1 Introdução
Desde 1988, preconiza-se, na legislação brasileira, a oferta de Atendimento Educacional Especializado (AEE) como mecanismo de garantia de acesso à escola comum para os alunos Público-Alvo da Educação Especial (PAEE) (Constituição da República Federativa do Brasil, 1988), sendo este reforçado, posteriormente, em 1996, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) (Lei nº 9.394, 1996). Entretanto, a adoção do termo preferencialmente nas legislações em questão dava margem à criação e à manutenção de ambientes que atendiam esse alunado em espaços segregados de ensino (Mazzotta, 2005; Bueno & Meletti, 2012). Ainda, as legislações federais desse período resumia-se à sinalização da possibilidade de existência do serviço de AEE, sem, no entanto, sistematizar em que espaços e de que forma deveria ocorrer.
Em 2003, houve a reorientação das políticas educacionais, tanto no âmbito da Educação Básica quanto da Superior (Dourado, 2007). Em consonância com tais modificações, instituiu-se, em 2007, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) (Lei nº 11.494, 2007), que influenciou diretamente as políticas educacionais posteriores, dado que as políticas de financiamento educacionais dizem respeito ao financiamento dos processos de gestão educacional, incluindo o papel do Governo Federal e as articulações entre as esferas pública e privada (Dourado, 2007). Nesse sentido, as políticas educacionais para a Educação Especial também sofreram grandes modificações, estando, inclusive, consonantes com documentos internacionais que dispunham sobre a inclusão dos alunos PAEE no sistema regular de ensino (Kassar, 2016), havendo, assim, a criação de programas e ações que objetivavam promover a inclusão escolar dos alunos PAEE na sala comum (Kassar, 2012).
A atual política de inclusão escolar é composta por 28 textos legais que discorrem, especificamente, sobre as características dessa política e do serviço nela previsto, contando, também, com outras legislações mais específicas como, por exemplo, a avaliação de estudantes com deficiência intelectual, as funções do profissional de apoio escolar, dentre outras (Santos, 2017). Nesse sentido, prevê-se, atualmente, a matrícula do aluno PAEE na sala comum e, no contra turno, no AEE, havendo dupla contabilização do FUNDEB para aqueles estudantes que estiverem devidamente matriculados no Censo Escolar em ambos os espaços (Decreto nº 7.611, 2011). De acordo com essa política, o AEE consiste em um "[...] conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucional e continuamente" (Decreto nº 7.611, 2011, p. 2), devendo ocorrer nas Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) ou em Centros de Atendimento Educacional Especializado (CAEE), de forma complementar para os alunos com deficiência ou com transtornos globais do desenvolvimento (TGD) e suplementar para os estudantes com altas habilidades/superdotação (AH/SD).
Esse é o único serviço previsto legalmente em âmbito nacional para promover apoio à inclusão escolar dos estudantes PAEE, cujas limitações vêm sendo apontadas na literatura (Mendes, Cia, & Tannús-Valadão, 2015) e sinalizam uma simplificação do conceito de AEE, o qual não se embasa na literatura da área no que diz respeito ao atendimento de públicos tão distintos como aqueles que compõem o PAEE (Santos, 2017). Observa-se a inexistência de propostas governamentais que tenham como foco atividades que promovam a parceria entre professores da sala comum com os do AEE, por meio de estratégias de apoio pedagógico ou coensino, por exemplo (Mendes, Vilaronga, & Zerbato, 2014). Ainda, tem-se uma visão clínica acerca do AEE que parte do pressuposto de que o conhecimento pleno do Braile ou da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) poderia ser suficiente para responder às especificidades dos alunos cegos e surdos, respectivamente (Bueno, 2011).
A partir da análise dos 28 documentos legais que compõem a atual política de inclusão escolar, observou-se que há textos que contemplam apenas os estudantes com deficiência, deixando de lado aqueles com TGD ou AH/SD (Santos, 2017) e evidenciando, desse modo, a possibilidade de que as vozes dos estudantes com deficiência são mais ouvidas do que a dos outros dois públicos que compõem o PAEE. Como um possível reflexo dessa constatação, tem-se a inclusão, em 2012, para efeitos legais, dos estudantes com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) no conjunto dos alunos com deficiência (Lei nº 12.764, 2012).
De acordo com a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais, as características do Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) consistem em: a) prejuízo persistente na comunicação social recíproca e na interação social e b) padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. As condições anteriores de autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação (TDG-SOE), transtorno desintegrativo da infância e transtorno de Asperger foram englobadas na terminologia TEA, na qual se apresenta uma perspectiva dimensional (espectro) para representar a grande variabilidade dentro do transtorno e dentro de um conjunto sintomatológico de sinais e sintomas, havendo classificações de leve a severo que são distinguidas em três níveis principais (1, 2 e 3), a depender da quantidade de auxílio necessário para desenvolver as atividades diárias (American Psychiatric Association [APA], 2013). Adicionalmente, os sintomas devem estar presentes no período inicial de desenvolvimento, mas pode não se manifestar plenamente até que determinadas demandas sociais estejam presentes, como no momento que a criança passa a frequentar a escola. Os sintomas causam prejuízo clinicamente significativo nas áreas social, ocupacional ou outras áreas importantes de funcionamento, e tais distúrbios não são melhores explicados por deficiência intelectual ou atraso no desenvolvimento global (APA, 2013).
Sobre a análise de políticas educacionais, Jannuzzi (2005) defende a posição dos indicadores educacionais como uma via para respaldar o diagnóstico, a formulação, a implementação e a avaliação das políticas públicas. Nesse mesmo sentido, Meletti e Bueno (2010) colocaram a análise dos indicadores fornecidos pelo Censo Escolar como uma possível via para a análise dessa política, uma vez que esses dados possuem grande relevância, pois, de acordo com informações providas oficialmente, eles consistem no "[...] principal instrumento de coleta de informações da educação básica e o mais importante levantamento estatístico educacional brasileiro nessa área" (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais [INEP], 2018), sendo uma "[...] ferramenta indispensável para que os atores educacionais possam compreender a situação educacional do país, [...] bem como das escolas e, com isso, acompanhar a efetividade das políticas públicas" (INEP, 2018).
Essa metodologia de análise da política vem sendo utilizada por pesquisadores brasileiros em todo o país. A partir de uma revisão de literatura, que considerou tanto artigos científicos quanto dissertações, observou-se que, em âmbito nacional, esses dados foram analisados considerando tanto os alunos PAEE como um todo (Caiado & Meletti, 2011; Castro, 2015; Côrrea, 2012; Cruz, 2011; Meletti, 2014; Meletti & Ribeiro, 2014; Nascimento, 2014), quanto somente os alunos com deficiência (Carvalho, 2012; Kasper, Loch, & Pereira, 2008; Laplane, 2014; Hass & Gonçalves, 2015; Martins, 2012; Meletti & Bueno, 2011; Rebelo, 2012; Sá & Cia, 2015; Souza, 2012). Castro (2015) e Côrrea (2012), além de realizarem a análise nacional, também compararam os dados por região do país, permitindo conhecer as especificidades de cada região. Ambas as autoras consideraram os alunos PAEE no geral e tiveram como recorte histórico os anos de 2007 a 2010 (Côrrea, 2012) e de 2009 a 2013 (Castro, 2015). Essa especificação por região do país é relevante, uma vez que há realidades díspares quando se considera tanto os aspectos populacionais como os demográficos.
Quanto ao público com TEA, somente dois estudos foram identificados (Lima & Laplane, 2016; Talarico & Laplane, 2016). Talarico e Laplane (2016) tiveram como objetivo mapear a trajetória escolar dos estudantes com autismo, Síndrome de Asperger, Síndrome de Rett e Transtorno Desintegrativo da Infância, no município de Campinas, com recorte histórico entre os anos de 2009 e 2012. Apesar das autoras terem considerado os alunos identificados com Síndrome de Rett, a partir do DSM-5 (APA, 2013), essa síndrome não se encaixa dentro do público com TEA, indo de encontro ao público indicado pelas autoras na introdução do artigo. Lima e Laplane (2016) tiveram como objetivo analisar o acesso e a permanência dos alunos com autismo na escola e verificar quais apoios terapêuticos e educacionais eles recebiam. Para tal, parte dos dados das autoras consistiu nos microdados de matrícula dos alunos com autismo da cidade de Atibaia cadastrados na Educação Básica entre os anos de 2009 e 2012. Novamente, foi feita a conceituação do TEA como um todo na introdução; entretanto, no método, consideraram-se apenas os alunos com autismo, tal como previsto pelo objetivo da pesquisa. As autoras, inclusive, apontaram que os alunos com autismo constituíam a maior parte da amostra dos alunos com TEA.
No que tange à análise de políticas educacionais, Power (2011) colocou que há duas possibilidades de análise, a depender do direcionamento do olhar do pesquisador. A primeira, de âmbito macro, possui um alcance amostral maior (por exemplo, estados, regiões do país ou o país como um todo), objetivando observar questões mais amplas, enquanto que a segunda, de âmbito micro, tem como foco aprofundar em detalhes e acumular informações descritivas acerca de um determinado local. Nesse sentido, os estudos de Lima e Laplane (2016) e de Talarico e Laplane (2016) focaram os estudantes com TEA em uma única cidade, o que não permitiu uma análise da política de inclusão escolar em âmbito nacional. Desse modo, evidenciou-se uma lacuna na literatura, inclusive no que diz respeito à análise específica da Lei Nº 12.764/2012, cujos impactos não foram discutidos pelas autoras e, de acordo com Ball (1995), essa Lei pode ser encarada como uma tentativa de conseguir maior representatividade política para esse público e implicar diretamente no âmbito prático da política de inclusão escolar e nas matrículas desses estudantes.
Enquanto os documentos legais e a legislação versam sobre o direito à educação, preferencialmente em sala comum, para alunos PAEE, ainda não há dados na literatura que permitam identificar a sua efetividade ou se essas leis produziram mudanças significativas no cenário educacional nacional inclusivo de alunos com TEA. Destarte, o objetivo deste estudo consistiu em caracterizar as matrículas contidas nos microdados do Censo Escolar dos estudantes com TEA na sala comum nas cinco regiões do país, considerando possíveis impactos da Lei Nº 12.764/2012.
2 Método
O presente estudo consistiu em uma pesquisa comparativa, na qual se buscou conhecer semelhanças e explicar divergências (Marconi & Lakatos, 2003), de caráter documental, que visou realizar a análise de documentos com objetivo de coletar fatos (Caulley, 1983), podendo ter como fonte: a) arquivos públicos; b) arquivos particulares; e c) fontes estatísticas (Marconi & Lakatos, 2003).
2.1 Universo, população e amostra
O universo investigado foram as cinco regiões do Brasil e a fonte de coleta de dados foram os microdados estatísticos, disponibilizados publicamente pelo Censo Escolar/ Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), referentes às matrículas escolares no país. A delimitação temporal teve início no ano de 2009, embora o marco utilizado normalmente por pesquisadores que realizam esse tipo de estudo ser o ano de 2008 - dado que se trata do ano em que houve a promulgação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (Lei nº 11.494, 2007), documento que norteou os documentos legais que dispõem sobre a política de inclusão escolar vigente, bem como em que o Censo Escolar passou a registrar os dados referentes ao AEE. Foi somente no ano seguinte, em 2009, que houve desmembramento da variável denominada ID_TIPO_NEC_ESP_TRANSTORNOS, a qual, de acordo com os microdados censitários do ano de 2008, correspondia aos alunos com TGD como um todo, sem especificações. Esse desmembramento deu origem às variáveis referentes às matrículas de estudantes identificados no Censo com: 1) Autismo; 2) Síndrome de Asperger; 3) Transtorno Desintegrativo da Infância; e 4) Síndrome de Rett. Uma vez que o presente estudo considerou os alunos com TEA (APA, 2013), a amostra foi composta pelas matrículas agregadas dos alunos identificados no Censo Escolar com TEA, ou seja, não incluiu os alunos identificados com Síndrome de Rett.
2.2 Equipamentos e materiais
Foi utilizado um computador com acesso à internet e a versão 21 do software de análise estatística IBM SPSS Statistics para tratamento e coleta dos dados.
2.3 Procedimento de coleta, tratamento e análise dos dados
Os procedimentos deste estudo consistiram na coleta, no tratamento e na análise de um conjunto de oito anos dos microdados de matrículas referentes as cinco regiões do país, disponibilizados individualmente na base de dados online do INEP, totalizando 40 bancos de dados. Para seleção das variáveis, realizou-se a leitura dos arquivos denominados leia-me que acompanham os bancos de dados anualmente e, a partir disso, consideraram-se as matrículas na Educação Básica dos alunos identificados com Autismo, Síndrome de Asperger ou Transtorno Desintegrativo da Infância, sendo coletados dados referentes a cinco variáveis: 1) total de matrículas na sala comum dos alunos com TEA e dos alunos identificados com outro tipo de deficiência; 2) sexo dos alunos com TEA; 3) etapa de ensino dos alunos com TEA; e 4) total de matrículas no AEE dos alunos com TEA.
A coleta dos dados deu-se por meio do procedimento de tabela de referência cruzada. Em relação à primeira variável, foram coletados os dados brutos e percentuais, enquanto as demais somente o percentual por ano e região estudados, uma vez que os dados brutos não seriam passíveis de comparação entre as regiões, pois havia grande discrepância entre os números brutos de matrículas por região do país. Para a coleta da variável referente às etapas de ensino em que os alunos se encontravam, consideraram-se todos os tipos de turma referentes às seguintes etapas: Educação Infantil, anos iniciais do Ensino Fundamental, anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio. Para a coleta dos dados, foi preciso tratá-los por meio da elaboração de um filtro em cada banco de dados, excluindo todos os registros de matrículas de alunos que não eram caracterizados como PAEE. Esse tratamento foi essencial para viabilizar a coleta do grande montante de dados pretendida dentro do período de tempo previsto para tal. Além desse filtro, também foram excluídas as matrículas dos alunos com AH/SD ou com Síndrome de Rett.
Outro tratamento realizado consistiu na criação de duas novas variáveis, pois, a partir da leitura dos bancos de dados em busca de possíveis inconsistências estatísticas, observaram-se situações em que um mesmo estudante era indicado como possuindo autismo e Síndrome de Asperger, por exemplo. Esse tipo de preenchimento causaria distorção nos dados, uma vez que, ao verificar a frequência dos estudantes, considerando o tipo de necessidade especial assinalada, esta seria superior ao número real de estudantes com TEA. Assim sendo, criou-se uma nova variável denominada TEA em todos os bancos de dados estudados e atribuiu-se para ela o valor positivo "1" quando uma ou mais das variáveis existentes no Censo que se referiam ao TEA fossem positivas e "0" quando negativas. O mesmo procedimento foi realizado com os demais estudantes com deficiência por meio da criação de uma variável chamada DDEF, para qual foi atribuído um valor positivo "1" caso o estudante fosse indicado com uma ou mais das seguintes deficiências: visual (dividida em cegueira e baixa visão nos microdados), auditiva (dividida em surdez e deficiência auditiva nos microdados), física, múltipla ou surdocegueira e "0" caso não fosse. Esse tratamento eliminou tais inconsistências, pois, a partir dele, os cruzamentos entre as variáveis foram executados utilizando essas novas variáveis com valores positivos, as quais diziam, de fato, sobre a quantidade de matrículas desejada5.
Os dados foram coletados por variável, ano e região estudada, totalizando a repetição do procedimento de coleta de cada uma das variáveis 40 vezes, uma para cada região do país em cada ano estudado. Ressalta-se que todos esses procedimentos foram realizados por meio do software de análise estatística IBM SPSS Statistics.
3 Resultados e discussões
Os resultados e as discussões foram divididos por variável estudada. A primeira variável consistiu no total bruto de alunos com TEA e com as demais deficiências matriculados no ensino regular (indicado como DDEF na Tabela 1) e o percentual de alunos com TEA em relação ao total de matrículas desses dois públicos somados. Considerando a taxa populacional de cada região como um todo que possui, de acordo com o censo demográfico de 2010, entre 0 e 19 anos, a região Sudeste liderou (38.2%), seguida da região Nordeste (30.6%), Sul (13.2%), Norte (10.5%) e Centro-Oeste (7.5%) (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2010). Indo ao encontro desses percentuais, pode-se observar na Tabela 1 que a região Sudeste possuía a maior concentração de matrículas de alunos com TEA e das demais deficiências, seguida da região Nordeste e Sul. A região Norte, no que tange à concentração de matrículas de alunos com deficiência, permaneceu, com exceção do ano de 2009, em quarto lugar, seguida da região Centro-Oeste. Para os alunos com TEA, houve maior oscilação entre essas duas regiões, ficando a região Centro-Oeste, ainda que com pequena diferença bruta em relação à região Norte, com a quarta maior concentração das matrículas nos anos de 2009, 2010, 2015 e 2016. Entretanto, quando se considerou os dados das sinopses estatísticas de 2010 do IBGE acerca da população entre 0 e 19 anos, observou-se que a região Sul contou com 6.595.166 pessoas, enquanto que a região Centro-Oeste possuía 4.706.098 (IBGE, 2010). Logo, foi tangível a diferença de matrículas de alunos com TEA nessa segunda região em relação à região Norte.
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
CO | DDEF | 26.707 | 31.613 | 37.939 | 42.144 | 46.535 | 51.040 | 63.583 | 66.804 |
TEA | 1.952 | 4.044 | 4.906 | 5.120 | 4.831 | 5.135 | 7.085 | 8.059 | |
% | 6.8% | 11.3% | 11.5% | 10.8% | 9.4% | 9.1% | 10.0% | 10.8% | |
NE | DDEF | 71.142 | 101.653 | 124.463 | 135.642 | 144.383 | 160.058 | 186.159 | 196.032 |
TEA | 6.630 | 11.835 | 14.527 | 16.292 | 16.114 | 19.103 | 23.328 | 28.035 | |
% | 8.5% | 10.4% | 10.5% | 10.7% | 10.0% | 10.7% | 11.1% | 12.5% | |
N | DDEF | 23.390 | 31.337 | 38.605 | 44.094 | 49.155 | 53.014 | 61.967 | 65.480 |
TEA | 1.681 | 4.087 | 5194 | 5.724 | 5.585 | 6.147 | 8.055 | 9.833 | |
% | 6.7% | 11.5% | 11.9% | 11.5% | 10.2% | 10.4% | 11.5% | 13.1% | |
SE | DDEF | 135.625 | 156.995 | 171.563 | 193.960 | 202.626 | 213.532 | 275.900 | 283.365 |
TEA | 31.163 | 24.511 | 20.035 | 21.586 | 22.485 | 26.708 | 39.025 | 47.584 | |
% | 18.7% | 13.5% | 10.5% | 10.0% | 10.0% | 11.1% | 12.4% | 14.4% | |
S | DDEF | 46.010 | 65.154 | 80.964 | 93.780 | 95.577 | 103.479 | 137.862 | 139.993 |
TEA | 3.615 | 5.155 | 6.507 | 7.399 | 7.651 | 9.317 | 13.210 | 15.623 | |
% | 7.3% | 7.3% | 7.4% | 7.3% | 7.4% | 8.3% | 8.7% | 10.0% |
Fonte: Elaboração própria com base nos microdados do Censo Escolar (INEP, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016).
Legenda: (CO - Centro-Oeste; NE - Nordeste; N - Norte; SE - Sudeste; S - Sul)
No que diz respeito ao percentual de matrículas de alunos com TEA, considerando o total de alunos com deficiência, a região Sudeste iniciou o período estudado liderando em 2009 (18.7%) e em 2010 (13.5%). Esse percentual sofreu queda nos anos seguintes, passando a ocupar o terceiro lugar, juntamente à região Nordeste em 2011 (10.5%), o quarto lugar em 2012 e 2013 (10% em ambos os anos), voltando para o maior percentual em 2014, permanecendo dessa forma até o final do período estudado; entretanto, com uma diferença percentual menor em relação às demais regiões. Esse dado foi ao encontro dos dados de Castro (2015) que observou que a região com maior percentual de matrículas de alunos PAEE em relação ao total de matrículas na Educação Básica por região foi a região Centro-Oeste. Além disso, a autora também verificou que essa região foi a que mais sofreu aumento percentual no período estudado (216%), seguida das regiões Norte (116%), Sul (109%) e Nordeste (98%), enquanto que a região Sudeste, apesar de contar com o maior número bruto de matrículas de alunos PAEE, sofreu um aumento de apenas 31.8%. Dessa forma, pode-se inferir que houve um crescimento maior do percentual de matrículas dos alunos com TEA no período estudado em todas as regiões, com exceção da região Sudeste, a qual sofreu queda e voltou a crescer em 2014. Esse crescimento pode sinalizar o impacto da Lei Nº 12.764/2012.
Visando obter dados mais acurados em relação aos possíveis impactos desta lei nas matrículas deste alunado, elaborou-se a Tabela 2 que traz a variação percentual das matrículas dos alunos com TEA e daqueles com outra deficiência, entre 2009 e 2012 e entre 2012 e 2016.
CO | NE | N | SE | S | |
---|---|---|---|---|---|
TEA (2009 - 2012) | 162% | 146% | 241% | -31% | 105% |
DDEF (2009-2012) | 58% | 91% | 89% | 43% | 104% |
TEA (2012-2016) | 57% | 72% | 72% | 120% | 111% |
DDEF (2012-2016) | 59% | 45% | 49% | 46% | 49% |
Fonte: Elaboração própria com base nos microdados do Censo Escolar (INEP, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016).
Como pode ser observado na Tabela 2, houve grande diferença entre a variação percentual das matrículas dos alunos identificados com TEA durante o primeiro período estudado em relação aos demais alunos com deficiência. No primeiro recorte trazido, observou-se que, com exceção da região Sudeste, o crescimento das matrículas dos alunos com TEA foi superior ao crescimento dos alunos com as demais deficiências, sendo estas maior que o dobro nas regiões Norte e Centro-Oeste, consideravelmente maior na região Nordeste e similar na Sul. A região Sudeste, por sua vez, consistiu naquela com maior diferença nesses dados, uma vez que as matrículas dos alunos com TEA sofreram queda entre 2009 e 2012, e as matrículas dos demais alunos com deficiência apresentou um crescimento consideravelmente inferior em relação às demais regiões.
Esses dados foram ao encontro dos trazidos por Castro (2015), ainda que a variação de período estudado e o agrupamento dos dados modificaram a ordem de maior variação percentual em relação a este estudo. O segundo período estudado demonstrou que ambos os grupos de matrículas permaneceram crescendo, entretanto, de forma inferior de 2009 a 2012, com exceção da região Sudeste, a qual demonstrou grande mudança no quadro de matrículas dos estudantes com TEA entre 2012 e 2016. Ainda foi possível observar que, com exceção da região Centro-Oeste, o crescimento foi bastante similar. Nas demais regiões, o crescimento das matrículas dos alunos com TEA foi consideravelmente maior do que o das demais deficiências (grupo cuja variação percentual de matrículas foi próxima de 50% em todos os locais estudados) - na região Sul, por exemplo, entre 2009 e 2012, o crescimento foi similar para ambos os públicos (105% para TEA e 104% para DDEF), enquanto que entre 2012 e 2016 o crescimento foi de 111% para os alunos com TEA e de apenas 49% para as demais deficiências. Essa diferença no crescimento percentual pode demonstrar que houve impacto da Lei Nº 12.764/2012 nas matrículas dos alunos com TEA em todo o país, com exceção da região Centro-Oeste, a qual, desde o começo do período estudado, assim como demonstrado no estudo de estudo de Castro (2015), já apresentava um crescimento percentual superior as demais, o que pode ter refletido em um crescimento inferior entre 2012 e 2016.
A Tabela 3 apresenta o percentual de matrículas no ensino regular dos alunos com TEA separados por sexo e também a média desse percentual por região. Pode-se observar que houve pouca variação no percentual por região, mantendo-se, inicialmente, uma relação de cerca de 30% de matrículas do sexo feminino e 70% do sexo masculino. Essa proporção aumentou ao longo dos anos, sendo as regiões que mais se distinguiram a Sudeste e Sul, de maneira que o aumento de matrículas do sexo masculino foi maior em relação aos demais, chegando próximo aos 80% das matrículas nesses locais no ano de 2016, enquanto os demais mantiveram um percentual de cerca de 75% de alunos do sexo masculino. Cabe ressaltar que, como pode ser observado na Tabela 3, em todas as regiões estudadas, o crescimento deu-se a partir do ano de 2012, ano em que se promulgou a Lei Nº 12.764/2012. Tal dado, quando confrontado com a literatura, corroborou no sentido de identificar impactos dessa Lei.
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
CO | Feminino | 28 | 28.3 | 28 | 26.6 | 25.7 | 25.8 | 25.2 | 24.4 |
Masculino | 72 | 71.7 | 72 | 73.4 | 74.3 | 74.2 | 74.8 | 75.6 | |
NE | Feminino | 33.2 | 33 | 32.4 | 31.6 | 30 | 29 | 27.6 | 26.7 |
Masculino | 66.8 | 67 | 67.6 | 68.4 | 70 | 71 | 72.4 | 73.3 | |
N | Feminino | 32.7 | 32.8 | 32.7 | 31.1 | 30.3 | 28.3 | 26.8 | 25.5 |
Masculino | 67.3 | 67.2 | 67.3 | 68.9 | 69.7 | 71.7 | 73.2 | 74.5 | |
SE | Feminino | 31.5 | 29.6 | 27.2 | 26.1 | 23.7 | 22.7 | 22.6 | 21.9 |
Masculino | 68.5 | 70.4 | 72.8 | 73.9 | 76.3 | 77.3 | 77.4 | 78.1 | |
S | Feminino | 27 | 26.1 | 25.7 | 24.3 | 22.5 | 21 | 21 | 20.6 |
Masculino | 73 | 73.9 | 74.3 | 75.7 | 77.5 | 79 | 79 | 79.4 | |
MÉDIA | Feminino | 30.6 | 30.0 | 29.2 | 27.9 | 26.5 | 25.4 | 24.6 | 23.8 |
Masculino | 69.4 | 70.0 | 70.8 | 72.1 | 73.5 | 74.6 | 75.4 | 76.2 |
Fonte: Elaboração própria com base nos microdados do Censo Escolar (INEP, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016).
Quando se discutiu a proporção de alunos com deficiência por sexo de acordo com estudos censitários nacionais, observou-se que havia uma prevalência de, aproximadamente, 60% de alunos do sexo masculino e 40% do feminino. Rebelo (2012) identificou essa proporção em todos os estados brasileiros, enfatizando, assim, a importância da questão do viés do gênero no que tange aos alunos com deficiência. Esse viés foi discutido por Mendes e Lourenço (2009), as quais pontuaram que havia prevalência de meninos em relação às meninas (de 60 para 40%), tal como trazido nos estudos censitários sobre o tema. Em contraponto, de acordo com um relatório do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos acerca da prevalência e das características de crianças de oito anos de idade diagnosticadas com TEA em diferentes estados dos Estados Unidos nos anos de 2010 e 2012, a prevalência era de 4.5 e 4.4 de meninos para uma menina, respectivamente. Em termos percentuais, aproximadamente 82% e 81% (Christensen, Baio, & Braun, 2016). Esse dado condiz com o estudo de Lima e Laplane (2016), o qual demonstrou que, entre os anos de 2009 e 2012, na cidade de Atibaia, os dados das matrículas dos alunos com TEA apresentavam uma prevalência quatro vezes superior em estudantes do sexo masculino em relação aos do sexo feminino.
Logo, considerando a literatura nacional e internacional e os dados contidos na Tabela 3, pode-se inferir que a prevalência por sexo de estudantes com TEA sofreu modificação ao longo dos anos no país, caminhando no sentido da proporção esperada pela literatura em relação à distribuição desse público de acordo com o gênero, começando a dar-se esse crescimento a partir de 2012, fortalecendo a hipótese de que a Lei Nº 12.764/2012 estaria impactando positivamente para que haja mais matrículas de estudantes com TEA na rede regular de ensino.
A Tabela 4 apresenta a distribuição das matrículas dos alunos com TEA por etapa de ensino agregada. Como pode ser notado na Tabela 4, quando comparadas as matrículas dos estudantes com TEA em relação às etapas de ensino, observou-se que os dados dos anos iniciais do Ensino Fundamental foram desproporcionalmente maiores em relação às demais etapas, demonstrando a concentração das matrículas nessa etapa de ensino em todo o período estudado. Essa informação foi consonante com a literatura da área, a qual demonstrou a mesma concentração tanto nos alunos com deficiência no geral em diferentes recortes históricos posteriores ao ano de 2008 e também em diferentes localidades (Carvalho, 2012; Laplane, 2014; Martins, 2012; Meletti & Bueno, 2011). O mesmo deu-se com os estudos de alunos PAEE no geral (Meletti & Ribeiro, 2014; Nascimento, 2014), havendo, inclusive, uma concentração de 74% das matrículas dos alunos PAEE em 2012 em todo o país nos anos iniciais do Ensino Fundamental (Meletti & Ribeiro, 2014). Dado similar foi encontrado por Françozo (2014), cujo público-alvo consistiu nos alunos com deficiência visual. Já no que diz respeito à Lei Nº 12.764/2012, esta não pareceu impactar na distribuição das matrículas dos alunos com TEA no período estudado.
EDUCAÇÃO INFANTIL | ||||||||
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | |
CO | 9.8 | 16.4 | 13.7 | 13.0 | 13.7 | 14.4 | 14.3 | 15.3 |
NE | 17.8 | 14.0 | 12.2 | 11.9 | 13.0 | 13.6 | 14.8 | 15.4 |
N | 17.8 | 11.7 | 9.4 | 8.6 | 10.4 | 13.0 | 14.5 | 15.4 |
SE | 7.7 | 9.1 | 13.2 | 13.0 | 14.4 | 14.7 | 15.7 | 17.1 |
S | 11.7 | 12.9 | 14.1 | 14.3 | 15.8 | 16.7 | 16.5 | 19.0 |
ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL | ||||||||
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | |
CO | 68.0 | 63.6 | 63.3 | 62.2 | 60.3 | 58.0 | 57.5 | 56.8 |
NE | 70.3 | 71.5 | 71.2 | 68.5 | 66.5 | 64.4 | 61.9 | 60.3 |
N | 71.3 | 74.2 | 74.2 | 72.5 | 69.3 | 67.6 | 64.4 | 63.4 |
SE | 64.3 | 58.8 | 58.1 | 58.2 | 58.0 | 58.3 | 58.1 | 57.7 |
S | 64.4 | 61.8 | 60.2 | 58.3 | 59.6 | 58.3 | 56.1 | 55.0 |
ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL | ||||||||
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | |
CO | 19.3 | 17.1 | 19.4 | 20.2 | 20.6 | 21.4 | 21.9 | 21.2 |
NE | 10.9 | 12.8 | 14.8 | 17.4 | 17.9 | 19.1 | 20.5 | 21.3 |
N | 8.4 | 12.3 | 14.4 | 16.5 | 16.7 | 16.4 | 17.5 | 17.9 |
SE | 25.5 | 28.6 | 24.7 | 24.2 | 22.5 | 20.9 | 20.1 | 19.3 |
S | 22.9 | 22.8 | 22.3 | 23.2 | 20.0 | 19.5 | 21.5 | 21.1 |
ENSINO MÉDIO | ||||||||
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | |
CO | 2.9 | 2.8 | 3.7 | 4.7 | 5.4 | 6.1 | 6.3 | 6.7 |
NE | 1.1 | 1.7 | 1.8 | 2.2 | 2.7 | 2.9 | 2.8 | 3.0 |
N | 2.5 | 1.8 | 2.0 | 2.4 | 3.5 | 3.0 | 3.5 | 3.3 |
SE | 2.5 | 3.4 | 4.0 | 4.7 | 5.1 | 6.1 | 6.1 | 5.9 |
S | 1.1 | 2.4 | 3.4 | 4.2 | 4.7 | 5.5 | 5.9 | 5.0 |
Fonte: Elaboração própria com base nos microdados do Censo Escolar (INEP, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016).
Além disso, os dados trazidos na Tabela 4 aparentaram ser inconsistentes, ou seja, se for comparada à variação percentual do ano de 2016 em relação ao ano de 2009 por região do país, observou-se que, na região Centro-Oeste, Sudeste e Sul, houve um crescimento na Educação Infantil (56%, 122% e 62%, respectivamente) e queda nas regiões Nordeste e Norte (-13% em ambas). Já nos anos iniciais do Ensino Fundamental, houve queda em todas as regiões, sendo estas: -16%, -14%, -11%, -10% e -15% para as regiões Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul, respectivamente. Nos anos finais do Ensino Fundamental, houve um movimento inverso, isto é, de aumento para as regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte (10%, 95% e 113%, respectivamente) e queda nas regiões Sudeste e Sul (-99% nas duas regiões). Por fim, no Ensino Médio, apresentou-se crescimento em todas as regiões acima de 100% para as regiões Nordeste (173%), Sudeste (136%) e Sul (355), enquanto que a região Norte possuiu um aumento de 33% e a Centro-Oeste uma queda de -98%.
Esses dados inconsistentes, ou seja, aumentos bruscos seguidos de queda e vice versa, corroboraram com os de Lima e Laplane (2016) e Talarico e Laplane (2016) que estudaram a trajetória escolar das matrículas dos alunos com TEA em contextos municipais e observaram que apenas 12.92% do público estudado na pesquisa de Talarico e Laplane (2016) e 6.38% no estudo de Lima e Laplane (2016), no período de 2009 a 2012, possuíam escolarização completa. Tanto Talarico e Laplane (2016) quanto Lima e Laplane (2016) verificaram um alto índice de matrículas caracterizadas como trajetórias parciais sem retenção escolar (40% e 25.53%, respectivamente), ou seja, aquelas matrículas dos alunos apareceram, desaparecem e reaparecem no período estudado sem ter havido retenção do aluno em nenhum ano. Esse dado, associado ao baixo índice de trajetórias completas, sinalizaram o alto índice de evasão escolar.
Relatos de entrevistas com pais de alunos com TEA em Talarico e Lima (2016) demonstraram a preocupação com a falta de avanço na aprendizagem de seus filhos, com falas que indicavam que os alunos não estavam aprendendo em sala de aula, que muitas lições completas eram feitas por outras pessoas e que os próprios pais tinham de ensinar em casa. As autoras sugeriram que a falta de apoio era uma barreira para a escolarização desse público, visto o baixo percentual de alunos com TEA matriculados no AEE no munícipio investigado, bem como com o relato dos familiares desses alunos, os quais apresentaram para a autora que apesar de existir o serviço de AEE no município, seus filhos não eram atendidos (Talarico & Lima, 2016).
Buscando verificar a incidência de alunos com TEA matriculados no AEE no país, elaborou-se a Tabela 5. Como pode ser observado na Tabela 5, com exceção da região Sudeste, no ano de 2009, o percentual de matrículas de alunos com TEA no AEE foi menor por região. E, em todas as regiões, houve crescimento gradual ao longo do período estudado, de forma que, em 2016, este percentual era de aproximadamente 30%, novamente com exceção da região Sudeste, cujo percentual era de 25.5%. A variação percentual no período estudado não permitiu inferir que as matrículas no AEE sofreram impactos relacionados à Lei 12.764/2012, demandando, desse modo, outras metodologias de estudo ou aguardar os dados censitários que irão emergir nos próximos anos para verificar novamente uma possível existência de impacto nesse aspecto.
2009 | 2010 | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
CO | 5.8 | 15.5 | 19.7 | 18.8 | 18.7 | 21.5 | 27.9 | 28.9 |
NE | 4.9 | 13.2 | 17.1 | 18.7 | 20.7 | 25.4 | 25.5 | 28.9 |
N | 6.3 | 14.2 | 17.9 | 19.6 | 19.0 | 23.0 | 30.0 | 32.6 |
SE | 17.3 | 14.1 | 18.8 | 19.7 | 20.9 | 22.3 | 22.9 | 25.5 |
S | 7.3 | 12.0 | 15.1 | 17.8 | 21.5 | 26.3 | 29.1 | 31.1 |
Fonte: Elaboração própria com base nos microdados do Censo Escolar (INEP, 2009, 2010, 2011, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016).
De acordo com Meletti (2014), no ano de 2014, a maioria dos alunos PAEE não recebia AEE no país. Rebelo (2012), ao estudar os dados de 2009, observou que as regiões Sudeste e Sul compunham cerca de 68% do total de matrículas de alunos PAEE no AEE, sendo que somente cerca de 40% do total de matrículas deste público recebia o atendimento e a maioria desse alunado eram alunos com deficiência intelectual. Esse baixo índice e o principal público-alvo atendido, quando se considera o PAEE como um todo neste ano, corroborou com o dado trazido no presente artigo acerca dos estudantes com TEA em 2009. Além disso, a autora também verificou que havia uma relação direta entre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e o percentual de matrículas no AEE, ou seja, os quatro estados que possuíam o menor IDH também possuíam o menor número de alunos matriculados no AEE (Roraima, Sergipe, Amapá e Amazonas).
Em relação aos alunos com TEA nos contextos municipais cujos dados censitários já foram estudados, observou-se um baixo índice de matrículas desse público no AEE. No município de Campinas, entre 2009 e 2012, o percentual de alunos com TEA matriculados no AEE era de 13,9% em 2009, 7,48% em 2010, 5,31% em 2011 e 7,12% em 2012. Assim, observou-se que houve redução das matrículas desse público no AEE (Talarico & Laplane, 2016). Lima e Laplane (2016), de forma similar, em relação ao munícipio de Atibaia, concluíram em seu estudo que um pequeno número de alunos com TEA frequentavam o AEE e que a rede estadual não fornecia nenhum tipo de apoio extra para essa população, o que pode ser, inclusive, um fator que pode ocasionar a evasão escolar, já previamente discutida, uma vez que os alunos realizam sua escolarização na rede municipal até o Ensino Fundamental e, quando vão para a próxima etapa de ensino, não encontram apoio, o que ocasiona desistência devido à falta de apoio pedagógico. Dos 96 alunos com TEA cujas trajetórias foram estudadas em Atibaia, apenas seis completaram as etapas de ensino da Educação Básica, indicando a grande dificuldade na permanência escolar. Ambos os municípios supracitados se localizam no estado de São Paulo, confirmando o dado em relação à região Sudeste, apresentado no presente artigo, como sendo aquela em que, apesar de possuir maior índice de matrículas em 2009 no AEE, sofreu o menor crescimento percentual tanto no total de matrículas de alunos com TEA na sala comum quanto no AEE.
Vale ainda considerar que, como pontuado por Meletti (2014, pp. 806-807):
Outro aspecto é o AEE ser oficialmente a efetivação da educação especial na escola regular por meio de um trabalho que não se caracteriza como paralelo à educação regular. Cumpre questionar que tipo de apoio os alunos com necessidades educacionais especiais, que não recebem AEE, estão tendo na escola regular.
Essa problemática impacta diretamente na aprendizagem dos alunos com TEA, uma vez que estes demandam intervenção e suporte individualizado, multidimensional e multidisciplinar que tenha como objetivo maximizar a independência funcional e a qualidade de vida ao longo do desenvolvimento e da aprendizagem, melhorando as habilidades sociais e a comunicação, bem como reduzindo as dificuldades e promovendo a independência e provendo suporte às famílias (Lai, Lombardo, & Baron-Cohen, 2014). Desse modo, o AEE, ainda que tivesse grande concentração de matrículas, não se encaixaria na metodologia de intervenção e suporte adequados para esse público.
Vale ressaltar que a atual política de inclusão escolar consiste em uma política cuja única via de apoio incide em um serviço que ocorre no contraturno e sem prover apoio na sala comum, associada a uma educação que possui um dos piores desempenhos do mundo, não vem se mostrando suficiente para atender as necessidades tão distintas do público-alvo ao qual se destina (Mendes et al., 2015), apontando no sentido da necessidade de reformulação dessa política.
4 Considerações finais
A partir dos dados trazidos neste estudo, acredita-se que foi possível atingir o objetivo de caracterizar as matrículas contidas nos microdados do Censo Escolar dos estudantes com TEA na sala comum nas cinco regiões do país, considerando possíveis impactos da Lei Nº 12.764/2012. Essa caracterização foi essencial para compreender mais sobre os alunos com TEA matriculados na escola comum e buscar estudos que tivessem como foco intervir para que esse público permaneça na escola e, de fato, aprenda.
Observou-se que essas matrículas sofreram crescimento superior às dos demais alunos com deficiência durante o período estudado, possuindo a região Sudeste a maior concentração bruta de matrículas de alunos com TEA e com as demais deficiências, seguida da região Nordeste e Sul. Entretanto, a região Sudeste foi aquela que teve menor crescimento percentual, especificamente entre 2009 e 2012, enquanto as demais regiões apresentaram crescimento superior a 100% nas matrículas de alunos com TEA. Esse quadro inverteu-se entre 2012 e 2016, período que a região Sudeste apresentou crescimento de 120% dessas matrículas, liderando o percentual desse período. Em relação às matrículas dos demais alunos com deficiência, em ambos os períodos, a região Sudeste manteve seu crescimento percentual menor se comparada às demais (com exceção da região Nordeste entre 2012 e 2015, cujo crescimento percentual foi apenas 1% menor que a Sudeste).
No que diz respeito ao sexo dos alunos, observou-se que com o passar dos anos a proporção de meninos e meninas com TEA vem se aproximando da esperada pela literatura, ou seja, cerca de uma menina para, aproximadamente, 4.5 meninos.
Em ambos os dados supracitados, pode-se inferir que houve um possível impacto da Lei Nº 12.764/2012, uma vez que eles possuíam variação percentual mais acentuada após o ano de 2012. Entretanto, no que tange à permanência escolar desse público, não foi possível verificar impactos dessa lei, considerando os percentuais estudados. No que diz respeito, por exemplo, à distribuição das matrículas por etapa de ensino, notou-se a sua concentração nos anos iniciais do Ensino Fundamental, tal como ocorreu com os demais alunos PAEE. Outro fator levantado consistiu na inconsistência em relação à variação percentual e à distribuição das matrículas por etapa de ensino. Mais especificamente, enquanto houve crescimento das matrículas, em todas as regiões do país, na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, houve queda nas matrículas referentes aos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Tais informações sinalizaram grande índice de evasão escolar. Vale ainda pontuar, que, novamente, a região Sudeste foi aquela cujos percentuais diferiram das demais, apontando para um número inferior de acesso à sala comum para os alunos com TEA, corroborando com os dados já discutidos anteriormente.
Uma vez constatada a evasão escolar desse público, analisaram-se os dados referentes ao AEE, a partir dos quais foi possível verificar, em consonância com a literatura, que apenas um pequeno percentual desse público era atendido, de forma que a falta de apoio demonstrou ser a razão pela qual há grande índice de evasão escolar. Além disso, a literatura evidenciou que o apoio promovido no AEE não era suficiente para prover as necessidades especiais dos alunos com TEA. Logo, inferiu-se que a Lei Nº 12.764/2012 teve impacto no acesso à escola comum para os alunos com TEA, mas esse acesso não foi suficiente para garantir sua permanência. Essa perspectiva refletiu não somente os dados dos estudantes com TEA, mas do PAEE no geral, uma vez que se tem uma política cuja única via de apoio é paralela a sala comum, a qual vem demonstrando não ser suficiente para atender às demandas do alunado da Educação Especial.
Tem-se como limitação do presente estudo as inconsistências existentes nos dados censitários, bem como o fato de que a Lei Nº 12.764/2012 foi implementada no meio do período histórico dos oito anos estudados, o que pode não ser suficiente para verificar os seus reais impactos. Desse modo, demandam-se estudos que possuam outras formas complementares de coleta de dados ou ainda um período histórico mais longo subsequente à implantação da lei.