As redes sociais, os canais midiáticos e diversas outras tecnologias aproximam, distraem e acompanham os cotidianos de muitas pessoas nos dias de hoje. Possibilidades de entretenimento, formação e capacitação por meio de diferentes mídias é uma das características do modo de estar no mundo contemporâneo. Diante disto, muitas ideias interessantes ganham visibilidade e disparam novas reflexões acerca da Educação, contudo, é importante destacar que, por outro lado, parte dos conteúdos disponibilizados e acessados são produzidos a partir de vivências e opiniões limitadas que, muitas vezes, prejudicam discussões relevantes para área.
Em função disto, convencionou-se, por meio de uma quantidade considerável de comunicadores leigos, a se acreditar, popularmente, que o campo educacional é moldado por opiniões individuais de diferentes profissionais, políticos e influenciadores que fazem propostas diversas sem conhecerem o dia-a-dia e as dinâmicas que envolvem professores, estudantes e demais sujeitos da área. Neste caso, os argumentos mais comuns - defendidos por quem toma a Educação enquanto lugar de visitação - atacam temas de grande relevância educacional que por anos têm sido investigados, problematizados e transformados por profissionais da área.
A partir de uma combinação de tensões ideológico-políticas, crenças acerca dos saberes educacionais e lógica econômica muitos “especialistas” se colocam à disposição da área de modo irresponsável. Neste contexto, emergiram ou se intensificaram enfrentamentos ideológicos, ideais inovadores - conservadores - e oportunidades de mercado em meio ao caos causado por velhas desigualdades sociais que envolvem as práticas educacionais cotidianas, tanto no mundo quanto no Brasil. Tal situação tem aumentado o abismo existente entre aqueles estudantes que se encontram em posições privilegiadas e aqueles que enfrentam inúmeros desafios sociais e econômicos.
Diante disto, entendemos que o campo da Educação precisa ser discutido de maneira responsável, a partir das proposições de profissionais que o estudam profundamente e o vivem de forma intensa. Não são os julgamentos morais ou os valores individuais que são capazes de resolver os desafios enfrentados por estudantes, professores e pesquisadores, pois as dificuldades são mais profundas e complexas do que muitos pensam. Mais de 1,5 bilhão de estudantes foram prejudicados pela pandemia em todo o mundo. O Relatório de Monitoramento Global da Educação (UNESCO, 2020) indica que mais de 40% dos países mais pobres não apoiaram seus estudantes durante a pandemia. No caso do Brasil o número de crianças e adolescentes sem acesso à educação saltou de 1,1 milhão, em 2019, para 5,1 milhões em 2020 (UNICEF-CENPEC, 2021). Ainda, a desigualdade social foi aprofundada, aumentando a quantidade de pessoas em situação de extrema pobreza. Em março de 2020, havia cerca de 13,5 milhões de pessoas nessa condição. Um ano depois, registrou-se um aumento de 5,8%, equivalente a 784 mil brasileiros. (DIEESE, 2021).
Tais dados indicam que as narrativas leigas e “inovadoras” sobre os rumos da Educação não dão conta das realidades vividas por grande parte dos estudantes e, portanto, direcionam-se apenas a um recorte do sistema educacional, o qual abrange uma pequena porção de brasileiros. Esta questão nos convoca a minimizar as iniquidades que constituem as vidas de milhares de brasileiros e, mais detidamente, de milhares de estudantes e professores. Certamente, é necessário que pensemos sobre a importância das inovações e transformações nos mais diversos contextos pedagógicos, já que esta é uma prática fundamental em qualquer território teóricoprático, contudo fortalece-se a necessidade de estranharmos as desigualdades que sobrecarregam e enfraquecem as políticas públicas de educação.
Nesta direção, entendemos que a colaboração de colegas professores e pesquisadores são de grande valia, pois convidam a pensarmos em desafios e possibilidades de maneira edificante. É por meio destas colaborações que apresentamos a coletânea de artigos de fluxo que compõem a edição de maio/agosto de 2022 da Revista Reflexão e Ação.
No primeiro artigo, Ensino Médio Integral em Tempo Integral: competência socioemocional para uma educação integral?, Daniel de Souza França e Jane Mery Richter Voigt, da Universidade da Região de Joinville (Univille), problematizam o desenvolvimento da competência socioemocional no Ensino Médio Integral em Tempo Integral, tendo em vista a crescente centralidade do tema no que se refere à inserção no mercado de trabalho. Na sequência, em Educação integral, estético-ambiental e cúpula geodésica: contribuições à formação humana, Danielle Müller de Andrade, Fabiana Celente Montiel (ambas do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense - Campus Pelotas- Visconde da Graça) e Elisabeth Brandão Schmidt, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) apresentam potencialidades da construção e utilização de uma Cúpula Geodésica no que se refere ao desenvolvimento da Educação Integral.
No terceiro artigo, Programa Ensino Integral: a proposta do estado de São Paulo, Adriana Locatelli França e Renata Portela Rinaldi, ambas da Universidade Estadual Paulista (UNESP), discutem o Programa Ensino Integral na rede estadual do estado de São Paulo. As autoras o tomam como estratégia para garantia do direito social à educação de qualidade na escola pública. A partir de pesquisa documental e revisão de literatura, discorrem sobre o quanto o Programa se alinha, ou não, da concepção de Educação Integral na perspectiva da omnilateralidade e da emancipação humana.
No texto Educação Integral, Jornada Ampliada e o Pensamento Complexo: ensaios sobre os territórios educativos, Diovane de César Resende Ribeiro, Marcus Vinicius Neves Araujo e Regina Maria Rovigati Simões (Universidade Federal do Triângulo Mineiro) estabelecem relações entre a Educação Integral, a Educação em jornada ampliada, o pensamento complexo e as potencialidades dos territórios para o desenvolvimento social. A seguir, Daniella de Souza Bezerra, do Instituto Federal de Goiás e Thaisa Lemos de Freitas, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás aproximam conhecimentos relativos ao Ensino Médio de Tempo Integral, à Educação Integral e à Epistemologia da Complexidade para discutirem o sentido do tempo e da formação destinada à juventude brasileira. Também, discorrem sobre os sentidos da educação popular na perspectiva integral no artigo intitulado Sob os prismas da educação integral e da complexidade: possibilidades para o Ensino Médio.
No sexto artigo, Promoção de estratégias de aprendizagem no Ensino Superior: desafios para aprender, Luciana Toaldo Gentilini Avila, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e Lourdes Maria Bragagnolo Frison, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) analisam as contribuições de uma oficina sobre aprendizagem oferecida a estudantes de diferentes cursos de graduação de uma Universidade Pública. Em Educação social e saberes necessários: análises a partir de experiências em acolhimento institucional, Verônica Regina Muller e Paula Marçal Natali, da Universidade Estadual de Maringá (UEM), em parceria com Karine dos Santos, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), escrevem sobre os saberes relevantes para a prática dos educadores sociais em casas de acolhimento institucional.
O próximo manuscrito, intitulado Fake News: produção colaborativa de vídeo no contexto da cibercultura é de Jessica Chagas Oliveira e de Edvaldo Souza Couto, ambos da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Nele, autora e autor transitam pelos estudos da cibercultura para analisarem os processos de produção colaborativa de um vídeo em sala de aula. Na sequência, em Notificação de violência interpessoal/autoprovocada: ação no contexto de formação de enfermeiros, de Fabiana Veronez Martelato Gimenez e Sandra Regina Gimeniz-Paschoal, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), apresentam práticas educativas, no contexto da formação de enfermeiros, acerca de notificações de violência.
Formação Docente e Educação Inclusiva: elementos para uma interseção é o décimo artigo da edição. Escrito por Ademárcia Lopes de Oliveira Costa (Universidade Federal do Acre), Robéria Vieira Barreto Gomes (Universidade Federal do Ceará) e Maria Irinilda da Silva Bezerra (Universidade Federal do Acre) apresenta uma reflexão sobre a importância da formação docente na direção da inclusão. Após, em Atendimento Educacional Hospitalar: atribuições e contribuições da organização do trabalho pedagógico, Leila Cristina Mattei Cirino, Jacques Lima Ferreira e Ricardo Antunes de Sá, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA), discorrem sobre uma investigação de abordagem qualitativa sobre a relação entre organização do trabalho pedagógico e atendimento educacional hospitalar.
Elisangela da Sila Bernardo (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro- Unirio), Flavia Gonçalves da Silva (Universidade Federal Fluminense- UFF) e Rosângela Cristina Rocha Passos Felix (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro- Unirio) são as autoras do artigo intitulado Ensino Médio Inovador: os desafios da Educação Integral e(em) Tempo Integral para a juventude. Nele, apresentam uma reflexão sobre os desafios da implantação do Ensino Médio Integral e(m) Tempo Integral desenvolvido pela Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro.
Análise da meta 4 do Plano Nacional de Educação: estudos realizados em Mangaratiba - RJ, de Elaine Alves Leite, Sérgio Crespo Coelho da Silva Pinto e Ruth Maria Mariani Braz, pesquisadoras e pesquisador da Universidade Federal Fluminense, apresenta uma análise do cumprimento da Meta 4 do Plano Nacional de Educação no município de Mangaratiba. Em Inovação pedagógica: concepções que orbitam este conceito, de Joao Ferreira Sobrinho Junior e Nyuara Araújo da Silva Mesquita, da Universidade Federal de Goiás, apresentam concepções relacionadas a inovação pedagógica. Neste sentido, argumentam que a inovação pedagógica se estabelece pelo criar, adequar ou readaptar técnicas ou tecnologias.
No último artigo da edição O papel dos anciãos na preservação e divulgação do etnoconhecimento Terena em escolas indígenas no estado de Mato Grosso do Sul, de Paulo Roberto Vilarim, Décio Ruivo Martins, Sérgio Paulo Jorge Rodrigues, da Universidade de Coimbra, e Jorge Eremites de Oliveira, da Uiversidade Federal de Pelotas (UFPel), analisam o papel dos anciãos na preservação e divulgação do etnoconhecimento Terena no contexto de escolas públicas existentes em aldeias Terena, localizadas no estado de Mato Grosso do Sul.
Ainda, apresentamos a entrevista intitulada La escuela y el tiempo escolar en América Latina, feita pelo Professor Éder da Silva Silveira, do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul, com Sergio Martinic, Professor e Chefe do Deapartamento de Ciências Sociais da Universidade de Aysén, no Chile.
Esperamos que a leitura dos artigos e demais textos seja produtiva e que desperte novas discussões sobre o campo da Educação.