Introdução
O presente trabalho tem por objetivo apresentar e discutir dados de uma pesquisa1 que teve como objetivo compreender como os cursos de pedagogia têm feito a formação inicial dos professores para que possam trabalhar nas escolas do campo. Ou seja, a pesquisa pretendeu traçar um panorama mais geral da formação dos professores que atuam nas escolas não urbanas, considerando os cursos de pedagogia como o local dessa formação inicial.
A referida pesquisa partiu das seguintes questões:
a) Qual a formação oferecida para os professores que atuam nas escolas do campo?
b) Quantas e quais universidades oferecem formação relacionada à Educação do Campo?
c) Quantas e quais disciplinas existentes nos cursos de pedagogia discutem as questões relacionadas à Educação do Campo?
d) Como são as ementas dessas disciplinas?
A ideia de realizar este trabalho surgiu a partir das reuniões do Núcleo Bocaíuva, que é composto por professores e professoras interessados em estudar e discutir a Educação do Campo e das populações ribeirinhas no Brasil, especificamente na região do Pantanal sul-mato-grossense.
Na verdade, tudo começou com a realização do Seminário “Ser Professor no Pantanal”, organizado pelo Acaia Pantanal,2 que teve o objetivo de promover aprendizagens de professores, coordenadores e estudantes do Pantanal sul-mato-grossense e dar maior visibilidade ao trabalho que vem sendo realizado por eles (SEMINÁRIO SER PROFESSOR NO PANTANAL, 2019). Foi o início de um diálogo sobre as questões da docência no munícipio de Corumbá, tanto nas Escolas das Águas como nas Escolas do Campo e nas Escolas da Cidade.3
Colocar o professor no centro do debate por meio do relato de suas experiências no cotidiano da escola foi uma das estratégias utilizadas para favorecer a valorização do seu conhecimento sobre o ensino e aprendizagem. Foi criado um espaço de troca de olhares, aberto também aos pesquisadores, universitários e interessados nesta realidade. Nosso desejo era que a voz desses sujeitos ecoasse em outros cantos para se sentirem representados no cenário nacional.
O seminário propôs uma reflexão sobre a identidade do professor por meio do resgate de suas práticas cotidianas e discussões teóricas (SEMINÁRIO SER PROFESSOR NO PANTANAL, 2019). A formação de professores precisa considerar, segundo António Nóvoa (1992), três dimensões: a preparação acadêmica, a preparação profissional e a prática pessoal. Todas integradas, sem separar concepção de execução.
Ainda de acordo com esse autor:
A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência. (NÓVOA, 1992, p. 13).
A avaliação do evento apontou para a necessidade de darmos continuidade às atividades que promovessem a formação desses professores (SEMINÁRIO SER PROFESSOR NO PANTANAL, 2019).
Portanto, sentimos a necessidade de criar um grupo permanente para estudar, pensar e agir a fim de oportunizar novas experiências com foco nos professores do Pantanal do Mato Grosso do Sul. Assim, no início de 2020 foi criado o Núcleo Bocaiuva,4 que pretende ser um espaço para promover tais ações.
No entanto, com a pandemia e a impossibilidade de atividades presenciais, nossas ações ganharam novas configurações e decidimos iniciar o trabalho com a realização de uma pesquisa que nos indicasse um panorama sobre a formação inicial dos professores que vão atuar nas escolas não urbanas.
O presente artigo está estruturado da seguinte forma: num primeiro momento, traremos algumas reflexões sobre a Educação do Campo, suas origens e a legislação atual que a normatiza. Em seguida, pretendemos apresentar os dados levantados sobre os cursos de pedagogia e a formação para a Educação do Campo: quantos e quais cursos oferecem disciplinas que discutem essa questão, quais as temáticas estão presentes nos cursos. Por fim, teceremos algumas considerações a respeito dessa formação inicial e quais as possiblidades de atuação desses professores nas escolas localizadas na zona rural.
A educação das populações rurais no Brasil
A trajetória da Educação do Campo, ainda denominada como Educação Rural, no Brasil, inicia-se na década de 1930, paralelamente ao início da industrialização.
O Brasil, durante o século XX, passou por um processo abrupto de urbanização acompanhado de um êxodo rural, no qual milhares de moradores do campo foram expulsos das suas terras, seja porque foram atraídos pela ilusão de melhores condições de vida na cidade, seja por conta da mecanização do campo, que lhes tirou o trabalho.
Assim, a educação rural no Brasil sempre esteve em segundo plano. Havia um pensamento de que “gente da roça não necessita de escola”. Além disso, havia também a ideia de que o campo era um lugar atrasado e que, aos poucos, o Brasil se tornaria um país urbano e desenvolvido.
Nos anos de 1960, Paulo Freire inicia um debate sobre educação e apresenta uma proposta pedagógica que viria questionar a ideia de que os moradores do campo não são portadores de conhecimento e de cultura. Assim, com Freire, o Brasil conhece uma proposta de educação libertadora que valoriza as classes populares.
Segundo Antonio e Lucine (2007, p. 183):
Identificados pelas problemáticas vividas, os povos do campo encontram na Pedagogia Libertadora um dos ancoradouros para a discussão dos processos de exclusão e empobrecimento crescente dos trabalhadores. Processos que adentram a escola, nos seus aspectos organizacionais e didáticos do currículo escolar.
Paulo Freire oferece contribuições significativas, principalmente no campo da educação popular, destacando-se: o Plano Nacional de Alfabetização, os Movimentos de Educação de Base (MEB), os Centros Populares de Culturas (CPC), anunciando, assim, um novo paradigma da educação escolar centrada na concepção libertadora de educação, ao contrário dos programas de governo vigente até então, que tinham uma proposta de educação compensatória voltada ao treinamento de mão de obra mais produtiva. Paulo Freire entra com uma proposta de valorização à prática social do sujeito (LEITE, 2002).
A partir da década de 1980, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) torna-se uma força, as tensões entre o Estado e os povos campesinos, no que diz respeito à educação, ocorrem devido à mobilização dos movimentos reivindicarem a necessidade de promover uma educação voltada aos interesses dos povos do campo. Dentre as garantias dos direitos propostos pelo movimento estava uma educação diferenciada, com propostas e iniciativas para a Educação do Campo, visando atender aquelas pessoas a partir da sua realidade. Nesse contexto, o movimento encontra na Pedagogia Libertadora de Freire uma referência que fortalece o sonho de libertação dos sem-terra.
Sendo assim, atualmente não é possível pensar a educação brasileira sem incluir as crianças, os jovens e os adultos que moram no campo. E tampouco uma proposta pedagógica para as escolas do campo que não contemple a história de seu povo, sua cultura, seu modo de vida, e o tempo próprio do campo.
A Constituição Federal de 1988 já contempla a educação rural quando diz que todos têm direito à educação e que o Estado garantirá o acesso, a permanência e condições de igualdade para todos (BRASIL, 1988).
Essa premissa é reforçada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) no art. 28: “Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região” (BRASIL, 1996).
No final dos anos 1990, foi criado o Programa Nacional da Educação na Reforma Agrária (Pronera), que, segundo Molina (2003), é um programa destinado aos sujeitos do campo, propondo uma metodologia específica que valorize a cultura e o saber do educando, fortalecendo a educação do campo na política educacional.
Em 2002, o Ministério da Educação (MEC) lança as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, aprovada após a emissão do Parecer CNE/CEB nº 36/2002 (BRASIL, 2002), que afirma:
Art. 2º: Estas Diretrizes, com base na legislação educacional, constituem um conjunto de princípios e de procedimentos que visam adequar o projeto institucional das escolas do campo às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e Médio, a Educação de Jovens e Adultos, a Educação Especial, a Educação Indígena, a Educação Profissional de Nível Técnico e a Formação de Professores em Nível Médio na modalidade Normal.
Parágrafo único. A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva no país.
Em 2008, foram ainda aprovados o Parecer CNE/CEB nº 03/2008 (BRASIL, 2008a) e a Resolução CNE/CEB nº 02/2008 (BRASIL, 2008b). Essa Resolução, além de definir normas, diretrizes e princípios, ainda define a população rural como: agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados da reforma agrária, quilombolas, caiçaras e outros.
Segundo Silva e Pasuch (2010), esses documentos são históricos na regulamentação e orientação da Educação do Campo no país. Apesar de ainda pequeno, o reconhecimento do direito dos camponeses a uma Educação do Campo é reforçado a cada dispositivo legal que surge e está vinculado a uma consciência de luta por uma democracia real.
Segundo Caldart (2002), a Educação do Campo é um projeto educacional compreendido a partir dos sujeitos que têm o campo como seu espaço de vida. Nesse sentido, ela é uma educação que deve ser no e do campo: “No, porque o povo tem o direito a ser educado no lugar onde vive; Do, pois o povo tem direito a uma educação desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais.” (CALDART, 2002, p. 26).
A cultura entendida como modo de vida e das formas de compreensão que as pessoas têm do mundo, das explicações que buscamos para a vida. Então, é necessário considerar o modo de vida do campo distinto do modo de vida de quem vive nas cidades. Assim como o modo de vida dos ribeirinhos, que tem características tão singulares. A cultura dessa população precisa ser considerada com suas características próprias e não através da lente de quem enxerga de fora do seu contexto.
Alfredo Veiga-Neto (2003, p. 7) problematiza a questão da monocultura; para ele, durante muito tempo a cultura foi considerada no singular, ou seja, só existia apenas uma para todos. E cabia à escola educar as pessoas com base nessa cultura única. De alguma maneira é o que tem sido observado em relação às escolas do campo e ribeirinhas aqui no Brasil. Ou seja, parte-se da lógica das escolas urbanas e, a partir de pequenas adaptações, leva-se essa cultura escolar para as áreas rurais, como se todos tivessem as mesmas demandas educacionais. Como, por exemplo, na questão do calendário escolar: muitas das escolas ribeirinhas têm problemas em relação ao seu acesso durante determinadas épocas do ano. As crianças ficam impedidas de chegar às suas escolas, ou porque o rio subiu demais e alagou suas casas e a própria escola ou o rio secou, sumindo com os caminhos de acesso. Nestes casos, o calendário precisa ser outro, o padrão das escolas da cidade não é adequado para uma situação como esta.
Juliana Araújo (2009), na sua pesquisa sobre a docência numa escola do campo no estado de São Paulo, aponta características no modo de ser das crianças moradoras da zona rural relatadas pelos professores escutados. A percepção deles é que existem algumas diferenças na relação entre as crianças e entre elas e os adultos. Apesar de ser uma amostragem pequena, pode indicar algumas visões que se tem sobre as diferenças entre quem mora na cidade e quem mora no campo.
Assim, em face de algumas mudanças nos paradigmas da educação das populações rurais do Brasil, novos desafios surgiram, novas proposições foram feitas e novas formas de pensar e agir em relação às escolas do campo foram sendo implementadas pelas políticas públicas educacionais brasileiras.
Nesse contexto, muitas questões foram surgindo: Quem pensa o projeto pedagógico das escolas do campo? Por qual ótica? Existe um espaço de escuta do público-alvo para a construção do projeto político pedagógico de cada uma dessas escolas?
Essas questões nos levam a refletir sobre como se dá a formação inicial dos professores que vão atuar em escolas com contextos tão específicos. Os cursos de pedagogia conseguem olhar para essas especificidades?
É preciso destacar que o curso de Pedagogia tem sido o espaço de formação de profissionais para atuação na educação básica.
A Resolução CNE/CP nº 1/2006 (BRASIL, 2006) define as finalidades do curso e as aptidões requeridas para a formação do(a) pedagogo(a):
Art. 4º O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.
Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:
I - Planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas próprias do setor da Educação;
II - Planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares;
III - Produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares e não escolares.
Assim, amplia-se o horizonte da formação do(a) pedagogo(a), requerendo-se ainda que o currículo dos cursos de Pedagogia se estruture em um núcleo de estudos básicos, um núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos, um núcleo de estudos integradores e o estágio curricular. As DCNP destacam ainda a necessidade do egresso do curso “demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras” (BRASIL, 2006).
Nesse sentido, o curso de Pedagogia é um espaço muito importante para a formação de professores e professoras que trabalharão nas escolas do campo, garantindo que as crianças e adolescentes possam ter acesso a uma educação de qualidade. Por entender que essas escolas têm características próprias, acreditamos que os professores também precisam de uma formação mais específica para conseguirem desenvolver um trabalho conectado com o contexto no qual está inserido.
Portanto, o Núcleo Bocaiuva se propôs a realizar um levantamento de dados que investigasse essa questão, ou seja, que pudesse compreender como os cursos de pedagogia têm feito a formação inicial dos professores para que possam trabalhar nas escolas do campo. A seguir, apresentaremos os dados levantados.
A Pesquisa5
O levantamento de dados foi realizado de modo virtual nos sites de todas as universidades públicas do Brasil (estaduais e federais) e teve como objetivo mapear os cursos de Pedagogia e/ou Educação que são oferecidos de forma presencial e/ou à distância, e quais disciplinas relacionadas à Educação do Campo são oferecidas nesses cursos. Foram coletados dados sobre a obrigatoriedade ou não das disciplinas, a carga horária e as temáticas das ementas.
Como ponto de partida para um estudo posterior mais aprofundado, optou-se pela coleta de dados nos sites que podem ser considerados como documentos oficiais eletrônicos. Condizente com o que se pode considerar como uma pesquisa documental, como um procedimento metodológico. Segundo Lüdke e André (1986), analisar documentos contribui para a construção de dados que orientam a pesquisa. Dependendo do objeto de estudo e dos objetivos da pesquisa, pode-se caracterizar como principal caminho de concretização da investigação ou se constituir como instrumento metodológico complementar. “A análise documental busca identificar informações factuais nos documentos a partir de questões e hipóteses de interesse.” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 38).
No momento atual de pandemia, a coleta de dados nos sites das Universidades foi o recurso possível para a realização do mapeamento quantitativo das ofertas de disciplinas relacionadas à formação inicial de professores para trabalharem nas escolas do campo.
Do total das 93 universidades pesquisadas, 57 são federais e 36 são estaduais.
Foram encontradas 10 universidades na região Norte, 33 na região Nordeste, 9 na região Centro-Oeste, 28 na região Sudeste e 13 na região Sul.
A diferença de cursos oferecidos por uma mesma universidade foi um dos dados que se destacaram na pesquisa. A quantidade de campus em cada universidade foi outra informação relevante para se entender em qual região são encontrados os cursos de pedagogia e quais as disciplinas relacionadas à Educação do Campo.
O curso de Pedagogia ou Educação é oferecido em diferentes campi das universidades federais e estaduais, sendo 37 na região Norte, 100 na região Nordeste, 44 na região Centro-Oeste, 58 na região Sudeste e 24 na região Sul. São 263 cursos no total, que são ofertados majoritariamente de forma presencial.
Dentre os cursos de Pedagogia, são oferecidas 112 disciplinas relacionadas à Educação do Campo.
A Região Nordeste tem a maior concentração de disciplinas relacionadas à Educação do Campo, seguida pela Região Sudeste. As disciplinas encontradas são oferecidas de forma optativa ou obrigatória.
Em relação à carga horária das disciplinas, foi observada uma variação entre 15 e 83 horas por semestre para cada disciplina. Em geral, cada curso oferece apenas uma disciplina relacionada à Educação do Campo.
Consideramos que o tempo reservado de 15 horas num semestre parece ser insuficiente, principalmente se levarmos em conta a complexidade do trabalho numa escola do campo. Fica a pergunta: qual seria o tempo necessário para que os alunos possam ser apresentados a algumas teorias, compreendê-las e vivenciarem uma prática reflexiva sobre a Educação do Campo?
Uma questão interessante que encontramos é a oferta da disciplina de Estágio Supervisionado em Educação do Campo, que poderia ser um espaço de reflexão entre a teoria e a prática. No entanto, apenas duas universidades a oferecem, sendo uma no Pará e outra na Paraíba.
As 112 disciplinas encontradas têm nomes variados, mas a grande maioria é denominada Educação do Campo. O Quadro 1 apresenta os nomes dessas disciplinas.
Nome das disciplinas | Quantidade |
---|---|
Educação do campo | 82 |
Educação no campo | 5 |
Educação rural | 4 |
Estágio supervisionado na educação do campo | 2 |
Especificidades da escola rural | 1 |
Educação no campo e políticas públicas de Educação no campo | 1 |
Educação do campo e suas populações | 1 |
Educação do campo e dos povos da Amazônia | 1 |
Educação do campo, desenvolvimento de sociedade sustentável | 1 |
Educação do campo e movimentos sociais | 1 |
Educação do campo/ estágio supervisionado | 1 |
Educação do meio rural | 2 |
Escola do campo | 1 |
Educação Camponesa e indígena | 1 |
Educação do campo: o cotidiano do campo e o enriquecimento curricular | 1 |
Educação e Populações Rurais | 1 |
Educação escolar do campo | 1 |
Fundamentos e metodologia da educação do campo | 1 |
Movimentos do campo e educação | 1 |
Pedagogia do campo | 1 |
Práticas educativas do/no campo | 1 |
Tópicos em educação do campo | 1 |
Total | 112 |
Fonte: Elaborado pelas autoras deste artigo com base em dados da pesquisa.
As ementas encontradas nos permitiram apontar quais as temáticas em relação à Educação do Campo que estão sendo consideradas importantes nos cursos de Pedagogia para a formação inicial dos professores.
Temáticas encontradas | Quantidade de vezes encontradas |
---|---|
Contexto mais geral | 09 |
Concepção teórico metodológica | 36 |
Políticas públicas - legislação | 33 |
Identidade - cultura | 20 |
Currículo | 13 |
Desenvolvimento sustentável | 13 |
Movimentos sociais | 19 |
Direito à educação | 02 |
Educação popular | 04 |
História | 26 |
Formação de professores - educadores | 08 |
Pedagogia da terra | 03 |
Pedagogia da alternância | 06 |
Reforma agrária | 02 |
Fonte: Elaborado pelas autoras deste artigo com base em dados da pesquisa.
Vale mencionar outras temáticas que foram encontradas apenas uma vez nas ementas: indígenas; classes multisseriadas; quilombolas; escolas unidocentes; educação ambiental; financiamento; estado; decolonização; educação não formal; agroecologia; pedagogia do movimento; ongs; cidadania; desigualdade social; meio ambiente; pedagogia do oprimido.
A partir da análise das ementas, constatou-se um predomínio de questões mais gerais, tais como: legislação, políticas públicas, concepções teórico-metodológicas e cultura.
Por outro lado, as temáticas que dizem respeito às questões de práticas de sala de aula e/ou formas de organização das escolas do campo tiveram uma incidência bem menor. Podemos citar: pedagogia da alternância, classes multisseriadas, currículo. Vale destacar que, de acordo com o censo escolar de 2011 (BRASIL, 2012), existem no Brasil 42.711 classes multisseriadas localizadas na zona rural, ou seja, existe um número expressivo de escolas com esta estrutura.
Assim, podemos levantar algumas questões: Como será que um professor recém-formado vai atuar diante de um contexto não apresentado no curso que deveria habilitar para tal situação? Será que a formação inicial dos professores oferecida nos cursos de Pedagogia está contribuindo para que os professores possam atuar em diferentes realidades? Quais conexões existem entre as teorias abordadas no curso e as práticas encontradas nas escolas?
Considerações finais
Esse artigo teve como foco a apresentação e análise dos dados de uma pesquisa a respeito da formação inicial de professores para trabalharem nas escolas do campo. O objetivo da referida pesquisa foi compreender como os cursos de Pedagogia têm feito a formação inicial dos professores que irão trabalhar nas escolas do campo e nas escolas ribeirinhas.
O debate sobre a formação do professor para atuar na Educação do Campo é relativamente novo no Brasil, tendo ganhado corpo e visibilidade a partir das discussões levantadas pelos movimentos sociais sobre o novo paradigma do campo, que vem se construindo a partir da década de 1980 no Brasil.
Oliveira (2016, p. 104) afirma que:
A discussão sobre a formação desse (a) profissional para atuar nas escolas do Campo não está dissociada da discussão mais geral sobre as políticas de formação inicial de professores (a) que envolve, entre outros aspectos, o lócus da formação inicial, os currículos e os projetos político-pedagógicos das agências formadoras e as políticas nacionais de formação de pedagogos (as) / professores (as).
Sendo assim, ressaltamos a importância e a relevância de se compreender o espaço destinado nos cursos de Pedagogia para que essa formação aconteça. Pretendemos que os achados dessa pesquisa possam contribuir para a discussão acadêmica na área das políticas curriculares voltadas à formação do professor para atuar na Educação do Campo e nas escolas ribeirinhas e, consequentemente, para a melhoria da qualidade da educação oferecida aos moradores da zona rural.
Na presente pesquisa foram considerados os seguintes pontos: a existência ou não de disciplinas dos cursos de Pedagogia ligadas à temática da Educação do Campo, o nome das disciplinas, o número de horas e suas ementas.
Os dados encontrados apontam que na maioria dos cursos de Pedagogia analisados não foram encontradas disciplinas relacionas à Educação do Campo. Além disso, percebeu-se que, geralmente, é ofertada apenas uma disciplina por curso e com uma carga horária irrelevante.
Isso demonstra que existe uma lacuna a ser preenchida nos espaços acadêmicos e que, apesar da legislação sobre Educação do Campo ter avançado bastante nas últimas décadas, a formação de professores está muito aquém do desejado.
Nesse ponto, Oliveira (2016, p. 44), que analisou os cursos de Pedagogia da Universidade Federal da Paraíba, chegou à seguinte conclusão:
Este fato nos faz entender que a Universidade, mesmo tendo um papel decisivo na legitimação dos lugares periféricos de enunciação dos discursos e sendo o lócus privilegiado para a formação do (a) Pedagogo (a) / Professor (a) (SOUZA, 2009), ainda apresenta uma lacuna a ser preenchida nos espaços acadêmicos, no que diz respeito à discussão do currículo da formação deste profissional para atuar na Educação campesina.
Por outro lado, mesmo considerando as disciplinas encontradas e analisadas durante a pesquisa, percebe-se que as temáticas trabalhadas nos cursos de Pedagogia se referem às questões mais gerais, tais como: legislação, políticas públicas, concepções teórico-metodológicas e cultura. Isso indica a falta ou a pouca formação para questões mais ligadas às praticas das escolas e da sala de aula.
Por acreditarmos no direito dos povos que vivem fora das cidades de terem uma educação de qualidade e que valorize a cultura local, entendemos que é necessário criar novos espaços de formação para os professores. “Um processo de formação humana que constrói referências culturais e políticas para a intervenção das pessoas e dos sujeitos sociais na realidade.” (FERNANDES; CERIOLI; CALDART, 2011, p. 23).
Os dados encontrados apontam para a necessidade de se pensar numa formação que dialogue com as reais necessidades dos professores, alunos e comunidade das escolas não urbanas.
É fundamental que se encontre um caminho para que os alunos dos cursos de Pedagogia possam realizar estágios também neste tipo de escola, com supervisão e momentos de reflexão para construírem suas aprendizagens sobre a docência em regiões tão singulares.
Pelos dados coletados e analisados nessa pesquisa fica evidente que os cursos de Pedagogia oferecem um espaço muito discreto (poucas horas, poucas disciplinas e temáticas muito distantes da prática) para formar os futuros professores das escolas ribeirinhas e do campo. É na graduação que a maioria dos professores entra em contato com o que é ser professor, portanto sua contribuição é essencial para a mudança da qualidade da educação oferecida nestes contextos.