Introdução
Criado por meio da Lei 12.513, de 26 de outubro de 2011, o Pronatec - Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego foi concebido para ofertar cursos profissionalizantes gratuitos, promovendo a expansão, interiorização e democratização da oferta de educação profissional e tecnológica no país, fomentando a ampliação das oportunidades de educação e de formação profissional de um público carente destas ofertas (Ministério da Educação [MEC], 2016).
Entretanto, poucas análises foram realizadas no sentido de entrelaçar os vultosos números relativos ao investimento no programa com o efetivo impacto da formação profissional ofertada para a ocupação de vagas de postos formais de trabalho no mesmo período.
Temos presente que a implementação deste programa atua no sentido de materializar ações que atendam aos ‘anseios’ presentes nos discursos governamentais e dos representantes dos setores econômicos, nos quais se apontam a relação entre a escassez de mão de obra qualificada no Brasil e as implicações negativas desta carência para o desenvolvimento econômico e tecnológico do país.
Neste contexto, o presente estudo é resultado de uma pesquisa que se propôs à análise da oferta dos cursos do Pronatec, no período de 2011 a 2015, considerando o argumento (a justificativa) de existente deficiência de mão de obra qualificada para atender aos requerimentos dos setores produtivos econômicos, em especial, no município de Cascavel, estado do Paraná.
Para subsidiar esta reflexão, realizou-se o entrelaçamento dos dados referentes aos cursos ofertados e as necessidades sinalizadas pelos setores econômico e demandantes, expressos pelos dados do MTE, CAGED, IBGE, IPARDS, RAIS, CNI, FIEP, SEED e Agência do Trabalhador. Tal análise alicerçou a construção de um panorama da oferta da Educação Profissional, em que se construiu a representação da demanda de oferta de cursos Pronatec e dos postos de trabalho ofertados. Nesse panorama, foi possível constatar se os cursos atendem aos requerimentos dos setores produtivos e, ainda, se houve significativo aumento nas taxas de ocupação dos postos formais de trabalho por meio dos encaminhamentos realizados pela Agência do Trabalhador no município de Cascavel, estado do Paraná.
Embora tenha sido lançado em 2011, o Pronatec é uma política pública resultante de uma série de ações iniciadas na década anterior, na ocasião do lançamento do Plano Nacional de Educação - PNE, relativo ao período 2001-2010. Tais ações encaminham-se para as ‘tratativas’ referentes ao discurso de escassez de mão de obra qualificada no Brasil, proferido pelos representantes dos setores econômicos e, endossados pelos governantes, que, historicamente, sinalizam essa condição como um dos principais entraves do desenvolvimento econômico do país.
Feres (2015) considera que o PNE almejava a consolidação de uma visão sistêmica da educação, verificada no tracejar de metas e rumos para as políticas públicas da área de educação que convergiam para o vínculo da educação profissional ao Sistema de Educação Nacional, em contrariedade à fragmentação observada nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996.
Já em 2007, o Governo Federal apresentou o Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, no qual foram vinculadas ações de assistência técnica e financeira da União para Estados e Municípios que cumprissem as metas de qualidade estipuladas no Plano de Ações Articuladas - PAR.
Sequencialmente, em 2008, obteve-se a aprovação da Lei que criou os Institutos Federais de Educação Tecnológica - IFETS, possibilitando a formação de uma rede que compreende, além dos Institutos Federais, outras instituições que oferecem educação profissional em todos os níveis. Isso subsidiou a criação do Programa Brasil Profissionalizado; da Rede e-Tec Brasil, de ensino a distância; do Acordo de Gratuidade com o Sistema S; e a criação do Sistema Nacional de Informações da Educação Profissional e Tecnológica - Sistec.
Na análise de Feres (2015), enquanto o Brasil Profissionalizado almejou a estruturação e ampliação da estrutura física das redes estaduais de educação profissional e tecnológica, a Rede e-Tec buscou fortalecer a oferta da educação profissional a distância. No tocante ao Acordo de Gratuidade, o Sistema S assumiu o compromisso de aplicar, a partir de 2014, dois terços dos recursos provenientes do compulsório para oferta de cursos técnico de nível médio, qualificação profissional ou formação inicial continuada, ao público de baixa renda.
Essa foi a estruturação que precedeu o lançamento do Pronatec, que por meio de iniciativas próprias ou interligando-se a outros programas, abarca uma série de subprogramas, projetos e ações de assistências técnica e financeira.
A Bolsa Formação1 apresenta-se como a iniciativa de maior impacto do programa ao promover o pagamento de bolsas de estudo para as escolas ofertantes, tanto públicas quanto privadas, para que estas custeassem as despesas com os cursos (pagamento de professores, insumos, material didático e kit escolar), e a assistência estudantil aos alunos (alimentação e vale transporte). Além do aporte financeiro, sua amplitude refere-se também ao rol de parceiros ofertantes - Institutos Federais, Universidade Federais e Estaduais, redes estaduais e distritais de educação profissional, Sistema S e fundações públicas mantenedoras de escolas que ofertam cursos técnicos, e demandantes - cerca de 15 Ministérios e todas as Secretaria Estaduais e Distritais de Educação, mobilizadoras de Centros de Referência em Assistência Social (Cras), Secretarias Municipais de Turismo, Cultura, Emprego, entre outras.
Os cursos ofertados por esta rede de ensino atendeu, prioritariamente aos/à(s): estudantes do Ensino Médio e da Educação de Jovens e Adultos da rede pública; trabalhadores; beneficiários, titulares e dependentes dos programas federais de transferência de renda; pessoas com deficiência; comunidades étnicas; adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas; egressos do ensino médio da rede pública ou de instituições privadas, desde que tenha estudado na condição de bolsista integral.
Entre 2011 e 2014, o programa registrou mais de 6 milhões de matrículas no país (Tabela 1). A análise dos dados do Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação - SETEC/MEC (2013), relativos às matrículas realizadas em cada uma das iniciativas agrupadas pelo Pronatec, demonstram a expressividade dos números presentes na modalidade de Formação Inicial Continuada, componente do Bolsa Formação, ofertada pelos Sistema S.
Enquanto as Redes Estaduais registraram 5% de matrículas e a Rede Federal 15%, a iniciativa do Acordo do Sistema S permaneceu com 80%, divididos em 43% SENAI, 30% SENAC, 4% SENAT e 3% SENAR. O público mais beneficiado com o programa foi o encaminhado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome - MDS, com 40,9% das matrículas, seguido pela Secretaria de Educação e Cultura - SEDUC, com 20,2%. As inscrições on-line, sem demandante específico, representaram 23,6% das matrículas; o Ministério do Trabalho e Emprego - MTE 5,1%; e a soma de outros demandantes pontuaram 10,6% de matrículas no período (SETEC/MEC, 2013).
Ainda em julho de 2014, a então Presidente Dilma Rousseff lançou o Pronatec 2.0 com a promessa de oferecer 12 milhões de vagas em 220 cursos técnicos e em 646 cursos de qualificação a partir de 2015 (Brasil Sorridente e Pronatec, 2014). Entretanto, mesmo com o anúncio da efetivação do Pronatec como Programa de Estado, em 2015, os cortes no orçamento do governo - 9,5 bilhões somente no Ministério da Educação ocasionaram uma brusca queda no número de vagas anunciadas. De três milhões, a previsão passou a um milhão, com efetivação de apenas de 288.000, ou seja, uma redução de mais de 60% das vagas. Mesmo assim, na totalidade, os números de matrículas e de investimentos mostram-se expressivos, conforme demonstrado na Tabela 2.
Cursos técnicos | 2011 | 2012 | 2013 | 2014* | Total | |
Bolsa Formação | Previsto | 9415 | 99.149 | 151.313 | 151.313 | 411.190 |
Executado | 0 | 101.541 | 304.966 | 28.823 | 435.330 | |
Brasil Profissionalizado | Previsto | 33.295 | 90.563 | 172.321 | 233.781 | 529.960 |
Executado | 82.823 | 79.770 | 70.355 | 0 | 232.948 | |
E-TEC | Previsto | 74.000 | 150.000 | 200.000 | 250.000 | 674.000 |
Executado | 75.364 | 134.341 | 137.012 | 0 | 346.717 | |
Acordo com o Sistema S | Previsto | 56.416 | 76.119 | 110.545 | 161.389 | 404.469 |
Executado | 85.357 | 102.807 | 132.289 | 0 | 320.453 | |
Rede Federal EPCT | Previsto | 72.000 | 79.560 | 90.360 | 101.160 | 343.080 |
Executado | 117.621 | 119.274 | 121.958 | 7.788 | 366.641 | |
Cursos FIC | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | Total | |
Bolsa Formação | Previsto | 226.421 | 590.397 | 743.717 | 1.013.027 | 2.574.102 |
Executado | 22.876 | 531.101 | 1.243.047 | 356.746 | 2.153.770 | |
Acordo como o Sistema S | Previsto | 421.723 | 570.020 | 821.965 | 1.194.266 | 3.007.974 |
Executado | 582.931 | 733.223 | 844.561 | 2.160.735 | 4.321.450 | |
Total Geral Fic + Técnicos | 967.772 | 1.802.057 | 2.854.208 | 393.357 | 6.016.594 |
* Até 3/3/2014. Fonte: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos [CGEE] (2015a), e SETEC/MEC (2013).
Iniciativa | Investimento no período |
Bolsa Formação | 8.284.725.453,81 |
Expansão e reestruturação da Rede Federal | 5.199.892.371,84 |
Rede e-Tec Brasil | 556.567.615,83 |
Brasil Profissionalizado | 1.049.931.687,80 |
Total | 15.091.117.129,28 |
Fonte: CGEE (2015a) Siafi Gerencial. Elaborado pela Setec/MEC (2013).
Em suma, entre os anos de 2011 a 2015, o Governo Federal materializou, através do Pronatec, uma série de ações voltadas à ‘ampliação’ da oferta de educação profissional para ‘sanar a escassez de mão de obra qualificada’, investindo mais de 15 bilhões no Programa, que suscitaram cerca de 6.304.594 de matrículas.
Entretanto, tais investimentos tiveram relativo impacto na ocupação dos postos de trabalho formais, que, conforme os discursos dos setores econômicos, não são preenchidos por falta de mão de obra qualificada? Como é feito o acompanhamento dos egressos destes cursos para mapear sua inserção no mercado de trabalho?
Embora não existam dados oficiais ou não oficiais de que a oferta do Pronatec, na amplitude de suas articulações, proporcionou ou não o ingresso do público por ele atendido no mercado formal de trabalho, aumentando a empregabilidade e proporcionando melhoria de qualidade de vida, em atendimento aos objetivos primeiros do programa, algumas medidas foram deflagradas, em 2013, pelo MEC. Entre essas medidas estavam previstas a elaboração do Mapa da Educação Profissional, elaborado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE); o desenvolvimento de um sistema de avaliação dos cursos técnicos elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira - INPE; e outro sistema, para avaliação de egressos dos cursos técnicos e FIC, elaborado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas - IPEA. Em 2015, o CGEE apresentou o Mapa da Educação Profissional e Tecnológica do Brasil, expondo dados para subsídios da oferta da EPT no país, porém, as propostas dos sistemas de avaliações, até o momento, não se concretizaram (SETEC/MEC, 2013).
No Relatório Final do Mapa desenvolvido pela CGEE (2015b), a expansão da educação profissional oportunizada pelo Pronatec aconteceu na proporção de 29% de vagas para cursos técnicos e 71% para cursos FIC, evidenciando uma política de educação profissional que privilegia cursos de curta duração. O estudo considera que este é um ponto de atenção, pois essa oferta se volta, prioritariamente, para uma população de baixa escolaridade, com dificuldade de retorno aos bancos escolares, relegando, a segundo plano, a formação profissional de nível médio.
Com o intuito de verificar em que medida o Pronatec contribuiu como política pública para ampliação da oferta de educação profissional, e, se essa oferta tem atendido aos requerimentos dos setores econômicos, é necessária uma leitura sobre o mercado de trabalho e as perspectivas de vagas ofertadas nas diversas áreas profissionalizantes, em curto e médio prazo, conforme apontado por Feres (2015).
Para esta análise, foi realizado o entrelaçamento dos dados relativos à oferta de postos de trabalho em Cascavel - PR, coletado em indicadores do CAGED, IPARDS, IBGE e MTE, versus os cursos ofertados pelo Pronatec. A relação entre a oferta de formação profissional com as vagas ofertadas pela Agência do Trabalhador no município demonstra se há coerência nesse processo, ou seja, se a oferta de cursos é condizente com a demanda sinalizada.
Os dados da Agência do Trabalhador foram tidos como ponto de partida desta análise por considerar que, além de serem demandantes dos cursos do Pronatec, mobilizando e encaminhando os beneficiários do programa, também administram os serviços de recrutamento, seleção e colocação de trabalhadores no mercado de trabalho sob a égide da Divisão de Intermediação de Mão de Obra - DIM. Os serviços ofertados pelas Agências do Trabalhador são gratuitos e objetivam informar e orientar trabalhadores e empregadores, fazendo a intermediação entre ambos (Secretaria da Justiça, Trabalho e Direitos Humanos [SEJU], 2015).
Para o estudo, foi analisado o perfil de vagas descrito nos anúncios da Agência do Trabalhador em Cascavel, com o perfil dos candidatos inscritos e colocados. Os dados são relativos ao ano de 2011 e foram extraídos do portal eletrônico da Secretaria da Justiça, Trabalho e Direitos humanos - SEJU, contemplando os segmentos de intermediação por atividade econômica, perfil combinado dos colocados, perfil combinado dos candidatos e perfil combinado de exigência de vagas.
A estratificação da evolução de encaminhamentos para postos de trabalho realizados pela Agência, entre 2011 e 2015, demonstra uma oscilação na oferta de vagas, com quedas expressivas que acompanharam o movimento nacional no mesmo período (Tabela 3).
Os dados demonstram que a maior demanda de vagas ofertadas está concentrada nos setores de comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas, indústria de transformação, construção, atividades administrativas, alojamento/alimentação, transportes e armazenagem (Tabela 4).
O maior ponto de atenção é que o número de colocados é sempre aquém às ofertas de vagas e, ainda mais discrepante se considerarmos os encaminhamentos para o preenchimento das ocupações, conforme evidenciado na Tabela 5. Essa permanência de vagas em aberto, mesmo havendo um grande número de pessoas encaminhadas para as ofertas, é percebido, também, nos dados nacionais.
Ano | Inscritos | Vagas | Encaminhados | Colocados | Taxa de ocupação das vagas % |
2010 | 24.310 | 10.775 | 33.251 | 3.351 | 31,10 % |
2011 | 22.199 | 11.154 | 35.695 | 3.537 | 31,71 % |
2012 | 15.605 | 8.888 | 34.497 | 4.617 | 51,95 % |
2013 | 13.330 | 10.148 | 29.194 | 3.689 | 36,35 % |
2014 | 13.061 | 12.567 | 32.463 | 3.598 | 28,63 % |
2015 | 10.878 | 9.693 | 33.399 | 3.290 | 33,94 % |
Total | 99.383 | 63.225 | 198.499 | 22.082 | 35% |
Fonte: Base GAP - Prestação de Contas, Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (2015). Tabela elaborada pela Autora.
Atividade econômica | Vagas | Encaminhados | Colocados |
Comércio; Reparação de Veículos Automotores e Motocicletas | 2940 | 9640 | 995 |
Indústrias de Transformação | 1667 | 4243 | 446 |
Construção | 853 | 1166 | 155 |
Atividades Administrativas e Serviços Complementares | 579 | 1817 | 183 |
Alojamento e Alimentação | 447 | 1749 | 86 |
Transporte, Armazenagem e Correio | 438 | 1340 | 109 |
Atividades Profissionais, Científicas e Técnicas | 324 | 1115 | 189 |
Não Definido/Não Cadastrado | 258 | 579 | 68 |
Agricultura, Pecuária, Produção Florestal, Pesca e Aquicultura | 203 | 473 | 104 |
Informação e Comunicação | 194 | 373 | 31 |
Artes, Cultura, Esporte e Recreação | 130 | 487 | 45 |
Atividades Financeiras, de Seguros e Serviços | 112 | 286 | 26 |
Saúde Humana e Serviços Sociais | 68 | 243 | 24 |
Atividades Imobiliárias | 41 | 67 | 5 |
Água, Esgoto, Atividades de Gestão de Resíduos e Descontaminação | 24 | 63 | 8 |
Eletricidade e Gás | 8 | 15 | 0 |
Indústrias Extrativas | 4 | 1 | 0 |
Administração Pública, Defesa e Seguridade Social | 1 | 2 | 0 |
Totais | 8291 | 23659 | 2474 |
Fonte: Base SIMO Internet (SEJU, 2015).Tabela elaborada pela Autora.
Ano | Trabalhadores Inscritos para Intermediação | Vagas captadas junto a empregadores | Encaminhamentos para entrevistas | Trabalhadores colocados no mercado de trabalho | % de Vagas preenchidas |
2000 | 4.805.733 | 1.281.220 | 2.559.597 | 581.618 | 45,40% |
2001 | 4.687.001 | 1.435.173 | 2.884.805 | 742.880 | 51,76% |
2002 | 5.118.563 | 1.648.542 | 3.445.531 | 869.585 | 52,75% |
2003 | 5.443.121 | 1.560.502 | 3.428.546 | 844.572 | 54,12% |
2004 | 4.872.769 | 1.670.751 | 3.553.823 | 886.483 | 53,06% |
2005 | 4.977.550 | 3.869.769 | 1.718.736 | 893.728 | 23,10% |
2006 | 5.148.720 | 4.031.713 | 1.772.282 | 878.394 | 21,79% |
2007 | 5.428.622 | 4.866.693 | 2.060.917 | 980.997 | 20,16% |
2008 | 5.990.907 | 5.781.814 | 2.526.628 | 1.068.114 | 18,47% |
2009 | 5.894.722 | 6.019.575 | 2.538.081 | 1.018.807 | 16,92% |
2010 | 5.497.650 | 3.660.711 | 7.729.292 | 1.246.201 | 34,04% |
2011 | 4.708.101 | 2.569.720 | 5.883.262 | 933.613 | 36,33% |
2012 | 6.144.893 | 2.642.970 | 5.490.055 | 658.862 | 24,93% |
2013 | 5.802.948 | 2.901.446 | 6.192.575 | 749.115 | 25,82% |
2014 | 5.185.085 | 2.600.860 | 5.571.657 | 676.032 | 25,99% |
2015 | 2.885.405 | 1.143.410 | 3.060.051 | 324.412 | 28,37% |
Total | 81.902.250 | 47.441.551 | 59.735.744 | 13.271.159 | 27,97% |
*Dados até 11/8/2015. Fonte: Base de Gestão da Intermediação de Mão de Obra BGIMO (MTE, 2016).
As causas para a não ocupação dessas vagas permanecem obscuras, uma vez que a relação entre o perfil requerido para a ocupação da vaga e o perfil dos candidatos encaminhados, em sua grande maioria, são compatíveis em níveis de escolaridade. A experiência profissional também não seria o fator dominante, pois, conforme dados do SEJU (2015), 74,79% das vagas não requeria comprovação de experiência em carteira de trabalho (Tabela 6).
É inquietante que vagas de trabalho permaneçam ociosas, mesmo com uma parcela significativa de candidatos apresentando os requisitos mínimos para preenchimento. Cabe refletir, ainda, que, se quase 80% das empresas não apontam necessidade de experiência profissional registrada em carteira, o que caracteriza a mão de obra qualificada tão escassa no mercado de trabalho? Se existe a necessidade de formação profissional, possivelmente, os cursos de rápida formação, foco de investimento do Pronatec, podem não atender às expectativas de formação profissional desejado pelos setores produtivos. Porém, é preciso ressaltar que cursos de 160 horas formam um profissional apto a iniciar as atividades no oficio. Caberia, às empresas, assumir parte da formação destes trabalhadores, uma vez que a espera pelo profissional ‘pronto’, com o pacote de competências completo, parece não existir.
Araujo e Borges (2000) analisam que as dificuldades estruturais do mercado de trabalho são mascaradas pela imposição da qualificação como condição de empregabilidade. Esse conceito exime o governo da responsabilidade quanto ao desenvolvimento e adoção de políticas públicas para esse fim, isenta as empresas da responsabilidade na formação do trabalhador e relega ao indivíduo todo e qualquer ônus por sua inserção no mercado de trabalho.
Esse viés político de atuação na esfera educacional está em consonância com os ditames dos organismos internacionais. Na percepção do Banco Mundial (2010), a educação atua de modo compensatório sobre a situação de pobreza causada pelos ajustes econômicos. Ela também é apontada como um mecanismo fundamental na promoção de um novo padrão de acúmulo de capital, considerando que, conforme os discursos oficiais, é pela educação que se promove o desenvolvimento social, o aumento da coesão social e de melhores oportunidades para a população que, apta, pode usufruir de políticas ‘corretas’ (Deitos, & Lara, 2016).
A oferta de qualificação no escopo do Pronatec, mesmo sem considerar as necessidades estruturais do mercado de trabalho, é muito elogiada pelo Banco Mundial. No documento - Achieving World Class Education in Brazil: The Next Agenda (Alcançando uma Educação de Classe Mundial no Brasil: A Próxima Agenda), publicado em 2010, a entidade discorre elogios às políticas e reformas educacionais implantadas pelos governos dos últimos 15 anos, entre elas, o Pronatec, e continua ditando as perspectivas e os caminhos das políticas educacionais de seu modelo hegemônico de educação, sociedade e Estado.
Esse discurso neoliberal do Banco Mundial, na perspectiva de Cruz (2003), recupera e reformula a Teoria do Capital Humano2 ao apontar uma suposta relação de dependência entre educação e desenvolvimento econômico e social, em que se supervaloriza o desempenho individual como determinante da condição de cada um na sociedade. Nesta ótica, transpõe a lógica do mercado para a educação, e elege a livre concorrência como fundamental para a garantia da eficiência e da qualidade dos serviços educacionais prestados.
Escolaridade | Perfil da Vaga | Perfil do Candidato | Perfil dos Colocados | Média Salarial com maior % de oferta |
Analfabeto | 4,49% | 0,22% | 0,11% | <1 até 3 |
Alfabetizado | 9,18% | 0,28% | 0,08% | <1 até 3 |
Primário Incompleto | 6,56% | 2,78% | 0,64% | <1 até 3 |
Primário Completo | 14,92% | 6,0% | 3,21% | <1 até 3 |
Primeiro Grau Incompleto | 10,87% | 13,73% | 11,82% | <3 até 5 |
Primeiro Grau Completo | 9,89% | 9,9% | 8,08% | <3 até 5 |
Segundo Grau Incompleto | 7,80% | 16,13% | 15,60% | <3 até 5 |
Segundo Grau Completo | 21,93% | 35% | 43,01% | <3 até 5 |
Superior Incompleto | 0,69% | 9,0% | 9,18% | <3 até 5 |
Superior Completo | 2,78% | 7,06% | 7,3% | <3 até 5 |
Indiferente | 9,75% | - | - | - |
Fonte: Base SIMO Internet, SEJU (2015). Tabela elaborada pela Autora.
Mota Junior e Maués (2014) trazem à tona a perspectiva economicista de educação nesta perspectiva ao considerar que o sistema educacional deve desempenhar três papéis primordiais, sendo: o desenvolvimento de habilidades da força de trabalho para sustentar o crescimento econômico; a contribuição para a redução da pobreza e desigualdade, buscando a oferta de oportunidade educacional para todos; e voltar-se à transformação de gastos na educação em resultados educacionais. Essa concepção está impregnada da Teoria do Capital Humano ao defender que as pesquisas internacionais demonstram que o Capital Humano, ao ser considerado como a média de escolaridade da força de trabalho, atua como elemento crítico para o crescimento econômico.
Frigotto (2009) alerta para o caráter falso do legado do economicismo, quando situa a educação como um capital (humano) motor do desenvolvimento e da superação da desigualdade entre nações e entre classes ou grupos sociais, sem, contudo, modificar as relações de poder e de classe (as circunstâncias) que produzem a desigualdade.
Percebe-se não se tratar de uma política para a educação para todos, mas sim, de uma política social voltada à formação imediata de mão de obra na perspectiva da empregabilidade3, sem discutir a questão do emprego, enfatizando as práticas neoliberais embasadas no Estado não interventor, incentivo à individualidade e discurso da igualdade de oportunidades.
Lima (2012) nos adverte de que o lançamento do Pronatec promoveu a continuidade da política de precarização e adaptação da formação técnica secundária aos interesses do capital, pois, conforme analisa,
PRONATEC é muito mais do que a adaptação do PROUNI (Programa Universidade Para Todos, que transfere recursos públicos para instituições privadas, através de Bolsas) para o ensino técnico. A Lei 12.513/2011 alterou configurações do FAT (fundo de Amparo ao Trabalhador), do seguro desemprego, do FIES (Fundo de Financiamento do Estudante de Ensino Superior) e dos programas de transferências de renda. O Pronatec é a materialização das recomendações da UNESCO de que os governos da América Latina deveriam utilizar o modelo do Sistema ‘S’ para a formação profissional (Lima, 2012, p. 10).
Um dos objetivos da educação profissional, em todos os seus níveis, refere-se ao desenvolvimento de uma habilidade profissional para que o indivíduo atue como cidadão dentro de um contexto socioeconômico, com geração de ganhos. Porém, mesmo após qualificado, depara-se com um mercado de trabalho seletivo, que exige cada vez mais e mais saberes, habilidades e competências, que agregue ganhos de produtividade para a empresa, sem refletir, necessariamente, em melhores salários aos trabalhadores.
O salto tecnológico, com uma nova etapa de desenvolvimento industrial vislumbrado para o Brasil, somente será possível com a mudança do atual modelo enraizado em trabalho pouco qualificado que gera altos lucros para as empresas. Seria mais pertinente um projeto que vislumbrasse a importância do investimento no trabalho qualificado, com lucros menos gananciosos e mais distribuídos, possibilitando a equidade e a inserção social, sem necessidade de políticas compensatórias de quase nenhum retorno (CGEE, 2015b).
Considerações finais
Os dados analisados demonstram que a oferta de educação profissional, na esfera do Pronatec, não teve impacto no suprimento dos postos de trabalho formais ofertados. No período de análise, as vagas permaneceram em aberto mesmo com uma grande demanda de candidatos (qualificados) encaminhados.
No Brasil, foram 9,4 milhões de matrículas. Em Cascavel, somente entre 2011 e 2015 foram capacitadas sete mil pessoas. No mesmo período, foram ofertadas, pela Agência do Trabalhador, de 8 a 12mil vagas, e apenas uma média de 3.680 dessas foram efetivamente ocupadas. Ou seja, mais de 50% permaneceram em aberto, embora 74% delas não exigissem experiência profissional.
Isso nos conduz ao entendimento de que o Programa se caracteriza como uma política social para a empregabilidade, com formação imediata de mão de obra, sem discutir a questão do emprego, fortalecendo os preceitos neoliberais que incentivam a individualidade e o discurso da igualdade de oportunidades.
Embora seja anunciado como um grande investimento na Educação Profissional, tida como alavanca do desenvolvimento econômico e social do país, a maior parte dos recursos foram investidos em cursos de formação inicial e continuada, que atende aos setores de produção de produtos de baixa qualidade, baixo conteúdo tecnológico, e baixos salários, indo na contramão dos modelos de produção emergentes no cenário mundial, contribuindo para o desemprego a longo prazo.