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Estudos em Avaliação Educacional

versão impressa ISSN 0103-6831versão On-line ISSN 1984-932X

Est. Aval. Educ. vol.35  São Paulo  2024  Epub 07-Maio-2024

https://doi.org/10.18222/eae.v35.10501 

ARTIGOS

HABILIDADES SOCIAIS E EMPATIA EM PROFESSORES DO ENSINO FUNDAMENTAL

HABILIDADES SOCIALES Y EMPATÍA EN DOCENTES DE EDUCACIÓN BÁSICA

SOCIAL SKILLS AND EMPATHY IN BASIC EDUCATION TEACHERS

IAtitus Educação, Passo Fundo-RS, Brasil;

IIAtitus Educação, Passo Fundo-RS, Brasil;

IIIAtitus Educação, Passo Fundo-RS, Brasil;

IVAtitus Educação, Passo Fundo-RS, Brasil;


RESUMO

O estudo objetivou avaliar o repertório de habilidades sociais e empatia de 94 professores de ensino fundamental. Trata-se de estudo quantitativo transversal, utilizando o Inventário de Habilidades Sociais-2-Del-Prette e o Inventário de Empatia. Da amostra, 62,7% apresentaram habilidades sociais acima da média ou na média e 37,2% tiveram indicação para treinamento de habilidades sociais. A empatia obteve escores elevados, e o altruísmo destaca-se acima da média (95%). Foram identificadas correlações negativas das habilidades sociais com o altruísmo e positivas com sensibilidade afetiva e tomada de perspectiva. Concluiu-se que a maioria dos professores apresentou habilidades sociais e empatia satisfatórias; entretanto índices deficitários foram encontrados em uma parcela da amostra e indicam a necessidade de aprimoramento.

PALAVRAS-CHAVE HABILIDADES SOCIAIS; EMPATIA; PROFESSORES.

RESUMEN

El presente estudio tiene el propósito de evaluar el repertorio de habilidades sociales y empatía de 94 docentes de educación básica. Se trata de un estudio cuantitativo transversal, que utiliza el Inventario de Habilidades Sociales-2-Del-Prette, así como el Inventario de Empatía. En dicha muestra, el 62,7% presentó habilidades sociales por encima del promedio o de acuerdo con el promedio y el 37,2% fue indicado para capacitar las habilidades sociales. La empatía obtuvo escores elevados y el altruismo es superior al promedio (95%). Se identificaron correlaciones negativas de las habilidades sociales con el altruismo y positivas con la sensibilidad afectiva y en perspectiva. Se concluyó que la mayoría de los docentes presentó habilidades sociales y empatía satisfactorias, pero se han encontrado índices deficitarios en una parcela de la muestra e indican la necesidad de mejorar.

PALABRAS CLAVE HABILIDADES SOCIALES; EMPATÍA; DOCENTES.

ABSTRACT

This study aimed to assess the repertoire of social skills and empathy in 94 basic education teachers. This is a cross-sectional quantitative study using the Social Skills Inventory-2-Del-Prette and the Empathy Inventory. Based on the sample, 62,7% had above average or average social skills and 37,2% were referred to social skills training. Empathy had high scores and altruism was above average (95%). Negative correlations were identified between social skills and altruism, whereas positive correlations were identified between social skills and affective sensitivity and perspective-taking. It was concluded that most teachers had satisfactory social skills and empathy. Nevertheless, deficient indexes found in a portion of the sample need to be improved.

KEYWORDS SOCIAL SKILLS; EMPATHY; TEACHERS.

INTRODUÇÃO

A educação brasileira passou por mudanças expressivas nas últimas décadas. O avanço tecnológico e a velocidade no acesso à informação impactam o processo de ensino-aprendizagem, produzindo novas modalidades na configuração das instituições de ensino (Macedo & Osório, 2023). A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que define as aprendizagens essenciais da educação básica brasileira, faz menção à relevância do ensino baseado em competências, compreendidas como a mobilização de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores visando a solucionar demandas complexas da vida cotidiana. Essas competências e habilidades envolvem empatia, diálogo, construção da autonomia, flexibilidade, resiliência, autoconhecimento e curiosidade, entre outras (Ministério da Educação [MEC], 2017).

Desse modo, espera-se que o professor apresente um bom repertório de habilidades sociais (HS), qualificando o processo de aprendizagem. As HS podem ser caracterizadas como classes de comportamentos sociais necessárias para o manejo efetivo das interações sociais. São definidas como comportamentos socialmente apropriados, conforme o contexto do indivíduo, em relação a aspectos de sua cultura, classe socioeconômica, idade, sexo, educação e padrões de comunicação (Caballo, 2018). São organizadas nas seguintes categorias: comunicação; civilidade; assertividade; empatia; expressão de solidariedade; fazer e manter amizades; manejar conflitos e resolver problemas interpessoais; expressar afeto e intimidade; coordenar grupo; e falar em público. Esses comportamentos, que estão de acordo com os valores de respeito mútuo compartilhados por uma comunidade específica, apresentam alta probabilidade de atingir resultados favoráveis aos envolvidos (indivíduo, grupo ou comunidade), auxiliando na manutenção e na qualidade da relação (Del Prette & Del Prette, 2017).

Outro conceito importante no contexto educacional é a competência social, que se refere aos efeitos do desempenho das HS nas relações interpessoais. Esse conceito remete aos critérios de funcionalidade relacionados aos objetivos do indivíduo e às demandas culturais e situacionais: (a) consecução dos objetivos de determinada situação interpessoal; (b) manutenção/melhora da autoestima; (c) manutenção/melhora da qualidade da relação; (d) equilíbrio de poder entre os interlocutores; e (e) respeito/ampliação dos direitos humanos interpessoais (Del Prette & Del Prette, 2017).

Dentre as HS, a empatia destaca-se como um comportamento essencial a ser desenvolvido pelo docente, pois possibilita a compreensão da perspectiva pelo outro (Rovai & Silva, 2022). Ela auxilia no estabelecimento de vínculos saudáveis, na medida em que o indivíduo demonstra sensibilidade às emoções alheias (Soares & Oliveira, 2019). Essas habilidades permitem ao professor maior compreensão das opiniões, perspectivas e pontos de vistas de seus alunos, auxiliando a capacidade de selecionar métodos de ensino adequados às diferentes necessidades e orientações com mais aplicabilidade, visando a promover o crescimento tanto acadêmico quanto emocional dos alunos (Dias et al., 2022).

Há consenso na literatura acerca da existência de três componentes da empatia atuando de forma integrada: o cognitivo, o afetivo e o comportamental (Del Prette & Del Prette, 2005). O componente cognitivo consiste na habilidade de inferir os sentimentos e pensamentos de outrem sem ter vivenciado a mesma situação e/ou sentimento. O componente afetivo relaciona-se à capacidade de compartilhar emoções. O comportamental, por sua vez, diz respeito à expressão empática e à demonstração do entendimento da experiência do outro, e pode ser desenvolvido por meio de comunicação verbal ou não verbal (Falcone et al., 2008).

No contexto do ensino, o docente que dispõe de habilidades empáticas pode manter uma relação mais afetiva e próxima com seus alunos. Também pode utilizá-las para trabalhar assuntos recorrentes nas escolas, como o bullying e o sofrimento psíquico, estimulando o respeito às diferenças e a capacidade de compreensão de realidades distintas. Para Warren (2018), os professores em formação precisam exercitar a disposição empática, visando a trabalhar da melhor forma com crianças e adolescentes de diferentes culturas.

Uma das estratégias que pode ser utilizada para instrumentalizar o professor é investir na promoção de um repertório de HS satisfatório por meio do treinamento de habilidades sociais (THS), que consiste em um conjunto de atividades planejadas, mediadas e conduzidas por um terapeuta ou coordenador, com o objetivo de qualificar a proficiência de HS já aprendidas, porém deficitárias, ensinar novas habilidades e diminuir ou extinguir comportamentos concorrentes (Del Prette & Del Prette, 2017). Para Caballo (2018), o THS é uma das técnicas mais potentes e comumente utilizadas para aprimorar a efetividade interpessoal, para o tratamento de transtornos psicológicos e melhoria da qualidade de vida de modo geral.

Um estudo investigou as HS de 65 professores do ensino fundamental (anos iniciais e anos finais) de duas escolas públicas do Rio de Janeiro e constatou que, embora a maioria (69%, n = 46) tenha apresentado repertório bastante elaborado ou bom de HS, 29% dos sujeitos (n = 19) apresentaram repertório abaixo da média ou com indicação de THS. O instrumento utilizado foi o Inventário de Habilidades Sociais-Del-Prette (IHS-Del-Prette), em sua versão original (Del Prette & Del Prette, 2018), o qual encontrou média elevada na dimensão Conversação/Desenvoltura social, bem como média baixa em Autoexposição a desconhecidos e situações novas, seguido de Autocontrole da agressividade (Carneiro et al., 2015).

Achados semelhantes foram constatados em uma investigação das HS de 70 professores de ensino fundamental e médio, utilizando também o IHS-Del-Prette (Del Prette & Del Prette, 2018). Identificou-se um padrão bastante elaborado de HS em 95,71% da amostra (Reis et al., 2012), com média mais elevada na dimensão Conversação/Desenvoltura social e mais baixa em Autocontrole da agressividade. Tais resultados se repetiram na análise de professores do ensino fundamental de uma escola estadual de Rondônia, na qual também foi encontrado baixo escore na dimensão Autocontrole da agressividade (45% da amostra abaixo da média) e escore elevado em 68,13% em Conversação/Desenvoltura social (Almeida et al., 2017). Dessa maneira, pode-se inferir que estudos com professores constataram que, apesar de os profissionais apresentarem facilidade em exercer habilidades assertivas (defesa de direitos, expressão de sentimentos), demonstraram tendência a não saber como reagir de forma adequada a situações potencialmente estressantes (lidar com brincadeiras, gozações e críticas) que demandem um controle da agressividade e raiva (Reis et al., 2012).

Em relação às HS de professores de ensino fundamental, especialmente a assertividade, foi investigado se tinham influência no desempenho social na sala de aula e na relação com os alunos no contexto de trabalho institucional (Cintra & Del Prette, 2019). Constatou-se que todos os professores apresentaram HS acima da média, por meio da aplicação do IHS-2-Del-Prette (Del Prette & Del Prette, 2018), destacando melhora no conhecimento e no repertório de HS, exceto na relação cognitiva (tomada de perspectiva e flexibilidade interpessoal), o que indica dificuldade na expressão empática de forma equilibrada e assertiva pelos educadores.

Corroborando a eficácia do THS, um estudo clínico avaliou um programa de intervenção em HS em 24 pré-escolas comunitárias da Jamaica, com o objetivo de reduzir problemas de conduta de crianças, por meio de um treinamento direcionado aos professores. O resultado destacou a importância da promoção de HS como responsável pela diminuição dos problemas de conduta (perder a paciência facilmente, desobedecer a ordens, irritar e culpar os outros, ficar facilmente irritado, brigar ou discutir) e, consequentemente, aumento do repertório de HS em pré-escolares (Baker-Henningham et al., 2012).

Além das pesquisas com foco na avaliação das HS e no THS, é imprescindível abordar especificamente o desenvolvimento de programas de empatia. Nesse tipo de proposta, as habilidades empáticas abrangem a manutenção do contato visual, a aproximação do outro, a escuta (evitando interrupções), a tomada de perspectiva (colocar-se no lugar do outro), a expressão de compreensão, o incentivo à confidência (quando conveniente) e a demonstração de interesse para ajudar, compartilhar alegria e realização do outro indivíduo (Del Prette & Del Prette, 2017).

Outro aspecto identificado por um estudo realizado na China foi a relação entre empatia e saúde mental em 4.348 professores pré-escolares. O trabalho encontrou resultados relevantes. A partir do rastreio de problemas psicológicos e das dimensões da empatia, o estudo apontou a complexidade da variável empatia, compreendida como um fator de proteção em determinadas situações ou como fator de risco em outras. O estudo também concluiu que, conforme aumentam os anos de trabalho do professor, há também aumento da maioria dos sintomas psicopatológicos, independente da idade (Huang et al., 2020).

Dessa forma, considerando a relevância e o impacto da relação professor- -aluno na aprendizagem, este estudo teve como objetivo avaliar as HS e a empatia de professores municipais que atuam no ensino fundamental. Além disso, propôs-se a identificar as relações existentes entre as variáveis investigadas.

MÉTODO

Participantes

Trata-se de estudo com delineamento quantitativo e transversal. Participaram 94 professores de ensino fundamental de escolas da rede municipal do noroeste do Rio Grande do Sul (RS). Destes, 80% eram mulheres (n = 75), com média de idade de 43,12 anos (DP = 9,12). Foram incluídos professores que estivessem em docência em sala de aula e excluídos professores com contrato temporário e cargos de orientação educacional ou direção.

Instrumentos

Para a realização deste trabalho, foram utilizados os instrumentos descritos a seguir.

  1. Ficha de dados sociodemográficos: utilizada para caracterizar a amostra em termos de gênero, idade, estado civil, condição socioeconômica, entre outras informações.

  2. Inventário de Habilidades Sociais-2-Del-Prette/IHS-2-Del-Prette (Del Prette & Del Prette, 2018): reedição do IHS-Del-Prette (Del Prette & Del Prette, 2001). Tem 38 itens que reúnem habilidades indispensáveis para relações satisfatórias e bem-sucedidas. “A análise da estrutura fatorial reteve 30 itens, com carga fatorial > 0,29, com uma consistência interna excelente (α = 0,944)” (Del Prette & Del Prette, 2018, p. 37). Entretanto, os autores optaram por manter no caderno de aplicação os 38 itens da versão original do instrumento, com a mesma numeração, para que fossem possíveis estudos comparativos entre as diferentes versões. Sua estrutura organiza-se em cinco fatores: (1) conversação assertiva, voltado às habilidades relacionadas às situações de enfrentamento que tenham risco potencial de reação indesejável do outro (α = 0,934); (2) abordagem afetivo-sexual, voltado às habilidades de expressão afetivas e sexuais (α = 0,774); (3) expressão de sentimento positivo, que se relaciona às habilidades de expressão e manejo das demandas de afeto positivo com familiares e demais pessoas (α = 0,894); (4) autocontrole e enfrentamento, relativo às habilidades para manejo de situações que exigem autocontrole e enfrentamento, com risco de o outro ter condutas indesejáveis (α = 0,840); e (5) desenvoltura social, fator voltado ao conjunto de habilidades que envolvem desinibição e postura em interações sociais (α = 0,840). A interpretação do IHS-2-Del-Prette é realizada conforme a posição percentil dos escores (total e subescalas) (Del Prette & Del Prette, 2018):

    • Percentil 1-25: repertório inferior de HS é indicativo de déficit e necessidade de THS, especialmente nas subescalas e itens mais críticos para o ajustamento pessoal e profissional.

    • Percentil 26-35: repertório médio inferior de HS, com resultados abaixo da média em grande parte dos itens: indicativo de necessidade de THS, especialmente nas subescalas e itens mais críticos para o ajustamento pessoal e profissional.

    • Percentil 36-65: bom repertório de HS, com resultados na média para a maior parte dos itens ou equilíbrio entre recursos e déficit nesses itens e subescalas.

    • Percentil 66-75: repertório elaborado de HS, com resultado acima da média para a maior parte dos itens e subescalas em que aparecem. Indicativo de recursos interpessoais bastante satisfatórios.

    • Percentil 76-100: repertório altamente elaborado de HS, com resultados acima da média para praticamente todos os itens e subescalas em que aparecem. Indicativo de recursos interpessoais altamente satisfatórios nesses itens.

  3. Inventário de Empatia (Falcone et al., 2008): instrumento de autorrelato, com 40 itens, baseado nos componentes cognitivos, afetivos e comportamentais da empatia. Utiliza escala do tipo Likert, de acordo com as frequências dos comportamentos descritos, variando de nunca (1) até sempre (5). Os itens do instrumento são distribuídos em quatro fatores ou subescalas: (1) tomada de perspectiva (α = 0,85), que se refere à capacidade de entender a perspectiva e os sentimentos da outra pessoa, mesmo em situações que envolvam conflito de interesses, demandando esforço para compreender as razões do outro antes de expressar as próprias perspectivas; (2) flexibilidade interpessoal (α = 0,78), que expressa a capacidade de tolerar comportamentos, atitudes e pensamentos dos outros, mesmo sendo diferentes ou provocadores de frustração; (3) altruísmo (α = 0,75), dimensão que reflete a capacidade para sacrificar os próprios interesses com a finalidade de beneficiar ou ajudar alguém, sendo que um escore baixo neste fator revela tendência egoísta; e (4) sensibilidade afetiva (α = 0,72), o que está relacionado ao interesse sincero em dar atenção às necessidades de outrem, experimentar sentimentos de simpatia e compaixão com o bem-estar dos outros, no qual um escore baixo pode refletir pouca atenção ou cuidado em relação às necessidades dos outros (Falcone et al., 2008).

Procedimentos

A pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade Meridional (IMED) sob o Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE) número 73085617.1.0000.5319. A coleta de dados ocorreu de forma coletiva, em encontros de formação de professores, nas salas de uma instituição de ensino, nos meses de fevereiro e março de 2020, com duração de 50 minutos. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), a fim de garantir a conformidade com os termos propostos e a participação voluntária na pesquisa, respeitando as questões éticas determinadas pelas Resoluções n. 466 (2012) e n. 510 (2016), do Conselho Nacional de Saúde. A aplicação foi realizada por duas psicólogas treinadas no protocolo da pesquisa.

Análise de dados

Os dados foram armazenados no Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 25.0. A análise dos dados foi realizada a partir da obtenção, com esse software, de estatísticas descritivas das variáveis armazenadas (médias, desvios-padrão e distribuições de frequência). Por meio do teste Kolmogorov-Smirnov, foi verificado o ajuste das distribuições acumuladas da amostra à função de distribuição teórica (Hair et al., 2010). E, a fim de analisar a associação entre as variáveis investigadas, foram calculados os coeficientes de correlação de Pearson entre elas. Resultados de testes de hipótese aplicados foram considerados estatisticamente significativos se p < 0,05.

RESULTADOS

Em relação às características sociodemográficas, o estado civil predominante era casado(a) ou em união estável (68%, n = 64), com 53% (n = 50) coabitando com companheiro(a) e filhos(as). Os dados são apresentados na Tabela 1.

TABELA 1 Dados sociodemográficos da amostra 

Variáveis Categorias n %
Renda 2 a 3 salários mínimos 14 15
4 a 5 salários mínimos 55 58
> 5 salários mínimos 25 27
Escolaridade Ensino superior 12 13
Pós-graduação 82 87
Tempo de profissão < 1 ano 6 6
1 a 2 anos 4 4
3 a 5 anos 3 3
5 a 10 anos 19 20
10 a 20 anos 30 32
20 a 30 anos 22 24
> 30 anos 10 11
Área de atuação no ensino fundamental Anos iniciais (1º ao 5º ano) 44 46
Anos finais (6º ao 9º ano) 25 27
Anos iniciais e finais 25 27

Fonte: Elaboração dos autores com base nos dados da pesquisa.

A maior parte dos indivíduos avaliados (62,7%) apresentou repertório preservado de HS no escore total do IHS-2-Del-Prette, somando-se as classificações bom, elaborado e altamente elaborado. Verificou-se que os fatores F1 - Conversação assertiva e F2 - Abordagem afetivo-sexual apresentaram, respectivamente, 64,9% e 63,9% dos participantes com repertório de HS classificados entre bom a altamente elaborado. Esse dado sugere que são habilidades mais desenvolvidas na amostra estudada. Já os fatores F3 - Expressão de sentimento positivo, F4 - Autocontrole e enfrentamento e F5 - Desenvoltura social foram os que demonstraram maior frequência de participantes cujo repertório foi classificado como inferior ou médio inferior, respectivamente, 44,6%, 46,8% e 42,6%. Esses resultados são indicativos da presença de um repertório deficitário de HS e necessidade de THS em uma parte da amostra, considerando especificamente essas habilidades. A Tabela 2 resume os resultados da classificação dos participantes de acordo com o repertório de habilidades sociais do IHS-2-Del-Prette.

TABELA 2 Distribuição dos participantes de acordo com o repertório de habilidades sociais do IHS-2-Del-Prette 

Fatores Repertório de Habilidades Sociais
Altamente elaborado - acima da média Elaborado - acima da média Bom - média Médio inferior - indicativo de THS Inferior - indicativo de THS
n % n % n % n % n %
Escore total 19 20,2 5 5,3 35 37,2 10 10,6 25 26,6
F1 - Conversação assertiva 16 17,0 11 11,7 34 36,2 15 16,0 18 19,1
F2 - Abordagem afetivo-sexual 19 20,2 15 16,0 26 27,7 8 8,5 26 27,7
F3 - Expressão de sentimento positivo 22 23,4 4 4,3 26 27,7 13 13,8 29 30,9
F4 - Autocontrole e enfrentamento 10 10,6 6 6,4 34 36,2 11 11,7 33 35,1
F5 - Desenvoltura social 22 23,4 7 7,4 25 26,6 15 16,0 25 26,6

Fonte: Elaboração dos autores com base nos dados da pesquisa.

F1 = 64,9; F2 = 63,9; F3 = 55,4; F4 = 53,2; F5 = 57,4.

Em relação aos fatores do Inventário de Empatia, a maioria da amostra apresentou escores na média ou acima da média em todos os fatores. O fator mais elevado em termos da classificação dos escores foi o Altruísmo; já o fator Sensibilidade afetiva foi o que apresentou mais escores abaixo da média. Os resultados referentes ao Inventário de Empatia estão descritos na Tabela 3.

TABELA 3 Classificação dos escores obtidos pelos participantes no Inventário de Empatia 

Fatores Média DP Abaixo
da média
Média Acima da média
n % n % n %
F1 - Tomada de perspectiva 46,36 6,55 30 32 12 13 52 55
F2 - Flexibilidade interpessoal 33,43 5,17 27 29 7 7 60 64
F3 - Altruísmo 29,54 4,78 1 1 4 4 89 95
F4 - Sensibilidade afetiva 37,23 4,98 37 40 4 4 53 56

Fonte: Elaboração dos autores com base nos dados da pesquisa.

Foram identificadas algumas associações entre as HS e a empatia dos professores por meio do cálculo dos coeficientes de correlação de Pearson. Foi encontrada uma associação inversa entre o escore total do IHS-2-Del-Prette e o fator Altruísmo (F3) do Inventário de Empatia (-0,226*). Especificamente em relação aos fatores do IHS-2-Del-Prette, destaca-se a Abordagem afetivo-sexual (F2), que se associou inversamente com todos os escores do inventário, exceto com Tomada de perspectiva (F1). Já Expressão de sentimento positivo (F3) associa-se com Tomada de perspectiva (F1) (0,338***), Sensibilidade afetiva (F4) (0,258*) e escore total do Inventário de Empatia (0,231*). O fator Autocontrole e enfrentamento (F4) também apresentou associação inversa com Flexibilidade interpessoal (F2) (-0,275**) e Altruísmo (F3) do Inventário de Empatia (-0,236*). A Tabela 4 apresenta os resultados encontrados.

TABELA 4 Coeficientes de correlação de Pearson entre os escores dos professores em habilidades sociais e empatia 

IHS2-Del-Prette Inventário de Empatia
F1
Tomada de perspectiva
F2
Flexibilidade interpessoal
F3
Altruísmo
F4
Sensibilidade afetiva
Escore total
F1 - Conversação assertiva 0,064 0,086 -0,091 0,105 0,049
F2 - Abordagem afetivo-sexual -0,14 -0,257* -0,247* -0,229* -0,317**
F3 - Expressão de sentimento positivo 0,348*** 0,048 -0,09 0,258* 0,231*
F4 - Autocontrole e enfrentamento 0,009 -0,275** -0,236* 0,03 -0,14
F5 - Desenvoltura social 0,053 -0,084 -0,126 -0,016 -0,045
Escore total 0,135 -0,038 -0,226* 0,104 0,01

Fonte: Elaboração dos autores com base nos dados da pesquisa.

* 0,01 < p < 0,05;

** 0,001 < p <= 0,01; e

*** p <= 0,001.

DISCUSSÃO

Este estudo teve o objetivo de avaliar e identificar associações entre as HS e a empatia de professores que atuam em escolas municipais do ensino fundamental de uma cidade do interior do RS. Analisando os dados sociodemográficos da amostra, foi possível concluir que a maioria dos participantes são professores de carreira, com experiência em sala de aula e que investiram em cursos de pós-graduação ao longo da trajetória profissional. Além disso, a maioria reside com a família e tem boas condições socioeconômicas.

Os resultados obtidos no escore total do IHS-2-Del-Prette indicaram que a maioria dos professores (63%, n = 59) apresentou repertório de HS acima da média ou na média. Esses achados podem ser compreendidos à luz da literatura, tendo em vista que várias pesquisas com professores apontaram resultados semelhantes da presença de repertório de HS preservado ou bastante desenvolvido (Almeida et al., 2017; Carneiro et al., 2015; Reis et al., 2012). Atualmente, sabe-se que há relação direta entre HS e saúde ou qualidade de vida, bem como relação inversa entre HS e transtornos psicológicos ou problemas de funcionamento psicossocial (Braz et al., 2018). As HS também estão correlacionadas com relacionamentos saudáveis na família, resolução de problemas, otimismo, resiliência, autoconfiança, rede de apoio social e bom relacionamento afetivo e conjugal (Del Prette & Del Prette, 2017).

Por outro lado, foi detectado no escore geral que 37,2% (n = 35) dos professores apresentaram repertório deficitário e indicação para THS, o que pode significar que essa parcela da amostra tinha dificuldade nas interações sociais, além de influência negativa na autoestima e autoeficácia (Soares et al., 2019). Uma proposta para esses casos pode ser o mapeamento das habilidades deficitárias a fim de promover um programa de treinamento focado em seu aperfeiçoamento.

Referente aos fatores do IHS-2-Del-Prette, foram encontrados valores mais elevados nas dimensões Conversação assertiva (F1) e Abordagem afetivo-sexual (F2), que apresentaram repertório de HS classificados de bom a altamente elaborado. Dessa forma, tais resultados indicaram habilidade de iniciar, manter e encerrar conversas, lidar com críticas, falar em público, pedir favores, abordar autoridades e expressar desagrado (Del Prette & Del Prette, 2018), bem como habilidades desenvolvidas de expressões afetivas e sexuais. Já Expressão de sentimento positivo (F3), Autocontrole e enfrentamento (F4) e Desenvoltura social (F5) foram os que demonstraram maior frequência de participantes cujo repertório foi classificado como inferior ou médio inferior, indicativo de dificuldades nesses domínios. Nesse sentido, os achados apontaram que uma parcela dos professores pode ter dificuldades em lidar com demandas de expressar sentimentos positivos, agradecer e fazer elogios, enfrentar críticas e defender indivíduos em grupo, além de caracterizar um repertório deficitário de HS para lidar com situações que exijam autocontrole e enfrentamento com potencial risco de reação indesejável - por exemplo, reagir a críticas injustas, expressar desagrado, discordar de uma opinião ou defender alguém que esteja sendo criticado -, indicativo para a realização de THS (Del Prette & Del Prette, 2018). Também demonstraram problemas relacionados ao conjunto de habilidades que envolvem desinibição e postura em interações sociais.

Pesquisas apontam que a interação estabelecida entre professor e aluno pode influenciar positivamente ou negativamente no desenvolvimento infantil. As práticas negativas relacionadas a comportamentos punitivos (por exemplo, castigos, gritos ou expulsões) tendem a intensificar os problemas em sala de aula, estimulando a agressividade dos alunos, e as habilidades sociais educativas e a relação próxima e afetiva entre professor e aluno tendem a auxiliar o desenvolvimento das HS (Rovai et al., 2022).

Quanto às habilidades de conversação assertiva, algumas investigações (Almeida et al., 2017; Carneiro et al., 2015; Reis et al., 2012; Esteves, 2018 ) vão ao encontro do presente estudo, pois, ao avaliarem professores de ensino fundamental, também identificaram médias mais elevadas em Conversação por meio do IHS-Del- -Prette, em sua primeira versão, que tem forte associação com Conversação assertiva do IHS-2-Del-Prette, utilizado neste estudo, que também apresentou médias elevadas entre os professores (Del Prette & Del Prette, 2018). Uma hipótese para altos escores nesse fator pode estar relacionada ao contexto escolar, que expõe o professor a diferentes situações e o estimula a exercer postura assertiva e habilidades de conversação com seus alunos e colegas. Cabe ressaltar que não foram encontrados estudos utilizando a versão atual do IHS-2-Del-Prette com professores de ensino fundamental, o que dificultou a comparação entre os fatores das pesquisas com as versões antiga e atual do instrumento.

O repertório mais deficitário neste estudo foi constatado na dimensão Autocontrole/Enfrentamento, o que expressa uma dificuldade por parte dos professores no manejo da agressividade e da raiva em situações aversivas, como, por exemplo, possibilidade de rejeição, de oposição, reação a críticas injustas, etc. Tais achados também foram descritos em estudos utilizando a versão anterior do IHS- -2-Del-Prette, em que foram encontrados achados mais deficitários na dimensão Autocontrole da agressividade (Almeida et al., 2017; Carneiro et al., 2015; Reis et al., 2012). No contexto educacional, não ter essa habilidade desenvolvida pode configurar-se como um fator problemático para a manutenção de vínculos e de relações saudáveis, na medida em que o professor pode se descontrolar em situações de conflito com seus alunos.

Na avaliação da empatia, destaca-se o fato de os professores apresentarem ótimos níveis empáticos, com os quatro fatores acima da média. O escore mais elevado foi apontado na dimensão altruísmo, com 95% (n = 89) da amostra acima da média. Esse escore corresponde ao componente afetivo da empatia, que demonstra a capacidade de os professores sacrificarem temporariamente seus interesses com o intuito de auxiliar o próximo (Falcone et al., 2008). Outros estudos corroboram esses resultados, indicando que o altruísmo é o fator que se encontra mais elevado nas pesquisas com professores (Carneiro et al., 2015; Cintra & Del Prette, 2019).

É importante ressaltar que a empatia é uma habilidade primordial do professor, com muitas contribuições para o relacionamento em sala de aula. Considerando o contexto de diversidade na escola, de desigualdade social e de relevância da implementação de práticas responsivas na educação, a empatia é uma habilidade que vem ganhando notoriedade. Apesar disso, ao mesmo tempo que a empatia é essencial, pode-se estabelecer como hipótese que o excesso de altruísmo encontrado no Inventário de Empatia também pode se tornar nocivo, na medida em que o professor deixa suas atribuições e necessidades de lado para atender outras pessoas. Conforme destaca Falcone et al. (2008), o equilíbrio entre assertividade e empatia é relevante, e pode-se inferir que, em sala de aula, o professor assertivo e não empático não conseguirá desenvolver relações interpessoais autênticas com seus alunos, ao passo que o professor excessivamente empático e, consequentemente, não assertivo pode terminar o ano letivo com elevados níveis de estresse e desmotivação.

Por outro lado, na subescala Sensibilidade afetiva, 40% (n = 37) dos professores tiveram escores abaixo da média, o que indica diminuição de sentimentos de compaixão, interesse e consideração pelo estado de outra pessoa (Falcone et al., 2008). No contexto educacional, a sensibilidade afetiva é muito necessária, pois se espera que o professor tenha interesse genuíno por seus alunos e compreenda as dificuldades deles. Em geral, a amostra do estudo apresentou níveis elevados de empatia, especialmente nos componentes afetivos. Frisa-se, no entanto, a importância de um equilíbrio entre todos os componentes da empatia.

Em relação à análise dos coeficientes de correlação obtidos entre HS e empatia, foi verificado que o escore total do IHS-2-Del-Prette se associou inversamente com o Altruísmo. Esse resultado indica que, quanto mais HS os professores têm, menores são seus níveis de Altruísmo (componente afetivo da empatia). Buscando compreender essa indicação, pode-se traçar a hipótese de que as pessoas altruístas, que buscam renunciar às próprias necessidades temporariamente para auxiliar o outro, podem, muitas vezes, não conseguir agir com assertividade. Nesse sentido, enquanto a ausência de altruísmo relaciona-se com o egoísmo, o excesso dessa característica sugere dificuldade em dizer não, em negar pedidos abusivos por parte do interlocutor, levando a condutas de autossacrifício e ocasionando prejuízos ao indivíduo. Tais considerações corroboram o argumento de Huang et al. (2020), que afirmam que algumas dimensões da empatia se associam com a saúde mental, enquanto outras se associam a sintomas de doenças mentais, bem como Bubandt e Willerslev (2015), que constataram que algumas tendências empáticas podem ser consideradas fatores de risco para a saúde.

Da mesma forma, este estudo corrobora os achados de Duarte et al. (2016) sobre as relações entre empatia, autocompaixão e qualidade de vida profissional, que apontaram que altos níveis de empatia afetiva podem ser considerados fatores de risco para a fadiga dos profissionais, enquanto a autocompaixão esteve associada a fatores protetores, concluindo que o ensino de habilidades de autocompaixão e autocuidado é um recurso essencial em intervenções que visem a reduzir o esgotamento e a fadiga. Considerando o contexto do professor, torna-se essencial a adoção de uma postura que vise a equilibrar as próprias necessidades com as dos alunos, evitando sobrecarga.

Em relação à análise dos fatores do IHS-2-Del-Prette, a Abordagem afetivo-sexual se associou inversamente com todos os fatores do Inventário de Empatia (Flexibilidade Interpessoal, Altruísmo e Sensibilidade afetiva), exceto com a Tomada de perspectiva. Esse resultado sugere que, quanto mais elevadas as habilidades para manter conversas com pessoas recém-conhecidas, apresentar-se, declarar e expressar sentimento amoroso, abordagem para iniciar relação sexual (Del Prette & Del Prette, 2018), menos o indivíduo apresenta capacidade para tolerar pensamentos e comportamentos diferentes que causem frustração (Flexibilidade interpessoal), menos capacidade de sacrificar seus interesses em prol de alguém (Altruísmo) e menos sentimentos de compaixão e preocupação pelo estado emocional do outro (Sensibilidade afetiva) (Falcone et al., 2008). Todavia, embora o sujeito com escores elevados na Abordagem afetivo-sexual tenha dificuldade com algumas habilidades empáticas, não significa que não tenha capacidade de entender a perspectiva e os sentimentos dos outros (Tomada de perspectiva). Uma hipótese para esse resultado é que o indivíduo que deseja abordar alguém para iniciar conversa com intuito amoroso ou sexual pode ter uma postura mais ativa, focando inicialmente nos próprios interesses.

A Expressão de sentimento positivo do IHS-2-Del-Prette se associou com o escore total do Inventário de Empatia e com Tomada de perspectiva e Sensibilidade afetiva. Tais resultados indicam que, quanto mais habilidades de expressão de sentimentos positivos o indivíduo tiver, mais habilidades empáticas terá, principalmente em relação à capacidade de compreender as razões e sentimentos do outro (Tomada de perspectiva) e de ter compaixão pelo próximo (Sensibilidade afetiva) (Falcone et al., 2008). A literatura vai ao encontro desses resultados, confirmando que a empatia exerce papel catalisador no processo de desenvolvimento de habilidades afetivas (Ratka, 2018). Além disso, a empatia pode se associar com vários comportamentos e habilidades pessoais, como socialização, flexibilidade, simpatia, inteligência emocional, tolerância, julgamento moral, senso de humor, conscientização, conquista pessoal, influência social positiva, colaboração interprofissional e trabalho em equipe (Hojat, 2016).

O fator Autocontrole/Enfrentamento do IHS-2-Del-Prette se associou inversamente com Flexibilidade interpessoal e Altruísmo do Inventário de Empatia. Nesse sentido, quanto mais habilidades de expressar desagrado, reagir a críticas injustas, defender alguém que esteja sendo criticado, discordar de opiniões contrárias em grupos (Del Prette & Del Prette, 2018) o indivíduo tiver, menos habilidades de flexibilidade interpessoal e de altruísmo estarão presentes. Uma possibilidade para esse resultado é que, embora o indivíduo tenha habilidades de autocontrole e saiba manejar situações de enfrentamento, pode ser intolerante em relação a comportamentos diferentes dos seus ou não ter interesse em atender a necessidades alheias.

De maneira geral, os participantes deste estudo apresentaram bons níveis de HS e de empatia, além de terem sido identificadas algumas associações entre HS e empatia. No entanto, cabe mencionar que alguns fatores do IHS-2-Del-Prette e do Inventário de Empatia explorados neste estudo tiveram uma parcela da amostra com escores abaixo da média e se beneficiariam de um programa de THS com foco nas necessidades deficitárias.

CONCLUSÃO

Este estudo avaliou e identificou as associações existentes entre as HS e a empatia de professores de escolas municipais do ensino fundamental do noroeste do RS. Os principais resultados encontrados referem-se aos níveis elevados de HS de modo geral, com destaque para as dimensões Conversação assertiva e Abordagem afetivo-sexual, indicando boa capacidade dos professores dessa amostra em demonstrar afeto e desempenhar habilidades de comunicação, tendo bom repertório para iniciar, manter e encerrar conversas, lidar com críticas, falar em público, pedir favores, abordar autoridades e expressar desagrado (Del Prette & Del Prette, 2018), bem como habilidades desenvolvidas de expressões afetivas e sexuais.

Em relação à empatia, a maioria dos professores demonstrou ter ótimos níveis, principalmente de Altruísmo, com 95% da amostra apresentando níveis acima da média, embora uma parcela dos participantes (40%) tenha apresentado alguns prejuízos na área específica da sensibilidade afetiva.

Os coeficientes de correlação entre HS e empatia indicam que os professores que expressam seus sentimentos por meio de demonstrações afetivas, conversas e elogios costumam ter mais compaixão e compreensão dos sentimentos alheios. Já os que tiverem uma intensa tendência a doar-se para atender às necessidades alheias, em detrimento das próprias, podem apresentar menos HS.

Conforme os achados do presente estudo, existe uma relação inversa entre o componente afetivo da empatia (altruísmo) e as HS, o que pode indicar tendência a sobrecarregar o indivíduo, fazendo-o subestimar suas necessidades em prol do outro. Em suma, é fundamental compreender a importância que as HS e a empatia desempenham na educação. Apesar disso, as habilidades empáticas precisam estar em equilíbrio para não comprometer a saúde mental do professor.

As limitações deste estudo referem-se ao fato de a amostra ser composta por professores de uma única região do Brasil, que podem apresentar características específicas, de acordo com a cultura local, bem como por ser uma amostra somente de escolas públicas. Sugerem-se novos estudos, a fim de comparar professores de escolas públicas e particulares, da educação infantil, ensino fundamental e médio, de diferentes regiões do Brasil.

Espera-se que os resultados encontrados reforcem a necessidade de investimentos nas HS do professor e no vínculo entre professor e aluno, tendo em vista que um bom repertório de tais habilidades e empatia auxilia no fortalecimento das relações interpessoais. Além disso, é essencial mapear as habilidades deficitárias e propor programas de THS com professores, com o objetivo de qualificar seu repertório, investindo na promoção da saúde mental no ambiente educacional.

COMO CITAR:Heck, C., Zorzo, A., Oliveira, C. R. de, & Wagner, M. F. (2024). Habilidades sociais e empatia em professores do ensino fundamental. Estudos em Avaliação Educacional, 35, Artigo e10501. https://doi.org/10.18222/eae.v35.10501

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Recebido: 29 de Agosto de 2023; Aceito: 22 de Novembro de 2023

NOTA:

A contribuição de cada autora na elaboração do artigo foi: Camila Heck - coleta de dados, análise e discussão dos dados e redação do artigo; Andrieli Zorzo - análise dos dados e redação do artigo; Camila Rosa de Oliveira - análise e discussão dos dados e redação do artigo; Marcia Fortes Wagner - orientação, análise e discussão dos dados e revisão da escrita do artigo.

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