que vão além da especificidade do esporte (FRASER-THOMAS; STRACHAN; JEFFERY-TOSONI, 2013).
Algumas investigações no cenário esportivo de jovens e especificamente na competição mostram a influência do comportamento da família na participação das crianças. Na pesquisa de Marsh e colaboradores (2015) com jovens entre 13 e 17 anos (meninas e meninos) foi constatado que os pais não têm a compreensão clara do porquê seus filhos participam do ambiente esportivo, mostrando discrepância entre pais e jogadores nas percepções relacionadas ao elogio, compreensão, comportamento diretivo e pressão. A pesquisa de Holt e Sehn (2008) foi realizada em partidas de futebol com meninos entre 10 e 14 anos, utilizando entrevistas, diário e 120 horas de observação. Os resultados mostraram comportamentos de apoio parental e controle parental, trazendo reações verbais a partir de feedback, incentivo, instrução, equilíbrio, comentários negativos e comentários depreciativos, sendo o comportamento dos pais alterado em função da circunstância do jogo. Os pais apresentaram um envolvimento apropriado com comentários de apoio, ajudando a construir experiências positivas e também um envolvimento excessivo com pressão e comentários negativos, dificultando a participação. Isso de fato, indica que o comportamento dos responsáveis no ambiente competitivo pode prejudicar a atuação da criança, bem como seu desenvolvimento.
A atuação dos árbitros nas competições de futebol na infância requer formação, entendimento das necessidades, características e possibilidades dos jovens, participando como um agente pedagógico no cenário competitivo e auxiliando na formação dos jogadores. Nesse contexto, o árbitro não deve atuar somente na aplicação correta das regras e na busca de um comportamento distante e autoritário para o controle do jogo, mas na orientação das ações e condutas, estabelecendo um canal de comunicação que facilite a compreensão das crianças e que ajude no desenvolvimento de valores, como, o respeito, a cooperação e a autonomia (MARQUES et al., 2013).
A participação dos treinadores em ambientes competitivos é outro fator que influencia diretamente o comportamento das crianças. O treinador figura como papel preponderante para o bom andamento das experiências competitivas dos jovens, exercendo exemplo a ser seguido. Na pesquisa de Santos e colaboradores (2018), os jovens jogadores de futebol salientam que a forma como o treinador trata a equipe de arbitragem interfere como os jogadores irão se relacionar com os árbitros, bem como influencia no desenvolvimento de valores positivos. Os treinadores devem facilitar o desempenho dos jovens, estabelecendo intencionalmente oportunidades para a promoção de habilidades pessoais e sociais (SANTOS; MARTINEK, 2018).
O comportamento do treinador no cenário competitivo tem relação direta com a conduta de seus jogadores, logo, comportamentos negativos tendem a gerar condutas negativas, sendo que essas poderão gerar danos emocionais, psicológicos e até mesmo fisiológicos para as crianças (RAAKMAN; DORSCH; RHIND, 2010). O treinador além de organizar um processo seguro de desenvolvimento, deverá construir experiências positivas, gerando um aprendizado significativo. Ele necessita ter consciência dos objetivos do processo formativo, prezando pelo ensino e aprendizado e não pelo resultado competitivo a qualquer custo, que geralmente é fomentado por clubes e instituições em competições que não se preocupam com as reais necessidades das crianças.
Nas mais diferentes modalidades esportivas, bem como contextos esportivos no Brasil constatamos diferentes estratégias para a organização competitiva. Em muitos casos as ligas, federações, confederações e alguns pesquisadores têm utilizado de forma reduzida o nome das modalidades, como, mini handebol, minivoleibol, mini basquetebol e trazendo os elementos do jogo com menores proporções, como, o campo, a bola, os alvos, o número de jogadores e também alterando algumas regras (DE ROSE; PINTO FILHO; CORREA NETO, 2015; MACIEL, 2011; SANTOS, 2014). Em pesquisa com quatorze federações esportivas do estado do Paraná, Milistetd e colaboradores (2014) indicaram que o futebol apresenta apenas quatro divisões etárias e um número reduzido de modificações competitivas em relação as outras treze federações, sendo o tempo de jogo a única modificação estrutural proposta pela federação. Entretanto, temos o exemplo da Federação Paulista de Futebol que no ano de 2016 adotou as orientações da Fédération Internationale Football Association (FIFA) e reduziu o tamanho do campo e das balizas para a competição na categoria sub 11 (VALENTE, 2016).
O futebol inegavelmente é o esporte de maior expressão na cultura brasileira, entretanto na iniciação, a dificuldade de visualizar o processo em longo prazo muitas vezes leva ao pensamento imediatista e precoce na perspectiva das pessoas que organizam o esporte. Assim, a organização competitiva do futebol na etapa de iniciação precisa atentar para o desenvolvimento positivo da dimensão física, cognitiva e psicossocial, tornando o processo desafiador e com influências significativas para a vida das crianças e jovens (CHOI; JOHNSON; KIM, 2014).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O esporte na infância requer a construção de um ambiente seguro, que possibilite o desenvolvimento harmônico das capacidades e habilidades das crianças. A organização do contexto deve facilitar o estabelecimento de interações positivas entre os diferentes personagens do cenário esportivo, proporcionando uma formação esportiva adequada da infância até a vida adulta. A competição, importante elemento no processo de ensino-treino do futebol precisa ser apropriada as necessidades e características das crianças, respeitando os gostos e aspirações e adequando a organização do jogo conforme as possibilidades das crianças.
As pessoas envolvidas na organização competitiva devem pensar na adaptação da estrutura de jogo, como a diminuição do tamanho do campo, da bola, das balizas, do número de jogadores, bem como instituir regras que facilitem a compreensão sobre o jogo. A competição deve estar conectada aos objetivos do treino e vice-versa, realizando o ajustamento das disposições do jogo e estimulando a tomada de decisão dos jogadores em meio a todo processo de ensino-treino, bem como oportunizando o desenvolvimento constante dos indicadores de jogo, como a estruturação do espaço, a comunicação na ação e a relação com a bola. Os treinadores, figuras fundamentais na competição e que geralmente possuem uma compreensão mais ampla e específica do contexto devem se aproximar e orientar a participação da família e dos árbitros, zelando pela segurança das crianças, bem como propiciando interações positivas e significativas.
Portanto, a competição elemento essencial e constituinte do esporte representa também um componente motivador para as crianças, mas desde que visualizado para além de sua estrutura, ou seja, mantendo o desafio, a representação, a imprevisibilidade e o desequilíbrio. Para assim, além de motivar a participação tornar-se também uma fonte constante de desenvolvimento e aprendizado, tanto para a vida no jogo de futebol, quanto para o jogo da vida.