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Conjectura: Filosofia e Educação

versão impressa ISSN 0103-1457versão On-line ISSN 2178-4612

Conjectura: filos. e Educ. vol.27  Caxias do Sul  2022  Epub 10-Mar-2024

https://doi.org/10.18226/21784612.v27.e022062 

RESENHAS

ORLANDI, Eni Puccinelli. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. Editora da UNICAMP, 2007.

Anna Karolyne Resende Vilar Araujo1 

1Psicóloga graduada na Faculdade Ciências Biomédicas de Cacoal- UNIFACIMED (2020). Pós graduada em Psicologia Existencial Humanista e Fenomenológica pela Faculdade Dom Alberto (2020) Especialista em Didática do Ensino Superior - pela UNIFACIMED (2021). Graduada Pós de Avaliação Psicológica e Psicodiagnóstico (UNIAMERICA). Mestranda em Psicologia Clínica - PUC RIO Atualmente trabalhando como psicóloga escolar e clínica

ORLANDI, Eni Puccinelli. As formas do silêncio: no movimento dos sentidos. Editora da UNICAMP, 2007.


Eni P. Orlandi formou-se pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara em 1964, antes de fazer Mestrado em Linguística pela USP em 1970. Doutora em Linguística pela USP e pela Universidade de Paris/Vincennes em 1976, Orlandi é professora da Universidade de Paris/Vincennes e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara. Seu livro “As formas do silêncio: no movimento dos sentidos” foi originalmente escrito como um exercício de composição; seu título descreve como o silêncio funciona como um elemento coesivo na arte. Orlandi discute dois conceitos relacionados ao silêncio: silêncio implícito e silêncio fundador. O silêncio implícito é quando os sons estão presentes sem serem reconhecidos, enquanto o silêncio fundador é simplismente quando um silêncio é formado por intenção. A autora Eni afirma que esses dois elementos estão ligados, pois sem a intenção, não há reconhecimento implícito e a intenção estabelece o silêncio fundador. Orlandi passa a discutir a censura através do silêncio, que ela acredita ser uma política imposta pelos ditos silêncios.

As ideias atuais partem da investigação filosófica, pois apontam para os esforços do Estado para consolidar tendências históricas por meio de suas ferramentas ideológicas. Essas ideias desgastam as ideologias políticas do passado, que buscavam manter um ponto de vista interessante em uma pequena parcela da população. Ao criar um novo significado, as palavras devem primeiro permanecer quietas e desprovidas de significado. Esses primeiros silêncios estabelecem a necessidade de novas palavras, a necessidade de criar novos significados. As palavras requerem um espaço onde possam significar e remontar a ilusão da compreensão. E essa ilusão de remontagem é exatamente o que as pessoas desejam: um começo e um fim autênticos (BERTOLUCCI; ORLANDI, 1997). Considerando esse desejo de fechamento, os professores podem ajudar os alunos a entender que o primeiro silêncio serve como um componente essencial da linguagem. Quando as linhas de significado se cruzam, surge a divergência ou a concordância. Independentemente da origem, esses eventos interdependentes tornam-se irreversíveis. Silêncios significativos obedecem a esse aspecto. Como a ausência de resposta verbal é entendida como ocorrência significativa, o interlocutor pode discernir relações de expectativas e possibilidades em cada resposta.

Como o silêncio é parte essencial do trabalho, dinâmicas políticas de acordo silencioso são evidentes no processo de criação. Isso leva à revelação do que é considerado “não dito”, porque está inerentemente presente. Ao manter o silêncio, torna-se inevitável o apagamento necessário do que não é dito. A divisão que resulta desse processo de silenciamento também significa o não dito ao estabelecer uma fronteira. O texto explica que duas palavras implicam uma relação de “poder dizer”. O silêncio nesse sentido indica que tentamos apagar certos pensamentos ou ideias. Além disso, dizer “x” sobre “y” revela a intenção de ignorar o implícito. Isso significa o descarte de informações ou significados importantes.

Reconhecer publicamente a censura é um grande negócio. Por isso, os brasileiros devem estar cientes da importância do “cálice” composta por Chico Buarque e Gilberto Gil em 1973, expõe a realidade do regime militar na melodia. O “cálice” refere-se ao ato de silenciar a música ao retirá-la da circulação pública. Ao examinar a censura musical, muitos músicos e letristas criativos no Brasil perceberam a importância do silêncio como indicador de censura. Além disso, cada momento adicional de silêncio adiciona mais significado e peso do que qualquer outro marcador.

A primeira linha do subtítulo do livro de Orlandi (2007) exemplifica a fluidez e o movimento que a autora procura transmitir com seus conceitos. Como afirma o livro, essa percepção foge ao sujeito, o que paradoxalmente o torna transgressor de regras e dicionários. O desafio dos sentidos a esses construtos cria uma falta que a autora associa ao silêncio. Essa falta está associada ao excesso de linguagem, que ela afrima em vários trechos do texto. Para melhor transmitir o significado da primeira obra, uma segunda camada de retórica é adicionada. Isso serve para demonstrar que o silêncio não é desprovido de sentido; em vez disso, é um conceito propositalmente sem palavras que não funciona como um vazio na teoria.

De acordo com Primi (1998), o raciocínio analítico vem do processo de conceituar e dar exemplos. Essas funções demonstram o mérito da ferramenta em analisar conceitos e silêncios ao liberar informações sobre como os conceitos interagem entre si e seus falantes. De uma perspectiva discursiva, as marcas indicam silêncios que insinuam a natureza do significado através de várias disciplinas.

Quando o silêncio desempenha um papel importante em uma obra de arte, torna-se muito mais difícil analisá-la. O silêncio é extremamente importante na formação da estrutura geral de uma obra de arte; ele permite que o público crie suas próprias interpretações únicas do que está sendo percebido. De fato, o silêncio de uma obra específica pode ajudar a formar a identidade do público.

Eni Orlandi acredita que a sociedade passou a entender o silêncio como uma construção histórica. Isso leva à criação de cultura, tradições e contratos sociais. Os indivíduos não criam essas coisas; em vez disso, são instituídos pela história. Quando o contrato social é quebrado por alguém que quebra qualquer uma das ideologias de silêncio definidas, nasce a censura. Isso ocorre porque as pessoas veem que quebrar o contrato não é aceitável, mesmo que suas intenções sejam boas. A censura não é algo que pode ser imposto pela vontade de uma pessoa. Em vez disso, é um fenômeno histórico criado por pessoas que veem que a violação do contrato é prejudicial. Qualquer ato relacionado a silenciar os pensamentos ou palavras de alguém estende a ideia de censura a qualquer processo que cale alguém em termos de encontrar significado. Orlandi (2007, p.79 ) cita isso como sua inspiração para escrever o pensamento:

[...] a interdição manifesta da circulação do sujeito, pela decisão de um poder de palavra fortemente regulado. No autoritarismo [...] o sujeito não pode ocupar diferentes posições: ele só pode ocupar o “lugar” que lhe é destinado, para produzir os sentidos que não lhe são proibidos

(ORLANDI, 2007, p. 79)

Fica claro pela leitura da literatura que o silêncio não é interessante para todas as pessoas. Há momentos em que o silêncio é inconveniente, sempre inútil para a sociedade. Todo papel que a sociedade exige que o indivíduo desempenhe requer certos comportamentos. Por padrão, esses comportamentos respondem ao poder corrosivo do silêncio que revela outros lugares fazendo outras coisas quando em silêncio. Sem um discurso claro, as necessidades da sociedade seriam violadas. Cada indivíduo deve poder exercer seu direito perante o coletivo. É por isso que certos lugares são essenciais. Ao defini-los como tal, o discurso claro pode ser mantido. É assim que a sociedade pode funcionar corretamente.

Assim, o significado do silêncio é único em todos os sentidos. Ele força as pessoas a prestarem atenção, porque esconde informações, revela o que foi dito ou o que alguém pretendia e cria um sentido real de algo. E como o silêncio pode reverter a informação que oculta, pode ser o oposto da fala – que pode ser realmente o oposto. Orlandi afirma que o silêncio é o “não um” onde é preciso considerar os processos de construção dos sentidos e a historicidade, que se refere aos diversos significados. É também fruto do sentido literal e da indefinição da relação entre múltiplas formações discursivas. Por isso requer suporte.

O silêncio é uma representação do conceito completo e seu oposto. Pode revelar a verdade de uma afirmação sem preconceitos. Ao se basear no silêncio como ponto de partida para a busca de algo de que se precisa, como é comum nos ordenamentos jurídicos atuais, isso mostra que “todo discurso já é um discurso que fala com outras palavras, por meio de outras palavras”. Isso pode ser visto na complexidade do discurso de hoje (ORLANDI, 2007, p. 15).

Ao examinar as implicações da ideologia política no silêncio do sujeito, determina-mos que sua inação é parcialmente legítima devido à sua posição de poder. Ao entender cada momento de silêncio como uma oportunidade de afirmação da fala, conseguimos significar as particularidades do discurso silencioso. Esse método nos forneceu uma maneira de identificar quando os sujeitos estavam expressando seus pensamentos, atribuindo-lhes uma característica relacionada à fala. Essa abordagem nos permitiu interpretar qualquer instância de silêncio como uma declaração política. Eni Orlandi (2007) enfatiza a importância da comunicação verbal e não verbal. Ela estabelece que as palavras inerentemente apagam as “outras” palavras, necessitando de uma comunicação local e silenciosa. Além disso, ela revela que a comunicação não verbal é tão importante quanto a comunicação verbal. Isso porque: a) o silêncio cria espaço para o recuo do significante, o que nos dá condições de significar; b) silêncios verbais – ou uma palavra necessariamente apaga a “outra” palavra; e c) silêncios não verbais – a própria censura, que é o que é proibido dizer em determinada conjuntura.

Uma das muitas vantagens dos discursos jurídicos é que eles exploram o entendimento da autora Eni Orlandi. O artigo 5º, inciso LDXIII, da Constituição Federal estabelece que é assegurada ao preso a legítima defesa e a assistência de advogado quando listados seus direitos. Além disso, eles têem a garantia de ficar em silêncio e não dizer nada. Isso é visto na Constituição Brasileira, afirma que todos têm o direito de permanecer calados e não dizer nada contra suas crenças.

A segunda perspectiva de Orlandi (2007) envolve observar a postura. As pessoas inconscientemente concordam em manter uma certa postura quando estão em uma determinada área. Isso cria um contrato social sobre como eles devem se comportar, que é imposto pela moral e ética da sociedade circundante. As palavras das pessoas também estão em conformidade com o acordo, porque são entregues através apropriado. Como entendemos em nossa análise prévia, o silêncio tem um impacto muito maior do que apenas abster-se de falar. Também envolve escolher não falar e transmitir mais a cada elocução. Como resultado, o contrato social obriga todos os participantes a respeitar esta forma de comunicação silenciosa. Até que ponto a outorga do poder de criar um judiciário silencioso prejudicaria a ordem democrática do país? Vamos examinar isso agora.

Mesmo que não compreendamos o significado pleno de uma situação, os silêncios não são suficientes para resolver todos os enigmas do discurso. Em vez disso, precisamos pensar fora das definições tradicionais e aplicar nossa imaginação para entender o que realmente está acontecendo. Eni Orlandi nos encorajou a usar essa abordagem citando seu trabalho como exemplo. As ferramentas necessárias para interpretar o significado de um determinado discurso incluem gravações de áudio e transcrições de texto. O silêncio pode ser uma parte importante de um discurso, geralmente destaca ideias que requerem investigação. Isso significa que construir o discurso dos juristas com a comunidade requer entender as estruturas linguísticas do ambiente local.

Isso, porque o silêncio é muitas vezes um sinal de contradições conceituais que precisam ser compreendidas. O trabalho de um advogado é usar suas palavras para comunicar fatos e ideias. Mas um advogado que só fala do trabalho do Judiciário é limitado. A fala dele seria restringida pelas pessoas que estão ouvindo, porque ninguém consegue entender os pensamentos por trás de um longo silêncio. Como os silêncios são a parte mais saliente dessa obra, e não há outra forma de contestá-los, é preciso que a imaginação preencha com suas palavras as lacunas da fala do advogado. Tendencioso e não objetivo, o processo de tomada de decisão é antiético e imoral, porque capacita o agente a afirmar arbitrariamente suas crenças. Qualquer movimento histórico ou ideológico deve funcionar por meio da ação coletiva; tanto o público quanto o orador compartilham a responsabilidade por esse processo. Quando agem coletivamente, as pessoas cometem atos históricos ou ideológicos. Isso ocorre porque os movimentos usam a imaginação para criar uma causa legitimada, repetindo as mesmas ações várias vezes (muitas vezes por meio de movimentos sociais).

Embora falte o que se busca em um discurso completo, esse silêncio ainda é elogiado por Orlandi. Mesmo sem o discurso do silêncio, não há fim fechado para a busca de tudo o que está implícito no conceito de linguagem. Como observa a autora, o silêncio não é o abismo dos sentidos, nem o nosso lugar no mundo. Ao aceitar sua natureza contraditória como um “um” com um “múltiplo”, o sujeito trabalha seu problema fundacional. Essa contradição cria o “um” com o “múltiplo”, que os sujeitos aceitam quando se deslocam e se duplicam para observar que todo discurso tem outro lado – outro discurso que lhe dá um sentido real (ORLANDI, 2008).

Ao observar como um determinado discurso se desenvolve, podemos discernir a importância do contexto para seus estados em andamento. Perguntas como quem fala, com quem fala, o que está sendo dito e quando é dito devem ser respondidas antes que um discurso possa ser entendido e interpretado adequadamente. Para responder a essas questões, os pesquisadores examinam o lugar do sujeito enunciador no discurso. O sujeito pode ser considerado um agente do Poder Judiciário atuando em seu nome. Para separar os conceitos de “um” e “múltiplo”, um falante precisa encarar suas intenções e métodos de comunicação de frente. Fazer isso requer dividir um tópico em partes menores e, em seguida, encontrar temas interpretáveis na bagunça resultante. Uma vez feito isso, pode-se refinar o significado de suas palavras e produzir um entendimento coerente.

Por meio da consideração do silêncio, percebe-se a imensa dificuldade de explorar a natureza da Análise do Discurso. Por exemplo, por meio da reflexão entendemos que a produção de significados das palavras cria efeitos contraditórios. A chegada de novos significados de qualquer lugar também ressalta a necessidade de criar significados em primeiro lugar, pois falamos com palavras que já possuem significado. Consequentemente, a reflexão nos ensina que, embora as palavras tenham um significado inerente, esse significado pode chegar de qualquer lugar e se mover e mudar em outras direções.

A autora afirma que os sentidos ganham sentido ao mesmo tempo em que se movem. Isso, porque a decisão de se calar seletivamente resulta em insegurança e instabilidade jurídica. Na verdade, isso resulta na ruptura da Ordem Democrática de um país. Eles são interrompidos não apenas no sistema legal, mas também no fluxo social, linguístico e intencional do país. Isso vale também para todos os sentidos já estruturados em um discurso repleto de significados. O ordenamento jurídico brasileiro exige que todas as decisões sejam tomadas com imparcialidade. Isso, porque, ao tomar uma decisão, é necessário que o tomador de decisão seja imparcial tanto na decisão quanto no não cumprimento desta. Além disso, dizer a coisa errada quando confrontado é proibido por lei. Portanto, quando alguém diz algo que não cumpre a lei, mas não age, na verdade está dizendo algo a favor ou contra alguém, porque o descumprimento da lei é expressamente proibido quando provocado.

A Análise do Discurso revela anomalias no ordenamento jurídico que permanecem despercebidas pelo público ou identificadas incorretamente devido à má manutenção dos registros. Ao identificar essas anomalias, entendemos que a lei não se destina a todos, mas atende a determinados interesses. Isso fica evidente por meio de silêncios sobre provas concretas em registros que revelam a natureza ideológica e política do agente assaltado, o que demonstra que não falar tem consequências políticas e mina a noção de que “a lei é para todos”. Consequentemente, não há medida de justiça encontrada na legislação quando um indivíduo opta por permanecer calado diante de fatos ou provas contra ele, ou quando estes são apresentados a um juízo de valor sobre o qual decidem omitir o julgamento – independentemente de sua natureza –, o que resulta em prejuízo à ideia de justiça representada.

O campo jurídico se beneficia especificamente do estudo do silêncio no discurso. Isso se deve, em parte, à natureza da lei e seus princípios correlatos, que devem ser devidamente compreendidos para a adequada aplicação adequada em juízo. Muitos outros campos também se concentram nesse fenômeno, como a linguística e a retórica. Um dos conceitos que Orlandi revela em seu compêndio é a importância do silêncio no discurso. Ela explica como isso pode ser aplicado a outras áreas e por que é relevante para tantas disciplinas.

As formas de silêncio se materializam nos fatos históricos, porque são importantes quando os fatos acontece. Além disso, algumas formas silenciosas tornam-se desprovidas de sentido por não fornecerem qualquer visão sobre as declarações públicas do Judiciário. Em vez disso, essa declaração pública é muitas vezes o resultado de uma declaração verbal de alguém com autoridade, como um juiz.

Conhecer as especificidades da pesquisa de Orlandi facilita a identificação dos significados implícitos nos discursos políticos. Isso permite desconstruir os subtextos que os políticos usam como cobertura para se envolver em atividades fora de sua jurisdição. Com isso, pessoas com formação adequada podem começar a desconstruir os silêncios dos discursos políticos. Também é possível obter ferramentas para desconstruir discursos políticos interagindo com pesquisadores. Essa é uma tarefa difícil, porque não é atraente para aqueles que estão no poder.

Além disso, não se deve limitar a Análise do Discurso à busca de categorias estanques. Considero este livro importante, porque criou uma série. Já o vi ultrapassar mais de dez edições. Além disso, ele cria novos livros e os adiciona a cada versão. Por demonstrar a relação entre linguagem e realidade, é considerado exemplar na Educação. Busquei encontrar pontos em comum entre a relação entre os falantes, sua afinidade com o assunto sobre o qual se fala e como os falantes se relacionam com o conteúdo do discurso. Bem como compreender a relação entre as palavras e seus referentes, e como isso se relaciona com a forma como os falantes se relacionam entre si.

Quando aprende a Análise do Discurso, passa-se a entender que a interpretação de um texto pode variar. A Análise do Discurso enfatiza os pensamentos políticos, inconscientes e outras diferenças dentro dos textos. Fazer essas observações e tirar conclusões é elementar ao estudar a retórica. O que fascina e seduz no estudo da Análise do Discurso é a sua prática de pensamento e a forma como abre o nosso mundo a novas ideias e desafios. Entender que ideias diferentes podem ter o mesmo significado me impulsiona nessa direção. É por isso que é preciso distinguir entre interpretar, compreender e compreender. Tudo o que se precisa entender é a língua que está sendo falada.

As pessoas devem entender que a linguagem não é propriedade privada; é histórico e social. Não é transparente, então as pessoas não deveriam percebê-lo dessa forma. A forma como um sujeito é percebido influencia a sua identidade e significado. Esse conflito entre percepção e compreensão motiva a indagação de Pêcheux (2006) combina as ferramentas interpretativas da teoria e da análise. Isso define o caminho para interpretar a experiência como uma combinação de ambos os sentidos e autorreflexão. Perscruta a opacidade do texto para perceber sua falta de clareza. Para discernir e rejeitar nossas próprias interpretações para não ficarmos paralisados por nosso próprio entendimento.

A ideologia se materializa como linguagem por meio da qual as pessoas discutem seus princípios. Isso significa que a materialidade da ideologia é o discurso, e a materialidade do discurso é a linguagem humana. Consequentemente, essa mudança em relação às ciências sociais e comportamentais deve ser considerada muito importante. A ideologia existe como uma forma de pensar, não apenas um conjunto de crenças. Ele pode ser encontrado no contexto de qualquer prática discursiva e não é um “conteúdo” estático a ser colhido de quaisquer argumentos formalizados.

No Brasil duas ideologias formam a base de um sujeito histórico. Essas ideologias se entrelaçam com a política linguística para criar um sujeito histórico distinto. Esses movimentos ligam os indivíduos aos sujeitos que habitam (ALTHUSSER,1985, p. 93). Para entender melhor o que percebo como individuação do sujeito, é importante primeiro entender o contexto histórico em que meu estudo se insere. O sujeito moderno é representado através

de uma forma-sujeito historicamente estabelecida – a capitalista. Essa pessoa jurídica é representada por seus direitos e deveres, sua livre troca de recursos e sua capacidade de expansão livre. Instituições estatais, como as escolas, moldam o conceito de individualidade em uma forma encapsulada. Isso leva a um ser vivo com livre arbítrio e responsabilidade.

O Estado busca individualizar esses sujeitos, retirando seu significado cultural e histórico. Quando despojado desses elementos, esse indivíduo pode se tornar um mero reflexo ou variação. Porque não podemos resistir ao apelo da linguagem à sujeição, não somos sujeitos. Podemos resistir à forma como o Estado nos torna entidades individualizadas por meio das instituições que cria. Isso significa que não devemos nos curvar à maneira como as instituições nos “produzem em massa” de maneira serial.

A autora Orlandi (2007) escolheu abandonar o uso da palavra “interação” e continuou a manter distância filosófica de outros aspectos da pragmática, como interação. Em vez disso, se dedicou academicamente à Análise do Discurso e focou em outros conceitos. A Análise do Discurso analisa como a linguagem serve como uma prática social com significado espiritual em vez de apenas uma participação casual. Rejeita ideias de comunidade e família, pois estas não abordam adequadamente a questão da competição no conceito de classe.

Ao navegar na internet, muitas vezes sentimos que estamos em um ambiente urbano. No entanto, entender a Análise do Discurso nos leva a perceber que existem dois pontos de vista diferentes em relação à internet. Uma pessoa vê a internet como um lugar em que as pessoas navegam em relações de significado; o outro o vê como um onde as pessoas praticam gestos de interpretação. Essas diferenças levam a novas ideias. Por exemplo, navegar na internet nos leva a acreditar que estamos interagindo com informações. Na realidade, porém, estamos textualizando nossos dados em textos e imagens. Uma diferença ainda maior está entre esses pontos de vista: uma pessoa percebe a internet como um lugar de produção urbana, enquanto outra a percebe como informação textualizada. A criação, propagação e manutenção do significado acontecem simultaneamente. Isso significa que os instrumentos tecnológicos moldam a forma como nos expressamos ao exigir uma série de eventos: a formação, circulação e regulação das ideias.

O discurso eletrônico tem características específicas que sugerem consequências específicas sobre sua função autor e efeito leitor. Essas características incluem a maneira como as ideias circulam pelos sentidos. Assim, podemos dizer que quando pensamos no discurso eletrônico, embora os momentos sejam indissociáveis, olhamos para o processo de circulação como uma porta de entrada. Em seguida, olhamos para os outros dois momentos atráves dessa lente. Esse modo de transmissão no discurso eletrônico nos faz pensar que, por ser tão único, provoca certas mudanças no funcionamento de nossas memórias. Isso está diretamente relacionado a como cada faculdade sensorial funciona. A memória possui três categorias distintas: memória interdiscursiva, memória institucional ou arquivo e memória metálica. A memória discursiva ou interdiscussiva é alimentada pelo esquecimento em que uma pessoa sem voz se articula. M. Pêcheux (1997 [1983]) afirma que essas ideias são materiais e significativas (ORLANDI, 2005.).

A afirmação de M. Pêcheux (1999, p. 56) de que “algo fala antes, em outro lugar, independentemente” descreve um fenômeno que ocorre antes de nossas palavras. Isso significa que nossas palavras já contêm outras palavras já ditas a eles. Em contrapartida, o arquivo institucional ou simplesmente a memória de arquivo é aquele que não esquece. Em vez disso, é o que instituições como a escola, museu ou mesmo eventos praticam e padronizam regularmente. Isso fornece significado padronizado e contribui para o estado de individualidade de cada sujeito, mantendo uma textualidade documental. Novas tecnologias fornecem memória metálica, que é horizontal e não vertical por natureza.

A importância da interpretação não pode ser negada, razão pela qual diferentes formas de memória estão relacionadas a ideologias. Isso leva a diferentes formas de armazenar informações e formar o circuito de constituição/formulação/circulação. Além disso, cada forma de memória afeta a maneira como o emissor funciona e como o receptor a experimenta. No que diz respeito à questão da memória, a forma material do texto afeta a natureza da informação processada. A produção de texto também afeta o funcionamento da informação, influenciando os significantes utilizados. Diferentes linguagens quebram a produção de texto e criam um modo diferente de significação.

O que é um texto? É uma unidade de significado que se relaciona a uma situação particular. Essa definição pode manter-se coerente com sua natureza textual, que justapõe memória e fatores de produção. Ao considerar a materialidade de um texto surgem diferenças significativas. Ao examinar uma imagem como um texto pode-se entendê-la como um objeto simbólico, significativo e único com efeitos materiais. As imagens contêm múltiplas materialidades que produzem significados e efeitos específicos. Por possuírem uma materialidade separada dos textos, as imagens são capazes de criar significados simbólicos por meio de diferentes linguagens e formas de significar. Consequentemente, as imagens se comunicam por meio de textos eletrônicos de maneiras que nenhum texto pode. Já discuti isso antes; no entanto, vale a pena repetir.

O discurso eletrônico se vale de uma multiplicidade de textualidades e materiais tangíveis para criar seus efeitos. Como o discurso eletrônico ganha sentido a partir da coexistência dessas diferentes materialidades significantes? Além disso, como as formas materiais significantes estão relacionadas? A análise discursiva sugere que essa relação não é simples adição. A relação entre o espaço e sua materialidade é muito mais complexa do que se entende atualmente. Por natureza, o espaço representa a materialidade com vários significados.

Para entender o espaço digital, devemos começar com um enquadramento de quais fenômenos ele configura. A noção de urbano digital nos coloca diante da questão: que interpretação dos efeitos urbanos ou digitais ela produz? Assim como nos anos 60, nossa compreensão da leitura é questionada. Nesse sentido, perguntamo-os: o que significa ler? Ao derivar o termo “discurso eletrônico”, sua compreensão tornou-se necessária para questionar o quão transparente é a linguagem em formas eletrônicas. O mesmo se aplica ao significado da leitura ali — e mais ainda ao significado da escola nesse clima discursivo. Para conseguir isso, elaborei uma série de questões sobre a linguagem que transcendem a transparência do discurso eletrônico.

A Análise do Discurso fornece informações sobre como a linguagem, o assunto e a história se relacionam entre si. Isso é alcançado através da ligação de palavras, ideias e eventos em uma ordem aparentemente aleatória. Ele revela a materialidade e a organização da linguagem examinando a maneira como as palavras se conectam umas com as outras. Hoje, o discurso enfrenta um paradoxo fundamental. Quem a estuda deve conciliar suas contradições, falácias, falhas e mal-entendidos. Mas outros esperam erradicar esses problemas com um foco singular.

Os textos do fundador são abertos à interpretação, criando um desafio para os leitores pensarem por si mesmos. Em vez de aceitar esse desafio, alguns leitores buscam o fechamento interpretando os textos de outros. Eles adquirem conhecimento de teorias que já foram desenvolvidas por outros autores e desenvolvem teorias próprias. Isso apesar de o criador não ser um participante ativo nos sentidos ou nos pensamentos formados nele. O sujeito não controla como seus sentidos são formados ou sobre o que ele pensa. E mesmo que possa ser considerado a origem de si mesmo, ele não tem controle total sobre esses processos.

Os profissionais de Análise do Discurso podem vir a acreditar que não podem limitar sua exploração a um ponto final. Em vez disso, eles devem abordar cada nova descoberta com curiosidade. Eles não deveriam interrogar as autoridades; em vez disso, devem colaborar com elas nas diferenças em seu trabalho. Questões sobre linguagem nunca fecham. Eles retornam perpetuamente.

Referência

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Recebido: 25 de Novembro de 2022; Aceito: 25 de Novembro de 2022

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