EDUCAÇÃO E AVALIAÇÃO CIENTÍFICA: UMA PREMISSA
Neste artigo, a educação e a avaliação científica ganham um significado peculiar, correlacionado com o ambiente igualmente peculiar da creche onde desenvolvemos esta pesquisa.
Em particular, a educação científica é definida como a promoção do pensamento crítico e reflexivo (Dewey, 1949; Vygotskij, 1960; 1978; Bruner, Wood, Ross, 1976) e se concentra no desenvolvimento de conhecimento relacionado a coisas animadas e não e ao ambiente natural. De acordo com Dewey, o sujeito promove essas habilidades por meio de um processo de investigação, revelando e destacando questões. Nesse processo, é fundamental observar e apresentar as hipóteses, soluções e sua verificação.
A análise da produção científica nacional e internacional sobre ensino de ciências destacou aspectos que podem ser rastreados a partir de três linhas principais de investigação.
Sensibilização para questões ambientais (Educação Ambiental) (Duhn 2012; Erdogan et al. 2012; Cutter-MacKenzie et al. 2014).
A redescoberta do mundo natural através de uma relação direta com plantas e animais (experiência da agro-creche, creche na floresta) (Faber Taylor et al. 1998; Louv 2005; Peta, Ventura e Savarese 2013).
A importância de iniciar as crianças num método de investigação dos fenômenos do mundo natural. (Inan, Trundle e Kantor 2010; Giordano 2013; Andersson e Gullberg 2014).
Só esta última linha de investigação se centra explicitamente num ensino de ciências destinado a apoiar a relação da criança com a natureza em termos cognitivos. Em particular, emerge do fato de que o ensino de ciências na Educação Infantil não pode ser reduzido à simples transmissão de noções científicas. É fundamental propor caminhos que sustentem processos científicos de se relacionar e vivenciar o mundo, sabendo que as crianças, mesmo de modo embrionário, ativam espontaneamente esses processos desde a primeira infância.
A avaliação é um tema amplamente debatido e polêmico no campo educacional. Por um lado, parece haver um consenso geral de que avaliar é uma ação complexa que requer observação, documentação e consideração para melhorar a abordagem educacional. Por outro lado, há objeções relacionadas a uma perspectiva mais tradicionalista, que ainda considera a avaliação uma mera prática voltada para o julgamento dos desempenhos (Vertecchi, 2016).
Alguns documentos europeus (Indicazioni Nazionali italiane per il Curricolo della Scuola dell'Infanzia e del Primo Ciclo di Istruzione, 2012; Quality Toolbox: Executive Summary, 2012; Proposal for Key Principles of a Quality Framework for Early Childhood Education and Care, 2014) categoricamente recusam a ideia de avaliação como uma simples classificação e julgamento. Pelo contrário, a avaliação realizada pelo professor visa reconhecer, descrever e promover o crescimento e o desenvolvimento. Os documentos anteriormente citados transmitem um papel central nas estratégias profissionais de observação e documentação, salientando a importância da autoavaliação das crianças e dos professores. Analisar os documentos coletados anteriormente em grupos nos ajuda a reconhecer a coerência entre conceitos pedagógicos, escolhas culturais e ações realizadas para implementá-los (Raso, Lampugnani, Marone, Lichene, 2020). Nessa perspectiva, a avaliação é uma ferramenta fundamental na melhoria da educação escolar e no organizar as ações educativas que promovem o desenvolvimento infantil. De acordo com esse conceito, a Proposal for Key Principles of a Quality Framework for Early Childhood Education and Care (2012) afirma que a avaliação deve reconhecer, acompanhar, descrever e documentar os processos de desenvolvimento sem classificar e julgar os desempenhos.
Este tipo de avaliação requer observação cuidadosa e sistemática para distinguir as habilidades que a criança já possui daquelas que está adquirindo. Essas potencialidades devem ser reconhecidas e consolidadas para orientar escolhas e intervenções educacionais para estimular o crescimento contínuo das crianças. O professor deve apoiar (scaffolding), encorajar e facilitar o desenvolvimento harmonioso das crianças (Bruner, Wood, Ross, 1976). Esses procedimentos de avaliação precisam considerar as experiências cotidianas das crianças e convencer o professor a se concentrar no processo, assumindo a responsabilidade pelo método educacional escolhido, reconhecendo os sucessos e fracassos. Essa perspectiva explica o significado da avaliação educacional no que diz respeito aos processos de desenvolvimento e progresso da criança.
Nesta pesquisa sobre ensino de ciências, a avaliação é considerada um processo que “regula”, guia e orienta o esforço educacional, o procedimento do pesquisador e as ações dos professores. (Bondioli, Ferrari, 2006; Gariboldi, 2007; Bondioli, 2015; 2015b).
Realizamos um estudo exploratório com o objetivo de conhecer e analisar os melhores contextos - espaço, tempo e abordagens educativas - para estimular e promover o desenvolvimento do pensamento científico na Educação Infantil (Dewey, 1933; 1938; Isaacs, 1930, 1933; Bruner, Wood, Ross, 1976). O projeto inicial, acompanhado por uma equipe de pesquisadores e supervisores, sofreu pequenas modificações devido aos achados que surgiram na observação das crianças e na revisão documental. As considerações finais sobre a experiência contemplam o avanço das crianças no campo científico. Este progresso está intimamente ligado aos contextos analisados - ferramentas, tempo, abordagens educativas - escolhidos intencionalmente por adultos, documentados, monitorados e avaliados sob diferentes pontos de vista para oferecer a melhor experiência para crianças, professores e famílias.
A EDUCAÇÃO DE CIÊNCIAS COMO “ESTIMULANTE” DO PROCESSO DE APRENDIZAGEM.
A literatura científica sobre o tema (Giordano, 2010; Andersson, Gullberg, 2014; Bertolino, Guerra, Schenetti, Antonietti, 2017) sustenta que o ensino de ciências não pode se limitar à transmissão de conteúdo. Toda criança nasce com muitas curiosidades, questionamentos e interesses que os adultos precisam reconhecer - mesmo quando iniciam sua jornada na educação -, apoiar e estimular por meio de uma abordagem específica. Essa abordagem deve promover e apoiar os interesses e descobertas das crianças para incentivar novas investigações e processos de aprendizagem (Bondioli, Savio, 2014). Considerando este ponto de vista, mesmo as Indicazioni Nazionali per il curricolo in Italy de 2012 (atualizadas em “Nuovi scenari”, 2018) tratam da educação científica em “La conoscenza del mondo”. Centra-se principalmente na curiosidade das crianças, no interesse pelos fenómenos observados, na sua capacidade de fazer perguntas e investigar mais, e na sua vontade de partilhar as suas descobertas com os seus colegas e professores.
Essas considerações representam o marco necessário para interpretar o núcleo da pesquisa que realizamos: como implementar o conhecimento científico não apenas voltado para a transmissão de conceitos, mas também para o desenvolvimento de
“…capacidade e vontade de usar o corpo de conhecimento e a metodologia empregada para explicar o mundo natural, identificar questões e tirar conclusões baseadas em evidências. A competência em tecnologia é vista como a aplicação desse conhecimento e metodologia em resposta aos desejos ou necessidades humanas percebidas. A competência em ciência e tecnologia envolve uma compreensão das mudanças causadas pela atividade humana e responsabilidade como cidadão individual.” (Recomendação do parlamento europeu e do conselho sobre competências essenciais para a aprendizagem ao longo da vida, 2006, p. 15).
DO MARCO CONCEITUAL AO PLANEJAMENTO DA PESQUISA
O planejamento da pesquisa - brevemente descrito aqui - e as estratégias educativas realizadas pelo adulto estão ligadas às contribuições teóricas de John Dewey (1933; 1938) sobre o processo de investigação, ao conceito de “zona de desenvolvimento proximal” de Vygotsky (1930; 1934) e ao scaffolding de Bruner. Além disso, as contribuições de Susan Isaacs (1930, 1933) foram particularmente úteis porque ela efetivamente interpretou as teorias Deweyiana e psicanalítica em um propósito pedagógico com sua experiência na Malting House.
Utilizamos a abordagem de 'promoção de dentro' (Bondioli, 2008; Bondioli, Savio, 2009; Bondioli, 2015a e b, Savio, 2003; Bondioli, Savio, 2012; Savio, 2013) para manter uma conexão estreita entre as teorias e fontes anteriormente mencionada. Incluímos essa abordagem na estrutura conceitual delineada anteriormente. Caracteriza-se por uma estratégia participativa, pois o planejamento das ações educativas parte da curiosidade das crianças e acolhe suas sugestões.
Hipótese de trabalho e plano de investigação
A pesquisa faz parte do doutorado da autora na Universidade de Pavia, na Itália. Sua publicação é autorizada em observância de princípios éticos.
Na sequência dos estudos anteriormente referidos, um dos principais objetivos desta investigação foi identificar o melhor ambiente para promover e favorecer uma análise científica dos comportamentos naturais das crianças em idade pré-escolar, em particular, crianças em pré-escolas. Os estilos educacionais propostos pelos professores influenciam fortemente o fator ambiental. Portanto, eles também são examinados na pesquisa. O nosso objetivo secundário foi estudar em que medida as crianças do mesmo contexto educativo, faixa etária (4 e 5 anos), e sujeitas à mesma experimentação livre de 'ferramentas estimulantes' manifestavam o mesmo conjunto de competências e gama de atitudes científicas, depois de experimentar diferentes estilos de ensino.
Para tal, concebemos o seguinte plano de investigação:
engajamento de 3 grupos de crianças de 4 e 5 anos a frequentar o mesmo setor de uma instituição de educação infantil, equilibrados por idade e sexo;
- para cada grupo, em paralelo, propusemos um percurso com o mesmo número de encontros, no mesmo espaço, e com os mesmos materiais, mas com um papel adulto diferente. Em particular, cada grupo teria uma intervenção adulta diferente:
- grupo A: um adulto que promove internamente;
- grupo B: um adulto que promove internamente e apoia a conversa sobre o que foi feito;
- grupo C: adulto que observa e deixa as crianças agirem (laissez-faire);
- antes e depois do curso, realizamos dois encontros para cada turma onde as crianças podiam se movimentar livremente com os materiais disponíveis. Os adultos observavam e só intervinham em caso de emergência ou necessidade prática.
Contexto e assuntos.
Realizamos a pesquisa considerando um contexto de vida natural/ecológico, como a instituição de educação infantil. Referir-se à pré-escola e aos serviços educativos, em termos de contexto, significa adotar uma perspectiva ecológica (Bronfenbrenner, 1979) e refletir sobre o fato das pessoas, neste caso as crianças, se comportarem de forma diferente consoante a sua situação ambiental. A escolha de realizar a pesquisa no ambiente natural da pré-escola nos permitiu observar o comportamento das crianças dentro de um contexto familiar a elas, considerando as funções, atividades e relacionamentos de todos os participantes.
A escolha de uma instituição de educação infantil assume um valor maior ligada aos objetivos da investigação: desenvolver uma modalidade de intervenção educativa e didática que, com base na revisão literária considerada, permita uma atitude científica sobre o conhecimento no mundo das coisas naturais animadas e inanimadas.
Como sujeitos, escolhemos apenas crianças de 4 e 5 anos na pesquisa exploratória porque compartilham um passado educacional comum, interagindo por dois ou três anos.
Os três grupos foram compostos de forma aleatória, garantindo equilíbrio entre sexo e idade. Também consideramos os laços de amizade, mantendo os amigos nos mesmos grupos.
Cada grupo tinha de sete a oito crianças, o que nos permitia dar atenção aos grupos e às atividades individuais. Grupos que não eram numerosos também facilitariam as interações entre pares e adultos.
A experiência da pesquisa foi realizada na cidade de Mallare1, onde está localizada uma das cinco pré-escolas do Istituto Comprensivo di Carcare (SV). Em particular, a escola onde realizamos a investigação acolhe 29 crianças e é gerida por duas professoras assistidas por pessoal não docente.
Coletamos informações sobre a escola por meio de duas fontes: observação direta e entrevistas com professores, realizadas segundo uma abordagem 'próxima' do não diretivo, guiada pela abordagem de Roger (Lumbelli, 1981, 1990; Mignosi, 2002; Rogers, 1989; Bondioli , Gusmini, Schietroma, 2006).
A pré-escola fica no mesmo prédio de uma escola de ensino fundamental, que funciona 27 horas semanais (segunda a sexta das 8h15 às 13h e uma tarde até as 16h15). A instituição de educação infantil funciona 40 horas semanais (de segunda a sexta-feira, das 8h15 às 16h15), em setor único, atendendo crianças de 2 anos e meio a 6 anos. As áreas exteriores são um pátio cimentado e um espaço verde com estufa, que integra os laboratórios que caracterizam o Plano de Oferta Educativa do Instituto.
O material
O projeto previa a preparação de um conjunto de materiais e objetos a serem propostos às crianças, exigindo observações e explorações 'científicas'.
Estes são os materiais escolhidos e preparados: grandes tanques de acrílico transparente de diferentes tamanhos, farinhas (brancas, amarelas), areia, pedras, tampas (metal, plástico, cortiça), recipientes, funis, coadores, garrafas de diversos materiais e tamanhos, conchas e talheres de diversos materiais, parafusos, argolas (madeira, metal, plástico), papel crepom, lenço de papel, papelão, vegetais secos, sementes, fita adesiva colorida, fita adesiva, bolinhas de vidro, de ping pong e bolas de borracha.
Cada criança recebeu, desde o primeiro encontro, um kit composto por lupa, régua, caderno, lápis e lanterna para incentivar as crianças a adotarem um comportamento “explorador”, apelando assim de imediato ao comportamento proposto durante a viagem.
Para manter viva a curiosidade das crianças e não introduzir demasiados elementos de variabilidade, planejamos utilizar o mesmo conjunto de materiais por dois encontros sucessivos e depois alterá-lo parcialmente com a introdução de novos objetos.
Os diferentes tipos de intervenção de adultos.
Os estilos educativos propostos pelos professores nos três diferentes grupos de crianças são:
laissez-faire. O adulto mantém um papel de observador e não promove a atividade de exploração, intervindo apenas se surgirem problemas práticos particulares. Adotando esta abordagem, pretende-se verificar se é, em que medida a condição de total liberdade e autonomia, sem interferência dos adultos, afeta a condução da exploração científica das crianças;
promoção de dentro. (Bondioli, 2008; Bondioli, Savio, 2009; Bondioli, 2015a e Savio, 2003; Bondioli, Savio, 2012; Savio, 2013). O adulto intervém promovendo e favorecendo a exploração, seguindo o modelo da ‘promoção de dentro’. Nesse cenário, o professor espera e acolhe a iniciativa das crianças, estimula as perguntas e ‘reflete’ sua atitude científica em relação aos materiais, seja de forma verbal ou não verbal. O adulto, também amplia as iniciativas das crianças “mostrando como se faz” e elabora e amplia seus esforços exploratórios e inventivos. Os aspectos acima referidos definem a atitude participativa desta abordagem, preocupada com os interesses das crianças e participando ativamente no processo de aprendizagem. Esta abordagem pretende investigar se e em que medida a intervenção de um adulto que pretende estimular o interesse e a curiosidade das crianças sem controlar as suas ideias pode influenciar as atitudes científicas.
promoção de dentro + conversa final. Esta abordagem educacional é semelhante à anterior. No entanto, ao final das atividades, a pesquisadora estimula as crianças a discutirem a experiência, revisitando-a e refletindo sobre ela. Nesse cenário, o adulto deve favorecer a discussão, o confronto e a reflexão por meio de perguntas específicas: o que fizemos hoje? O que observamos? Como podemos continuar a experiência? Neste caso, o objetivo é analisar se é, como uma abordagem que promova de dentro e favoreça uma reflexão participativa pode influenciar as atitudes científicas. Além disso, esta abordagem também investiga o impacto da dimensão metacognitiva.
A implementação: os tempos e o encontro
A pesquisa durou três meses, com encontros realizados em uma sala de aula equipada como laboratório. O quadro abaixo mostra os diferentes tipos de encontros de grupo. Todos os encontros com os grupos infantis foram gravados e transcritos para acompanhamento do processo e posteriormente analisados.
Nos três grupos, o percurso seria precedido e seguido de dois encontros em que o adulto manteria um papel de observador, intervindo apenas por uma necessidade prática surgida ou para garantir a segurança necessária à continuidade da experiência. As duas sessões preliminares de observação visaram detectar o comportamento exploratório das crianças antes de serem submetidas a uma intervenção intencionalmente projetada para apoiar e promover a conduta científica.
As sessões finais de observação destinaram-se a detectar diferenças na conduta científica das crianças em relação às duas observações iniciais.
Entre as duas sessões de observação preliminar e final, foram planejadas outras quatro para cada grupo, caracterizadas pela abordagem diferenciada do adulto, conforme descrito anteriormente. Os encontros dos três grupos, os dois iniciais, os quatro centrais e os dois últimos, ocorreram paralelamente para garantir que a vivência ocorresse para todos no mesmo período.
As quatro sessões centrais (fase de intervenção) foram programadas de forma que cada grupo participasse da experiência uma vez por semana, com intervalo de tempo semelhante entre uma sessão e outra. O plano de pesquisa incluiu oito sessões (4 observações e 4 entrevistas) para cada grupo de crianças.
ANÁLISE DE DADOS: IDENTIFICAÇÃO DAS CATEGORIAS ‘EPISTÊMICAS’ E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO DO ADULTO
Considerações metodológicas
Antes de continuar descrevendo as etapas para elaborar as grades para analisar os dados qualitativamente, devemos refletir sobre o método de coleta de dados.
Os materiais audiovisuais foram fundamentais porque permitiram aos pesquisadores rever as sessões inúmeras vezes e perceber mais peculiaridades a cada vez. Além disso, facilitaram a inclusão de outros observadores na fase de análise, principalmente os supervisores do processo.
O envolvimento dos supervisores visou evitar qualquer influência da subjetividade e incluir diferentes perspectivas para enriquecer a análise dos materiais coletados (Lucisano, Salerni, 2002).
A documentação do processo e seu reexame permitiram aos pesquisadores identificar pontos críticos e, por vezes, a necessidade de dar um passo atrás e refletir sobre a intervenção.
O estudo dos materiais permitiu ainda delinear quadros de análise para descrever as atitudes científicas das crianças e as estratégias e ações perpetradas pelo adulto para desenvolver os processos de pensamento, seguindo a abordagem da 'promoção desde dentro'. As etapas acima citadas fazem parte da ideia de avaliação explicitada na premissa, que “procedem, acompanham e seguem” (Indicazioni Nazionali, 2012, p.19) o processo de aprendizagem. Seguindo esta perspectiva, os pesquisadores e supervisores analisaram as gravações e conseguiram descrever algumas atitudes científicas das crianças e algumas estratégias implementadas pelo adulto.
As atitudes científicas identificadas
A ordem sequencial das categorias na lista não segue sua sequência de manifestação, mas destaca a complexidade e articulação das diferentes abordagens.
Detecção do fenômeno. São todas aquelas situações em que as crianças interagem com os materiais percebendo algumas características sem continuar a investigação. Por exemplo, Leonardo olha para as garrafas plásticas, deita no chão, mira e sopra em uma das garrafas em pé. Ele repete essa ação algumas vezes soprando cada vez mais forte até conseguir fazê-lo cair.
Montagem e construção. Os comportamentos considerados 'referem-se a situações' em que as crianças, individualmente e/ou em grupo, procuram objetos com o objetivo de construir algo para um projeto, objetivo que atingem sem “encrencas” particulares. Alguns exemplos foram a construção de uma pista de mármore e a montagem de diferentes materiais para criar uma tenda.
Exploração. Esta categoria inclui todos os comportamentos em que uma criança não apenas detecta e observa brevemente um fenômeno, mas o explora ativando comportamentos que indicam a intenção de aprofundar o conhecimento, de entender “como funciona”; para alcançar um objetivo fora do cognitivo. Por exemplo, Alice tenta pegar um pedaço de fita adesiva, mas não consegue rasgá-la. Ela tenta puxar com mais força e observa que a fita estica, mas não rasga. Ela tenta arrancá-lo com os dentes (“se eu puxar com mais força ou morder com os dentes, vai rasgar”), mas percebe que não adianta e coloca de volta na caixa, segurando o rolo de papelão na mão.
Experimentação. Esta categoria inclui os comportamentos pelos quais as crianças agem e interagem com o material disponível a partir de uma hipótese a ser verificada. O aspecto discriminante nesta categoria consiste na explicação verbal da hipótese em mente e na implementação de ações práticas para testá-las, observando os efeitos. Esse tipo de conduta se desenvolve ao longo de um processo que se enquadra na teoria do processo de investigação de Dewey. Por exemplo, Leonardo está trabalhando em uma poça d'água e de repente diz: “Olha! Isso flutua (indica um pedaço de madeira), mas se eu colocar isso (uma garrafa plástica cheia de água), vai cair tudo”.
Detecção do problema. Esta categoria é bastante semelhante à anterior, implicando um processo que se enquadra no processo de investigação de Dewey (Dewey, 1933, 1938). Nos comportamentos desta categoria, ao explorar o material disponível, a criança se depara com um dilema. Nessa condição, as crianças ficam frustradas porque sua pesquisa é 'bloqueada' por um problema 'imposto' pela realidade externa. É uma situação problemática quando as crianças identificam explicitamente o obstáculo que os coloca em dificuldade e tentam superá-lo. Mostramos aqui um exemplo.
“Leonardo percebe um pedaço de papelão do rolo de papel quebrado. Após alguns instantes, Leonardo diz: “Aqui está quebrado”. Ele olha em volta, se aproxima de uma caixa e pega um rolo de fita azul. Ele me mostra, apontando levanta a ponta saliente do rolo de papelão e diz: “Tenho que consertar!”. Olhando para o rolo de fita, ele tenta encontrar a ponta para levantá-lo para rasgar um pedaço. Peter e Alice se aproximam dele. Leonardo começa a puxar o pedaço de fita adesiva. Ele puxa com força, olha o rolo de papelão e a fita adesiva e diz: “Como você faz... como você faz?”. Alice propõe: “Se pegarmos uma tesoura, podemos cortar.”
Estratégias e funções dos adultos
Quanto à análise da intervenção do adulto, citaremos um exemplo do quadroabaixo para demonstrar como a pesquisadora realizou ações de apoio e estratégias para promover e desenvolver as atitudes científicas das crianças. Mesmo neste cenário, a escolha dos procedimentos e funções dos adultos foi influenciada pela ideia de uma avaliação pretendida como instrumento de “controle” da coerência entre bases pedagógicas, objetivos a atingir e escolhas educativas.
Em particular, para identificar estratégias e funções educativas desempenhadas pelo adulto que sejam coerentes com a abordagem da 'promoção a partir de dentro', consideramos as categorias de Bondioli e Savio (1996, 2001). Eles destacaram a importância de um estilo de intervenção que não atrapalhe, mas aprimore os interesses e as perspectivas da criança. O adulto 'reflete' sobre os comportamentos verbais e não verbais das crianças sem julgar. Ele também fazia perguntas abertas que permitiam muitas respostas possíveis e introduzia novos elementos (materiais ou atividades) coerentes com o que a criança ou grupo estava fazendo.
As estratégias citadas acima têm funções específicas2. - pertencente à teoria da tutoria (Bruner, Wood, Ross, 1976) - em relação com as esferas cognitiva, emocional e social.
ATITUDES CIENTÍFICAS DAS CRIANÇAS E O PAPEL DO ADULTO
Analisamos os dados processados nos esquemas acima citados quantitativa e qualitativamente. A primeira análise permitiu considerações específicas sobre a manifestação e desenvolvimento de categorias científicas, modos de comunicação e socialização ligados a essas atitudes. Além disso, o estudo dos esquemas relativos ao papel do adulto permitiu abrir uma investigação sobre as estratégias e funções que melhor favorecem e promovem os processos de aprendizagem nas crianças.
As tabelas (Tabela 1, 2, 3) que descrevem a manifestação dos comportamentos científicos das crianças durante as sessões comprovam que os grupos A (promoção de dentro) e B (promoção de dentro e posterior discussão) parecem diferentes do grupo C (sem intervenção para promover a atitude científica), especialmente no que diz respeito à categoria de experimentação (A=6, B=10, C=1) e à detecção do problema (A=10, B=5, C=0). As diferenças parecem mínimas na detecção dos fenômenos e nas categorias de exploração. Isso sugere que ao fornecer às crianças materiais estimulantes e deixá-las explorar livremente, embora fundamental, é insuficiente para ativar atitudes científicas mais articuladas e complexas. Essencialmente, estas atitudes, pertencentes ao processo de investigação de Dewey (Dewey, 1933, 1938), apareceram nos grupos onde os materiais eram fornecidos e explorados livremente, mas também acompanhados por um adulto, que planejava intervenções alicerçadas no quadroteórico e metodológico da tutoria de Bruner (1967) e da zona de desenvolvimento proximal de Vygotsky (1934; 1938). Portanto, essas intervenções visavam promover atitudes científicas e desenvolvê-las e enriquecê-las, promovendo processos de aprendizagem.
GRUPO A promoção de dentro | Pre- observação | 1 | 2 | 3 | 4 | Pós-observação | TOTAL |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Detectando os fenômenos | 4 | - | - | - | 1 | 3 | 8 |
Montagem/construção | 1 | 1 | 1 | 1 | - | 2 | 6 |
Exploração | 3 | 4 | 2 | 3 | 4 | 4 | 20 |
Experimentação | - | - | 2 | 1 | 2 | 1 | 6 |
Identificando o problema | 2 | 2 | 1 | 2 | 1 | 2 | 10 |
GRUPO B Promoção de dentro + conversa final | Pré- observação | 1 | 2 | 3 | 4 | Pós-observação | TOTAL |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Detectando os fenômenos | 1 | 1 | 2 | - | 1 | - | 5 |
Montagem/construção | 2 | - | - | 1 | - | 2 | 5 |
Exploração | 3 | 3 | 2 | 4 | 4 | 4 | 22 |
Experimentação | 2 | 2 | - | 1 | 2 | 3 | 10 |
Identificando o problema | 2 | - | 1 | 1 | - | 1 | 5 |
GROUP C Laissez-faire | Pré- observação | 1 | 2 | 3 | 4 | Pós-observação | TOTAL |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Detectando os fenômenos | 1 | 2 | 1 | 1 | 1 | 2 | 8 |
Montagem/construção | 2 | - | - | 1 | 1 | 1 | 5 |
Exploração | 4 | 4 | 1 | 2 | 2 | 2 | 15 |
Experimentação | - | 1 | - | - | - | - | 1 |
Identificando o problema | - | - | - | - | - | - | - |
Observando e analisando as experiências das crianças, a pesquisadora e os supervisores identificaram alguns elementos que consideraram dignos de investigação. Por exemplo, por quanto tempo as crianças dos três grupos manifestaram atitudes científicas e o uso que fizeram para investigar um determinado “tema” ou fenômeno observado. Em particular, os grupos A e B, trabalhando com um adulto que 'promovem de dentro', focaram em suas atitudes científicas por um período mais longo (de 37% no primeiro encontro para 42% no último) quando comparados ao grupo C (de 24 % no primeiro encontro para 12% no último), em que o adulto não enfatizou ou privilegiou os interesses das crianças e não interveio voluntariamente para promover o processo de aprendizagem.
Considerações semelhantes podem ser feitas em relação à identificação do comportamento epistêmico articulado3: atitudes complexas perpetradas pelas crianças para investigar um fenômeno observado. Em particular, a análise dos dados recolhidos evidenciou que as crianças dos grupos A e B (abordagem 'promoção a partir de dentro') tinham diferentes comportamentos epistémicos (A e B=11) - relacionados com a investigação científica - (exploração, experimentação, identificação de o assunto) para aprofundar seus conhecimentos sobre o mesmo fenômeno. Mais uma vez, o grupo C apresentou menor quantidade (C=4) e complexidade (construção e exploração) quanto aos comportamentos voltados para a aprendizagem seguindo um método de investigação científica. Os quadros abaixo mostram a quantidade e a qualidade dos comportamentos epistêmicos articulados para investigar os diferentes fenômenos observados.
Em conclusão, surgiram diferenças entre os grupos quanto a:
comportamento epistêmico. Os grupos A e B diferem do grupo C. Em particular, são mais ativos em condutas que se enquadram nas categorias científicas de experimentação e identificação de problemas.
tempos dedicados a atividades epistêmicas. Os grupos A e B registram uma porcentagem mais significativa do tempo, em relação ao C, no que diz respeito ao tempo que as crianças se envolvem em atividades que exigem a ativação do comportamento epistêmico. O aprofundamento deste aspecto, através da análise das atividades 'não científicas' realizadas pelos grupos no tempo residual, poderá fornecer maiores informações.
situações e reuniões “características” devido a dados divergentes da tendência geral de um determinado grupo. Nos grupos A e B, há encontros em que casos particulares emergem de alguns dados. No grupo B, por exemplo, houve queda acentuada na segunda sessão na comunicação verbal, na dimensão social e no percentual de tempo dedicado à conduta científica. Da mesma forma, outro dado a destacar é a altíssima porcentagem de tempo dedicado a atividades científicas na quarta sessão (B = 87%), que será analisada quanto ao papel do adulto. No grupo A, a partir da segunda sessão, encontram-se comportamentos científicos mais complexos - por exemplo, experimentação e detecção do problema - (ver parágrafo sobre ‘As atitudes científicas identificadas’). Essa situação não é observada no grupo C (laissez-faire) porque as crianças parecem permanecer em uma condição em que não ativam comportamentos epistêmicos mais complexos, modalidades comunicativas verbais e interações sociais mais colaborativas.
Dessas considerações emergem os primeiros elementos de influência das abordagens de intervenção propostas nos grupos A e B - promoção de dentro (Bondioli, 2008; Bondioli, Savio, 2009; Bondioli, 2015a e Savio, 2003; Bondioli, Savio, 2012; Savio, 2013) - no apoio e promoção de atitudes cognitivas face aos fenómenos observados. Essa hipótese precisa ser aprofundada no momento por meio de elementos adicionais que possam apoiá-la.
Estratégias e funções do adulto
A análise das estratégias de adultos realizadas comprova quantas intervenções são coerentes com a abordagem de 'promoção de dentro' (Bondioli, 2008; Bondioli, Savio, 2009; Bondioli, 2015a e Savio, 2003; Bondioli, Savio, 2012; Savio, 2013) adotada pelos grupos A e B (espelhamento, em particular). Nestes dois grupos, o propósito do adulto era solicitar novos insights, a continuação da experiência, ou a reflexão sobre ela (A=35 e B=36). Em comparação com os outros grupos, o grupo C é caracterizado por mais intervenções para garantir o funcionamento dos fatores sociais (C=13). Esse funcionamento era ativado por meio de estratégias acomodativas (o adulto concordou em brincar com as crianças para estabelecer algumas regras) ou por meio de orientações mais específicas (“Vamos pegar seu kit e ver o que tem dentro? Tem alguma coisa interessante? Vamos tentar separar os objetos flutuantes dos afundando?”).
Os dados relativos às sessões em que o adulto 'involuntariamente' realizava intervenções mais diretas, mostrando às crianças o que fazer em vez de considerar suas sugestões e apresentando-lhes respostas diretas às suas perguntas, causaram uma diminuição no tempo gasto em atividades científicas, na comunicação das atitudes manifestadas e na interação grupal. Tudo isso confirma o que foi dito anteriormente sobre os efeitos da promoção de dentro. Esse aspecto sugere que, ao propor atividades que não condizem com os interesses das crianças, o adulto se torna um substituto, dificultando a interação das crianças, a teoria, a verificação e o compartilhamento com os colegas. Em um ambiente em que o adulto não ouvia ou considerava suas curiosidades, as crianças apresentavam dificuldades em realizar atitudes científicas e em lidar com as interações dentro do grupo. O pesquisador teve que intervir várias vezes para garantir um contexto harmonioso onde as atividades pudessem continuar. Esse tipo de questão não apareceu durante as sessões dos outros dois grupos, que seguiram a abordagem de 'promoção de dentro'.
Assumindo que se trata de um estudo exploratório, a riqueza do material produzido e sua análise quantitativa e qualitativa tem fornecido alguns dados valiosos para delinear as características de uma abordagem educacional e didática que parecem contribuir para a estruturação de um contexto favorável ao desenvolvimento de uma atitude científica tal como definida no parágrafo dedicado à revisão da literatura e ao referencial teórico e cultural (Dewey, 1933, 1938; Isaacs, 1930, 1933; Vygotskij, 1960; Bruner, Wood e Ross, 1976). Portanto, é fundamental oferecer às crianças materiais diferenciados e conscientes (na experiência realizada, água, pranchas de madeira e garrafas plásticas foram os objetos mais utilizados), e permitir que as crianças se movimentem livremente e explorem o espaço e os objetos. Por exemplo, deixe-os perceber as diferentes cores produzidas pela luz do sol ou por uma lanterna. Essas condições, embora fundamentais, não são suficientes para explicar as diferenças observadas nos três grupos de crianças para as quais as condições eram as mesmas, exceto pelo estilo de intervenção proposto pela pesquisadora.
Observamos a consolidação e fortalecimento da experimentação e identificação de comportamentos de pesquisa naqueles grupos que puderam explorar o material livremente e foram apoiados por um adulto que propôs intervenções. Essas intervenções foram fundamentadas no referencial teórico e metodológico da tutoria de Bruner (1976), da zona de desenvolvimento proximal de Vygotsky e da abordagem “promoção de dentro” (Bondioli, 2008; Bondioli, Savio, 2009; Bondioli, 2015a e Savio, 2003; Bondioli, Sávio, 2012; Sávio, 2013). Um adulto que observa, escuta e acolhe as iniciativas das crianças por meio de etapas que visam ampliar seu valor e estimular o grupo a compartilhar e pedir contribuições. Esta atitude ajuda a criar as condições adequadas para aprofundar o conhecimento de um fenómeno assente em comportamentos cada vez mais articulados. Isso parece ser confirmado pelo fato de que os grupos de 'promoção de dentro' apresentarem mais situações em que um tema foi aprofundado por conta de comportamentos de diferentes categorias epistêmicas. Em vários casos, essas categorias pertencem a um nível cognitivo complexo que parece seguir etapas semelhantes às do processo de investigação de Dewey (Dewey, 1933, 1938) (experimentação e identificação de problemas).
CONSIDERAÇÕES FINAIS E QUESTÕES EM ABERTO
O rico material coletado durante a pesquisa e sua análise quantitativa e qualitativa forneceram dados fundamentais para identificar os parâmetros de uma abordagem educacional que sustente um contexto favorável para o desenvolvimento de atitudes científicas. Nesse cenário, essas atitudes remetem a uma investigação ativa que leva à construção autônoma e participativa do conhecimento e à compreensão científica (Andersson, Gullberg, 2014; Onida, Salvadori, 2020). A análise dos materiais também forneceu indicações sobre como apoiar o desenvolvimento de um comportamento orientado para a ciência, que aprofunde a reflexão sobre essas questões e a compreensão do mundo complexo, emaranhados e relações que caracterizam este trabalho (Arcà, Mazzoli, 1995; Bertolino, Guerra, Schenetti, Antonacci, 2017).
A perspectiva exploratória desta investigação permitiu ainda identificar questões a considerar no planejamento de intervenções educativas para desenvolver processos de pensamento crítico. Em particular, esta oportunidade pode colocar questões que devem ser respondidas e orientar escolhas educacionais e didáticas. Que estratégias são mais eficientes para favorecer atitudes científicas mais complexas? Quais são as opções mais indicadas para estimular a verbalização e a cooperação das crianças na investigação de um fenômeno? Como perceber e evitar a rotina diária que causa automatismos que levam a respostas não espelhadas (onde o adulto ignora ou não acolhe as entradas da criança)?
Quais são as sugestões para organizar e organizar uma experiência semelhante ao parágrafo anterior, adaptando-a ao cotidiano de trabalho na escola? Em particular, como criamos pequenos grupos de crianças em um horário específico do dia e coletamos a documentação adequada por meio de gravações em vídeo ou observação de estilo antigo com papel e caneta para analisar posteriormente com os colegas? A reflexão sobre o que precisa ser feito não deve depender dos dados coletados na experiência nem da intenção de planejamento. Esse processo de contemplação da ação (Schön, 1993) que une a intenção de planejamento, sua execução e sua documentação, visando avaliar seus desdobramentos e as possíveis correções, implica escolhas específicas do professor. Em particular, essas decisões dizem respeito tanto à organização das atividades quanto ao uso da ferramenta de “avaliação”. Portanto, o processo de avaliação visa “regular” o processo de aprendizagem e reunir insumos para sustentá-lo, melhorando o contexto, em vez de julgar o desempenho das crianças.
Os conceitos acima citados permitem considerar a avaliação como um processo de pesquisa onde os professores, compartilhando valores e princípios pedagógicos, teorizam caminhos de desenvolvimento que observam, documentam e avaliam. Esses processos visam reanalisar a experiência e identificar melhorias nos métodos (observação, documentação) e nas diferentes perspectivas. Desse ponto de vista, a avaliação não é um processo unidirecional (o professor julga as crianças ou o pesquisador avalia os resultados de sua investigação). É caracterizada por um emaranhado de camadas que se influenciam mutuamente. Esta ideia de avaliação como processo de investigação exige do professor estratégias de intervenção flexíveis e participativas, não baseadas em preconceitos, mas na possibilidade de questionar a sua abordagem educativa e didática, valorizando as vivências quotidianas, a curiosidade, as diferenças e as diversas respostas pessoais. A oportunidade de discutir as escolhas do adulto para oferecer um ambiente educacional que promova processos de pensamento requer a capacidade de abandonar as certezas e expor-se à situação emocionalmente desafiadora de incerteza (Bion, 1973). Este aspecto envolve uma certa ansiedade que deve ser controlada para evitar a tentação de encontrar soluções 'pre-embaladas'.
Da mesma forma, nesta perspectiva, o investigador e os orientadores devem estar dispostos a acolher as hipóteses que surjam da análise dos dados recolhidos, mas mantendo sempre a coerência científica do projeto. Esta consideração leva a refletir e valorizar o grupo de trabalho que se pretende um organismo capaz de acolher novas hipóteses promovendo o confronto. Certamente, cada grupo de trabalho deve passar por uma formação profissional que potencialize o diálogo, o confronto, a autoavaliação como instrumento fundamental para “regular” e orientar o ato educativo. Portanto, a formação deve preparar professores capazes de pesquisar com as crianças, dispostos a enfrentar o desafio emocional e a incerteza desse processo. Além disso, o professor tem que lidar com dúvidas e saber esperar sem ceder ao desejo de explicar, transmitir conceitos e sugerir atividades específicas que ignoram os interesses das crianças.