INTRODUÇÃO1
Na última década a história da educação em Brasília vem sendo redescoberta e revisitada pela historiografia (cf. PEREIRA et al., 2011; PEREIRA et al., 2018; CHAIN, 2018; ANJOS e BARBOSA, 2020; ANJOS, PINTO e MÜLLER, 2020; BARBOSA, 2021). As narrativas históricas elaboradas nesse período, em sua maior parte, têm destacado o caráter inovador do sistema público de ensino local, planejado por Anísio Teixeira quando na direção do INEP. Tal sistema estribava sua organização em centros de educação elementar (compostos por Jardins de Infância, Escolas-Classe e Escola Parque), centros de educação média e a Universidade de Brasília, todos devidamente adaptados à arquitetura e urbanização modernistas da capital federal, planejada em fins da década de 1950 e inaugurada em 21 de abril de 1960 (PEREIRA, 2011). Valendo-se da possibilidade de realização de entrevistas com professores e ex-alunos (PEREIRA e ROCHA, 2011; SOUZA, 2011; MARTINS, 2011) - fontes valiosas, mas nem sempre perspectivadas por essa historiografia, carecendo quando de sua utilização de uma adequada separação entre história e memória - tem se delineado pelas mãos de parte dos historiadores a imagem de uma escola utópica, na qual professores denominados “pioneiros” realizaram pela educação local algo que nunca mais foi concretizado pelos que os sucederam: um ensino abnegado, integral, avançado para o período, de qualidade e que materializou os ideais da escola ativa (defendidos por Anísio Teixeira) em práticas escolares inovadoras, que teriam marcado época, sido esquecidas e, agora, resgatadas pela historiografia da educação, sobretudo, a produzida em torno do futuro Museu da Educação do Distrito Federal.
Em um olhar mais detido sobre essa historiografia, em trabalhos como o de Eva Waisros Pereira e Pedro Mesquita de Carvalho (2011) e Pedro Mesquita de Carvalho (2011), nos quais estes recorrem não às fontes orais, mas, sobretudo, a notícias extraídas do Correio Braziliense, um periódico daquele tempo, flagra-se um cenário mais complexo e contraditório, embora menos valorizado nas análises historiográficas a que hoje se pode chamar de hegemônicas. Ao acompanharem no rastro das notícias desse jornal o processo de implantação do sistema de ensino, Pereira e Carvalho (2011) dão visibilidade a uma série de percalços enfrentados naqueles primeiros anos da educação em Brasília, como a explosão demográfica e escassez de escolas; déficit de professores; promessas não realizadas pelo governo para com os primeiros docentes, a exemplo do caso de oferta de moradia não efetivada, dentre outros. Pedro Mesquita de Carvalho (2011), por sua vez, acompanhando nas páginas do Correio Braziliense o primeiro ano escolar de Brasília, desvela os conflitos ocorridos entre os primeiros professores e as autoridades do ensino da capital, nos quais fica claro que entre o plano anisiano e a realidade escolar havia uma considerável distância, a qual a memória dos primeiros professores, com o passar dos anos, tendeu a minimizar e subsumir/reinterpretar quando da coleta de suas entrevistas para a escrita dessa história.
Do que foi, em termos historiográficos, brevemente recuperado até aqui, evidencia-se que uma história da educação em Brasília implica ser analisada sob múltiplos enfoques e a partir de diversas fontes, que deem conta de apreender uma realidade educacional marcada por avanços e limites; que superem as brumas de uma memória épica e romantizada presente na fala de alguns sujeitos dessa história - fontes, repito, importantes, mas parciais como o são toda documentação histórica - e avancem na escrita de uma narrativa que busque compreender tanto as realizações como as contradições que em matéria de educação tiveram lugar na Brasília dos anos 1960.
No bojo dessas reflexões é que se inscreve o objetivo deste artigo: tomando como fonte o jornal Correio Braziliense, mais especificamente a coluna “Visto, Lido e Ouvido”, da autoria do jornalista Ari Cunha, intenta-se analisar as críticas nela veiculadas ao sistema de ensino de Brasília entre os anos de 1960 a 1965, datas balizadoras dentro das quais foram localizadas no periódico importantes informações sobre a educação na capital federal nos primeiros anos de sua implantação. A hipótese em tela é de que, por meio das críticas tecidas por Ari Cunha, é possível vislumbrar de forma mais concreta o cotidiano escolar em Brasília, com seus avanços e insucessos, reveladores, por isso, da dinâmica educacional vivenciada pela escolarização na cidade recém-inaugurada.
O artigo divide-se em duas partes. Na primeira são apresentados o jornal Correio Braziliense e a coluna “Visto, Lido e Ouvido” como fontes desta pesquisa. Na segunda, são interrogadas as críticas de Ari Cunha ao sistema de ensino brasiliense. Ao final, encerram-se com considerações, a modo de conclusão.
UMA COLUNA JORNALÍSTICA COMO FONTE HISTORIOGRÁFICA
A respeito do uso do jornal como fonte historiográfica, são oportunas as observações feitas por Bruno Bontempi Jr. e Carolina Silva:
Ao longo da história da historiografia, o periodismo noticioso foi tratado entre duas posições extremas: como portador de informações objetivas sobre a realidade, nos casos em que o historiador assume o discurso da objetividade e isenção que o jornalista moderno utiliza para vender seu produto; como veículo de ideologia, que em certos modelos teóricos assume o significado de “mentira”, forjada e difundida por grupos em posições dominantes para manipular a opinião de outrem. De fato, o jornal do dia dá razão a ambas as posições: se ele se reporta a acontecimentos efetivamente vistos ou experimentados por alguém, é também verdade que na composição da notícia e do comentário inserem-se elementos da visão de mundo e dos interesses do indivíduo que os escreve, da entidade jornalística e empresarial, dos grupos sociais a que se associam e, afinal, do próprio leitor que é representado na mensagem. Do ponto de vista metodológico, para o historiador, isso implica identificar os sujeitos da enunciação, seus interlocutores diretos, as modalidades e recursos discursivos; perscrutar a representação da realidade e, à luz do “projeto” do jornal, analisar o tratamento de tópicos específicos segundo tradições e convicções editoriais, ainda que estas não se mantenham intactas ou retilíneas na luta social e política cotidiana (BONTEMPI JR; SILVA, 2019, p. 26-27).
Segundo defendem esses historiadores, o jornal não é um espelho da realidade, mas um portador de informações sobre ela, informações produzidas a partir de interesses editoriais que precisam ser levados em conta pela operação historiográfica que busca interrogá-lo. Quais seriam esses interesses e filtros jornalísticos no caso da coluna “Visto, Lido e Ouvido” que era parte de um veículo maior, o Correio Braziliense?
O Correio Braziliense foi o primeiro jornal diário impresso em Brasília e seu número de lançamento veio a lume em 21 de abril de 1960, mesma data de inauguração da capital2. Circula até os dias de hoje, em formato impresso e digital. Nascendo como mais um braço do maior conglomerado de mídia de então, os Diários Associados, do empresário das comunicações Assis Chateaubriand, o jornal assistiria aos principais eventos ocorridos na cidade em formação, documentando-os e deles participando. Na década de 1960 o jornal possuía a seguinte estrutura:
[...] doze páginas e dois cadernos. No primeiro caderno eram publicadas: na página 2 notícias internacionais e os últimos fatos e a continuação de matérias publicadas na capa; a página 3 era dedicada basicamente à política, assuntos do Congresso, Judiciário e Executivo; o editorial, os artigos assinados e a continuação de algumas matérias publicadas na capa eram distribuídas na página 4; na página 5 notícias policiais, estaduais e locais; na página 6 anúncios; na 7 editais, avisos e balanços e na página 8 matérias de repercussão ou de interesse da cidade. No caderno 2, as colunas de Ari Cunha, “Visto, Lido e Ouvido”, “Sociais de Brasília” com a colunista Katucha; “Ensino Dia a Dia” e “Esquinas de Brasília” com Yvonne Jean; notícias sobre Taguatinga, Anápolis e Goiânia (onde, inclusive, o jornal manteve sucursais durante a década de 60); a “Agenda CB” com informes sobre cinema e eventos da cidade (entre estes aniversários da nascente elite brasiliense); “Correio Informativo” com informações sobre o tempo, horário de aviões, ônibus e funcionamento de farmácias e bibliotecas; além dos classificados; e a última página do Caderno 2 era dedicada ao esporte nacional e o local (MORELLI, 2002, p. 52).
O Correio nunca teve uma posição ideológica exclusiva, mas alinhada à dos Diários Associados. Isso significa, em termos nacionais, segundo os estudos de Glauco Carneiro (1999), que esteve, em alguns momentos, favorável ao nacional desenvolvimentismo de JK, noutros em confronto com o populismo de João Goulart e abertamente pró-militares a partir do golpe de 31 de março de 1964 (embora com alguns recuos quando das investidas destes sobre os interesses comerciais dos Associados em meados da década). Em termos de relações local-nacional, esse alinhamento ao poder assumia contornos próprios, como observa Ana Morelli:
A cobertura dos anos 60 era basicamente voltada, no âmbito local, para a fixação de Brasília no Planalto Central e regularmente os editoriais do jornal tratavam de assuntos referentes às necessidades da cidade. Havia um grande destaque para assuntos relacionados ao funcionalismo público: moradia, transporte, educação, lazer e salário. No âmbito nacional, o enfoque era a política federal, pequenas notas sobre os fatos nos estados e matérias internacionais. Com a ascensão dos militares ao poder, houve um incremento da dinâmica econômica da cidade e isto pode ser observado com o aumento do número de anúncios classificados, principalmente dos imobiliários, sendo, inclusive, criado aos domingos espaço específico para o setor imobiliário e automobilístico. Desde o início de sua circulação, o Correio sempre teve preocupação de oferecer ao leitor um jornalismo de serviço com caráter informativo (MORELLI, 2002, p. 51).
Ari Cunha - pseudônimo de José de Arimathea Gomes Cunha (1927-2018) - era um dos redatores do novo jornal, e “participou da equipe pioneira encarregada da implantação do Correio Braziliense, em 1959. Acompanhou toda a obra de construção do prédio do jornal e a instalação dos equipamentos gráficos. ” (VASCONCELOS, 1992, p. 124). Ao longo da história do Correio, além de redator-chefe, de 1965 até os anos 1970 (MORELLI, 2002), exerceu funções de direção “entre as quais as de Diretor Responsável e Vice-Presidente” (VASCONCELOS, 1992, p. 124). Assinou até a data de sua morte a coluna intitulada “Visto, Lido e Ouvido”, na qual tecia - e aqui me remeto especificamente ao conteúdo dos anos 1960 - comentários e críticas aos acontecimentos e necessidades da cidade em formação, temperados com ironia e acidez. Dialogava com os leitores (que em várias ocasiões parecem ser seus informantes); apontava os problemas e as contradições que a metrópole planejada enfrentava e, indiretamente, cobrava para eles soluções das autoridades ou dos responsáveis. Sua coluna, nesse sentido, quanto se referia a assuntos públicos ligados à esfera estatal, assumia muitas vezes uma posição crítica ao governo do Distrito Federal3, destoando, em certos aspectos, da postura mais governista via de regra adotada pelo periódico. O que lhe possibilitava essa atitude aparentemente paradoxal era, além da função de redator-chefe que passou a exercer em determinado momento, a localização de sua coluna: o segundo caderno, dedicado a assuntos culturais, entretenimento e matérias diversas de amenidades. Segundo José Salomão d’Amorim, analisando a história do periódico,
No Correio, os assuntos da política e economia são considerados transcendentais para o homem e a sociedade, enquanto a cultura é a esfera do supérfluo. À política e à economia se reserva o espaço nobre do primeiro caderno, à cultura (rubrica na qual se incluem os espetáculos, o lazer e o entretenimento) se reserva o do segundo caderno. Esta diferença de tratamento se reflete também no maior controle da direção sobre as notícias de política e economia, em contraposição à maior liberdade para os assuntos da cultura. De um lado, portanto, a cautela e o controle sobre a forma e o conteúdo. De outro, a descontração e abertura para a crítica e a polêmica. (D’AMORIM, 1993, p. 105).
Embora habitualmente se encontre a afirmação de que a coluna “Visto, Lido e Ouvido” existe desde o primeiro número do Correio Braziliense, esta pesquisa identificou que a sua estreia regular deu-se na edição número 22, de 15 de maio de 1960, na página 11, no segundo caderno. Sem nenhuma apresentação ou nota inaugural, já começou indo direto ao ponto:
A esposa de um deputado, conversando com uma amiga pelo telefone interurbano, falava de Brasília e dizia que aqui era tudo igual. Os apartamentos são mobiliados todos da mesma maneira, com os mesmos móveis, no mesmo lugar, enfim, tudo como num hotel. “É tudo igualzinho a um hotel, com a diferença de que a gente tem que fazer a própria comida”, finalizou (CUNHA, 1960a, p. 11).
Em seguida, no mesmo tom, passa a discorrer sobre o hotel Brasília Imperial (ainda incompleto e no qual faltava até roupa de cama limpa), o ritmo da construção da capital na ótica do prefeito Israel Pinheiro, a formação “da maior favela do Brasil” atrás de um hospital e finalizando com um elogio ao funcionário de Goiás responsável pelo trânsito da capital até aquela data (CUNHA, 1960a, p. 11).
Por um lado, a leitura contínua da coluna revela que esta se limitava a apontar os desafios que a vida brasiliense ia encontrando naqueles momentos inaugurais de sua história, propondo muito raramente soluções para eles. Por outro lado, ao fazer reclamos para que seus leitores ou autoridades competentes dessem solução às cenas cotidianas que relatava, Ari Cunha tentava, com isso, intervir na realidade que era apresentada, tornando a coluna uma espécie de serviço de utilidade pública alinhada aos interesses editoriais do Correio Braziliense. Foi assim que entre os anos de 1960 a 1965, o jornalista deu espaço em sua coluna, também, para assuntos ligados à educação, apontando as suas contradições e contingências na cidade em evolução, fornecendo, com isso, ao historiador, um interessante material empírico sobre a situação do sistema público de ensino da capital, conforme veremos a seguir.
O SISTEMA DE ENSINO DA NOVA CAPITAL E SEUS PERCALÇOS
Ao planejar o sistema de ensino de Brasília, Anísio Teixeira afirmava: “O plano de construções escolares de Brasília obedeceu ao propósito de abrir oportunidade para a Capital federal oferecer à nação um conjunto de escolas que pudessem constituir exemplo e demonstração para o sistema educacional do país” (TEIXEIRA, 1961, p. 195). Logo, o sistema de ensino proposto para a nova capital se queria modelar para todo o Brasil, uma vitrine de modernidade educacional. Trata-se de um sistema de ensino público, financiado pelo governo do Distrito Federal e governo federal, do jardim de infância à Universidade, pensado para receber todos os estudantes da cidade em construção.
Em cada superquadra (divisão adotada para as quadras do Plano Piloto de Brasília) deveria haver um jardim de infância (para crianças de 5 a 6 anos) e uma escola-classe (escola de ensino primário com duração de seis anos, para crianças de 7 a 14 anos) (TEIXEIRA, 1961). A cada quatro superquadras uma Escola Parque (com atividades artísticas, trabalhos manuais e educação física, a ser frequentada em contraturno pelos alunos de quatro escolas-classe) (TEIXEIRA, 1961). Jardim de Infância, Escola-Classe e Escola Parque formariam os centros de educação elementar. O ensino secundário seria ministrado no Centro de Educação Média (instituição de ensino integral para estudantes de 11 a 18 anos, com cursos de humanidades, técnicos, comerciais e científicos) dotado de um Parque de Educação Média (quadras esportivas, núcleo cultural, biblioteca e museu, administração e restaurante) (TEIXEIRA, 1961). Por fim, haveria a Universidade de Brasília, formada por Institutos, Faculdades, Reitoria, Sala Magna e Biblioteca Central, além de campos de recreação e setor de serviços administrativos e gerais (TEIXEIRA, 1961). É para este sistema de ensino - sobretudo os centros de educação elementar que alcançavam a maior parte da população escolar - e os percalços encontrados na sua implantação/ funcionamento que se voltaram parte da atenção de Ari Cunha em sua coluna “Visto, Lido e Ouvido”.
Uma primeira questão sobre a qual pesou a pena de Ari Cunha foi sobre o financiamento do ensino na nova capital. Veja-se o que escreveu na coluna de 18 de agosto de 1961:
O Plano Educacional de Brasília jamais havia previsto isto: a Escola Parque pede de cada aluno a importância de 500 cruzeiros, para a compra de material; pede que cada aluno leve sua merenda, “enquanto não estiver organizada a merenda escolar”, e o Jardim de Infância recebe de cada aluno 50 cruzeiros “para ajudar na compra do material”.
O Ensino primário é obrigatório, mas não a este preço. Começando a ser desvirtuado o plano educacional teremos bagunça, desordem e incompreensão e não é isto que queremos.
E atentem bem para a questão da merenda escolar: “enquanto não estiver organizada a merenda escolar”. Já estamos na segunda metade do ano e este serviço ainda não está organizado. (CUNHA, 1961a, p. 9)
Ari Cunha inicia demonstrando conhecer o plano educacional de Brasília, que, de fato, não fazia previsões orçamentárias para sua efetivação - coisa que era de responsabilidade da Fundação Educacional do Distrito Federal, recebendo para isso aportes financeiros do governo federal e governo distrital. Mas, segundo permite inferir, nos primeiros anos de implantação do sistema de ensino, esse financiamento ocorria de forma irregular, razão pela qual a Escola Parque (única escola desse tipo em efetivo funcionamento na década de 1960 em Brasília, contrariando, à partida, o plano anisiano que queria uma para cada quatro quadras) pedia dos alunos a importância de 500 cruzeiros para a compra de material utilizado nas aulas do estabelecimento. No Jardim de Infância - sem mencionar um em particular, sugerindo, assim, ser o problema generalizado - pedia-se uma contribuição menor, de 50 cruzeiros, mas ainda assim para o mesmo fim de adquirir os materiais essenciais ao ensino. Se lermos esses dados financeiros pela ótica da evolução escolar, isto é, da progressão de um aluno pelo sistema de ensino, os pais, em 1961, tinham que começar desembolsando 50 cruzeiros para assegurar a educação dos pequenos no jardim de infância e dez vezes mais para garantir seu pleno aproveitamento quando estivessem em idade de frequentar a Escola Parque, isso tudo num sistema de ensino que deveria ser integralmente financiado pelos cofres públicos.
Outro problema era a merenda escolar. Enquanto esta não estava organizada pela Fundação Educacional, a Escola Parque recomendava que cada aluno levasse sua própria alimentação para o contraturno escolar. Esse, inclusive, era fato espantoso para o colunista, por já estarem na segunda metade do ano e esse serviço ainda não encontrar-se organizado. A fonte em tela não nos permite adentrar nos meandros das contradições que a ausência da merenda escolar possa ter trazido aos estudantes, especialmente se dentre eles houvesse aqueles com menores recursos financeiros, mas é de se supor que a situação causasse transtorno a todos os envolvidos, razão pela qual a falta da merenda vem denunciada pelo jornalista.
Tudo o que faltava nas escolas - dinheiro para a compra dos materiais, merenda escolar para alimentação dos estudantes -, na opinião de Ari Cunha, começava a desvirtuar o plano educacional, gerando “bagunça, desordem e incompreensão” não sendo isso o que se queria. Mas, ao mesmo tempo, o ensino não poderia ser obrigatório a esse preço, isto é, a custa do considerável comprometimento financeiro dos pais a suplementar a falta de recursos públicos para o efetivo funcionamento do sistema de ensino.
No dia seguinte, Ari Cunha voltou ao assunto, mas fazendo alguns reparos importantes ao que sua coluna poderia ter sugerido aos leitores vinte e quatro horas antes:
O que há com relação ao ensino é isto. As autoridades não sabem o que se passa. As professoras reclamam a falta de material, e a secretaria de Educação não informa à Prefeitura a verdadeira situação das escolas.
O Plano de economia do governo é no sentido de evitar viagens ao exterior à custa do povo, despesas com passagens para cima e para baixo à custa do povo, compras [para] educação, não. Para o ensino devem sair todas as verbas necessárias contanto que nenhuma criança fique sem escola e nenhuma escola fique sem material (CUNHA, 1961b, p. 7).
Se um dia antes as críticas de Cunha sugeriam um hiato de ação por parte do governo do Distrito Federal, que estaria na causa da falta de recursos para a implementação do sistema de ensino, aqui - talvez por repercussão do que havia dito? - equaliza melhor suas censuras. Afirma que a causa da escassez do vil metal não poderia ser atribuída a descaso do governo, mas antes, à falta de informações da Secretaria de Educação à Prefeitura do Distrito Federal, de modo que “as autoridades não sabem o que se passa”. Afinal, o plano de economia do governo alcançava somente os gastos não essenciais, como “viagens ao exterior à custa do povo”, não no que dizia respeito a compras para a educação. Sem indicar, porém, se o governo modificaria a situação, conclui apenas que “para o ensino devem sair todas as verbas necessárias”, para que “nenhuma criança fique em escola e nenhuma escola fique sem material”. Como se nota, seja por repercussão ou por fidelidade ao caráter governista do Correio Braziliense, Ari Cunha, sem negar o problema enfrentado na implantação do sistema de ensino denunciado um dia antes, desonera de responsabilidades o governo do Distrito Federal, atribuindo sua causa a uma falha de comunicação por parte da Secretaria de Educação. Em outras palavras: mantém as críticas, mas inocenta o indiretamente criticado.
Em 1965, as questões relativas ao material escolar tornaram a figurar na coluna “Visto, Lido e Ouvido”, mas apresentando novas facetas dessa história. Assim se manifestou o jornalista em 23 de fevereiro daquele ano:
Todos os anos, quando começa o ano escolar, já reclamações de pais contra as escolas. Algumas exigem certos livros e determinam o local onde comprar. Outras, determinam certa qualidade de cadernos e determinam local onde comprar.
Vem daí um desentendimento dos mais desagradáveis, difíceis de explicar. Mas eu ponho a mão no fogo pelas professoras e queria dizer aos pais que muitas vezes elas assumem compromissos com livrarias e papelarias, não para ganhar comissão, como ocorre noutras partes, mas porque o abastecimento em Brasília é difícil e há livrarias que arcam com despesas enormes para manter estoque suficiente.
Mas há excessos e eu sei disto. (...)
E há mesmo quem informe que os cadernos do MEC estão sendo rejeitados, o que é um absurdo, uma afronta. Ocorre que são os melhores cadernos que se faz no país, com aproveitamento de páginas para instrução cívica e são os que mais barato custam. O ideal seria que todo mundo só usasse caderno do MEC, porque valem muito mais (CUNHA, 1965, p. 3).
Se, em 1961, Ari Cunha apontava os obstáculos do financiamento do ensino, aqui, quatro anos depois, naturaliza o fato de que o governo não bancava tudo e havia materiais, como livros e cadernos, cuja responsabilidade pela aquisição competia aos pais dos alunos. Estamos, como se vê, num outro momento da implantação do sistema de ensino local. Em todo caso, isso era fator de tensão entre escolas e famílias, já que as instituições indicavam os livros, os tipos de cadernos e os locais onde poderiam ser comprados (numa cidade que dispunha de poucos estabelecimentos com estoque suficiente). Ao que parece, isso gerava desconfiança nos pais de família de que as professoras receberiam comissões por essas indicações, coisa que o jornalista rechaça e pela qual põe “a mão no fogo”, embora reconheça que “há excessos”. Aqui, Ari Cunha insere-nos num dos fenômenos da cultura material escolar experimentado pelo sistema de ensino de Brasília: o do provimento material.
Em Brasília, em 1965, o provimento material escolar era partilhado entre Estado e famílias. As famílias entravam com a compra de livros e cadernos em estabelecimentos particulares, o Estado, representado pelo MEC, colaborava com a confecção de cadernos mais baratos, “com aproveitamento de páginas para a instrução cívica”, bem ao gosto da ditadura civil-militar então instaurada no país. As famílias viam-se na necessidade de ir aos estabelecimentos indicados pelas escolas para fazerem suas aquisições, embora, na ótica de Ari Cunha, quando o assunto eram os cadernos, a solução proposta pelo governo deveria ser acatada pelos pais, ou seja, deveriam adquirir e consumir os que eram produzidos pelo Ministério da Educação “porque valem muito mais”. A escola, na fonte em questão, comparece como um mercado, um vetor de miúdas relações econômicas, tendo as famílias como consumidoras e o Estado como um dos braços dessa relação, perpassada por pequenas tensões, como as focalizadas pelo articulista. Demonstra, ao mesmo tempo, que na recém-inaugurada Brasília, esse mercado, a escola, encontrava-se em franco funcionamento e seus consumidores, ainda que por vezes reticentes, claramente em movimento e suas queixas chegando até as páginas do Correio Braziliense. E o financiamento do ensino, tema candente alguns anos atrás, já apaziguado na capital federal, ao menos, quando o assunto era o material escolar.
Outro aspecto de que se ocupou Ari Cunha foi a questão do transporte escolar numa cidade planejada na qual as escolas deveriam, segundo o plano educacional e urbanístico, estar às portas da casa das crianças, possibilitando-lhes, inclusive, ir à pé até o estabelecimento de ensino (PEREIRA, 2011). Contudo, na prática, a situação era outra. Sobre isso, leiamos o que escreveu na edição de 9 de junho de 1960:
Os suburbanos (residentes do lado leste do eixo) estão sofrendo um bocado. A civilização está ao lado oeste, onde estão inclusive as escolas. Com isto, quem sofre também é a criançada. Antes, o ônibus que apanhava as professoras nos apartamentos JK trazia, também, os alunos. Hoje, com o número crescido demais, muitas crianças estão sem poder frequentar a escola, porque não dispõem de transporte (CUNHA, 1960b, p. 5)
A zona residencial do plano piloto de Brasília é dividida em Asa Sul e Asa Norte, conferindo, junto com o Eixo Monumental, o famoso formato de avião à cidade. As “Asas” são cortadas por um eixo rodoviário. Metade das quadras se localiza abaixo desse eixo e outra metade acima. Em 1960, a Asa Sul era a mais urbanizada de Brasília, particularmente a parte de cima do eixo (parte Oeste), dotada de comércio, residências e equipamentos públicos. A parte de baixo (Leste) era a região da Asa Sul onde se localizavam moradias mais baratas, mas com menos “civilização”, como diria o jornalista Ari Cunha. Segundo o plano urbanístico da cidade, o desenvolvimento do “bairro” deveria ter se dado por igual. O problema é que Brasília foi inaugurada sem estar completamente concluída, o que acarretou uma série de inconvenientes aos seus primeiros moradores, inclusive, em matéria de acesso às escolas, construídas inicialmente, em sua maioria, no eixo superior da Asa Sul. Assim elas acabaram se localizando distantes das casas de parcela considerável da população estudantil, o que tornou necessária a implantação de um transporte escolar.
No momento flagrado pelo colunista, porém, esse serviço que acabou tornando-se essencial para o sucesso do sistema de ensino local, não vinha sendo feito a contento. Inicialmente, fora criado para transportar as professoras residentes na parte leste do bairro e acabava dando “carona” às crianças que ali moravam, levando a todos para as escolas na parte oeste de Brasília. Contudo, com o aumento da demanda por parte das crianças, o transporte originalmente pensado para as professoras já não dava conta de levar todos às escolas, fazendo com que “muitas crianças” não pudessem frequentá-las. Ou seja, se a escola em Brasília era pensada para atender a toda a clientela escolar, parte dessa população estava impedida de frequentá-la pela distância e falta de transporte adequado. Isso, em 9 de junho de 1960, pouco menos de dois meses após a inauguração da cidade, em 21 de abril daquele ano. Um problema, como se vê, a marcar as origens da implantação do próprio sistema de ensino. Mas um problema que, diferente de outros, foi rapidamente resolvido.
Na edição de 14 de junho o assunto voltou à baila, desta vez, destacando que a queixa de dias anteriores foi atendida: “Muito bem ao grupo de trabalho que manda diariamente um ônibus para as crianças que moram nos JK e que estavam sem frequentar a escola por falta de transporte.” (CUNHA, 1960c, p. 5). Aqui, evidencia-se uma vez mais o diálogo efetivo que a coluna “Visto, Lido e Ouvido” estabelecia com os leitores do Correio Braziliense e autoridades da capital: uma queixa, feita dias antes, é atendida e sua resolução igualmente noticiada. Percebe-se que em meio a contradições e dificuldades, havia por parte dos gestores interesse em colocar o sistema de ensino em funcionamento, algo que, indiretamente, foi registrado pela pena de Ari Cunha.
A implantação de escolas no bairro da Asa Norte do plano piloto foi outra temática recorrente na coluna “Visto, Lido e Ouvido” nos anos de 1961 e 1962. Este bairro, cuja construção começou depois da Asa Sul, levou mais tempo para urbanizar-se e ser dotado dos equipamentos públicos previstos tanto no plano urbanístico quanto no plano educacional de Brasília. Havia, com isso, certa desigualdade no acesso aos serviços para quem residia nessa região da cidade. As primeiras escolas só foram inauguradas em 1961 e sobre elas, na edição do Correio Braziliense de 17 de agosto daquele ano, Ari Cunha anotava: “Duas escolas foram inauguradas ontem na Asa Norte. Uma do lado oeste, a outra do lado leste. Para as más línguas não falarem, quer dizer que tanto o pessoal que mora no Capua e Capua como os moradores da cidade livre terão escola para seus filhos.” (CUNHA, 1961c, p. 9). Aqui, abusando de uma ironia só compreendida por quem conhecia a geografia da cidade em formação, o colunista mostra a falta de planejamento com que foram inauguradas essas primeiras escolas: estariam mais próximas das regiões afastadas do plano piloto chamadas Capua e Capua e Cidade Livre do que das residências dos moradores da Asa Norte, contrariando dessa forma o plano educacional de Brasília que propugnava pela presença das escolas dentro das quadras, próximo às moradias.
Três meses passados, em 18 de novembro de 1961, depois de enumerar os vários problemas com os quais conviviam os moradores da Asa Norte, chega ao de uma das escolas do local: “A escola é tremendamente imprópria e mal localizada. Os garotos não têm defesa contra os automóveis e outro dia um foi atropelado.” (CUNHA, 1961d, p. 7). De novo a má localização da escola é objeto de sua crítica. Dessa vez, denuncia que tal fato teria deixado os escolares indefesos, causando, inclusive, o atropelamento de um deles. Se ao pensar as escolas dentro das quadras um dos objetivos era garantir a segurança, autonomia e independência das crianças, as primeiras escolas da Asa Norte, mal planejadas, iam na contramão de todas essas diretrizes urbanístico-educacionais.
Além do problema da má localização das escolas, o seu número, a julgar pela nota publicada em 6 de fevereiro de 1962, era, ademais, insuficiente: “Falta na Asa Norte: telefone, táxi, hospital, escola, jardim de infância, mercado e parede sem rachadura.” (CUNHA, 1962, p. 7). O improviso do bairro é latente: nele escasseava desde serviços básicos como telefone, taxi, hospital, mercado até mesmo escolas e jardins de infância em número necessário para atender a demanda da população escolar que ali vinha se instalando. E as construções que vinham sendo feitas no Bairro - talvez incluindo aí as próprias escolas - já contavam com problemas estruturais, como rachaduras nas paredes. Todas essas carências, ao figurarem na coluna “Visto, Lido e Ouvido” anunciavam as desigualdades a marcar o processo de implantação da novíssima capital federal no cerrado bem como do seu sistema de ensino.
Por fim, a instabilidade da condição docente, ocasionada pela falta de pagamento dos salários a alguns professores, foi assunto de uma nota na coluna de 17 de setembro de 1964. O colunista principia afirmando:
A situação do ensino em Brasília é desesperadora e ameaçadora, principalmente. Na verdade, nenhum aluno ficou sem estudar por falta de escola, mas para que isto acontecesse, é preciso que se saiba o que vai por trás de tudo.
Os professores contratados não recebem há dois meses. No próximo dia trinta completarão os três meses. A qualquer indagação, o Secretário de Educação diz que a verba dada pelo Ministério foi desviada em administração passada e não se sabe quem desviou.
Não se sabe, porque se alguém soubesse quem desviou essa verba não seriam os professores que estariam pagando pelo erro alheio. O que é fato é que as providências são sempre retardadas.
Mas parece que não é bem verdade essa história do desvio de verbas, porque as folhas de pagamento do pessoal contratado só são feitas quando recebem ordem. Se fosse rotina, é que se poderia atinar para a falta de dinheiro (CUNHA, 1964, p. 3)
O audacioso sistema de ensino em Brasília exigiu, desde o início, um grupo considerável de professores para sua implementação. Ocorre que, para atender a demanda do ensino, somente uma parte era concursada. Outra - aquela a que se refere Ari Cunha - era contratada. E estes professores contratados, em 1964, enfrentavam o atraso de seus pagamentos, ocasionado, segundo afirmavam as autoridades à época, por desvios de verbas - um eufemismo para corrupção. Se nenhuma criança havia ficado sem escola, muitos professores estavam sem receber seus vencimentos, o que certamente gerava instabilidades para o exercício de sua profissão, criando, ao menos, duas categorias de docentes à época no sistema de ensino de Brasília: os concursados, com estabilidade e pagamento em dia e os contratados, sem estabilidade e sem dinheiro no bolso. A história do desvio de verbas, contudo, não convencia o cronista, que acreditava que sua causa estaria na desorganização da gestão, evidenciando, com isso, outra fragilidade vivenciada pelo sistema de ensino de Brasília quatro anos após sua implantação. Segundo Ari Cunha, outras personagens do cotidiano escolar vinham sofrendo com o atraso dos pagamentos:
O caso das diretoras, das substitutas e das responsáveis, é outra lástima. Umas recebem, outras não e não se conhece até hoje qual o critério a se adotar para tratar a coletividade.
Enfim, vem a palavra do mestre, o Secretário de Educação: “a escola vive em função do aluno, e não da professora˜. E dai, vem a interpretação dada à frase: a professora que procure resolver inclusive os problemas da Fundação, contanto que o aluno aprenda, tenha aula. Mas não se vê que para isto a professora deve inclusive ter seus direitos assegurados. Os direitos pelo menos (CUNHA, 1964, p. 3).
Também as diretoras, substitutas e as responsáveis (auxiliares docentes, talvez?) vinham padecendo com a inconstância no pagamento de seus vencimentos. “Umas recebem e outras não e não se conhece até hoje qual o critério a se adotar para tratar a coletividade”. Haveria aqui, no critério de pagamento das funcionárias, personalismos e protecionismos que faziam com que algumas fossem pagas e outras não? Não é possível averiguar tal hipótese, mas parece plausível enunciá-la diante do contexto relatado por nossa testemunha jornalística. Fato é que, em face dessa situação, o secretário de Educação era enfático em afirmar que a preocupação central da escola era o aluno e não a professora, o que demonstra que estas, naquele contexto, viviam uma situação de extrema fragilidade diante do governo local, a ponto de suas necessidades não serem devidamente consideradas pelos gestores públicos. Na ótica do colunista, “a professora que procure resolver inclusive os problemas da Fundação, contanto que o aluno aprenda, tenha aula”. Isso revela o quanto a docência, apesar de fundamental para o funcionamento do sistema de ensino local, era tratada com descaso, ao menos, no momento em flagrado por Ari Cunha e razão de mais um de seus reclames na coluna “Visto, Lido e Ouvido”, inclusive e mais uma vez, contra a governo, na contramão da linha governista habitualmente adotada pelo Correio Braziliense. Para os leitores, ficou o registro do problema. Para a história, mais uma faceta do processo de implantação do sistema de ensino brasiliense e suas contradições.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo teve por objetivo analisar, na coluna “Visto, Lido e Ouvido”, do jornal Correio Braziliense, as críticas elaboradas por Ari Cunha ao sistema de ensino da recém-inaugurada capital federal, entre os anos de 1960 a 1965. Trabalhou-se com a hipótese de que, por meio dessas críticas, é possível vislumbrar de forma mais concreta o cotidiano escolar em Brasília, com seus avanços e insucessos, reveladores, por isso, da dinâmica educacional vivenciada pela escolarização na cidade recém-inaugurada.
Ao interrogar a coluna em questão foi possível observar, de fato, os impasses enfrentados no processo de implantação do sistema de ensino na capital federal, a partir de alguns tópicos que, no recorte cronológico desta pesquisa, foram sendo abordados pelo jornalista Ari Cunha. Flagramos, assim, os problemas relacionados ao financiamento do ensino na nova capital; a falta de merenda escolar nos primeiros anos de funcionamento das escolas; os obstáculos ao provimento material dos escolares numa cidade ainda em formação; o surgimento da necessidade do transporte escolar em que pese a cidade ter sido planejada para ter as escolas às portas das residências dos estudantes; a implantação desigual do sistema de ensino no Bairro da Asa Norte de Brasília e a instabilidade da condição docente na nova capital.
Os impasses narrados nesta investigação, contudo, constituem-se apenas em uma parte da história da implantação do sistema de ensino em Brasília. Aqui, guiados por Ari Cunha, nosso foco recaiu mais sobre os insucessos que sobre os avanços desse sistema. Que outros aspectos para além desses esperam por ser narrados, para uma compreensão cada vez mais aprofundada dessa história? Seria o jornal uma fonte a revelar-nos, também, os sucessos e realizações obtidas nesse processo, no período de que aqui nos ocupamos? Para além da coluna de Ari Cunha, que outras facetas da implantação do sistema de ensino em Brasília ocorreram, a modo de realizações e conquistas de um projeto que se queria modelar e inovador? São questões a serem perseguidas em estudos futuros. Uma coisa, porém, esta pesquisa que aqui se encerra nos dá por certa: essa não foi uma história épica ou romântica, mas uma história profundamente humana, marcada por percalços, omissões do poder público e desafios de variadas ordens aos atores envolvidos. Incorporar esses ingredientes às narrativas históricas sobre Brasília e as culturas escolares que nela foram produzidas é uma necessidade em qualquer pesquisa histórica que busque compreender os fenômenos educativos que ali tiveram lugar.