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Conjectura: Filosofia e Educação

versão impressa ISSN 0103-1457versão On-line ISSN 2178-4612

Conjectura: filos. e Educ. vol.27  Caxias do Sul  2022  Epub 01-Mar-2024

https://doi.org/10.18226/21784612.v27.e022016 

ARTIGOS

As sombras que a invisibilidade da pandemia projeta: quais alternativas para o porvir?

The shadows the pandemic invisibility projects: what alternatives to the future?

Vânia Gomes Zuin1 

Caroindes Julia Corrêa Gomes2 

*Professora da Universidade Federal de São Carlos junto ao Departamento de Química (Associada), credenciada ao Programa de Pós-Graduação em Química e ao Programa de Pós-Graduação em Educação, bem como professora visitante da University of York (UK) e Leuphana University (Alemanha).

**Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Federal de São Carlos.


Resumo

Há meses a população mundial enfrenta a pandemia causada pelo COVID-19, uma situação ímpar e talvez a mais desafiadora que rememoramos. Para a maioria dos sujeitos, essa crise junta-se às demais emergências e reforça injustiças, violências, discriminações e sofrimento, uma vez que são considerados invisíveis e sobrevivem em espaços desprovidos de higiene, saúde, educação e segurança e repletos de outras manifestações de renúncia e impossibilidade. Considerando que a própria estrutura social é a responsável por chegarmos onde estamos, precisamos nos contrapor à inconsciência de uma realidade que se mostra normativa e imutável, apreendendo-a em perspectivas críticas e transformadoras. Dessa forma, este texto parte da seguinte problematização: quais alternativas poderemos vislumbrar no pós-pandemia, visto que as desigualdades e as injustiças aumentam? Delineamos prognósticos do tempo presente a partir do diálogo entre Adorno e Horkheimer (2006) e Santos (2007), utilizando como categorias de análise a racionalidade instrumental, o pensamento abissal, o pensamento pós-abissal e a educação emancipatória. A racionalidade tornou-se o cânon da sociedade esclarecida, fundamentando as estruturas e as relações sociais em uma percepção universal, totalitária e homogênea que despreza e invisibiliza as diferenças. Defendemos uma educação para a contestação, a inquietude e a resistência que desvele e problematize as linhas abissais a fim de pensarmos e agirmos para além delas, vislumbrando alternativas, novas práticas e perspectivas solidárias e sustentáveis, pois quaisquer ideais de progresso e desenvolvimento serão ilusórios enquanto persistirem a invisibilidade “do outro lado da linha”. A reflexão da realidade, em suas estruturas históricas e sociais, efetiva-se como possibilidade de novos caminhos para a compreensão dos obstáculos e potencialidades emancipatórias.

Palavras-chave COVID-19; Racionalidade instrumental; Pensamento abissal; Educação emancipatória

Abstract

For months the world population has faced the COVID-19 pandemic, a unique situation and perhaps the most challenging which we bring to mind. For most individuals, that crisis joins to further emergencies and intensifies injustices, violence, discrimination, and suffering, once they are considered invisible and survive in spaces lacking in hygiene, health, education, and safety and replete of so many other manifestations of renunciation and impossibility. Considering that the social structure is liable for getting us where we are, we need to stand against the unawareness of a reality that displays itself as normative and immutable, apprehending it in critical and transforming perspectives. That way, this text proposes the problematization: which alternatives can we foresee in the post-pandemic world, since the inequalities and injustices increase? Current time prognoses are delineated based on the dialogue among Adorno and Horkheimer (2006) and Santos (2007), using as analyses categories: instrumental rationality, abyssal thinking, post-abyssal thinking and emancipatory education. The rationality has become the cannon of the enlightened society, underlying the social structures and relations in a universal, totalitarian, and homogeneous perception, that despises and invisibilizes the differences. We advocate an education to contestation, to restlessness and to resistance, that unveils and problematizes the abyssal lines, thus thinking and acting beyond them, envisaging alternatives, new practices and supportive and sustainable perspectives, since any ideal of progress and development will be illusory as long as the invisibility “of the other side of the line” keeps on. The forethought of the reality, in the light of its historical and social structures, is an effective possibility of new ways to the comprehension of the obstacles and emancipatory potentialities.

Keywords COVID-19; Instrumental Rationality; Abyssal thinking; Emancipatory Education

Introdução

Em 1969, pouco antes de sua morte, Theodor Adorno (1903-1969) concedeu uma entrevista à revista alemã Der Spiegel, na qual expôs algumas de suas reflexões sobre a relação entre teoria e prática como forma de apreender e transformar a realidade. O contexto gerador da entrevista foi a interrupção de uma de suas aulas por estudantes que integravam o movimento estudantil à época, reivindicando que o professor compactuasse com suas ações (ADORNO, 2003; SILVA; VAZ, 2013). Não por coincidência, este texto também inicia com as mesmas palavras pronunciadas no começo do diálogo entre o entrevistador da Spiegel e o filósofo, pois, ainda que em outra conjuntura histórica e social, elas traduzem, em nossa percepção, a completude do tempo presente.

Há meses a população mundial enfrenta a pandemia causada pelo novo coronavírus (COVID-19), uma situação ímpar e talvez a mais desafiadora na qual rememoramos. Para algumas pessoas as proporções e consequências dessa crise sanitária – em vários setores sociais – refletem um cenário desolador e incerto; enquanto para a maioria dos sujeitos esse cenário já se materializava (de diferentes formas) muito antes das notícias sobre a pandemia serem veiculadas nos meios de comunicação em massa e agora vem se agravando com a mesma rapidez com que o vírus se espalha pelos lugares.

Quando refletimos sobre as controvérsias do planeta, a normalidade e a ordem não são recorrentes. Aliás, sequer existem para aqueles e aquelas que diariamente são impedidos de ser e existir socio-historicamente. São considerados invisíveis, moradores e moradoras das cidades sem direito à cidade (SANTOS, 2020), sobrevivendo em espaços desprovidos de higiene, saúde, educação, segurança e repletos de manifestações de renúncia e impossibilidade. Para eles e elas, a atual emergência decorrente do coronavírus junta-se a outras tantas emergências e reforça injustiças, violências, discriminações e sofrimentos.

Os interesses culturais e políticos que perpassam a sociedade desprezam as maiorias submissas. A própria maneira como o Brasil vem enfrentando a crise sanitária revela, por si só, que as aspirações não se destinam aos cidadãos e às cidadãs em sua totalidade. As meninas e as mulheres, os negros e as negras, os indígenas, os trabalhadores e as trabalhadoras informais e as pessoas que lutam diariamente contra o vírus, a fome, a pobreza e a impossibilidade não possuem seus direitos representados.

Ao considerarmos que a própria estrutura social é a responsável por chegarmos onde estamos, precisamos nos contrapor à inconsciência de uma realidade que se mostra normativa e imutável, apreendendo-a em perspectivas críticas e transformadoras. Dessa forma, este texto parte da seguinte problematização: quais alternativas poderemos vislumbrar no pós-pandemia, visto que as desigualdades e as injustiças aumentam? Para tanto, delineamos prognósticos do tempo presente baseados no diálogo entre Adorno e Horkheimer (2006) e Santos (2007), utilizando como categorias de análise a racionalidade instrumental, o pensamento abissal, o pensamento pós-abissal e a educação emancipatória.

O texto justifica-se pela necessidade de problematizarmos a realidade e compreendermos objetivamente as possibilidades e os desafios emancipatórios para a construção de uma sociedade livre, equitativa para todos e todas e que respeite a vida (em todas as suas formas). No tópico seguinte apresentamos uma reflexão sobre as sombras que a invisibilidade da pandemia projeta, contextualizando, em seguida, a construção do pensamento moderno ocidental e a educação como fundamental para a transformação das relações sociais. Finalmente, ponderamos o futuro que queremos, convergindo realidade e utopia para a construção de um inédito viável (FREIRE, 2019).

Além do vírus e aquém da conjuntura

O SARS-Cov-2 ou COVID-19 foi identificado nos mercados de animais em Wuhan, China, em meados de dezembro de 2019, embora cientistas de pelo menos cinco países, incluindo o Brasil3, tenham evidências da presença do vírus em amostras de esgotos meses antes do primeiro caso registrado (CHAVARRIA-MIRÓ et al., 2020; MAGENTA, 2020). O fato é que as mudanças nos ecossistemas, o modo de consumo e a globalização acabaram influenciando sua rápida disseminação. Em 30 de janeiro de 2020 a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a doença causada pelo novo coronavírus como sendo uma Emergência de Saúde Pública Internacional – o nível de alerta mais alto da Organização – e em 11 de março ela foi caracterizada como pandemia (OPAS, 2020).

Mais do que emergir questões como segurança alimentar e desigualdades, a pandemia assegurou problemas socioambientais que há tempos permeavam o contexto mundial, principalmente em países em que a vulnerabilidade, os direitos e as garantias básicas de sobrevivência são mais precários (ou inexistentes), como é o caso do Brasil.

Destacamos que não é possível concebermos o atual momento como uma situação de crise que se contrapõe à normalidade de meses atrás, a julgar pelas controvérsias vivenciadas em todo o mundo. De acordo com o relatório “Progress on drinking water, sanitation and hygiene: 2017 update and SDS baseline”, da Organização Mundial da Saúde e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), 1,3 bilhão de pessoas no mundo não possui água potável em suas casas e 4,7 bilhões não dispõem de esgotamento sanitário (WHO; UNICEF, 2017), refletindo diretamente no postergar de condições humanamente dignas e que assegurem uma vida saudável.

No Brasil, 46,9% da população não usufrui de saneamento básico e 16,4% não têm água potável em seus lares (TRATA BRASIL, 2020a). Incoerentemente, em 2018, a cada 100 litros de água captados para distribuição, aproximadamente 40 litros foram perdidos durante o processo como resultado de problemas em infraestrutura e gestão (TRATA BRASIL, 2020b). A perda chegou a 6,5 bilhões de m3, ou 7,1 mil piscinas olímpicas desperdiçadas por dia e um prejuízo econômico de 12 bilhões de reais – mesmo valor investido no país em água e esgoto durante o ano (TRATA BRASIL, 2020b).

Os diferentes impactos causados pelo COVID-19 se consolidam de acordo com o lugar ocupado por determinado grupo social, relacionado com questões históricas, sociais, políticas, econômicas e refletido em contradições normatizadas, colocando grande parte das pessoas em situações subumanas. A contaminação do vírus no Brasil iniciou nos centros urbanos e se alastrou às periferias, onde há maior densidade populacional, insuficiência de infraestrutura básica de esgoto e água potável, dificuldade para o cumprimento das medidas de isolamento social devido ao trabalho – na maioria informal – e casas pouco arejadas.

Fortes, Oliveira e Sousa (2020) observam que a dinâmica de contaminação da doença entre as regiões na cidade do Rio de Janeiro é diversa. Na Baixada Fluminense e Zona Norte, onde estão concentradas as famílias com menor poder aquisitivo, os níveis de contágio são mais acentuados quando comparados com os da Zona Sul, que possui o predomínio da classe média alta. Além disso, existe a possibilidade de que esses números sejam maiores em razão dos casos subnotificados – também superiores em locais mais pobres.

Situação semelhante pode ser observada entre as regiões brasileiras. Silva et al. (2020) discorrem que o avanço da pandemia no país está relacionado ao Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de cada região4. Suas análises demonstram que ao longo da pandemia as regiões Norte e Nordeste foram as áreas mais impactadas em comparação às outras, sendo também as que possuem os menores IDHM5.

Pires, Carvalho e Xavier (2020) afirmam que a incidência de doenças crônicas associada aos casos mais graves de COVID-19 no Brasil se correlaciona às pessoas com menor escolaridade (apenas Ensino Fundamental), sendo que essa correlação é ainda mais evidente entre os que possuem mais de um fator de risco. Segundo a OMS, essas doenças6 são a principal causa de morte em todo o mundo e, em 2016, 78% delas ocorreram em países de baixa e média renda. A probabilidade de um adulto entre 30 e 69 anos morrer precocemente em razão dessas enfermidades é aproximadamente o dobro em países mais pobres (WHO, 2018).

No âmbito de possibilitar a criação de sistemas mais resilientes, a alimentação saudável se mostra como um dos fatores essenciais na prevenção e no cuidado às pessoas que possuem enfermidades. Estima-se que a taxa de obesidade mundial triplicou entre 1975 e 2016 e continua aumentando devido a dietas ricas em gorduras e açúcares e ao sedentarismo, sendo que a região das Américas possui a maior taxa de adultos obesos (29%) (WHO, 2018). Em 2016, 340 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 19 anos e 40 milhões de crianças menores de 5 anos estavam obesas ou com sobrepeso, oportunizando o risco de diabetes tipo 2 e a morte precoce na vida adulta (WHO, 2018).

Nesse mesmo ano, 22% dos adultos no Brasil estavam obesos (WHO, 2018), convergindo com o menor consumo de arroz, feijão, carne bovina e frutas e o aumento de alimentos ultraprocessados e fast foods pelas famílias brasileiras; além da ingestão diária de verduras, legumes e frutas ser muito abaixo da recomendada e os níveis de sódio, sal e açúcar estarem acima do limite aceitável (JANSEN; OKUMURA, 2020). A alta exorbitante no valor de alguns produtos – como temos observado – também pode contribuir para o agravamento dessas questões, principalmente entre os sujeitos de média e baixa renda.

No que se refere à saúde, outro fator que merece destaque é o Sistema Único de Saúde (SUS), implementado pela Constituição de 1988 sob os princípios de universalização, equidade e integralidade, sobretudo para os mais pobres e vulneráveis. A pandemia expôs ainda mais suas fragilidades estruturais, notadamente na disponibilidade de leitos e profissionais para o atendimento das pessoas. Lembremos ainda que a situação, já precária, foi agravada por decisões como a Emenda Constitucional nº 95 de 20167, que, dentre outros descasos, reduziu os gastos com saúde pública; e a diminuição de 21% dos médicos e médicas atuando no país devido ao fim do Programa Mais Médicos, reverberando também na escassez desses profissionais em lugares periféricos ou de difícil acesso (JUCÁ, 2020).

É necessário que a gestão epidemiológica do poder público perpasse ações efetivas que garantam a manutenção de direitos e a segurança de seus cidadãos e cidadãs, fundamentando-se em ações responsáveis (social e ambientalmente). O que vivenciamos há anos – assim como durante a pandemia – é o descaso e a omissão refletidos em cortes orçamentários prioritários para o bem comum e o desenvolvimento do país, além de políticas que representam a perda de direitos já consolidados e o postergar de melhores condições, principalmente para as maiorias submissas e diariamente silenciadas.

Santos et al. (2020) afirmam que as notificações do COVID-19 pelos órgãos públicos exteriorizou a subjetividade do racismo institucional, pois a incorporação do quesito raça/cor nos formulários somente ocorreu após o posicionamento e a imposição de algumas instituições8. No entanto, observamos que o boletim divulgado na 36ª semana epidemiológica (30 de agosto a 5 de setembro) ainda permanecia com uma alta porcentagem de desinformação, em que aproximadamente 27% dos novos casos (cerca de 95 mil) não possuíam essa referência9 (BRASIL, 2020).

Para Santos, colaboradores e colaboradoras (2020), a situação expressa a invisibilidade dada à temática, dificultando mensurar o alcance da pandemia em uma perspectiva de equidade e revelando o pouco interesse na formulação de políticas e pesquisas que oportunizem aprofundar as percepções sociais, raciais e econômicas do país. Os autores e autoras discorrem que outros grupos sociais também são invisíveis diante dos números e das estatísticas, como no caso dos moradores e moradoras de rua, que em 2015 somavam mais de 101 mil pessoas, sendo 77% em grandes cidades. A insuficiência de registros fragiliza a tomada de decisões que atinjam esse segmento populacional e se agrava com a crise sanitária, visto que as recomendações não se enquadram a essas pessoas.

O isolamento social e a permanência dentro de casa – principais medidas adotadas para controlar a disseminação da doença –, também se apresentam como exceção quando observamos os noticiários. Exemplo recente foi o despejo de famílias que vivem há mais de 20 anos no Acampamento Quilombo Grande, em Minas Gerais. Além de ignorar a pandemia, a ação de reintegração de posse desconsiderou a produção agroecológica local, reconhecida nacionalmente, e até mesmo a escola comunitária Eduardo Galeano – um dos primeiros locais a ser derrubado (BELMONT, 2020). No momento em que o país atingia 100 mil mortes pelo COVID-19, casas, plantações e histórias eram literalmente destruídas com o amparo das próprias instituições que deveriam garantir a segurança de homens, mulheres e crianças que ali residiam.

De acordo com o documento Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil, divulgado em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre as múltiplas manifestações de desigualdades, raça e cor ocupam destaque por estarem diretamente relacionadas ao processo de desenvolvimento brasileiro, traduzindo-se em maior vulnerabilidade social e econômica para a população preta e parda. Eles e elas são a maioria entre os que moram na rua (SILVA et al., 2021)10 ou estão em situações de privação de liberdade (DEPEN, 2017)11, sobrevivem em extrema pobreza e em domicílios sem abastecimento de água e esgotamento sanitário, possuem os menores salários ou trabalham no setor informal e têm menor acesso à educação (IBGE, 2019)12.

Os indígenas e as populações ribeirinhas também representam grupos esquecidos por políticas públicas e ações para a contenção do vírus. A falta de assistência social e as invasões frequentes de seus territórios colocam em risco suas vidas, identidades e valores culturais, visto que as lideranças são formadas majoritariamente por idosos. Além disso, a exploração ambiental contribui para o agravamento da vulnerabilidade desses sujeitos, que constantemente precisam lutar para a garantia e a permanência de seus direitos e tradições. A lógica de que a prática ilegal diminuiria durante a pandemia foi inversa: o COVID-19 camuflou ainda mais os descasos e os crimes ao ambiente.

Aragão, Silva Junior e Anderson (2020) afirmam que entre agosto de 2019 e maio de 2020 houve aumento de 89% nos índices de desmatamento em relação ao mesmo período do ano anterior. Tais questões convergem com legislações recentemente aprovadas, como a Instrução Normativa nº 9, de 16 de abril de 202013, que legitima invasões e explorações de terras indígenas no território brasileiro ainda não homologadas pelo Estado; e o Decreto nº 10.341, de 6 de maio de 202014, que subordinou órgãos ambientais e (novamente) terras indígenas à jurisdição das Forças Armadas.

Considerando que as áreas desmatadas são posteriormente queimadas, o clima seco pode ocasionar grandes e incontroláveis incêndios. Segundo Aragão, Silva Junior e Anderson (2020), os desmatamentos no início de 2020 foram responsáveis por 50% das queimadas na região amazônica – porcentagem atípica para esses meses. Os incidentes também foram agravados pelo aumento anormal da temperatura do oceano Atlântico, que intensificou as secas e a consequente expansão dos fogos bem como refletiu diretamente na qualidade do ar e na incidência de doenças respiratórias nas pessoas que vivem nos arredores – majoritariamente indígenas e populações ribeirinhas. A situação é ainda mais preocupante no contexto pandêmico, visto que as demandas hospitalares de uma região que já opera abaixo do limite são sobrepostas (ARAGÃO; SILVA JUNIOR; ANDERSON, 2020).

A poluição atmosférica é responsável pela morte anual de 7 milhões de pessoas em todo o mundo e indicada como fator crítico para o agravamento de doenças crônicas15 (ONU, 2018). Apesar de representar uma ameaça para todos e todas, os sujeitos mais vulneráveis enfrentam as maiores consequências, sobretudo porque o problema soma-se a tantos outros e às indiferenças governamentais.

Santos (2020) discorre que as mobilizações políticas e sociais são mais rápidas no caso de emergências em que há alta letalidade em um curto período, ao contrário de crises nas quais a mortalidade se estende ao longo do tempo. De acordo com o autor, tais mobilizações resolvem as consequências, mas não atingem suas reais causas e tampouco são percebidas pela maioria da população. Mudanças climáticas e a miséria, por exemplo, não suscitam respostas imediatas ao seu enfrentamento quando comparadas ao COVID-19.

Respiramos ar poluído, convivemos com a fome, a pobreza, as negligências e os descasos socioambientais ao nosso lado, mas não questionamos o modus operandi da sociedade e seu caminho, a passos largos, em direção ao futuro insustentável. O COVID-19 trouxe inúmeras crises consigo, agravou muitas outras e vem reafirmando a inexistência e a invisibilidade das maiorias submissas.

Compreendemos que as urgentes transformações socioambientais perpassam mais do que o desvelar das controvérsias, sendo necessário apreendê-las no âmago de suas estruturas históricas e sociais. Fundamentamos nossas discussões na percepção de Adorno sobre a relação entre teoria e prática como forma de olhar o tempo presente, uma vez que transformar a consciência é também transformar a realidade. À vista da imanência do pensamento em relação à prática social, delineamos nos próximos parágrafos a consolidação desse pensar como forma hegemônica e normativa na cultura em que vivemos.

A construção do pensamento moderno ocidental e implicações no real

Os seres humanos sempre buscaram aperfeiçoar seu modo de vida por meio do conhecimento de técnicas e instrumentos que possibilitassem sua sobrevivência e bem-estar. Quando refletimos sobre nossa ancestralidade, o domínio do fogo, os primeiros utensílios de pedras e metais, a agricultura, a domesticação de animais, o desenvolvimento da linguagem, da arte e da ciência e outros incontáveis feitos nos permitiriam dizer que caminhamos, desde os primórdios, ao progresso e à civilização graças ao intelecto, pois o desejo de conhecer é, por natureza, característico do ser humano (ARISTÓTELES, 1984).

Mais do que o simples ato de conhecer o mundo inteligível, a humanidade também buscou, ao longo dos séculos, compreender a essência desse conhecer enquanto relação do pensamento com a realidade. Burns (1968) discorre que o auge da revolução intelectual ocorreu com o Iluminismo ou Época das Luzes, iniciado na Inglaterra em meados do século XVI e alcançando seu apogeu dois séculos mais tarde, na França. “Poucos movimentos históricos tiveram efeitos tão profundos no sentido de moldar o pensamento dos homens e orientar o curso das suas ações” (BURNS, 1968, p. 678). Essa foi a reflexão feita pelo autor sobre o período no qual uma das fundamentais concepções passou a ser o uso da razão como o único e infalível guia para o conhecimento (BURNS, 1968).

O Iluminismo foi inspirado, em certa medida, pelas ideias de René Descartes (1596-1650), embora a obra de Isaac Newton (1642-1727) também tenha tido importante significado ao movimento e à construção histórica do pensamento ocidental, fundamentando-se na ideia de que os fenômenos naturais poderiam ser calculados por leis matemáticas universais e a natureza reduzida a interpretações mecânicas e precisas (BURNS, 1968). “A natureza é, antes e depois da teoria quântica, o que deve ser apreendido matematicamente” (ADORNO; HORKHEIMER, 2006, p. 32).

No texto Discurso do Método, publicado em 1637, Descartes descreve que a razão é o poder de julgar e distinguir as coisas verdadeiras daquelas que são falsas e o que diferencia o ser humano (DESCARTES, 1979). Para o filósofo, o caminho da verdade respalda-se na dúvida constante e nos preceitos que fundamentam o método científico, como a divisão dos conhecimentos em tantas parcelas quanto possíveis e necessárias para melhor compreendê-lo e o direcionamento das ideias simples às mais complexas, conduzindo a generalizações (DESCARTES, 1979).

A premissa iluminista acerca da racionalidade transcendeu a época e constituiu a base do pensamento ocidental, conservando sua hegemonia até o tempo presente e materializando-se no sistema político, no econômico, nas relações sociais e na própria construção da personalidade dos sujeitos, reduzindo-os à adaptação e ao conformismo (ADORNO; HORKHEIMER, 2006).

Para Adorno e Horkheimer (2006), a racionalidade propõe transformar homens e mulheres em senhores e senhoras da natureza por meio da ciência e da técnica, mas na medida em que o mundo pode ser calculável e o número se torna o cânon da sociedade esclarecida, o pensar se abstém de seu elemento crítico e se configura como instrumento a favor da ordem existente, permanecendo preso à imediaticidade, à repetição e à falsa individualidade. A razão caracterizou-se em termos sociais objetivos, não como resultado da consciência ou do esclarecimento. Ela se reduziu à adaptação e ao conformismo dos sujeitos frente aos processos e aos produtos que oportunizam o alcance de fins que lhes são estranhos. Estranhos por representarem a negação de suas subjetividades e se manifestarem como renúncia e impossibilidade de exercerem sua vida dignamente.

Com a complexidade e a sofisticação do empreendimento técnico-científico e da estrutura social, o mercado – um megacidadão que somente tem direitos, mas nenhum dever, como bem descreve Santos (2020) – aprofunda desigualdades ao mesmo tempo em que aparece como uma lógica justa, uma instituição neutra que não favorece e nem desfavorece ninguém, prometendo ser a garantia para a promoção dos ideias de liberdade e igualdade almejados pela sociedade, incluindo, mais recentemente, a solução para a crise sanitária do coronavírus.

Trata-se de uma racionalidade instrumental que controla o sistema produtivo e as relações sociais, em que a ética dos processos e dos produtos é conduzida apenas pela geração de lucro e descarte de recursos e sujeitos, obrigando a maioria das pessoas a depender de situações cotidianas em relação às quais são impotentes bem como a permanecer imobilizada em uma conjuntura de desumanização.

Santos (2007) afirma que as injustiças sociais relacionam-se às injustiças cognitivas, na medida em que o pensamento moderno materializa um sistema de distinções visíveis e invisíveis. Consiste em um pensamento abissal, criado por linhas divisoras de realidades sociais que produzem e radicalizam diferenças e impossibilitam a copresença igualitária de lados opostos. O “outro lado da linha” – como denomina o autor – é invisível, inexistente e divide o mundo humano do mundo subumano, favorecendo uma falsa percepção sobre a exclusão, uma vez que seres subumanos sequer são candidatos à inclusão.

A objetivação da racionalidade, mediada pela ciência e pela técnica como força produtiva, se coloca entre o sujeito e a realidade, impedindo-o de reconhecer suas contradições e, por conseguinte, transformá-la. Como um mundo desenvolvido científico e tecnicamente pode apresentar a miséria como uma de suas formas dominantes?

O abismo sociocultural existente entre os sujeitos produz e (ao mesmo tempo) elimina a pluralidade e as distinções que coexistem e são elos complementares. “As distinções internamente visíveis que estruturam a realidade social deste lado da linha se baseiam na invisibilidade das distinções entre este e o outro lado da linha” (SANTOS, 2007, p. 72), pois, ao comportar-se como totalidade, o pensamento abissal diferencia o que está deste lado daquilo que não lhe pertence, tornando-o invisível e inexistente. “Inexistência significa não existir sob qualquer forma de ser relevante ou compreensível” (SANTOS, 2007, p. 71).

A premissa de desenvolvimento e progresso da modernidade ocidental se legitima com a violação dos princípios democráticos de seus cidadãos e cidadãs. De acordo com Santos (2007, p. 79), “direitos humanos são violados para que possam ser defendidos, a democracia é destruída para que se garanta sua salvaguarda e a vida é eliminada em nome de sua preservação”.

Resistir ao silenciamento e à invisibilidade significa fundamentarmos nossa luta em uma epistemologia que não se limite apenas a gerar alternativas, mas que se configure como um “pensamento alternativo de alternativas” (SANTOS, 2007, p. 83), um pensamento pós-abissal. Defendemos, neste trabalho, que a gênese desse pensamento seja uma educação que esclareça e emancipe os sujeitos, conduzindo-os à contestação e à inquietude e reconhecendo a persistência da linha abissal como a base propulsora para pensarmos e agirmos para além dela.

Educação, transformação e pensamento pós-abissal

“A educação não é necessariamente um fator de emancipação” (MAAR, 1995, p. 9). Considerando que ela se encontra no âmago das estruturas históricas e sociais, sua essência é o reflexo das condições objetivas e subjetivas que se materializam ao mesmo tempo em que possibilita a permanência dessa materialidade caso não oportunize o espaço para a crítica, a transformação, a inquietude e a resistência.

Santos (2007) discorre que o paradigma moderno ocidental fundamenta-se na tensão entre regulação e emancipação16, na qual conflitos, acontecimentos, discursos e práticas sociais se baseiam. Da mesma forma, a lógica (invisível) da apropriação/violência é também instaurada nos territórios esquecidos, ganhando força com o encolhimento da regulação/emancipação, já que o domínio desta se reduz e se contamina com a lógica perversa daquela.

Para Adorno (1995), a premissa principal da educação é a criação de mecanismos para que Auschwitz não se repita. No entanto, o autor afirma que a pouca consciência sobre essa exigência e as consequências que ela suscita demonstram que a barbárie ainda sobrevive e reverbera nos processos civilizatórios. Quando muitos acontecimentos nos provam que a violência e o desrespeito à vida ainda permanecem e são usados para legitimar discursos e práticas, discussões sobre a ameaça da regressão à barbárie não são possíveis, uma vez que os fundamentos que a geraram ainda se constituem socialmente.

Destarte, é necessário nos contrapormos à ausência de consciência dos determinismos e das realidades naturais e imutáveis, partindo de uma reflexão crítica sobre o que foi e o que continua sendo Auschwitz. Como uma sociedade esclarecida, no cerne da revolução intelectual, conduziu homens, mulheres e crianças aos campos de concentração? A pretensão de que o conhecimento seria suficiente para a humanização delineou suas próprias contradições humanas e históricas. À vista disso, não é possível pensarmos a educação somente como apropriação de instrumental técnico, é fundamental formarmos a consciência ética e política dos sujeitos, colocando Auschwitz no centro das discussões pedagógicas a fim de que o outro e a outra sejam reconhecidos em sua dignidade humana.

Tendo em vista que a existência das linhas abissais (SANTOS, 2007) foi a base propulsora para o antissemitismo17, seria coerente, neste trabalho, fundamentarmos nossas discussões e nossos ideais formativos em epistemologias pós-abissais. Isso significa uma educação que considere o “outro lado da linha” em perspectivas simultâneas de igualdade e reconhecimento das diferenças bem como pressuponha o sentido da incompletude, da possibilidade de transformar todos os seres em sujeitos, restabelecendo, juntamente com eles, seus lugares na história e no tempo.

De acordo com Santos (2007), a copresença igualitária é a primeira condição para a existência de um pensamento pós-abissal, visto que a modernidade reduziu o ser humano a um só modelo e invisibilizou as pluralidades que nos definem enquanto seres no mundo e com o mundo. Para além do reconhecimento do pensamento abissal, é essencial produzirmos outras formas de entender e agir na realidade a partir de uma formação que compreenda o todo e, do todo, apreenda cada uma das particularidades que o compõem.

As experiências formativas do sujeito não se esgotam na relação com o conhecimento, mas implicam a transformação de si e da realidade. Recuperá-las, em estruturas sociais que inviabilizam a reflexão e a criticidade, oportunizaria pensarmos a razão em seus ideais de autonomia, autodeterminação e liberdade – como apresentou Kant (1974). Essa recuperação, no entanto, não representa simplesmente uma aspiração pelo conhecer enquanto condição puramente intelectual, mas uma necessidade que põe à prova os rumos da barbárie que progride a humanidade.

Na medida em que pressupõe o reconhecimento da pluralidade dos sujeitos em interações sustentáveis e dinâmicas, o pensamento pós-abissal é compreendido por Santos (2007) como uma ecologia de saberes. No contexto deste trabalho, também expressa perspectivas solidárias e harmoniosas que oportunizam respeitar o outro e a outra (e o ambiente) e renunciar qualquer epistemologia geral e unitária.

Além disso, o conhecer precisa se corporificar como intervenção no real, não como sua representação. É incoerente pensarmos uma ecologia de saberes que conceba conhecimentos abstratos, uma vez que convergiríamos para o pensamento alienado e alienante característico da racionalidade instrumental. Trata-se de orientar a prática transformadora e emancipatória a fim de que a teoria seja uma expressão do comportamento crítico frente ao que é socialmente materializado, recusando generalizações e destinos inexoráveis numa “crítica radical da política do possível, sem ceder a uma política impossível” (SANTOS, 2007, p. 92).

Entre realidades e utopias: que futuro queremos?

Em algum remoto rincão do universo cintilante que se derrama em um sem-número de sistemas solares, havia uma vez um astro, em que animais inteligentes inventaram o conhecimento. Foi o minuto mais soberbo e mais mentiroso da história universal: mas também foi somente um minuto

(NIETZSCHE, 2007, p. 25).

Em tom poético, Friedrich Nietzsche (1844-1900) expressa a soberba do intelecto humano em relação ao universo bem como rompe com padronizações e verdades científicas absolutas ao afirmar que o conhecimento é uma invenção efêmera e pontual utilizada pelos homens e mulheres para iludir a si próprios e aos demais.

Com efeito, representamos cerca de 0,01% da vida na Terra (SANTOS, 2020) e precisamos de novas práticas, discursos e compreensões para que ocupemos uma posição mais humilde, responsável e solidária, coerente e consciente de que a defesa da vida e da justiça socioambiental é indispensável para a existência humana digna e saudável.

O COVID-19 nos revelou (e continua revelando) que existem alternativas, outros modos de viver, produzir, consumir e se organizar como sociedade. No entanto, essas novas formulações serão capazes de se materializar? Haverá alternativas quando a que buscamos é a falsa normalidade que nos conduziu à pandemia e nos conduzirá a tantas outras crises? (SANTOS, 2020).

Contrariamente ao que possamos imaginar, o breve futuro pós COVID-19 não será promissor a transformações, visto que as desigualdades aumentarão e os governos e líderes mundiais não estarão aptos a realizar investimentos sociais. Em entrevista no ano de 2019, António Guterres, secretário-geral da ONU, destacou progressos desde a proposição dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável18, em 2015, porém, em contrapartida, salientou que a fome havia aumentado, metade da população mundial ainda não possuía acesso a educação e cuidados básicos de saúde e a desigualdade de gênero continuava reproduzindo os mesmos cenários, dificultando o empoderamento de meninas e mulheres (ONU..., 2019). Além dos grupos sociais cuja vulnerabilidade já precedia a pandemia, os espaços de invisibilidade poderão se multiplicar em muitos lugares, bastando apenas que nossas janelas estejam abertas para enxergá-los (SANTOS, 2020).

Considerando a razão instrumental como forma hegemônica de racionalidade, qualquer oportunidade real de emancipação estaria bloqueada por suas próprias estruturas. Essa aporia, conforme descrita por Adorno e Horkheimer (2006), configura uma crítica cuja possibilidade torna-se cada vez mais precária. No entanto, Nobre (2014) afirma que a maneira como as coisas devem ser é também parte da realidade, uma vez que mostra os elementos que impedem a realização plena de suas potencialidades. Em nossa percepção, as potencialidades constituem uma sociedade livre, justa e plural para todos e todas, não importando sua condição socioeconômica, sua raça, seu gênero, sua religião, sua cor e quaisquer outras características que promovam sua individualidade no coletivo.

Para Nobre (2014), não se trata de utopia, visto que oportuniza enxergarmos, dentro da própria realidade, as possibilidades emancipatórias “de compreender o que é tendo em vista o melhor que ele traz embutido em si” (NOBRE, 2014, p. 10). O desvelar tampouco se materializará sem apreendermos a realidade social como resultado da ação humana, que ocorre, por sua vez, no contexto das estruturas históricas fundamentadas em uma organização social.

Decerto, as linhas abissais continuarão se perpetuando enquanto utilizarmos instrumentos conceituais e políticos que as reproduzam (SANTOS, 2007). Os cenários alternativos precisarão vislumbrar problemas esquecidos e invisibilizados, novas verdades e percepções sobre o nosso papel – individual e coletivo –, além do rompimento com o “progresso” e a “civilidade” que demarcam a contradição entre economia e vida.

Uma educação pós-abissal, que emancipe e esclareça, nos parece ser um dos cenários fundamentais – se não o fundamental – para a transformação das realidades e dos sujeitos, pois as alternativas iniciam a partir de uma sociedade que constrói condições de equivalência. Também afirmamos a necessidade de apreendermos e enfrentarmos as desigualdades elaborando o passado, a fim de dissiparmos suas condições objetivas e subjetivas (ADORNO, 1995). No caso do Brasil, trata-se de refletir sobre o processo de colonização e o de opressão sofridos acerca da barbárie instaurada sob os indígenas, negros e negras. “Após Auschwitz, é preciso elaborar o passado e criticar o presente prejudicado, evitando que este perdure e, assim, que aquele se repita” (MAAR, 1995, p. 11).

Não há realidade sem utopia e tampouco alternativas e possibilidades sem compreendermos as raízes que perpassam nosso tempo presente; considerando, inclusive, as histórias e estatísticas na perspectiva dos vencidos e vencidas. O pensamento moderno ocidental ainda continua abissal19, centrado em uma racionalidade dual e normativa, mas dialogamos durante o texto com uma proposta educativa que possui como premissa ética e política o olhar solidário de atenção para o outro, a outra e o ambiente em uma percepção dialógica, interdependente, transformadora e, sobretudo, sustentável.

Considerações

Longe de pretendermos desvelar todas as invisibilidades expostas pela pandemia – o que seria uma tarefa impossível –, procuramos apresentar as controvérsias em uma perspectiva geral, conscientes de que outros grupos sociais – igualmente vulneráveis – não foram aqui representados.

Após o diálogo realizado entre Adorno e Horkheimer (2006) e Santos (2007), voltamos à problematização inicial: quais alternativas poderemos vislumbrar no pós-pandemia, visto que as desigualdades e as injustiças aumentam? Mais do que transcender a época, a racionalidade tornou-se o cânon da sociedade esclarecida, fundamentando as estruturas e as relações sociais em uma percepção universal, totalitária e homogênea, que despreza e invisibiliza as diferenças e coisifica os sujeitos. Para tanto, defendemos uma educação para a contestação, a inquietude e a resistência, que desvele e problematize as linhas abissais a fim de pensarmos e agirmos para além delas, vislumbrando alternativas, novas práticas e perspectivas solidárias e sustentáveis, pois quaisquer ideais de progresso e desenvolvimento serão ilusórios enquanto persistirem a invisibilidade “do outro lado da linha”.

Ao revisitarmos o texto antes de sua publicação, o futuro que queremos tem se distanciado. Devido ao COVID-19, mais de 550 mil pessoas já não estão entre os seus; vivenciamos o estado do Amazonas – descrito como o pulmão do mundo – lastimar a falta de oxigênio; e os ideais democráticos estão sendo devastados em um misto de barbárie, impunidade e extermínio de direitos. Apesar dos retrocessos e incivilidade, prevalecem espaços, pessoas, ações e discursos que resistem, esperançam e nos motivam no longo caminho a ser percorrido.

Concordando com a percepção de Nobre (2014), a reflexão da realidade, em suas estruturas históricas e sociais, efetiva-se como possibilidade de novos caminhos para a compreensão dos obstáculos e das potencialidades emancipatórias. Sobre isso, gostaríamos de compartilhar, em poucas palavras, as experiências elaboradas nos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Química da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), localizada no município de São Carlos, São Paulo. Para responder às demandas contemporâneas, as disciplinas, nas modalidades presencial e online20, são baseadas em estudos de caso de questões sociocientíficas por meio de uma abordagem interdisciplinar, holística e que considera aspectos de importância local. De maneira geral, elas têm contribuído para o aprendizado de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais, oportunizando condições para que os estudantes possam melhor atuar em situações complexas de maneira ética e contribuir para o desenvolvimento de sociedades mais justas e sustentáveis (ZUIN; GOMES, 2020). É nos interstícios educativos que construímos cotidianamente pontes para cruzar abismos e zonas abissais. Aí reside nosso verbo esperançar no emancipar.

3A pesquisa foi liderada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), detectando a presença do vírus nas amostras de esgoto de Florianópolis a partir de 27 de novembro de 2019, sendo que Santa Catarina registrou oficialmente os primeiros casos em 12 de março de 2020 (MAGENTA, 2020).

4Embora utilize as mesmas dimensões do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – longevidade, educação e renda –, o IDHM possibilita uma adequação dos índices globais ao contexto e à disponibilidade dos indicadores nacionais, sendo mais apropriado para mensurar o desenvolvimento dos municípios e das regiões brasileiras (ATLASBR, 2021).

5O IDHM da região Norte é 0,667, sendo classificado em médio; do Nordeste, 0,663 (médio); do Centro-Oeste, 0,757 (alto); do Sudeste, 0,766 (alto); e do Sul, 0,754 (alto) (PNUD; IPEA, 2016).

6O termo utilizado pela OMS é non communicable diseases (doenças não transmissíveis), incluindo doenças cardiovasculares, câncer, doenças respiratórias, diabetes, entre outras morbidades (WHO, 2018).

7BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Emenda Constitucional nº 95, de 15 de dezembro de 2016. Brasília, DF. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc95.htm. Acesso em: 10 set. 2020.

8O posicionamento partiu do Grupo de Trabalho Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, da Coalizão Negra e da Sociedade Brasileira de Médicos de Família e Comunidade. A inclusão dessas informações nos formulários de saúde é de competência do SUS e obrigatória desde a publicação da Portaria nº 344 do Ministério da Saúde, em 2017 (SANTOS et al., 2020).

9A tabela divulgada de acordo com raça/cor mostra que aproximadamente 17% dos novos casos ignoraram esse quesito e 10% não tinham essa informação (BRASIL, 2020).

10 Silva et al. (2021) analisaram o perfil sociodemográfico da população em situação de rua inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais (Cadúnico). De acordo com os autores e as autoras, a maior concentração ocorreu no Sul e no Sudeste, sendo que nessas duas subpopulações foi predominante a raça/cor preta e parda (67,5%).

11De acordo com o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em 2017 as pessoas pretas e pardas totalizavam 63,6% da população carcerária (DEPEN, 2017, p. 31).

12Em 2018, 8,8% da população preta e parda possuía rendimentos diários inferiores a US$ 1,90 (entre os brancos e as brancas esse percentual era 3,6%). No que se refere aos serviços de saneamento, 17,9% não possuíam abastecimento de água (contra 11,5% da população branca) e 42,8% residiam em domicílios sem esgotamento sanitário (contra 26,5% da população branca). O rendimento médio per capita era R$ 934 (contra R$ 1846 da população branca) e a ocupação no setor informal, 47,3% (contra 34,6% da população branca). Entre as taxas de analfabetismo, observamos que a população preta e parda representava 9,1%, enquanto a branca representava 3,9% (IBGE, 2019).

13BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública. Fundação Nacional do Índio. Instrução Normativa nº 9, de 16 de abril de 2020. Brasília, DF: 2020. Disponível em: https://www.in.gov.br/web/dou/-/instrucao-normativa-n-9-de-16-de-abril-de-2020-253343033. Acesso em: 10 set. 2020.

14BRASIL. Presidência da república. Casa Civil. Decreto nº 10.341, de 6 de maio de 2020. Brasília, DF: 2020. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/2020/decreto-10341-6-maio-2020-790157-publicacaooriginal-160587-pe.html. Acesso em: 10 set. 2020.

15A poluição atmosférica é responsável por 24% das mortes por doenças cardíacas, 25% das por acidentes vasculares cerebrais (AVC) e 29% das por câncer de pulmão (ONU, 2018).

16Essa tensão expressa os ideias positivistas de ordem e progresso. A regulação social é constituída pelas concepções do Estado, da comunidade e do mercado, enquanto a emancipação se respalda na racionalidade (SANTOS, 2007).

17Aversão e/ou ideologia oposta aos judeus. Relacionamos a existência das linhas abissais e o antissemitismo baseado na discussão feita por Santos (2007), em que se afirma que “o outro lado da linha” é sócio-historicamente produzido como inexistente, justificando sua exclusão e, sobretudo, sua subumanidade.

18Organizado pela ONU e com o apoio de 193 países, o evento delineou 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável para responder desafios como pobreza, crise climática, degradação ambiental, desigualdade, paz e justiça até 2030 (UN, 2015).

19Não quereremos afirmar que ele seja a única forma de pensamento abissal, mas não seria o objetivo do texto delinear as outras formas, principalmente considerando que o contexto brasileiro está fundamentado no pensamento moderno ocidental.

20Os cursos Introdução à Química Verde e Sustentável e Introduction to Green and Sustainable Chemistry estão disponíveis no Portal de Cursos Abertos da UFSCar (PoCA) (https://poca.ufscar.br/), sendo gratuitos, a distância e com certificação.

Agradecimentos

As autoras agradecem ao CNPq (311000/2014-2; 421096/2016-0; 310149/2017-7; 166762/2018-0) e à CAPES (88882.426363/2019-01) pelo fomento à pesquisa.

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Recebido: 09 de Dezembro de 2020; Aceito: 03 de Agosto de 2021

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