1 Introdução
Entre os anos de 1990 e 2000, a Educação Especial assumiu o formato de modalidade educacional, regulamentada por leis e diretrizes. A partir da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, organizada pela UNESCO em 1990, foi estabelecida a Declaração Mundial de Educação para Todos com o objetivo de impulsionar os esforços para oferecer a educação adequada para toda a população em seus diferentes níveis de ensino e estabelecer objetivos e metas para suprir as necessidades básicas de educação para crianças, jovens e adultos (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCO], 1990). Em 1994, em Salamanca, realizou-se um encontro cujo objetivo era fornecer princípios, políticas e práticas em Educação Inclusiva, além de ampliar o conceito de Necessidades Educacionais Especiais (Declaração de Salamanca, 1994).
Com efeito, ao concordar com a Declaração Mundial de Educação para Todos, o Brasil optou por construir um sistema de educação inclusivo, dando início a um processo de, pelo menos legalmente, transformação no sistema educacional. O artigo 58 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), de 1996, define a educação especial como "[...] a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais [...]" (Lei nº 9394, 1996).
No ano de 2001, as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial (DNEE), regulamentaram os artigos presentes na LDB e normalizaram as premissas inclusivas que estavam em debates internacionais sobre a inclusão escolar (Garcia & Michels, 2011). Entre 2003 e 2010, de acordo com Garcia e Michels (2011), o Governo Federal implementou programas que delimitaram novos contornos para as políticas educacionais no tocante à Educação Especial: Programa de implantação de salas de recursos multifuncionais (implementava salas com recursos necessários para o atendimento educacional especializado); Programa de educação inclusiva: direito à diversidade (formação de professores e gestores para transformarem os sistemas educacionais em inclusivos de fato); e Programa Incluir (propõe ações para acesso de pessoas com deficiências às instituições federais de ensino superior).
Indo ao encontro do proposto pela LDB e pelas DNEE, os dados do censo escolar realizado em 2009 mostraram que a matrícula de alunos com deficiência na rede regular de ensino apresentou significativo aumento: de 43.923, em 1998, para 387.031, em 2009 (Camargo & Anjos, 2011). Portanto, é evidente que a inserção de alunos com deficiência vem avançando nas escolas da Educação Básica brasileira.
Em que pese esses avanços quantitativos, ainda há diversas dificuldades para a construção de um sistema educacional inclusivo. Segundo Garcia (2006), a política brasileira definiu grupos de pessoas que precisam de políticas específicas para sua escolarização, ao estabelecer o termo Necessidades Educacionais Especiais (NEE). Para a autora, esse termo refere-se a alunos que não acompanham o trabalho pedagógico da escola regular, enfatizando as diferenças individuais, como proposto pela Declaração de Salamanca. Assim sendo, ao estabelecer a separação dos estudantes em grupos-alvo de políticas específicas, a política educacional brasileira estabelece que a escola deve se adaptar à diversidade dos estudantes (Garcia, 2006). Entretanto, estabelecer
[...] a concepção de necessidades especiais presente na documentação coligida não é suficiente para superar uma abordagem clínica, além de possibilitar o obscurecimento das desigualdades presentes nos processos de aprendizagem vigentes e colocar, mais uma vez, a responsabilidade do sucesso ou fracasso sobre os alunos, individualmente, à medida que contribui para difusão de uma imagem de escola "democrática" e "politicamente correta"(Garcia, 2006, pp. 304-305).
Dessa forma, o sistema educacional brasileiro, paradoxalmente, ao invés de incluir todos os estudantes, exclui determinados sujeitos baseado em suas deficiências. Sobre os conteúdos curriculares, Garcia (2006) aponta que, na sala de aula regular, os alunos com deficiência devem aprender os conteúdos com aplicabilidade prática e instrumental e na classe especial, devem aprender atividades ligadas à vida autônoma e social. Logo, fica evidente o acesso restrito aos conhecimentos eruditos.
A autora chama de flexibilização curricular a escolha do que deve ser ensinado aos alunos com deficiência. No contexto da Educação Especial, isso implica na redução dos conteúdos a serem aprendidos de acordo com as Necessidades Especiais de cada aluno (Garcia, 2006). Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) contemplam as diferenças individuais e tratamento diversificado dentro do mesmo currículo, propondo recursos e métodos diversificados (Parâmetros curriculares nacionais, 1998). Contudo, o que acontece, na prática, é a eliminação de conteúdos básicos do currículo quando o aluno não possui condições para atingi-lo (Garcia, 2006). À vista disso, as políticas de Educação Especial brasileiras propõem uma flexibilização para os alunos com deficiência que esvaziam o conteúdo historicamente acumulado. Portanto, ao não democratizar o saber produzido pelo homem, a escola, em uma perspectiva histórico-crítica, não realizará a sua função legítima de possibilitar a humanização dos indivíduos com deficiência (Saviani, 2011).
Assim sendo, notamos que as políticas públicas que regulamentam a educação escolar de pessoas com deficiência têm apresentado avanços legais significativos, como observado pela implementação de medidas que enfatizam as diferenças dos estudantes e instaura métodos e recursos para a aprendizagem desses alunos. Entretanto, quando nos atentamos ao que vem sendo feito, constatamos que, apesar do discurso político vigente, a escolarização dos alunos com deficiência ainda acontece baseada no assistencialismo e integração social. Em um sistema educacional inclusivo, as escolas brasileiras deveriam proporcionar aos alunos com e sem deficiência os meios adequados para apropriação do conhecimento historicamente acumulado pela humanidade e legitimados nas estruturas curriculares da educação formal em seus diferentes níveis de ensino.
Assim, incluir os estudantes com deficiência na rede regular de ensino implica em propiciar a eles as mesmas oportunidades de aprendizagem dos conteúdos curriculares definidos para todos, para além de um espaço apenas de socialização e capacitação mínima. Dentro desse aspecto, considerando que a LDB de 1996 ratifica a obrigatoriedade do ensino de ciências da natureza na Educação Básica, é imperativo que os estudantes com deficiência também tenham oportunidade para a aprendizagem dessa área do saber.
Segundo Bego (2016), por ser uma área do conhecimento, assim como artes, línguas e ciências humanas, as ciências da natureza são um patrimônio histórico e sociocultural da humanidade ao qual todo cidadão tem o direito de ter acesso. Considerando a escola como a instituição cujo papel consiste na socialização do saber sistematizado (Saviani, 2011), cabe, então, a esses espaços formais democratizar esse saber de modo a ampliar a visão de mundo dos estudantes e sua cultura para que atuem de maneira competente e crítica na sociedade em que vivem (Bego, 2016). Assim, a educação escolar tem como objetivos centrais identificar os elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos para que se humanizem e descobrir as metodologias mais adequadas para esse processo (Saviani, 2011).
Desse modo, no intuito de propiciar um ambiente educacional que seja considerado inclusivo, Viveiro e Bego (2015, p. 10) afirmam que "[...] os desafios postos pelo processo educacional inclusivo são multifacetados, abarcando diferentes aspectos da educação escolar e dinâmicas sociais". Para os autores, dentre as diversas faces da problemática a serem enfrentadas, um dos aspectos prementes é justamente a "[...] necessidade de investimentos em pesquisas que permitam abarcar as especificidades de cada necessidade educacional especial e conduzam ao avanço e consolidação da inclusão de forma a garantir o sucesso acadêmico dos estudantes" (Viveiro & Bego, 2015, p. 6).
No tocante ao aspecto das pesquisas da interface Ensino de Ciências e Educação Especial, o trabalho de Lippe e Camargo (2009) havia alertado para o fato da pequena quantidade de investigações na área. De acordo com os autores, até a década de 1990, a área não pesquisava temas sobre a educação especial e que, apesar do recente crescimento de pesquisas dentro da temática, ainda havia muitas investigações a serem realizadas, uma vez que muitas escolas (públicas e particulares) já tinham iniciado ações de inclusão escolar e diversos desafios começavam a emergir.
Nesse sentido, o importante trabalho de Camargo e Anjos (2011) apresenta um retrospecto histórico sobre o desenvolvimento da linha de pesquisa de educação inclusiva dentro da área de Ensino de Ciências, ao analisar trabalhos de conclusão de disciplinas e de cursos; pré-projetos e projetos de iniciação científica, de mestrado e de doutorado; minicursos e artigos. O trabalho destaca que, de 2005 até 2010, foram publicados 46 trabalhos ligados a essa linha. Do total, 39 tratavam do Ensino de Ciências e deficiência visual e abordavam a temática de materiais multissensoriais, condução de atividades de ensino, formação de professores, ensino e aprendizagem, levantamento bibliográfico e concepções alternativas. Sete trabalhos abordavam o ensino de ciências e a deficiência visual, sendo trabalhadas as temáticas ensino e aprendizagem e formação de professores.
No último século, houve dois grandes encontros a fim de estabelecer diretrizes para a educação especial e, a partir disso, criar políticas públicas para que a inclusão de pessoas com deficiência no sistema educacional se efetivasse. Entretanto, para isso ocorrer, é necessário que a Educação Especial seja alvo de pesquisas acerca do Ensino de Ciências. A partir do exposto, o presente artigo, objetiva mapear os principais enfoques das pesquisas na área de Ensino de Ciências e Educação Especial, em artigos publicados nas revistas A1 e A2 da área de ensino. Assim, buscamos responder duas questões: "Quais têm sido os enfoques das pesquisas em Educação Especial nos periódicos acadêmico-científicos mais bem avaliados da área de Ensino de Ciências?"; e "Quais os principais aspectos ausentes nas pesquisas da área de Ensino de Ciências e Educação Especial?".
2 Desenvolvimento
Diante do objetivo proposto, utilizamos, nesta pesquisa, os procedimentos de revisão bibliográfica definidos pela Análise de Conteúdo (AC) propostos por Bardin (2011). Segundo a autora, a AC é um método analítico sistemático que auxilia na organização e na padronização dos dados coletados, análise do texto e seu significado. Vosgerau e Romanowski (2014) afirmam que uma revisão bibliográfica exige uma análise sistemática e organizada dos dados, por isso optamos pela AC.
A constituição do corpus de dados foi realizada a partir de periódicos acadêmico-científicos dos estratos A1 e A2 da área de ensino de ciências definidos pelo qualis da CAPES, na avaliação realizada em 2014. Os estratos delimitados se justificam em função do sistema de classificação de periódicos nacionais e internacionais Qualis-Periódicos da CAPES indicar os periódicos em que há publicações que representam a produção intelectual dos programas de pós-graduação de excelência brasileiros de determinada área do conhecimento. Assim, foram selecionados seis periódicos para análise de todo acervo digital online disponível em seus respectivos websites: Anais da Academia Brasileira de Ciências ? Anais da ABC (A2); Ciência e Educação ? C&E (A1); Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências ? Ensaio (A2); Investigações em Educação em Ciências ? IENCI (A2); Revista Brasileira de Educação Especial ? RBEE (A1); e Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências ? RBPEC (A2).
Após as leituras realizadas para a pesquisa, selecionamos os termos que relacionam Ensino de Ciências e Educação Especial. Definimos os seguintes descritores de pesquisa: inclusão, educação inclusiva, educação especial, necessidades educacionais especiais e formação de professores. Para a RBEE, devido a sua especificidade de publicação na área de Educação Especial, o termo educação especial foi substituído por ensino de ciências, visto que a revista não é específica para a área de Ensino de Ciências.
As buscas referentes às revistas Anais da ABC, C&E, Ensaio e RBEE foram realizadas usando aspas e os termos foram digitados sem acentuação na plataforma SciELO. As revistas IENCI e RBPEC possuem a ferramenta de busca em seus websites e os termos foram pesquisados usando aspas. As buscas foram realizadas em dezembro de 2016. Para que o levantamento fosse homogêneo, selecionamos apenas os artigos nos quais existisse no título, no resumo ou nas palavras-chave os descritores supracitados.
2.1 Distribuição quantitativa
A partir dos descritores de pesquisa nos seis periódicos e dos critérios de amostragem definidos, selecionamos 28 trabalhos, apresentados na Tabela 1.
Categoria | Anais da ABC | C&E | Ensaio | RBEE | RBPEC | IENCI |
---|---|---|---|---|---|---|
Trabalhos disponíveis | * | 572 | 369 | * | 386 | 394 |
Trabalhos retomados por ferramenta de busca ou manualmente | 13 | 91 (15,9%) | 61 (16,5%) | 192 | 52 (13,5%) | 80 (20,3%) |
Selecionados | 0 | 9 (9,9%) | 4 (6,6%) | 5 | 5 (9,6%) | 5 (6,3%) |
Excluídos | 0 | 82 (90,1%) | 57 (93,4%) | 0 | 47 (90,7%) | 75 (93,7%) |
Fonte: Elaboração própria.
*O número de trabalhos totais não estava disponível no momento da pesquisa.
De acordo com os dados apresentados na Tabela 1, no periódico Anais da ABC, 13 artigos foram encontrados usando os termos de busca; entretanto, nenhum se encaixava na temática desejada. Na revista C&E, apenas 15,9% dos trabalhos pesquisados eram referentes aos termos usados na busca, e, dos 91 artigos encontrados, somente 9 (9,9%) tratavam o tema da Educação Especial e o Ensino de Ciências. Na revista Ensaio, a porcentagem de artigos encontrados foi um pouco maior, de 16,5% (61 artigos); entretanto, apenas 6,6% (quatro) dos trabalhos tratavam da temática desejada. Na RBEE, encontramos 192 usando os termos de busca e apenas 5 foram selecionados para análise. Na RBPEC, o número de artigos retomados na busca foi menor do que nas duas revistas anteriores, apenas 52 (13,5%). Já a quantidade de artigos sobre Educação Especial e Ensino de Ciências é comparável à revista C&E, totalizando 9,6% (5 artigos). Na última fonte pesquisada, a IENCI, houve um aumento significativo na quantidade de trabalhos retomados pela pesquisa usando os termos selecionados, totalizando 20,3% (80 trabalhos), porém apenas 5 (6,3%) abordavam a temática investigada. Como o número total de artigos publicados nos Anais da ABC e na RBEE dentro do período pesquisado não estava disponível, não foi possível mostrar a porcentagem de trabalhos encontrados e selecionados.
Assim sendo, a despeito da pequena quantidade de artigos que abordam a temática da Educação Especial no âmbito do Ensino de Ciências, podemos afirmar que as revistas C&E e RBPEC têm sido os periódicos em que há maior porcentagem relativa de publicação de artigos dentro de temática desde a sua criação, visto que ambas possuem uma porcentagem maior de publicações, cerca de 10% do total, com relação ao total de artigos retomados pela busca com os termos selecionados. Em termos absolutos, a revista C&E se destaca com a publicação de 9 artigos sobre a temática.
2.2 Caracterização geral dos textos sobre educação especial e ensino de ciências
Além do levantamento quantitativo acerca da frequência com que esse tema aparece nas revistas A1 e A2 de Ensino de Ciências e Educação Especial, buscamos identificar: os principais autores e a frequência com que aparecem nos 28 artigos selecionados; as Instituições de Ensino Superior (IES) em que essas pesquisas foram realizadas; as palavras-chave, a metodologia das pesquisas e as principais conclusões. Os resultados foram organizados nos Quadros 1 a 5.
Fonte | Ano | Título | Autores | IES |
---|---|---|---|---|
C&E | 2006 | O ensino de física para deficientes visuais a partir de uma perspectiva fenomenológica | Costa, Neves, & Barone | IFG; UFG; SEDUC |
C&E | 2010 | A comunicação como barreira à inclusão de alunos com deficiência visual em aulas de mecânica | Camargo | UNESP |
C&E | 2010 | A educação inclusiva na percepção de professores de Química | Vilela-Ribeiro & Benite | UFG |
C&E | 2012 | Formação inicial de professores de física: a questão da inclusão de alunos com deficiências visuais no ensino regular | Lima & Castro | UERJ; UNIGRANRIO |
C&E | 2013 | Alfabetização científica e educação inclusiva no discurso de professores formadores de professores de ciências | Vilela-Ribeiro & Benite | UFG |
C&E | 2013 | Inclusão de uma aluna cega em um curso de licenciatura em Química | Regiani & Mol | UFAC; UnB |
C&E | 2015 | O compartilhamento de significado na aula de Física e a atuação do interlocutor de Língua Brasileira de Sinais | Pessanha, Conzendey, & Rocha | UFSCar; USP |
C&E | 2015 | Trajetória da formação de professores de ciências para educação inclusiva em Goiás, Brasil, sob a ótica de participantes de uma rede colaborativa | Pereira, Benite, Padilha, Mendes, Vilela-Ribeiro, & Benite | IFG; UFG; SEDUC |
C&E | 2016 | A emergência do pensamento algébrico nas atividades de aprendizes surdos | Fernandes & Healy | UNIAN |
Fonte: Elaboração própria.
Fonte | Ano | Título | Autores | IES |
---|---|---|---|---|
Ensaio | 2010 | Contextos comunicacionais adequados e inadequados à inclusão de alunos com deficiência visual em aulas de mecânica | Camargo & Nardi | UNESP |
Ensaio | 2011 | As representações sociais dos licenciandos de física referentes à inclusão de deficientes visuais | Lima & Machado | USP; UNIRIO |
Ensaio | 2011 | Educação inclusiva e a formação de professores de ciências - o papel das universidades federais na captação dos futuros educadores | Oliveira, Antunes, Rocha, & Teixeira | UFG |
Ensaio | 2012 | Análise do processo inclusivo em uma escola estadual no município de Bauru - a voz de um aluno com deficiência visual | Lippe, Alves, & Camargo | UNESP |
Fonte: Elaboração própria.
Fonte | Ano | Título | Autores | IES |
---|---|---|---|---|
IENCI | 2006 | Ensino de física e deficiência visual - atividades que abordam o conceito de aceleração da gravidade | Camargo, Silva, & Barros Filho | UNESP; UNICAMP; USM |
IENCI | 2007 | Dificuldades e alternativas encontradas por licenciandos para o planejamento de atividades de ensino de eletromagnetismo para alunos com deficiência | Camargo & Nardi | UNESP |
IENCI | 2012 | Redes sociais como espaço de interações discursivas sobre formação de professores de ciências para a educação inclusiva | Pereira & Benite | UFG |
IENCI | 2015 | A importância da tutoria no ensino de ciências naturais com alunos especiais | Costa, Lima, Stadler, & Carletto | UTFP |
IENCI | 2015 | Análise das relações docente em sala de aula com perspectivas de ser inclusiva | Passos, Arruda, & Passos | UEL |
Fonte: Elaboração própria.
Fonte | Ano | Título | Autores | IES |
---|---|---|---|---|
RBEE | 2008 | O emprego de linguagens acessíveis para alunos com deficiência visual em aulas de óptica | Camargo & Nardi | UNESP |
RBEE | 2013 | Releitura de conceitos relacionados à astronomia presentes nos dicionários de LIBRAS: implicações para interpretação/ tradução | Alves, Peixoto, & Lippe | USP; UNICAMP |
RBEE | 2014 | Ensino de matemática a alunos com deficiência intelectual na educação de jovens e adultos | Brito, Campos, & Romanatto | UNESP; UFSCar |
RBEE | 2014 | Interações entre o aluno com surdez, o professor e o intérprete em aulas de física: uma perspectiva vygotskyana | Vargas & Gobara | UFMS |
RBEE | 2016 | Cego e aprendizagem de genética em sala de aula: percepções de professores e alunos | Rocha & Silva | UFF |
Fonte: Elaboração própria.
Fonte | Ano | Título | Autores | IES |
---|---|---|---|---|
RBPEC | 2009 | Formação de professores de ciências em rede social - uma perspectiva dialógica na educação inclusiva | Benite, Pereira, Benite, Procópio, & Frierich | UFG |
RBPEC | 2010 | A comunicação como barreira à inclusão de alunos com deficiência visual em aulas de física moderna | Camargo, Nardi, & Correia | UNESP |
RBPEC | 2012 | Material Didático para Ensino de Biologia - possibilidades de inclusão | Vaz, Paulino, Bazon, Kiill, Orlando, Reis, & Mello | UNIFAL; UFSCar |
RBPEC | 2014 | Ensino do Sistema Solar para alunos com e sem deficiência visual - proposta de um ensino inclusivo | Rizzo, Bortolini, &Rebeque | IFRS |
RBPEC | 2015 | Estudos sobre a relação entre o intérprete de LIBRAS e o professor - implicações para o ensino de ciências | Oliveira & Benite | UFG |
Fonte: Elaboração própria.
Nas quatro fontes pesquisadas, encontramos um total de 61 autores distintos, dos quais 4 se repetiram com frequências diferentes. O nome mais citado é o do Prof. Dr. Éder Pires de Camargo, com um total de 7 (25%) artigos encontrados. Em seguida, a Profa. Dra. Anna Maria Canavarro Benite aparece em 5 (17,9%) dos trabalhos encontrados. Outros 2 pesquisadores apareceram mais de uma vez nos trabalhos, com uma frequência de 14,3% (4 artigos) e 10,7% (3 artigos): Prof. Dr. Roberto Nardi e Profa. Dra. Eveline Vilela-Ribeiro, respectivamente. Os demais autores apareceram apenas uma ou duas vezes dentre os 28 trabalhos analisados. Portanto, os principais pesquisadores da temática em âmbito nacional são Éder Pires de Camargo e Anna Maria Canavarro Benite.
Sobre as IES, aparecem 22 distintas. Desse total, a UNESP é indicada em 8 artigos (28,5%). Outra IES com frequência considerável é a UFG com 7 artigos, representando uma frequência de 25%, seguida da USP, com um total de 5 artigos (17,9%). Por fim, a UNICAMP e a UFSCar aparecem, ambas, em 3 trabalhos (10,7%). As demais IES são apontadas uma vez. Pode-se afirmar que o Estado de São Paulo tem sido um dos grandes centros de investigações sobre Educação Especial na área de Ensino de Ciências. Em relação à metodologia de investigação, todos os trabalhos eram constituídos de pesquisas empíricas com abordagem qualitativa. Fato que revela a ausência de pesquisas mais abrangentes sobre a temática como grandes levantamentos ou pesquisas com delineamentos do tipo quali-quantitivo.
Com relação à distribuição temporal, podemos observar no Gráfico 1 que, no ano de 2015, foram publicados 5 artigos, seguido de 4 trabalhos publicados entre os anos de 2010 e 2012. Em 2013, foram 3 trabalhos, enquanto que, em 2006, 2011 e 2016, foram publicados 2 trabalhos nas fontes pesquisadas. Por fim, ao longo dos anos de 2007, 2008 e 2009 foi publicado apenas 1 artigo.
De acordo com o Gráfico 1, é possível perceber que as publicações referentes à Educação Especial e Ensino de Ciências tiveram início em 2006 nas revistas pesquisadas. Apesar de a LDB definir a Educação Especial como uma modalidade de ensino em escolas regulares desde 1996, as publicações referentes à temática estudada são recentes, tendo maior representatividade nos anos de 2010, 2012 e 2015. Os dados encontrados corroboram a afirmação de Lippe e Camargo (2009), já que, segundo os autores, até a década de 1990, a área do Ensino de Ciências não abordava a temática da Educação Especial. É possível afirmar que a implementação de uma linha de pesquisa específica sobre educação inclusiva, por volta de 2005 (Camargo & Anjos, 2011), tenha impulsionado as publicações dentro da temática na área nos últimos 5 anos, demonstrando seu desenvolvimento paulatino.
2.3 Palavras-chave e temáticas envolvidas nos trabalhos analisados
Ao analisarmos os 28 artigos referentes à Inclusão Escolar e Ensino de Ciências, notamos 57 palavras-chave diferentes, mostradas na Tabela 2. O termo mais frequente, citado 12 vezes, foi "deficiência visual", seguido de "inclusão", que aparece 10 vezes. Os termos "ensino de física"; "ensino de ciências" e "educação inclusiva" foram indicados 8 e 7 vezes, respectivamente. "Formação de professores" aparece 5 vezes e, por fim, "inclusão escolar" e "educação especial" 4 vezes. Os demais termos são indicados apenas uma ou duas vezes. Esses dados mostram-nos que a maior parte dos trabalhos encontrados se referem ao ensino de física para deficientes visuais e à formação de professores no âmbito da educação inclusiva, além de mostrar que os termos mais usados para se referir à temática pesquisada são inclusão, inclusão escolar, educação inclusiva e ensino de ciências. De acordo com as palavras-chave e os títulos dos artigos analisados, é possível perceber que o ensino de física para deficientes visuais é o tema mais publicado nas revistas analisadas. Em contrapartida, poucos trabalhos abordavam as demais deficiências, tais como a auditiva e a mental. Além disso, são poucos os trabalhos dentro da temática no contexto do ensino de química, matemática e biologia.
Palavras-chave | Frq | Palavras-chave | Frq | Palavras-chave | Frq |
---|---|---|---|---|---|
Ensino de física | 8 | Ambiente digital de aprendizagem | 1 | Didática multissensorial | 1 |
Deficiência visual | 12 | Concepções | 1 | Ensino de astronomia | 1 |
Inclusão escolar | 4 | Mecânica | 1 | Física moderna | 1 |
Deficiência auditiva | 1 | Comunicação | 2 | Material didático | 1 |
Surdez | 1 | Educação especial | 4 | Formação de professores em rede | 1 |
LIBRAS | 2 | EJA | 1 | Interações discursivas | 1 |
Inclusão | 10 | Alunos surdos | 1 | Aceleração | 1 |
Análise do discurso | 1 | Interação | 1 | Gravidade | 1 |
Formação inicial | 1 | Inclusão educacional | 1 | Atividades de ensino de eletromagnetismo | 1 |
Formação de professores | 5 | Ensino de mecânica | 1 | Formação de professores de física | 1 |
Ensino de ciências | 8 | Contexto comunicacional | 1 | Matriz 3x3 | 1 |
Educação inclusiva | 7 | Relações docentes | 1 | Ensino de ciências naturais | 1 |
Análise de conteúdo | 1 | Relação com o saber | 1 | Professor tutor | 1 |
Deficiente visual | 1 | Deficiência intelectual | 2 | Educação | 1 |
Necessidades educacionais especiais | 1 | Representação social | 1 | Meios de ensino | 1 |
Ensino superior | 1 | Inclusão educacional | 1 | Ensino | 1 |
Ensino de química | 1 | Licenciaturas | 1 | Astronomia | 1 |
Educação matemática | 2 | Currículo | 1 | Pensamento algébrico | 1 |
Aprendizes surdos | 1 | Surdos | 2 | Intérprete de LIBRAS | 1 |
Fonte: Elaboração própria.
Quanto às temáticas, 15 trabalhos (53%) abordavam o Ensino e Aprendizagem no Ensino de Ciências para alunos com algum tipo de Necessidade Educacional Especial, representando mais da metade dos trabalhos analisados. Esses trabalhos ressaltam fundamentalmente que a comunicação age como a principal barreira para que haja a inclusão desses alunos nas salas de aula regulares. Além disso, fica evidente a importância do planejamento, que deve acontecer em conjunto com o professor da sala de recurso, e aplicação de atividades em sala de aula que estimulem o aprendizado dos alunos por meio da diversificação de estratégias didáticas.
Sobre Formação de Professores na perspectiva da Educação Especial, foram encontrados 12 trabalhos (43%), enquanto que apenas 1 (4%) abordava a avaliação e o currículo na perspectiva da inclusão escolar. Majoritariamente as investigações apontam que, no geral, há falta de preparo dos professores frente à inclusão, mas as redes colaborativas podem ser um bom espaço de formação de professores, tanto inicial quanto continuada, pois favorecem troca de experiências, leituras especializadas no tema e nas discussões. O único artigo que abordava a temática da Avaliação e Currículo para a educação especial destaca a falta de disciplinas sobre o assunto na formação inicial de professores, afirmando que a falta de preparo do professor em atuação na rede regular deriva da falta de contato com o assunto ainda durante a graduação.
Interessante sublinhar que, ao analisarmos a produção dos últimos anos da área investigada, é possível apontar a relação dialética entre interesses de pesquisa decorrentes de inquietações intrinsecamente acadêmicas e as demandas oriundas de programas instituídos pelo Estado. No período de 2003 a 2010, os programas do Governo Federal, já citados anteriormente, visavam a implementação da sala de recursos para o atendimento especializado para os alunos com deficiência, que demandavam pesquisas a respeito do ensino e a aprendizagem de ciências dos alunos com deficiências, e a formação de professores e gestores para a escola inclusiva, exigindo pesquisas sistemáticas a respeito da formação inicial de professores - fato que mostra a importância de política públicas relacionadas ao fomento de pesquisas acadêmicas acerca da temática. As temáticas foram definidas a partir da leitura integral dos textos (Gráfico 2).
A partir dos dados arrolados nas seções anteriores, podemos perceber o escasso número de publicações nos periódicos analisados frente à quantidade de publicações totais desde a data de criação. Lippe e Camargo (2011), ao fazerem um levantamento dos principais enfoques das pesquisas na área de Educação Especial e Ensino de Ciências em artigos publicados nas mesmas revistas analisadas neste trabalho e nos anais do Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC), mostraram a mesma tendência apontada em nossa discussão. Há um predomínio de pesquisas relacionadas ao ensino de física para deficientes visuais, enquanto que as outras áreas e deficiências têm sido pouco pesquisadas, indicando que, nos últimos cinco anos, essa tendência não sofreu variações expressivas dentro da área. Esse fato aponta tanto para a necessidade da ampliação quantitativa das pesquisas dentro da temática quanto para a necessidade da diversificação das deficiências investigadas no contexto do Ensino de Ciências.
3 Conclusão
Frente à quantidade de artigos disponíveis para a pesquisa nos 6 periódicos delimitados, apenas 28 artigos tratavam de temática do Ensino de Ciências associada à Inclusão, Educação Inclusiva, Educação Especial, Necessidades Educacionais Especiais e/ou Formação de Professores. Desses 28 artigos selecionados para análise, 9 eram da revista C&E, as revistas RBPEC, IENCI e RBEE continham 5 artigos cada, e a revista Ensaio retornou 4 artigos. As revistas C&E e RBPEC foram as que apresentaram maior porcentagem de artigos do total, aproximadamente 10%, que discutiram a temática educação inclusiva e ensino de ciências. Contudo, é possível afirmar que o número de publicações na interface Ensino de Ciências e Educação Inclusiva ainda é muito pequeno frente ao total de publicações desses periódicos até o momento.
No tocante às filiações e autoria das publicações, os autores Éder Pires de Camargo e Anna Maria Canavarro Benite têm sido os maiores expoentes nacionais da Educação Inclusiva na área de Ensino de Ciências. Com exceção da UFG, as Universidades públicas paulistas são as instituições em que mais têm se realizado pesquisas da temática. Isso evidencia que as pesquisas na área vêm sendo realizadas majoritariamente pelos mesmos grupos de pesquisa, visto a concentração de grande parte das publicações em periódicos de qualidade ser de dois autores. Esse fato indica também a necessidade de ações com vistas à ampliação de grupos de pesquisas que enfocam o assunto da Inclusão no âmbito do Ensino de Ciências em outras regiões do país.
Com relação à abordagem metodológica, todos os trabalhos analisados apresentam abordagem qualitativa, bastante característica da área de Educação, no geral, e de Ensino de Ciências, em específico. Esse dado revela a ausência de trabalhos mais abrangentes com enfoques característicos das abordagens quantitativas. De acordo com as palavras-chave presentes nos artigos selecionados, é possível concluir que o ensino de física para deficientes visuais tem sido o tema mais publicado nas revistas analisadas. Em contrapartida, poucos trabalhos abordavam o ensino de química, matemática e biologia, assim como as demais deficiências, como a auditiva e a intelectual. Os termos mais adotados para se referir à temática pesquisada são inclusão, inclusão escolar, educação inclusiva e ensino de ciências.
As publicações nas revistas analisadas tiveram início em 2006, com o maior número de publicações em 2015. Assim sendo, em que pese o fato de a implementação de uma linha de pesquisa específica sobre Educação Inclusiva ter impulsionado as publicações dentro da temática na área nos últimos 5 anos, conclui-se que ainda é incipiente o número de pesquisas, possuindo pouca representatividade frente ao total de publicações nas revistas mais bem avaliadas da área. Vale ressaltar que as publicações em educação inclusiva dentro da área de ensino de ciências tiveram início somente 10 anos após a Educação Inclusiva se tornar uma modalidade de ensino na Educação Básica, mostrando que essa área é bastante recente e decorreu da demanda de ações para a inclusão dos estudantes com deficiência no que tange à aprendizagem de ciências da natureza.
Os marcos regulatório-normativos vigentes no país e a prática pedagógica acerca da Educação Especial, ao dar um caráter assistencial e integrador à inclusão de alunos com deficiência na escola regular e pautarem a flexibilização curricular como possibilidade legítima (Garcia, 2006), apontam, paradoxalmente, em uma perspectiva histórico-crítica, para a não inclusão de fato dos alunos com deficiência. Pois, se à educação escolar é facultada o processo de humanização dos indivíduos por meio do trabalho educativo, e este consiste no "[...] ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens" (Saviani, 2011, p. 13), os estudantes com deficiência não podem ser tolhidos do acesso e das condições para apropriação do conhecimento das propriedades do mundo real (ciência), de valorização (ética) e de simbolização (arte).
Por fim, ressaltamos que a evidência do número ainda exíguo de pesquisas na interface Ensino de Ciências/Educação Especial, reflete, de um lado, embora crescente, o pouco interesse acadêmico na temática; e, de outro lado, a necessidade de políticas públicas de fomento e apoio à comunidade acadêmica no que tange à temática de Educação Inclusiva em todas as suas dimensões para todos os conteúdos das disciplinas escolares. Assim, afirmamos junto a Viveiro e Bego (2015, pp. 11-12) que "[...] a educação inclusiva, kantianamente falando, se apresenta como imperativo categórico para uma sociedade que se diz democrática" e, nesse sentido, a comunidade acadêmico-científica tem papel fundamental para a concretização desse imperativo a contento.