INTRODUÇÃO
A análise da trajetória histórica do ensino médio brasileiro evidencia a ocorrência, sobretudo, desde os anos 1940, de várias reformas educacionais, que estabeleceram políticas que resultaram, na maioria das vezes, na criação (ou mesmo numa fraca mitigação) de obstáculos dualistas, constituindo-se em medidas educacionais seletivas e ou excludentes. Algumas dessas medidas foram removidas com a Lei nº 4.024/61, que estabeleceu o secundário composto por duas etapas, o ginasial e o colegial, os quais se constituíram como degraus ainda muito seletivos para o ensino superior. Nos anos 1970, essa estrutura em duas etapas foi superada com o advento da Lei nº 5.692/71, que fundiu o ginásio ao primário criando o chamado 1º grau que se tornou o ensino obrigatório. O colegial, por sua vez, transformou-se no ensino de 2º grau, cuja função social para além de concluir o ensino básico tornou-se regulador do acesso ao ensino superior.
Diante da pressão dos setores médios pela ampliação da oferta do ensino superior público e no contexto do “milagre econômico”, o governo militar, apesar de não alterar significativamente a infraestrutura escolar das unidades escolares estaduais e municipais que ofertavam 2º grau, definiu que toda a oferta escolar dessa etapa de ensino seria compulsoriamente profissionalizante. Mas tal medida opunha- se aos interesses dos donos de escolas particulares cujos alunos não visavam a uma formação técnica e pretendiam chegar ao ensino superior. Nas escolas públicas federais que já contavam com amplos investimentos e boa infraestrutura, o modelo de colegial profissionalizante foi incorporado e viabilizado na forma de cursos técnicos de 2º grau. Com o passar dos primeiros anos da década de 1970, tal modelo foi perdendo legitimidade econômica e política. A crise econômica do início da década de 1970 e a pressão dos setores privados da educação produziu revisões na sua base legal, que se iniciou com pareceres do Conselho Federal de Educação e se concluiu com a “reforma da reforma” delineada na Lei nº 7.044/82, que consolidou a desobrigação da oferta conjunta do ensino profissional com o ensino de segundo grau. No final da década de 1980, com uma crise econômica cada vez mais profunda, mas no contexto da escrita de uma nova constituição, novos projetos educacionais se colocaram, resultando em importantes avanços na redefinição preceito constitucional do direito à educação básica que incluía da educação infantil ao ensino médio. Mas uma nova lei de diretrizes e bases da educação, a Lei nº 9.394/96, admitia, mas não obrigava, a articulação entre o ensino médio e o ensino técnico.
Da segunda metade da década de 1990 ao final da década de 2010, dos governos Fernando Henrique Cardoso (Emenda Constitucional nº 14 de 1998 e o Decreto nº 2.208/97) aos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (Decreto nº 5.154/2004; Lei nº 11.741/2008; Emenda Constitucional 59/2009, Lei nº 13.005/2014), num ciclo de incipiente retomada do crescimento econômico, diversas mudanças legais restringiram e depois ampliaram as possibilidades de consolidação do direito ao ensino médio e de sua articulação com a educação profissional. Posteriormente, com o estabelecimento da crise econômica na segunda metade dos anos 2010, forjou-se a importante crise política que produziu e resultou no golpe jurídico-midiático-parlamentar, que impediu o prosseguimento do segundo mandato da presidenta Dilma e alçou ao poder, ainda em 2016, Michel Temer. Logo de imediato, em contrário aos avanços das bases legais do direito à educação, instituiu-se a Lei nº 13.415/2017, que fragmentou o currículo do ensino médio, inviabilizando a integração deste com a educação profissional, trazendo a profissionalização como um dos possíveis itinerários formativos. Esses movimentos de idas e vindas põem, repõem e contrapõem a função social do ensino médio, interferindo no acesso, na permanência e na conclusão da última etapa da educação básica, tendo desdobramentos no acesso ao ensino superior.
Neste trabalho, visamos a analisar a constituição da produção acadêmica acerca da reforma produzida pela Lei nº 13.415/2017, tema candente da sociedade atual que ganhou nos anos recentes amplo debate entre os pesquisadores da educação. Nosso esforço justifica-se pela necessidade de se apreender os diversos aspectos dessa reforma por meio do olhar sistemático da pesquisa bibliográfica e bibliométrica sem perder de vista as particularidades da referida reforma com o contexto de crises do capital, do estado e da democracia.
Organizamos esse artigo apresentando, inicialmente, os pressupostos teóricos que embasaram nossas análises; os procedimentos metodológicos empreendidos nas etapas do estudo; os resultados da primeira etapa, no qual expomos os artigos publicados em 2016 e 2017, captando as primeiras reações de educadores e pesquisadores que abordaram as tentativas de reforma curricular do ensino médio no contexto do golpe jurídico-midiático-parlamentar de 2016, a edição da Medida Provisória (MP) nº 746/2016 e a tramitação e a aprovação da Lei da Reforma; em seguida, os resultados e as análises da segunda etapa do estudo, nas quais apresentamos o rastreamento da produção de teses e dissertações sobre a implementação da reforma atual, evidenciando as palavras-chave da produção que, considerando o processo que leva à promulgação da lei e aos encaminhamentos para a sua implementação; por fim, desenvolvemos uma vinculação entre as bases teóricas e os autores-referência dos dois escrutínios, realizando um cruzamento entre os dois levantamentos, contrastando a relação entre os autores dos artigos e os membros de bancas das dissertações e teses.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Empreendemos uma revisão da literatura acerca da reforma, elegendo os principais aspectos conceituais assumidos pelos trabalhos, utilizando alguns procedimentos de bibliometria para oferecer uma visão transversal por tipo de trabalho em cada dois anos e no seu conjunto em quatro anos.
Na primeira etapa do estudo, mapeamos os artigos científicos publicados entre 2016 e 2017. Iniciamos a busca utilizando os descritores “Reforma do Ensino Médio”, “MP 746/2016” e “Lei nº 13.415/2017” focando em oito importantes periódicos que tomam a temática do Trabalho-Educação e que se vinculam ao materialismo histórico dialético, quais sejam: Educação e Sociedade, Retratos da Escola, Germinal, Holos, Geodiálogos, Boletim Tec. Senac, Movimento e Histedbr. Esse processo resultou, depois das exclusões dos artigos não correlatos, num conjunto de vinte e seis artigos produzidos por trinta e um autores, sendo dez artigos publicados em parceria e dezesseis por um único autor. Apenas dois dos vinte e seis artigos foram publicados em 2016. Para produzir as análises de conteúdo dos artigos, optamos por tomar como ponto de partida as categorias que deles emergiram. Assim, passamos a discorrer sobre os textos e sobre a posição dos autores em relação à lei, apresentando-os em ordem de publicação e por periódicos levantados; em seguida, analisamos e apresentamos as similitudes e as diferenças entre o que cada autor elaborou ao produzir sua análise, sistematizando essas concepções em um quadro analítico.
Na segunda etapa do estudo, buscamos analisar aspectos estruturantes das pesquisas de doutorado e de mestrado concluídas em 2018 e 2019. Para tanto, realizamos um levantamento bibliográfico em duas importantes bases de dados – o banco nacional de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) –, o que nos colocou diante de 46 trabalhos, sendo 12 publicações de 2018 e 34 do ano de 2019. Na busca efetuada nos bancos de dados, utilizamos dois descritores, “Reforma do Ensino Médio” e “Itinerários Formativos”, mas também operamos com outros filtros para excluir trabalhos que não se adequavam ao objeto de pesquisa.
Para compreender o impacto dessas produções, buscamos as citações recebidas no Google Scholar em 27.12.2020. Juntando o resultado das duas bases de dados, sequenciou-se a classificação de cada ano em separado, primeiro em 201, e finalizando no ano 2019. Essa seleção nos permitiu articular as palavras-chave, gerando uma análise transversal das teses e dissertações concluídas em cada ano.
MAPEAMENTO DOS ARTIGOS CIENTÍFICOS PUBLICADOS EM 2016 E 2017
O corpus documental resultante da primeira etapa do mapeamento é composto por 26 artigos produzidos por 31 autores, sendo dez artigos publicados em parceria e 16 por um único autor. Apenas dois dos 26 artigos foram publicados em 2016. Oito periódicos emergiram no processo, quais sejam, Educação e Sociedade, Retratos da Escola, Germinal, Holos, Geodiálogos, Boletim Tec. Senac, Movimento e Histedbr, conforme evidenciamos no Tabela 1 .
Nº | Autoria | Título | Periódico | Ano | Citações recebidas |
---|---|---|---|---|---|
1 | FERRETI, C. J.; SILVA, M. R. |
Reforma do ensino médio no contexto da Medida Provisória nº 746/2016: estado, currículo e disputas por hegemonia. |
Educação e Sociedade | 2017 | 127 |
2 | MOTTA, V. C.; FRIGOTTO, G. |
Por que a urgência da reforma do ensino médio? Medida Provisória nº 746/2016 (Lei nº 13.415/2017). |
Educação e Sociedade | 2017 | 119 |
3 | KUENZER, A. Z. | Trabalho e Escola: a flexibilização do ensino médio no contexto do regime de acumulação flexível. |
Educação e Sociedade | 2017 | 90 |
4 | FERREIRA, E. B. | A. Contrarreforma do Ensino Médio no contexto da nova ordem e progresso. |
Educação e Sociedade | 2017 | 52 |
5 | SILVA, M. R.; SCHEIDE, L. | Reforma do ensino médio: pragmatismo e lógica mercantil. |
Retratos da Escola | 2017 | 49 |
6 | CUNHA, L. A. | Ensino médio: atalho para o passado. | Educação e Sociedade | 2017 | 46 |
7 | KRAWCYK, N.; FERRETI, C. J. |
Flexibilizar para quê? Meias verdades da “reforma”. |
Retratos da Escola | 2017 | 41 |
8 | LEHER, R.; VITTÓRIA, P.; MOTTA, V. C. |
Educação e mercantilização em meio à tormenta político-econômica do Brasil. |
Germinal | 2017 | 38 |
9 | MOURA, D. H.; LIMA FILHO, D. L. |
A reforma do ensino médio: regressão de direitos sociais. |
Retratos da Escola | 2017 | 37 |
10 | FRIGOTTO, G. | Reforma do ensino médio do (des)governo de turno: decreta-se uma escola para os ricos e outra para os pobres. |
Movimento Revista de educação | 2016 | 34 |
11 | RAMOS, M. N.; FRIGOTTO, G. |
Medida Provisória 746/2016: a contra-reforma do ensino médio do golpe de estado de 31 de agosto de 2016. |
HISTEDBR | 2016 | 30 |
12 | GONÇALVES, S. R. | Interesses mercadológicos e o “novo” ensino médio. |
Retratos da Escola | 2017 | 29 |
13 | FERRETI, C. J. | Reformulações do Ensino Médio. | Holos | 2017 | 28 |
14 | MELO, A. A. S.; SOUSA, F. B. |
A Agenda do mercado e a educação do Governo Temer. |
Germinal | 2017 | 27 |
15 | MOLL, J. | Reformar para retardar. | Retratos da Escola | 2017 | 26 |
16 | LINO, L. A. | As ameaças da reforma: desqualificação e exclusão. |
Retratos da Escola | 2017 | 20 |
17 | FERREIRA, E B; SILVA, M R. |
Centralidade do Ensino Médio no contexto da nova “ordem e progresso”. |
Educação e Sociedade | 2017 | 19 |
18 | SIMÕES, W. | O lugar das ciências humanas na “reforma” do ensino médio. |
Retratos da Escola | 2017 | 18 |
19 | MORAES, C. S. V. | O Ensino Médio e as comparações internacionais: Brasil, Inglaterra e Finlândia. |
Educação e Sociedade | 2017 | 17 |
20 | CASTILHO. D. | Reforma do Ensino Médio: Desmonte na educação e inércia do enfretamento retórico. |
Geodiálogos | 2017 | 16 |
21 | ARELARO, L. R. G. | Reforma do ensino médio: o que querem os golpistas. |
Retratos da Escola | 2017 | 10 |
22 | ORSO, P. J. | A Educação em tempos de golpe, ou então, como avançar andando para trás. |
Germinal | 2017 | 9 |
23 | AMARAL, N. C. | O “novo” ensino médio e o PNE: haverá recursos para essa política? |
Retratos da Escola | 2017 | 9 |
24 | DUARTE, R. C.; DERISSO, J. L. |
A reforma neoliberal do ensino médio e a gradual descaracterização da escola. |
Germinal | 2017 | 7 |
25 | SILVA, R. S. S. | A Reforma do ensino médio. | Boletim Técnico SENAC | 2017 | 3 |
26 | MAUES, O. C. | Crítica da política educacional | Germinal | 2017 | 1 |
Fonte: Elaborado a partir da pesquisa conduzida.
Assumimos o índice h, elaborado por Hirsch (2005) , como métrica padrão para identificar o impacto da produção científica. Este índice é particularmente simples e útil para caracterizar uma determinada produção, sendo dado a partir do “número de artigos com número de citação ≥ h ” ( HIRSCH, 2005 , p. 1). Assim, chegamos ao índice desse mapeamento, que é 18, esse é o ponto de simetria quando os artigos são organizados de forma decrescente, logo é também o índice h. Segundo esse cálculo, os artigos desse núcleo h são os que mais impactaram o meio acadêmico. Neste aspecto, destacam-se os artigos da tabela 1 , a saber, enumerados de 1 a 18.
Passamos a analisar a autoria dos textos. Segundo a Lei do Elitismo, elaborada por Solla Price, em 1963, ao se contar a produção total daqueles que produzem n artigos, nota-se que “[...] o grande número de pequenos produtores contribuem tanto quanto o total do pequeno número dos grandes produtores [...]” ( PRICE, 1963 , p. 46). Segundo essa elaboração, é possível estabelecer um limite e afirma que o número dos que mais produzem é da mesma ordem que a raiz quadrada do número total de autores ( PRICE, 1963 ).
Seguindo as preconizações deste autor, efetuamos o cálculo e encontramos a raiz quadrada de 31, que é 5,5. Analisando os autores mais produtivos, segundo o número de artigos no mapeamento, identificamos os que possuíam dois ou mais artigos e encontramos cinco autores, quais sejam: C. J. FERRETI, G. FRIGOTTO e M. R. SILVA, com três artigos cada um; seguidos de E. B. FERREIRA e V. C MOTTA, com dois artigos cada uma das autoras. Os demais autores, que somados são vinte e seis, possuem um artigo cada um.
Como Morosini e Fernandes (2014) , reconhecemos que a elaboração da produção científica está inserida num campo científico e em suas regras constitutivas, que se referem ao pesquisador, à instituição e ao país onde este está inserido, bem como às relações que se estabelecem com a perspectiva global. Neste sentido, destacamos a inserção institucional dos autores identificados como sendo os mais produtivos nessa etapa do estudo, todos são professores universitários com longa trajetória acadêmica e estão inseridos na região sudeste (quatro autores) e na região sul (uma autora), além disso, atuam como professores em programas de pós-graduação e coordenam grupos de pesquisa que estudam o ensino médio tanto na perspectiva histórica-local como na sua relação com a perspectiva internacional, especialmente na América Latina.
Para identificar os periódicos mais devotados sobre o tema, adotamos a Lei da Dispersão, formulada por Bradford (1934), segundo a qual indica que se os periódicos científicos forem dispostos em ordem decrescente de produtividade de artigos sobre um determinado tema, pode-se distinguir um núcleo de periódicos mais particularmente devotado a este tema e vários grupos ou zonas que incluem o mesmo número de artigos que o núcleo ( BRADFORD, 1961 ). Cada uma dessas zonas tem em média 1/3 do número total de artigos relevantes: a primeira conterá o “core” daquele assunto, um pequeno número de periódicos altamente produtivos; a segunda, um número maior de periódicos menos produtivos; e a terceira zona inclui ainda mais periódicos com menos produtividade ( ARAÚJO, 2006 , p. 15). Assim, aplicando esta lei, organizamos os periódicos por produtividade, conforme gráfico 1 (periódicos por produtividade). Em seguida, os distribuímos em três zonas (núcleo central, zona periférica 1 e zona periférica 2) com aproximadamente 8,6 artigos cada uma (1/3 do total do universo da pesquisa), assim, separamos os artigos como apresentado no Gráfico 1 .
O periódico Educação e sociedade se constituiu como o mais devotado sobre o tema com sete artigos, 26% do total de artigos do mapeamento e 470 citações, 56% do total de citações dessa etapa. Criado em 1978, este periódico é uma publicação do Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES). Possui classificação QUALIS/CAPES A1, dedica-se às pesquisas acadêmicas sobre a educação nos diversos prismas de sua relação com a sociedade, possui mais 147 edições, cada uma com uma média de quatro dezenas de artigos e um importante acervo dos mesmos com análises e informações referentes ao debate no campo educacional, fontes teóricas e experiências pedagógicas, entre outros.
Destacamos, também, o periódico Retratos da Escola com nove artigos e 239 citações, representando 32% do número de artigos e 28,5% das citações recebidas. Trata-se de uma revista da Escola de Formação (Esforce) da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), com QUALIS/CAPES B1, criada em 2007 para proporcionar aos profissionais da educação conhecer a realidade das escolas brasileiras, buscando examinar a educação básica e o protagonismo da ação pedagógica no âmbito da profissionalização dos trabalhadores em educação, disseminando o conhecimento produzido sobre essa temática e estimulando inovações no campo educacional.
CATEGORIAS DE ANÁLISE DAS PRODUÇÕES ACADÊMICAS SOBRE A REFORMA DO ENSINO MÉDIO
Os procedimentos de análise a partir das categorias que emergiram dos artigos científicos evidenciaram a posição dos autores em relação aos dispositivos legais, destacando os impactos da reforma atual na educação básica e na vida dos jovens brasileiros.
Para Souza, Silva e Carvalho (2010), a categorização é uma maneira de organizar determinados conceitos e ideias em grupos ou categorias baseadas nas suas semelhanças, com o propósito de captar, da melhor forma, as análises desenvolvidas. Essas categorias são, portanto, resultados de elementos que apresentam características afins e que, a partir dessas afinidades, são reunidos e categorizados dentro de uma rede de sentidos que emergem a partir da leitura dos textos.
Diante disso, identificamos que os trabalhos encontrados possuíam duas formas de interpretação da reestruturação do ensino médio. Em suas posições, eram destacados aspectos endógenos, que afetavam o funcionamento e a constituição interna do ensino médio, bem como aspectos exógenos, que se relacionavam à origem e às consequências mais amplas da implementação da reformulação deste segmento.
Segundo o dicionário Houaiss (2004), endógeno diz respeito àquilo que é originado ou desenvolvido no interior do organismo ou de um sistema, ou por fatores internos. Sua etimologia vem do grego e significa “gerado de dentro” e pode ser usado para explicar aquilo que se refere a uma determinada causa interna. Já os aspectos exógenos, dizem respeito àquilo que vem do exterior; ou seja, que tem uma causa ou influência externa.
O termo exógeno, que também deriva do grego, significa “originado de fora” e pode ser compreendido como aquilo que se desenvolve exteriormente, mas que influencia os elementos internos. É um termo muito utilizado na biologia para explicar a origem de substâncias geradas fora do organismo, mas que exercem influência interna no organismo, ao serem absorvidos.
Desse modo, apropriamo-nos desses termos para transpor a uma análise referente aos impactos analisados pelos autores que discutem a Reforma do Ensino Médio regulamentada pela Lei nº 13.415/2017. Consideramos aspectos exógenos (extraescolares), aqueles elementos ligados à totalidade histórico-econômico- social e aspectos endógenos (intraescolares), aqueles elementos da particularidade pedagógica-curricular-educacional do ensino médio.
Nesse sentido, por essa classificação, identificamos que, dentro dos aspectos exógenos, teríamos a discussão das seguintes temáticas: contexto político e econômico; análise dos antecedentes da reforma; interesses de classe por trás da reforma; relação da reforma com o mercado de trabalho; viabilidade e implementação da reforma do ensino médio; mercado da educação; experiências internacionais de reformas do ensino médio. Dessa forma, identificamos sete categorias de análises que estariam agrupadas dentro dos aspectos extraescolares que se inter-relacionam à reforma do ensino médio.
Por outro lado, identificamos que as análises que perpassariam por elementos intraescolares, e que denominamos de aspectos endógenos tratavam das particularidades pedagógicas, trazendo a discussão das seguintes temáticas: o esvaziamento e a flexibilização curricular oriunda da reforma; a precarização da docência; a perspectiva de avaliação apontada pela reforma do ensino médio; a intensificação da dualidade educacional e social; e os gastos e investimentos necessários para a implementação da reforma. Abaixo, apresentamos um organograma ( Figura 1 ) que sintetiza a divisão das categorias e subcategorias.
A partir do exposto, passamos agora a analisar o que os autores elaboraram a respeito das categorias identificadas, apresentando, num primeiro momento, os apontamentos dos aspectos exógenos e, posteriormente, analisaremos os aspectos endógenos para, a partir daí, compreender os impactos promovidos pela reforma do ensino médio nas diversas esferas que envolvem a educação.
Na Tabela 1 , podemos observar o levantamento de todos os artigos encontrados, nome dos autores, título, local de publicação e um breve resumo do trabalho. Tais dados nos ajudam a compreender como a produção acadêmica tem analisado as novas proposições do governo atual para o ensino médio. Listados os trabalhos encontrados, passaremos a analisá-los a partir das categorias elencadas para, dessa forma, compreender, no conjunto, as análises feitas sobre a reforma do ensino médio na visão dos autores.
Passamos, agora, a contextualizar as categorizações identificadas nas produções acadêmicas fazendo, num primeiro momento, uma apresentação dos aspectos exógenos (extraescolares) ligados à reforma.
A categoria I refere-se ao “ contexto político e econômico ” e diz respeito à compreensão que os autores tiveram dos fatores políticos e econômicos que influenciaram a Lei nº 13.415/2017. A categoria II refere-se aos apontamentos dos autores em relação aos “ antecedentes da reforma ”, que correspondem às proposições legais que antecederam a lei que reestrutura o ensino médio, bem como a existência de outros modelos semelhantes ao atual. A categoria III corresponde aos “ interesses de classe ”. Destacamos essa categoria procurando identificar, nas produções, que interesses de classe estavam colocados na reforma e quais setores poderiam estar sendo privilegiados com essa política. A categoria IV remete ao “ mercado de trabalho ”. Com essa categoria, nosso objetivo foi identificar, nos artigos, como os autores abordavam a relação entre a reforma do ensino médio e o mundo do trabalho, se existia algum estreitamento com as demandas do mercado e se essa política era uma forma de atender às demandas de mão de obra. A categoria V, que se refere à “ viabilidade e implementação ”, corresponde às análises abordadas nas produções acadêmicas sobre o percurso legislativo que culminou na Lei nº 13.415/2017. A categoria VI trata do “ mercado da educação ” e corresponde às análises dos autores sobre a possibilidade de a reforma do ensino médio favorecer um amplo mercado em torno dos itinerários formativos, inclusive problematizando até que ponto as iniciativas que levaram à promulgação da Lei nº 13.415/2017 têm estreita relação com esses interesses mercadológicos no campo educacional. A categoria VII, que tem como foco as “ comparações internacionais ”, elenca elementos da atual reforma comparando-as com outras de cunho internacional, identificando semelhanças e diferenças que existem entre o modelo de reestruturação do ensino médio aplicado no Brasil e outros modelos executados em diferentes países.
CATEGORIZAÇÃO | |
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(I): Contexto político e econômico | Frigotto (2016); Ramos e Frigotto (2016); Arelaro (2017); Duarte e Derisso (2017); Ferreira (2017); Ferreti e Silva (2017); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Leher e Vittoria (2017); Lino (2017); Maues (2017); Melo (2017); Moll (2017); Moraes (2017); Motta (2017); Moura e Lima (2017); Orso (2017). |
(II): Antecedentes da reforma | Cunha (2017); Duarte e Derisso (2017); Ferreira (2017); Frigotto (2016); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher e Vittoria (2017); Lino (2017); Motta e Frigotto (2017); Silva e Scheide (2017); Silva (2017) |
(III): Interesses de classe | Ferreti e Silva (2017); Frigotto (2016); Gonçalves (2017); Kuenzer (2017); Leher, Vittoria e Motta (2017); Lino (2017); Maues (2017); Melo e Souza (2017); Moraes (2017); Orso (2017); Simões (2017) |
(IV): Mercado de trabalho | Duarte e Derisso (2017); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher, Vittoria e Motta (2017); Lino (2017); Melo e Souza (2017); Moll (2017); Motta e Frigotto (2017); Moura e Lima (2017); Silva (2017); Silva (2017); Simões (2017) |
(V): Viabilidade e implementação | Amaral (2017); Arelaro (2017); Castilho (2017); Cunha (2017); Ferreira (2017); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher, Vittoria e Motta (2017); Lino (2017); Melo e Souza (2017); Moll (2017); Motta e Frigotto (2017); Orso (2017); Ramos e Frigotto (2017); Silva e Scheide (2017); Silva (2017). |
(VI): Mercado da educação | Arelaro (2017); Castilho (2017); Ferreira (2017); Gonçalves (2017); Krawczyk (2017); Kuenzer (2017); Leher (2017); Lino (2017); Melo e Souza (2017); Motta e Frigotto (2017); Moura (2017); Orso (2017); Silva e Scheide (2017); Silva (2017). |
(VII): Comparações internacionais | Amaral (2017); Ferreira (2017); Moraes (2017); Silva (2017) |
Fonte: Elaborado a partir da pesquisa conduzida.
Apresentadas as definições das categorias que compõem as análises exógenas da reforma, passamos a contextualizar as categorizações identificadas nas produções acadêmicas, fazendo uma apresentação dos aspectos endógenos (intraescolares) ligados a elas.
A categoria VIII, que trata do “ esvaziamento e flexibilização curricular ”, corresponde às análises sobre as alterações sofridas pelo currículo e a como é entendida e abordada a flexibilização curricular e a limitação de carga horária para os conteúdos comuns. A categoria IX, “ precarização da docência ”, corresponde à análise das mudanças que ocorrerão na profissão docente após a reforma, destacando-se, aqui, a abordagem do profissional com notório saber no exercício docente dentro do campo do itinerário técnico-profissional. A categoria X, “ avaliação de larga escala ”, procurou identificar os impactos que a reforma trará nos índices de avaliações de larga escala e como a escola poderá se comportar diante dessa demanda. A categoria XI, “ dualidade educacional e social ”, corresponde às análises que partem da premissa que a reforma do ensino médio, na tentativa de resolver os problemas de desmotivação dos jovens pelos percursos escolares, acaba por intensificar um processo de diferenciação na transmissão do saber sistematizado, gerando escolas desiguais. A categoria XII, “ gastos e investimentos ”, corresponde às problematizações feitas pelos autores e textos em relação ao orçamento da união, sobre se existirão recursos para a implementação da reforma, considerando outras políticas de restrição orçamentária, tais como a Desvinculação de Receitas da União (DRU) e a Emenda Constitucional (EC) nº 95.
CATEGORIZAÇÃO | |
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(VIII): Esvaziamento e flexibilização curricular | Arelaro (2017); Castilho (2017); Duarte e Derisso (2017); Ferreira (2017); Ferreti e Silva (2017); Frigotto (2016); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher, Vittoria e Motta (2017); Lino (2017); Maues (2017); Melo (2017); Moll (2017); Moraes (2017); Moura (2017); Orso (2017); Ramos e Frigotto (2016); Silva e Scheide (2017); Silva (2017); Simões (2017) |
(IX): Precarização da docência | Castilho (2017); Duarte e Derisso (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher e Motta (2017); Lino (2017); Maues (2017); Motta e Frigotto (2017); Moura e Lima (2017); Orso (2017); Ramos e Frigotto (2016); Silva e Scheide (2017); Simões (2017) |
(X): Avaliação de larga escala | Ferreti e Silva (2017); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreira (2017); Maues (2017); Moll (2017); Moraes (2017); Orso (2017); Ramos e Frigotto (2016); Silva e Scheide (2017) |
(XI): Dualidade educacional e social | Duarte e Derisso (2017); Ferreira (2017); Frigotto (2016); Gonçalves (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher e Vittoria (2017); Lino (2017); Moraes (2017); Motta e Frigotto (2017); Moura e Lima (2017); Silva e Scheide (2017); Simões (2017). |
(XII): Gastos e investimentos | Amaral (2017); Arelaro (2017); Duarte e Derisso (2017); Ferreira (2017); Krawcyk e Ferreti (2017); Kuenzer (2017); Leher, Vittoria e Motta (2017); Lino (2017); Maues (2017); Melo (2017); Moraes (2017); Motta e Frigotto (2017); Orso (2017); Silva (2017). |
(VI): Mercado da educação | Arelaro (2017); Castilho (2017); Ferreira (2017); Gonçalves (2017); Krawczyk (2017); Kuenzer (2017); Leher (2017); Lino (2017); Melo e Souza (2017); Motta e Frigotto (2017); Moura (2017); Orso (2017); Silva e Scheide (2017); Silva (2017). |
Fonte: Elaborado a partir da pesquisa conduzida.
MAPEAMENTO DAS TESES E DISSERTAÇÕES DEFENDIDAS EM 2018 E 2019 SOBRE A REFORMA DO ENSINO MÉDIO
Levantadas as teses e dissertações nas bases de dados, sequenciamos a classificação por ano, abordando os resultados das buscas (título, autor, tipo, local, ano, citações recebidas) e as palavras-chave. Optamos por apresentar os dados separadamente, assim, os Quadros 3 e 4 , referem-se ao ano de 2018 e os Quadros 5 e 6 ao ano de 2019.
a) Produção acadêmica de 2018 – Dissertações de Mestrado e Teses de doutorado
Para o ano de 2018, conforme pode-se observar no Quadro 3 , identificamos 12 trabalhos, sendo uma tese e 11 dissertações. Mais abrangentes do que os artigos antes elencados, esses trabalhos de pesquisa colocam-se num movimento de análise cujo contexto situa-se posteriormente à aprovação da lei, o que permitiria uma análise mais cautelosa sobre a reforma e sobre seus possíveis desdobramentos na realidade escolar.
AUTOR / TÍTULO / TIPO / LOCAL / ANO | |
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1 | AMORIM, G. J. Da luta pela politecnia à reforma do ensino médio: para onde caminha a formação técnica integrada ao ensino médio. Dissertação. UFSCar, 2018. 0 citações |
2 | BENVENUTTI, C. D. A. S. Educação a distância de jovens e adultos do ensino médio: metodologias de ensino mediadas por tecnologias da informação e comunicação. Dissertação. Uninter, 2018. 0 citações |
3 | BORGES, S. G. A dialética das experiências escolares na emergência da prática de ocupar e resistir. Dissertação. Unisinos, 2018. 2 citações |
4 | COSTA, A. G. V. A. Flexibilização do ensino médio no Brasil: impactos e impasses na formação filosófica dos licenciados. Dissertação. UFG, 2018. 1 citação |
5 | GIANELLI, J. G. IF de SP - Campus São João da Boa Vista: a questão do EM Integrado. Tese. UFSCar, 2018. 0 citações |
6 | GOMES, R. S. Escola-de-ferro: um trem (des)governado pela “reforma do ensino médio”. Dissertação. Umesp, 2018. 0 citações |
7 | GONTIJO, J. R. M. Reforma do ensino médio: aspectos pedagógicos, formativos, legais e perspectivas. Dissertação. Uniube, 2018. 0 citações |
8 | MEDEIROS, F. V. G. A função social da escola na reforma do ensino médio: à luz da biologia. Dissertação. UFC, 2018. 0 citações |
9 | SILVA, G. M. S. Ensino médio no papel: educação, juventude e políticas educacionais. Dissertação. Uniesp, 2018. 0 citações |
10 | SILVA, M. M. A formação de competências socioemocionais como estratégia para captura da subjetividade da classe trabalhadora. Tese. Ubesp, 2018. 4 citações |
11 | SILVEIRA, A. R. O discurso sobre a reforma do ensino médio: uma análise da divulgação governamental. Dissertação. UCPel, 2018. 0 citações |
12 | VANDERLEI, S. A. V. Juventudes, escola e ensino de Geografia: sujeitos, espaços e sentidos. Dissertação. UFT, 2018. 0 citações |
Fonte: Catálogo de Teses e Dissertações da Capes e Biblioteca Digital de teses e Dissertações do CNPq (2018).
Conforme se pode ver no Quadro 4 , tomando-se as palavras-chave, termos escolhidos pelos seus autores como modo mais adequado de identificar suas escolhas de objeto e de abordagem, percebemos palavras e expressões mais frequentes que podemos encadear numa mesma lógica. Nesse Quadro, fica evidente que o termo “Educação” associado aos termos “Básica”, “Ensino Médio”, “de Jovens e Adultos”, “Profissional e Tecnológica”, que aparece seis vezes, define, com eficiência, o objeto de estudo. Por outro lado, o termo “Jovens”, associado aos termos “Culturas Juvenis”, “Movimento estudantil”, “Movimento Secundarista” e “Ocupações”, que apareceu cinco vezes, indica que parte dos trabalhos se preocupou mais em analisar a resistência à reforma do ensino médio que em avaliar sua implementação, quando em 2018, não parecia ganhar materialidade, em que pesem as justificativas do governo Temer para editar a MP.
Ademais, a expressão “Políticas e reforma educacional neoliberal e dualidade escolar”, com frequência de cinco aparições, expressa o tom crítico assumido pelos trabalhos que, ao mesmo tempo em que se opõem à reforma, preocupam-se com suas consequências. Ao abordarem também, de modo significativo, três vezes, os temas ligados ao termo “Docência”, classificam como as mudanças propostas para o ensino médio atingem a condição do professor.
O termo “Competências”, por outro lado, apesar de pouco proeminente no Quadro das palavras-chave mais frequentes, ainda assim, em menor escala, indica a importância do debate conceitual e prático dessa ideia já presente na LDB, mas muito reforçada na reforma em questão. Por último, mas não menos importante, emergem por quatro vezes os termos “Ensino Médio Integrado”, “Escola Unitária” e “Formação Humana Integral”, o que sinalizam a base teórica e as concepções pedagógicas que os autores assumem para contrapor a presente reforma.
Casos | Palavras-chave |
---|---|
06 | Educação (Básica, Ensino Médio, de Jovens e Adultos, Profissional e Tecnológica) |
05 | Jovens, Culturas Juvenis, Movimento estudantil e Movimento Secundarista de Ocupações |
05 | Políticas Educacionais, Neoliberalismo, Reforma Educacional e do Ensino Médio, Dualidade Escolar |
04 | Ensino Médio Integrado, Escola Unitária e Formação Humana Integral |
03 | Prática docente, ensino, Metodologia de ensino e Licenciaturas |
02 | Competências (não-cognitivas) e (socioemocionais) |
Fonte: Catálogo de Teses e Dissertações da Capes e Biblioteca Digital de teses e Dissertações do CNPq (2018).
b) Produção acadêmica de 2018 – Dissertações de Mestrado e Teses de doutorado
Para o ano de 2019, conforme se pode observar no Quadro 5 , identificamos a publicação de 34 trabalhos, sendo três teses e 31 dissertações. Mais abrangentes do que os artigos antes elencados, esses trabalhos de pesquisa situam-se num movimento de análise que vai além do contexto e do processo de aprovação da lei, com um olhar mais detalhado sobre suas implicações e possíveis desdobramentos curriculares.
AUTOR / TÍTULO / TIPO / LOCAL / ANO | |
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1 | ABRANTES, T. A. As condicionalidades do Banco Interamericano de desenvolvimento e as políticas de educação profissional no Brasil . Dissertação. Unioeste, 2019. 0 citações |
2 | ALBUQUERQUE, J. E. B. Educação e democracia e escola em tempos sombrios: neoconservadorismo na educação . Dissertação. UPF, 2019. 0 citações |
3 | ALMEIDA, F. C. Aprendizagem baseada em empreendedorismo: uma proposta para melhoria do ensino profissional técnico de nível médio no IFPA . Dissertação. Ifam, 2019. 0 citações |
4 | ANDRADE, N. L. A reforma do ensino médio (Lei nº 13.415/2017) : o que pensam alunos e professores? Dissertação. Unesp, 2019. 0 citações |
5 | ANGELI, G. Juventudes e trabalho : o discurso dos jovens sobre educação profissional no ensino médio. Dissertação. UFRGS, 2019. 0 citações |
6 | BEZERRA, V. O. Empresários e educação : consentimento e coerção na política educacional do EM. Dissertação. UFMS, 2019. 0 citações |
7 | CARDOSO, P. E. P. Crítica à contrarreforma do ensino médio (Lei nº 13.415/2017) . Dissertação. UFC, 2019. 0 citações |
8 | CHAGAS, A. B. Os primeiros passos para a implementação da reforma do ensino médio no RS : projetos em disputa. Dissertação. UFRGS, 2019. 1 citação |
9 | CRUZ, M. S. R. S. Programa ensino médio inovador (ProEMI): análise a partir do conceito de inovação e integração curricular . Dissertação. UFPA, 2019. 0 citações |
10 | FELÍCIO, S. C. Reforma do ensino médio e a disciplina história: leituras sobre as repercussões da proposta da BNCC . Dissertação. UFG, 2019. 0 citações |
11 | GALVÃO, N. L. G. O debate sobre politecnia e educação integral no contexto da reforma do ensino médio e da BNCC . Dissertação. UNINOVE, 2019. 0 citações |
12 | GOMES, F. A. Base nacional comum curricular do ensino médio: currículo, poder e resistência . Tese. PUC de Goiás, 2019. 0 citações |
13 | HARMEL, A. R. Lei nº 13.415/2017 : impactos no ensino médio técnico sob a ótica de coordenadores de cursos profissionalizantes do IFPR. Dissertação. Unioeste, 2019. 0 citações |
14 | HEEREN, M. V. A construção política e normativa do IFSP: a garantia do direito à educação básica e o conflito com a reforma do EM . Tese. Unesp, São Paulo, 2019. 0 citações |
15 | HILÁRIO, W. F. A. O Enunciado “educação para a vida e para o trabalho” inscrito nas reformas do ensino médio como tecnologia da governamentalidade neoliberal (1996-2017) . Dissertação. UFGD, 2019. 0 citações |
16 | LIMA, M. D. C. Os impactos da proposta da base nacional comum curricular para o ensino médio . Dissertação. CUML, 2019. 0 citações |
17 | MARTINS, E. A. Políticas de currículo e reformas no ensino médio: uma análise de contextos em documentos e na percepção de professores de ciências da natureza . Dissertação. UFRGS, 2019. 0 citações |
18 | OLIVEIRA, C. D. Jovens estudantes do ensino médio integrado no Instituto Federal de Salto: experiências do presente e projetos de futuro . Dissertação. UFScar, 2019. 1 citação |
19 | PEREIRA, C. S. M. Reforma do ensino médio – Lei nº 13.415/2017: avanços ou retrocessos na educação? Dissertação. UFRRJ, 2019. 0 citações |
20 | REYES, L. G. T. A reforma do EM: o que pensam os estudantes secundaristas... Dissertação. FURG, 2019. 0 citações |
21 | ROSA, L. A. Ocupações estudantis: um estudo psicopolítico sobre movimentos paulistas de 2015 e 2016 . Tese. PUC de São Paulo, 2019. 0 citações |
22 | SANTOS, G. A. #Ocupamendes: uma análise do perfil dos estudantes na ocupação no colégio estadual... Dissertação. UFRJ, 2019. 0 citações |
23 | SATO, C. A. Gestão escolar em duas escolas de EM-DF: o programa de ensino médio de tempo integral. Dissertação. UNB, 2019. 0 citações |
24 | SILVA, A. R. C. A concepção de trabalho e formação na reforma do ensino médio de 2017 . Dissertação. UFSC, 2019. 0 citações |
25 | SILVA, C. C. L. O IF do Acre e a “nova” política para o EM . Dissertação. UFAC, 2019. 0 citações |
26 | SILVA, F. P. C. A reforma do ensino médio no governo Michel Temer (2016- 2018) . Dissertação. UFMG, 2019. 0 citações |
27 | SILVA, H. S. A concepção e construção do Projeto de Vida no Ensino Médio: um componente curricular na formação integral do aluno . Dissertação. PUC de São Paulo, 2019. 0 citações |
28 | SILVA, J. R. A desconstrução do EM e suas consequências ao projeto de vida da juventude do RS . Dissertação. UFFS, 2019. 0 citações |
29 | SOUZA, F. G. O protagonismo juvenil nas ocupações de duas escolas estaduais no NRE/Londrina: análise sociológica . Dissertação. UEL, 2019. 0 citações |
30 | SOUZA, R. S. Família e escola: estudo de uma relação (in)delicada a partir de gênero . Dissertação. UFJF, 2019. 0 citações |
31 | SPERANDIO, R. S. Processo de institucionalização da reforma: análise das disputas envolvidas na configuração final da Lei nº 13.415/2017 . Dissertação. Ufes, Vitória, 2019. 0 citações |
32 | STEIMBACH, A. A. Escolas ocupadas no paraná: juventudes na resistência à reforma do EM (MP 746/2016) . Tese. UFPR, 2019. 0 citações |
33 | VICENTE, V. R. R. Políticas educacionais para o ensino médio: as implicações da Lei nº 13.415/2017 . Dissertação. UEM, 2019. 0 citações |
34 | WATHIER, V. P. Reforma do ensino médio: vamos pensar uma educação ecossistêmica? Tese. UCB, 2019. 0 citações |
Fonte: Catálogo de Teses e Dissertações da Capes e Biblioteca Digital de teses e Dissertações do CNPq (2019).
Nos 34 trabalhos de 2019 publicados nas bases de pesquisa, conforme se pode observar no Quadro 6 , as palavras-chave mais utilizadas guardam semelhança com o levantamento de 2018 sobre o mesmo tema. O objeto mais explícito desses trabalhos evidencia-se nos termos “Educação Básica e Profissional”, “Ensino médio”, “Reforma educacional”, “Política Educacional”, “Mudanças da legislação educacional” e Lei nº 13.415/2017, que aparecem, em separado ou vinculadas, em 52 casos. Mas esses trabalhos parecem focar mais no conteúdo e nas consequências da reforma do ensino médio ao apresentar como termos de destaque, por 14 vezes, as palavras-chave: “Novo Ensino Médio”, “Flexibilização curricular”, “BNCC”, “Empreendedorismo”, “Projeto de Vida”, “Projetos de futuro” e “Protagonismo juvenil”.
Ao analisarem a presente reforma, os trabalhos assinalam como contraponto a Lei nº 13.415/2017. Os termos que aparecem em oito casos (isolados ou associados) são: “Integração Curricular”, “Educação Integral”, “Ensino Médio Integrado”, “Formação integral” e “Politecnia”. Aparentemente, por esse levantamento, observa-se que, por um lado, os estudos trabalham com elementos da totalidade sócio-econômico-política que envolvem a educação apontando, em 12 casos, os termos: “Hegemonia”, “Crise do capital contemporâneo”, “Regime de acumulação flexível”, “Organismos Internacionais”, “Empresários”, “Democracia”, “Direito à Educação”, “Dualidade Curricular”. Mas por outro, apontam o enfrentamento à Reforma quando, em dez casos, destacam os termos: “Movimento estudantil”, “Ocupação”, “Resistência” e “Participação Política”.
Casos | Palavras-chave |
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40 | Ensino médio, Reforma educacional, Política Educacional e Mudanças da legislação educacional (Lei nº 13.415/2017 e Lei nº 9.394/96) |
14 | Novo Ensino Médio, Flexibilização curricular, BNCC, Empreendedorismo, Projeto de Vida, Projetos de futuro, e Protagonismo juvenil |
12 | Hegemonia, Crise do capital contemporâneo, Regime de acumulação flexível, Organismos Internacionais, Empresários, Democracia, Direito à Educação, Dualidade Curricular |
12 | Escola, Educação Básica e Profissional |
10 | Movimento estudantil, ocupação, Resistência e Participação política |
08 | Integração Curricular, Educação Integral, Ensino Médio Integrado, Formação integral, Politecnia e Ampliação da jornada escolar |
Fonte: Catálogo de Teses e Dissertações da Capes e Biblioteca Digital de teses e Dissertações do CNPq (2019).
A análise dos Quadros 3 e 5 nos mostra que tanto as teses quanto as dissertações dos anos de 2018 e 2019, ainda não causaram impacto significativo no meio acadêmico. Dos 36 estudos, apenas quatro foram citados até 27 de dezembro de 2020.
Com este estudo, observamos que, segundo a produção acadêmica, a reforma do ensino médio e sua estruturação em itinerários formativos implica importante retrocesso, com fortes impactos sobre os currículos escolares, ainda muito precários, que precisam ser revisados no sentido de sua valorização e na direção de seu esvaziamento.
Nos trabalhos elencados acima, retirados das bases da Capes e da BDTD, bem como nos artigos publicados em importantes periódicos da educação, pudemos observar como nasce o projeto de reforma do ensino médio: em meio a um cabo de guerra antidemocrático que traz, por um lado, um discurso de melhoria do ensino médio, mas se fundamenta em interesses de grupos nacionais e de organizações internacionais vinculados ao capital em estágio de crise. Nota-se, pelas pesquisas relacionadas, que a reforma não dá conta de todos os entraves que o ensino médio possui, pois ela não resolve problemas como o investimento, especialmente em estrutura e salários de professores, mantendo uma estrutura precária com a falta de laboratórios e bibliotecas, de professores e, principalmente, de condições para que o jovem permaneça nos bancos escolares.
Os autores são críticos e relatam que uma mudança curricular com uma lista de conteúdos e seus objetivos, por si só, não deve trazer melhorias ao que se tem estabelecido hoje, pelo contrário, o reducionismo curricular, já apontado na diminuição da carga horária, é maléfico para a educação no ensino médio.
CONCLUSÃO
É possível afirmar que os artigos (e suas abordagens) da primeira etapa, até por terem sido publicados antes, podem ter influenciado indiretamente os trabalhos da segunda etapa, razão pela qual há muita convergência entre as categorias de análise dos artigos e as palavras-chave das teses e dissertações. Mas não se pode afirmar que os autores-referência influenciaram diretamente nas escolhas dos orientandos ou examinandos.
Tomando os preceitos da bibliometria, a partir do cálculo do índice h, proposto por Hirsch (2005) , encontramos o núcleo h dos trabalhos, que é 18, e os artigos que tiveram maior impacto no meio acadêmico. Seguindo as preconizações da Lei do Elitismo de Price (1963) , encontramos o número dos autores mais produtivos, que é 5,5, em seguida identificamos os que possuíam dois ou mais artigos e encontramos os cinco autores, C. J. Ferreti, G. Frigotto, M. R. Silva, E. B. Ferreira e V. C. Motta. Por fim, aplicamos a Lei de Bradford (1934) e organizamos os periódicos segundo quantidade de estudos no mapeamento e dividimos em três zonas, assim, encontramos o periódico Educação e Sociedade no núcleo central, configurando-se, assim, como o mais devotado ao tema da reforma do ensino médio.
Não obstante aos dados apurados sobre os trabalhos que mais impactaram, autores mais produtivos e periódico mais devotado ao nosso objeto, nos debruçamos na identificação das categorias de análise e das palavras-chave. Desse modo, emergiram as seguintes categorias, contexto político e econômico (I); antecedentes da reforma (II); interesses de classe (III); mercado de trabalho (IV); viabilidade e implementação (V); mercado da educação (VI); comparações internacionais (VII); esvaziamento e flexibilização curricular (VIII); precarização da docência (IX); avaliação de larga escala (X); dualidade educacional e social (XI); e, gastos e investimentos (XII). Por fim, encontramos as palavras-chave mais recorrentes nas teses e dissertações, quais sejam: Ensino médio; Reforma educacional; Política Educacional e Mudanças da legislação educacional, que aparecem em 40 dos 42 estudos analisados.
De todo modo, fica claro que a produção acadêmica aqui classificada enfatiza o contexto, a resistência, os riscos e as implicações relativas à reforma em tela. Mas também, sinaliza-se a tendência das pesquisas em focar, cada vez mais, na possível implementação da Lei nº 13.415/2017, o que permitiria a produção de análises menos teóricas e mais empíricas da oferta escolar e da prática curricular.
Entretanto, na maioria dos casos, as formulações trazidas até aqui, já anteveem as consequências nefastas da aplicação da lei, além de apontar para a sua inviabilidade por não se consolidar, de fato, como fomento efetivo do ensino em tempo integral com repasses de recursos aos sistemas estaduais de ensino, dadas às restrições orçamentárias impostas pela Lei do Teto de Gastos (Emenda Constitucional 95) e por medidas gerais de austeridade.
Diante dessa produção, pudemos compreender que há uma base bastante convergente, segundo a qual, a Reforma do Ensino Médio tem estreita relação com a crise do capital que desmonta a base do Estado de Bem-Estar Social para a construção de um projeto educacional voltado para os pressupostos neoliberais. Dentre as medidas que mais se alinhariam a esse novo modelo de Estado, podemos destacar a Desvinculação de Receitas da União e a Ementa Constitucional nº 95, que colocam em risco o próprio cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE), que tem como meta, a progressiva melhoria da manutenção e do desenvolvimento da oferta escolar, prevendo a realização de políticas integradas entre os entes públicos.
Também pelo conjunto analítico, pode-se perceber que, para os autores, o problema da escola não seria curricular, ou de carga horária efetiva dos alunos na escola. Inferimos que olhar o problema por esse lócus seria ignorar que o que está por trás do desinteresse dos alunos é uma escola sucateada, sem uma infraestrutura condizente com as reais necessidades dos jovens, além da pobreza em que vivem os estudantes brasileiros.
Outrossim, segundo essa produção, a presente reforma abre a possibilidade de que se estabeleçam parcerias para a oferta dos itinerários. Tal projeto viabiliza a articulação entre instituições públicas e privadas, o que pode significar direcionamento de recursos públicos a instituições privadas ou paraestatais, especialmente quando se tratar do itinerário profissionalizante.
Em geral, podemos afirmar que os trabalhos publicados em revistas conceituadas no debate da educação e em pesquisas formuladas em importantes programas de pós-graduação em educação, têm sido unânimes em pontuar os limites e os equívocos da “Reforma do Ensino Médio”. E que essa medida tem mais a pretensão de se alinhar a interesses de organismos internacionais e a princípios de setores que pensam na educação como uma extensão da economia, do que pensar uma proposta que cumpra a função social da escola e, principalmente, do ensino médio.
De outro lado, a falta de legitimidade do governo Temer na difusão das políticas educacionais levou inúmeros pensadores do campo progressista a traçarem críticas contundentes à reforma. Apesar de esses pesquisadores da educação concordarem que o ensino médio brasileiro possui inúmeros problemas e que precisa ser reformulado, os autores e textos que analisamos são contundentes em afirmar que essas mudanças não se darão por meio de um dispositivo legal, mas que só serão possíveis se partirem de um projeto coletivo, democrático e amparado por uma política de investimento contrária à lógica de ajustes que foram impostos pela gestão Temer.