INTRODUÇÃO
O presente artigo foi produzido a partir dos dados de uma tese, em desenvolvimento, que tem por objetivo principal apresentar uma proposta de avaliação realizada e vinculada ao uso intencional e pedagógico dos processos de produção de videoaulas estudantis como estratégia de ensino e aprendizagem.
Para que se compreendam os passos percorridos até a elaboração desta proposta, dividimos o artigo em quatro partes: a primeira traz à tona alguns conceitos sobre metodologias ativas; a segunda, após apresentar um estudo exploratório em produções de vídeos estudantis de matemática, aponta a criação do vídeo estudantil como uma metodologia ativa, embasada na tecnologia digital; a terceira engloba diferentes concepções e formas avaliativas, assim como delineia uma concepção de avaliação, denominada de avaliação ampliativa, para ser explorada no processo de produção dos vídeos estudantis; a quarta relata, brevemente, uma experiência de criação de vídeos estudantis e apresenta um arquétipo de como nos utilizamos da avaliação ampliativa para acompanhar a atividade de produção de videoaulas estudantis com alunos do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul), campus Pelotas.
PRIMEIRA PARTE: METODOLOGIAS ATIVAS - EXPLORANDO CONCEITOS
No universo de uma sala de aula, vamos encontrar estudantes com graus variados de maturidades, com diferentes interesses, com saberes distintos, com sentimentos diversos, entre outras múltiplas variações próprias de cada ser, cada família, cada cultura. Portanto não podemos esperar que todos os alunos tenham o mesmo ritmo de aprendizagem. Mas o que fazemos quando transmitimos o conhecimento e aplicamos uma avaliação uniforme para todos os alunos? Não fechamos nossos olhos para as individualidades ali presentes?
O espaço da sala de aula pode ser estimulante para aqueles que criam e exploram os mais variados processos de aprendizagens. Desde o nascimento nosso aprendizado é ativo, na medida em que nos envolvemos no processo de aprender, pelo contexto em que nos encontramos e pelo que nos é significativo e relevante (Moran, 2019). Um exemplo disso é quando começamos a caminhar: aprendemos não só pelo fato de nos dizerem como fazer, mas também porque observamos, aplicamos teoria e desenvolvemos, conjuntamente, algumas técnicas de coordenação e equilíbrio. Assim, a aprendizagem ativa, pensada no âmbito escolar, requer um espaço de interação, reflexão, envolvimento, descoberta, criatividade e orientação, e esse espaço pode ser criado com uma abordagem de ensino que ficou conhecida como metodologias ativas.
Moran (2018, p. 4) define metodologias ativas como sendo “diretrizes que orientam os processos de ensino e aprendizagem e que se concretizam em estratégias, abordagens e técnicas concretas, específicas e diferenciadas” e qualifica essas metodologias dizendo que “são estratégias de ensino centradas na participação efetiva dos estudantes na construção do processo de aprendizagem, de forma flexível, interligada e híbrida” (p. 4), ou seja, o aluno deve ser agente ativo em todo o processo de aprendizagem.
No que se refere ao processo de aprendizagem de forma híbrida, o autor nos diz que ela “destaca a flexibilidade, a mistura e compartilhamento de espaços, tempos, atividades, materiais, técnicas e tecnologias que compõem esse processo ativo” (Moran, 2018, p. 4). Com a potencialização do ensino remoto (on-line), impulsionado pela pandemia, o ensino híbrido tem apresentado uma conotação de compartilhamento de espaço físico e virtual, de modo que as aulas podem ser divididas entre encontros presenciais e remotos. Porém o ensino híbrido não se remete somente ao espaço em que a aula acontece, mas a tudo que orbita o ato educativo: saberes, experiências, atividades, tecnologias, etc.
É preciso que aceitemos o fato de que vivemos em uma era digital e, por isso, as tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) estão presentes no nosso dia a dia, motivo pelo qual, em um processo gradual de adaptações e mudanças, muitas instituições de ensino têm se esforçado para se adequarem a essa nova realidade.
Portanto nós, como professores desta era, quando dispomos das TDIC como ferramentas de ensino, temos a oportunidade de tentar integrar metodologias ativas e tecnologias digitais, sendo que a “integração das TDIC no desenvolvimento das metodologias ativas tem proporcionado o que é conhecido como blendedlearning, ou ensino híbrido” (Valente, 2018, p. 29), ou seja, a flexibilidade, a mistura e o compartilhamento destacado por Moran (2018).
É importante refletirmos sobre o fato de que usarmos a ferramenta não implica a aplicação da estratégia e vice-versa: podemos fazer o uso da estratégia de metodologias ativas sem a ferramenta das TDIC, assim como podemos fazer uso das tecnologias digitais sem colocarmos em prática o conceito de metodologias ativas.
Muitos são os professores que implementam suas atividades pedagógicas com a inclusão de ferramentas digitais, o que não está errado, porém, quando falamos em metodologias ativas, é preciso que coloquemos o aluno como foco ativo de sua aprendizagem; na metodologia ativa, “a responsabilidade sobre a aprendizagem agora é do estudante, que precisa assumir uma postura mais participativa, na qual resolve problemas, desenvolve projetos e, com isso, cria oportunidades para a construção de seu conhecimento” (Valente, 2018, p. 26). Obviamente, o professor tem um papel muito importante em todo esse percurso, pois é ele quem vai mediar o processo de ensino e aprendizagem, inclusive sendo ele próprio um aprendiz dessa experiência.
Moran (2018) aponta alguns dos benefícios que podemos ter ao combinarmos as metodologias ativas com as tecnologias digitais móveis:
A combinação de metodologias ativas com tecnologias digitais móveis é hoje estratégica para a inovação pedagógica. As tecnologias ampliam as possibilidades de pesquisa, autoria, comunicação e compartilhamento em rede, publicação, multiplicação de espaços e tempos; monitoram cada etapa do processo, tornam os resultados visíveis, os avanços e as dificuldades. As tecnologias digitais diluem, ampliam e redefinem a troca entre os espaços formais e informais por meio de redes sociais e ambientes abertos de compartilhamento e coautoria. (Moran, 2018, p. 12).
Os apontamentos de Moran facilmente se encaixam na proposta de produção de videoaulas estudantis, como estratégia de metodologias ativas, pois, após as etapas de produção, as tecnologias digitais móveis têm um papel fundamental de divulgação/compartilhamento, publicação e troca de conhecimentos.
Uma das características das metodologias ativas é o fato de elas tornarem a aula desafiadora para alunos e professores, porquanto é preciso criar, envolver-se (alunos e professores) e participar ativamente no processo de aprendizagem. Ana Paula Sahagoff resume o papel do aluno protagonista das metodologias ativas:
Com o uso das metodologias ativas, o aluno passa a ter mais controle sobre sua aprendizagem e uma participação efetiva na sala de aula, já que as atividades dependerão de ações realizadas por ele: leitura, pesquisa, comparação, observação, imaginação, organização dos dados, elaboração e confirmação de hipóteses, classificação, interpretação, crítica, busca de suposições, construção de sínteses, planejamento de projetos e pesquisas, análise e tomadas de decisões. Desse modo, o desenvolvimento da autonomia torna-se fator fundamental no processo de aquisição de conhecimentos, diferentemente do ensino tradicional, no qual a independência intelectual não é explorada. (Sahagoff, 2019, p. 13).
O professor, por sua vez, tem o desafio de planejar, replanejar, reinventar, flexibilizar, acompanhar e, ao nosso ver, o mais desafiador: avaliar, já que não devemos repetir modelos, e sim considerar as especificidades das atividades propostas e também de cada aluno/turma, entre outras tantas nuanças que compõem o processo de avaliação. Sahagoff também resume o papel do professor proponente das metodologias ativas:
O professor deve ser flexível para atuar com a diferença entre os sujeitos em sala de aula. A mediação é uma tarefa complexa, que exige flexibilidade e criatividade do educador. A educação tem um papel transformador. Mas para transformar os alunos é necessário antes transformar a forma de pensar e agir do professor através de planejamentos e formação continuada. O processo de mediação exige que o docente conheça seus alunos, suas realidades, seus contextos. (Sahagoff, 2019, p. 14).
Conhecer e mediar a aprendizagem de cada aluno é tarefa trabalhosa para o professor comprometido com a educação, uma vez que requer um olhar atencioso para as necessidades e habilidades que vão se apresentando ao longo do processo educativo. Não basta adequarem instrumentos de ensino às tecnologias digitais, pois isso, por si só, não garante um melhor aprendizado, tão pouco garante uma aula criativa. “Lidar com as tecnologias da inteligência na era digital envolve recriar sentidos e significados para o conhecimento construído e compartilhado em redes” (Andrade & Sartori, 2018, pp. 175-176). É preciso, portanto, mudar a forma de pensar e agir, observando o aluno e buscando métodos mais significativos, tanto de aprendizagens quanto de ensino.
Uma opção para contornar a dificuldade de acompanhar o processo evolutivo de cada aluno é conhecer ferramentas avaliativas que possam facilitar esse acompanhamento. Na terceira parte deste artigo vamos explorar alguns processos avaliativos.
As metodologias ativas, voltadas para a educação, acabaram proporcionando uma nova forma de ensinar e aprender. Elas não tiram a responsabilidade do professor, mas dão um novo viés ao seu papel como educador; não engessam os alunos como receptores de conhecimentos, mas os colocam como protagonistas de seus aprendizados; não apenas usam as tecnologias digitais como ferramentas metodológicas, mas se utilizam delas como recursos de diálogo com os alunos, como inovação para aulas mais criativas e como formação continuada do professor que se permite ser aprendiz, visto que os mais jovens estarão, quase sempre, à sua frente no que diz respeito ao conhecimento tecnológico.
Para colocar as metodologias ativas em prática, é necessário que haja um planejamento, um roteiro por parte do educador/escola. Esse roteiro pode e deve ser alterado à medida que novas possibilidades são descobertas, que os grupos de alunos vão mudando, em etapas distintas de desenvolvimento escolar, em espaços socioculturais diferentes, enfim, a cada novo contexto e realidade que venha a surgir. O fato é que todos nós, educadores, podemos fazer parte de um ensino diferente e melhor e, para isso, devemos começar por observar nosso planejamento didático e nos perguntarmos: nossa forma de ensinar está dialogando com os anseios de nossos alunos? Estamos valorizando suas individualidades? Somos professores transmissores de conhecimentos? Se somos, queremos/podemos continuar sendo? E, depois dessas, outras tantas indagações surgirão.
Foram esses questionamentos que nos instigaram a experimentar o método da produção de vídeos estudantis de matemática.
SEGUNDA PARTE: PRODUÇÃO DE VÍDEO ESTUDANTIL - UMA PESQUISA EXPLORATÓRIA
Quando começamos a explorar a prática da produção dos vídeos pedagógicos, de imediato algo nos chamou a atenção: a diversidade de narrativas utilizadas para se contar uma história. Assim, entendemos que essa diversidade - que inclui a forma como o aluno se apropria do assunto, as conexões que faz com seu dia a dia, as ferramentas tecnológicas e digitais que utiliza e todo o processo criativo - pode ser utilizada de maneira a contribuir no processo de ensino e aprendizagem de matemática e, também, no de avaliação.
Buscando conhecer e compreender as diversas narrativas utilizadas nos vídeos, analisamos algumas produções estudantis em acervos de domínio público. Este estudo exploratório teve por objetivo conhecer de quais elementos os alunos estão se apropriando e quais estão utilizando para criarem narrativas referentes aos temas abordados e produzirem seus vídeos.
O acervo de vídeos que utilizamos, e que nos permitiu ter um olhar amplo sobre as produções brasileiras, pertence ao Festival de Vídeos Digitais e Educação Matemática,1 que se realiza anualmente, desde 2017, configurando-se como um evento de premiação de vídeos estudantis. O evento recebe vídeos de qualquer região do país, tanto de escolas públicas quanto de privadas. Optamos por analisar os vídeos premiados, por já terem passado por um processo de avaliação em que os jurados se baseiam em alguns quesitos, como: i) natureza da ideia matemática; ii) criatividade e imaginação; e iii) qualidade artística-tecnológica (Borba, 2022).
O festival é composto por um ambiente virtual de compartilhamento de vídeos com conteúdo matemático e um evento presencial que inclui palestras, mostras de vídeos e cerimônia de premiação. Os alunos de quaisquer níveis de ensino, ou qualquer pessoa que tenha interesse em participar, podem submeter seus vídeos.
Para que tenhamos uma visão geral do quantitativo de vídeos submetidos/classificados, finalistas e premiados, até 2020, montamos a Tabela 1. Em 2020, a organização do evento publicou apenas os vídeos classificados, e não todos os submetidos, por isso a redução na quantidade. Cabe salientar que terminamos esta pesquisa em 2021, antes de ser realizado o quinto festival.
CATEGORIA | ANO | TOTAL | |||
---|---|---|---|---|---|
Categoria: ensino médio | 2017 | 2018 | 2019 | 2020 | |
Submetidos/classificados | 45 | 29 | 40 | 17 | 131 |
Finalistas | 13 | 6 | 6 | 15 | 40 |
Premiados | 6 | 4 | 4 | 6 | 20 |
Fonte: Elaboração dos autores com base em dados extraídos da página do Festival (https://www.festivalvideomat.com/).
Sobre a escolha em analisar os vídeos da categoria ensino médio, esta se deu pelo fato de a primeira autora do artigo integrar o quadro de professores efetivos do IFSul campus Pelotas, sendo responsável pelas turmas de ensino médio envolvidas na pesquisa exploratória.
Para que analisássemos os vinte vídeos premiados, elaboramos um roteiro de investigação que resume as narrativas observadas, enquadra cada vídeo em uma determinada modalidade de técnica de filmagem e lista todos os elementos percebidos na linguagem audiovisual.2
A análise que realizamos tem caráter qualitativo, colocando em discussão elementos que visam a contribuir para que o educador tenha um novo olhar sobre a possibilidade de explorar essa ferramenta - produção de vídeos estudantis -, que transcende a rotina de sala de aula e dá uma certa liberdade para o aluno escolher as tecnologias digitais e as diferentes narrativas que pode usar para gerar e expressar o conhecimento matemático.
Para que possamos dar continuidade à descrição de nossas análises, é preciso fazer uma breve distinção entre os termos narrativa e narração, presentes em alguns comentários:
A narrativa é o enunciado em sua materialidade, o texto narrativo que se encarrega da história a ser contada. Porém, esse enunciado que, no romance, é formado apenas de língua, no cinema, compreende imagens, palavras, menções escritas, ruídos e música, o que já torna a organização da narrativa fílmica mais complexa. (Aumont et al., 1995, p. 106).
Já a narração pode ser definida como “ato narrativo produtor e, por extensão, o conjunto da situação real ou fictícia no qual ela toma lugar” (Aumont et al., 1995, p. 109). Portanto a narrativa é como se conta uma história e, no caso de vídeos, é composta por todos os planos e toda a estrutura utilizada para contá-la (voz, imagem, expressão corporal, ruídos, músicas, cenas, slides, etc.); a narração é a forma de apresentação da história, o discurso propriamente dito.
Detivemo-nos em trazer os resultados obtidos e algumas considerações que cremos serem relevantes: todos os vídeos analisados nos permitiram buscar e formular compreensões de como os alunos pensam a inserção das tecnologias (vídeos) na aula de matemática e como relacionam seu dia a dia com a teoria trabalhada em sala de aula; em relação à linguagem audiovisual de que os alunos se apropriaram e utilizaram para criar narrativas que abordassem os tópicos estudados, dentro do tema que se propuseram trabalhar, pudemos perceber a variedade de elementos escolhidos para a construção da narrativa, tanto em forma (modalidade do vídeo) quanto em conteúdo (assuntos escolhidos) e, também, as várias técnicas (ferramentas) e meios (espaços) utilizados para se expressarem dentro desses contextos.
Pudemos perceber que a edição de vídeos e/ou imagens foi sempre explorada, assim como a música - seja como fundo musical do vídeo ou como paródia criada para falar do tema abordado. Um ponto que nos chamou a atenção foi a disposição da maioria dos estudantes em expor suas imagens nos vídeos; outro ponto importante foi o fato de direcionarem seus trabalhos para suas habilidades, seus contextos socioculturais e sua própria linguagem, que foi escolhida conforme os elementos pelos quais optaram para compor suas narrativas.
Com esta pesquisa exploratória, buscamos levantar dados para pensar sobre a relevância de se utilizar a produção de vídeos como método de aprendizagem, não focando no produto em si, mas nos meios empregados, nos processos de construção que levam ao resultado final e, durante esse processo, nos elementos de que se apropriam e como os utilizam para apresentar suas narrativas dentro do tema que escolheram abordar. Ao conhecer esses elementos, podemos pensar em uma avaliação qualitativa dos estudantes, focando trechos que queiram dar maior ou menor destaque (roteiro, edição, conteúdo, etc.); ainda, entendemos que esses elementos favorecem projetos pedagógicos interdisciplinares (o roteiro, por exemplo, pode ser pensado nas aulas de matemática e de língua portuguesa; a edição, nas aulas de matemática e educação artística, etc.), estando em consonância com as novas orientações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC),3 sobretudo com as competências gerais da educação básica de números 1, 3, 4, 5 e 7 (Ministério da Educação, 2018).
Para nós, professores, como ressalta Resende (2016, p. 10), o vídeo produzido pode ser “uma ferramenta que pode dar dicas ao educador, sobre a visão e os contextos em que os alunos estão inseridos, revelando os interesses dos estudantes”. Nesse acervo analisado, pudemos perceber que os alunos procuraram fazer a conexão da matemática estudada na escola com a matemática implícita em seus cotidianos, como: estudo de progressão aritmética e cálculo da corrida de táxi; estudo de funções exponenciais e a expansão progressiva do vírus H1N1;4 composição de músicas para abordagem de conteúdos, entre outros. Dos vinte vídeos analisados, em dez deles os alunos se apropriaram de temas relacionados às atividades sociais e culturais, pessoais e/ou da região em que habitam, oportunizando, ao professor, conhecer contextos e realidades que uma aula, exclusivamente expositiva, poderia não ocasionar.
Uma ressalva que fazemos - que poderá servir para a reflexão de todo educador de uma era com inegável desenvolvimento tecnológico, em que muitos estudantes buscam na internet materiais audiovisuais para complementarem seus estudos (Martinez & Peraça, 2020) - é que sentimos falta dos elementos digitais que permitam a inclusão de alunos com deficiências, como auditiva e visual: audiodescrição, legendagem ou tradução em linguagem de sinais. Tavares et al. (2016) falam da importância de dar acesso às pessoas, com quaisquer tipos de deficiências, aos materiais e ambientes de aprendizagem. Hoje existem muitas ferramentas que possibilitam a inserção desses elementos inclusivos, portanto devemos ficar atentos para não excluir ninguém de acervos que são ricos em tecnologia, criatividade, conhecimento e arte, fomentando a empatia para com o outro (o que englobaria, além das já citadas, a competência geral número 9 da BNCC).
Dos vídeos que analisamos, descrevemos nosso olhar de expectadores de um produto finalizado, do qual não fizemos parte do processo de ensino, aprendizagem e avaliação envolvido nesses trabalhos. Porém essa investigação nos provocou a pensar em como podemos desenvolver e explorar todas as fases que envolvem essa produção.
Com essa provocação, decidimos por reunir nosso conhecimento, no que diz respeito às metodologias ativas e à produção de vídeos estudantis, e propusemos a um grupo de alunos que, como parte integrante do processo de ensino, aprendizagem e avalição, eles produzissem videoaulas sobre tópicos relacionados ao tema de estudo que estavam desenvolvendo na disciplina de matemática. E essa proposta de atividade foi a catalisadora da avaliação ampliativa, forma que construímos e convidamos o professor a pensar e a experimentar em sua prática docente. Um pouco sobre esse trabalho e seus desdobramentos está descrito na terceira e quarta partes deste artigo.
TERCEIRA PARTE: A AVALIAÇÃO AMPLIATIVA - PENSANDO UMA NOVA PROPOSTA DE AVALIÇÃO
Na terceira parte, refletiremos sobre um processo de avaliação que acompanhe todas as fases do aprendizado e proporemos uma concepção avaliativa que aponte um caminho inicial para nós, professores.
Para compreendermos as mudanças conceituais e o espaço que vêm ganhando as discussões em torno desse tema, e também para chegarmos à definição do que estamos entendendo como avaliação ampliativa, faremos uma breve discussão sobre avaliação e alguns de seus desdobramentos.
De forma simplificada, existem dois métodos de avaliação: i) aquele que tem como base medir, computar, em determinados períodos, o grau de instrução do aluno, o qual pode ser chamado de prova, teste, exame; ii) aquele que tem um olhar atencioso por cada aluno, que dialoga, que se caracteriza por um processo democrático e participativo de todos os pares, que se identifica por ser “um processo de interação, de descoberta pessoal e coletiva para a promoção de aprendizagens” (Batista, 2011, p. 9). A concepção que vamos propor, e que retrata esse segundo método avaliativo, chamaremos de avaliação ampliativa. Vamos encontrar vários títulos atribuídos às concepções avaliativas pertencentes ao segundo grupo - avaliação contínua, avaliação formativa, avaliação processual, entre outras -, porém a que vamos propor integra e amplia algumas características encontradas em outras concepções já utilizadas, conforme veremos a seguir.
Sabemos que todo processo educacional possui um ciclo de ensino-aprendizagem-avaliação e, ao tratarmos de uma metodologia ativa - entendida como um “processo de organização da aprendizagem (estratégias didáticas) cuja centralidade do processo esteja, efetivamente, no estudante” (Pereira, 2012, p. 6) -, é preciso que tenhamos algum entendimento sobre como podemos avaliar o processo de aprendizagem, de forma a contemplarmos todas as etapas que nele ocorrem. Sendo assim, neste item, procuraremos compreender e dissertar sobre definições, conceitos e importância da avaliação nos processos de ensino e aprendizagem.
Perpassando pesquisas voltadas a aprendizagem ativa e processos criativos, encontramos alguns exemplos de avaliações nos estudos de Moran (2019), nos quais ele cita várias formas de avaliar uma aprendizagem ativa. Para Moran (2019, pp. 11-12),
A avaliação, no contexto da aprendizagem ativa, é um processo contínuo, flexível, que acontece sob várias formas: avaliação diagnóstica, formativa, mediadora; avaliação da produção (do percurso: portfólios digitais, narrativas, relatórios, observação); avaliação por rubricas (competências pessoais, cognitivas, relacionais, produtivas); avaliação dialógica; avaliação por pares; autoavaliação; avaliação on-line; avaliação integradora, entre outras. Os alunos precisam mostrar, na prática, o que aprenderam com produções criativas, socialmente relevantes, que explicitem a evolução e o percurso realizado.
Para fins de compreensão e breve introdução das concepções e formas de avaliação que foram citadas por Moran (2019), faremos um resumo daquilo que concerne a cada uma e, em seguida, proporemos uma dinâmica de avaliação que objetiva contemplar o processo de ensino-aprendizagem presente na produção dos vídeos estudantis.
Concepções
i.Avaliação diagnóstica: possibilita, ao professor, obter informações sobre os saberes que seu aluno já possui e quais são suas necessidades; geralmente é realizada na forma de questionários, redações, debates, exercícios; serve como estratégia pedagógica para que o professor organize o trabalho a ser desenvolvido, de maneira a contemplar as necessidades observadas; possui caráter preventivo; as considerações do professor são retornadas ao aluno, permitindo que ele realize sua autoavaliação e se responsabilize, em parte, por sua aprendizagem. “Assim como é constitutivo do diagnóstico médico estar preocupado com a melhoria da saúde do cliente, também é constitutivo da avaliação da aprendizagem estar atentamente preocupada com o crescimento do educando. Caso contrário, nunca será diagnóstica” (Luckesi, 2013, p. 111).
Em resumo, a avaliação diagnóstica se caracteriza por: observação (feita pelo professor) e levantamento de saberes e necessidades do aluno/turma; programação pedagógica adequada ao aluno/turma; retorno (ao aluno/turma) das observações/considerações referentes ao aprendizado; proposição de novas alternativas e desafios para oferecer uma aprendizagem mais autônoma.
ii. Avaliação formativa: proporciona, ao professor, o acompanhamento (e a intervenção, sempre que necessária) dos passos produtivos de seu aluno, no que se refere ao desenvolvimento das atividades pedagógicas propostas; tem o portfólio5 como um dos instrumentos utilizados na organização dos dados observados que, estando atualizado, o professor pode acompanhar a evolução de seu aluno e refletir sobre sua prática pedagógica, optando por mantê-la ou repensá-la.
A avaliação formativa, como o próprio nome indica, intervém durante a formação do aluno, e não quando se supõe que o processo chegou a seu término. Ela indica as áreas que necessitam ser recuperadas, de forma que o ensino e o estudo imediatamente subsequentes possam ser realizados de forma mais adequada e benéfica. (Bloom et al., 1983, p. 22).
Nessa concepção de avaliação há de se permitir o constante feedback aos alunos, objetivando identificar as dificuldades nos conceitos iniciais que são necessários para a construção de outras aprendizagens. Porém não basta identificar as dificuldades, é preciso intervir de forma a recuperar as lacunas que se abrem durante o processo de ensino e aprendizagem. Para Grego, uma das características elementares da avaliação formativa
. . . é sua articulação com o processo de ensino e aprendizagem. Desta forma, ao ressignificar a avaliação, necessitamos igualmente ressignificar a ação pedagógica, resgatando sua essencialidade. Nesse processo ressignificamos também o papel do aluno, situando-o como coautor do projeto de aprendizagem, como construtor de seu próprio processo de desenvolvimento, através da interação com o conhecimento e com seus pares. Propostas inovadoras de ensino, que colocam o aluno no centro do processo educativo, vão nesta direção. (Grego, 2013, p. 11).
iii. Avaliação mediadora: o professor não se restringe à transmissão e correção daquilo que considera “errado”, mas pondera as diferentes situações de aprendizagens e se coloca como mediador do aluno, buscando favorecer novas descobertas para que ele, o aluno, construa sua própria aprendizagem. Jussara Hoffmann (2009, p. 135) diz que “refletir em conjunto com o aluno sobre o objeto do conhecimento, para encaminhar-se à superação, significa desenvolver relação dialógica, princípio fundamental da avalia- ção mediadora”.
Formas
i.Avaliação por rubricas: forma complementar de avaliação; consiste em breves anotações daquilo que está feito, que está por fazer, que pode melhorar, que está perfeito, entre outras; geralmente é realizada com auxílio de quadros (grades/tabelas), nos quais as colunas indicam a expectativa do professor quanto às atividades propostas; algumas imagens (emojis,6 por exemplo) podem ser usadas para indicar a categoria em que se encontra o trabalho (não realizado, parcialmente realizado, finalizado, etc.); auxilia o professor a refletir sobre sua prática pedagógica e a dar um retorno ao aluno sobre seu processo de aprendizagem.
. . . as rubricas apresentam critérios específicos básicos para a avaliação de desempenho do estudante sob forma descritiva que define diferentes níveis de desempenho relacionados à tarefa proposta. Tal gradação parte do mais alto grau de proficiência ao mais baixo, cada qual recebendo um valor cujas escalas podem ser numéricas, qualitativas ou uma combinação dos dois tipos. (Nicola & Amante, 2021, p. 6).
ii.Avaliação dialógica: fundamentada no diálogo entre professor e aluno; investe no diálogo como instrumento de diagnóstico para mediar e formar.
Em seus estudos, Paulo Freire já fazia referência à essência do diálogo na educação, como prática da liberdade,
. . . uma educação que tem como base o diálogo, abre espaço para a inclusão, a reflexão, o questionamento, a cooperação, a interação e, sobretudo, a busca de transformações: desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. (Freire, 1987, p. 78).
Sendo assim, na avaliação dialógica, o professor é, também, aprendiz; e o aluno é, também, educador.
iii.Avaliação por pares: caracteriza-se pelo fato de a avaliação das atividades desenvolvidas ser efetuada, em parte, pelos próprios colegas de turma; o aluno se torna parte ativa no processo de avaliação, tendo sua parcela de contribuição nos demais trabalhos; o professor pode oferecer alguns critérios de avaliação que direcionem a atenção daquilo que deve ser avaliado nas atividades dos pares.
Como para avaliar é preciso ter clareza do assunto que está sendo explicitado, esse método, além de descentralizar o professor do processo de avaliação, dá oportunidade para que os demais alunos participem de forma mais ativa nas atividades dos colegas, colaborando no processo de aprendizagem (seu e dos demais participantes).
iv. Autoavaliação: sua principal característica é a autorregulação do aluno, ou seja, oportuniza ao discente gerenciar sua aprendizagem, seu comportamento e suas ações; pode ser realizada no encerramento de um período de atividades ou em períodos estipulados pelo professor; pode ser praticada por alunos e por professores; geralmente é realizada com o preenchimento de uma ficha que contém itens referentes a estudo, comportamento, aprendizagem, críticas, entre outros; é considerada um dos instrumentos da avaliação diagnóstica, formativa e mediadora, pois “auxilia os alunos a adquirir uma capacidade cada vez maior de analisar suas próprias responsabilidades, atitudes, comportamento, pontos fortes e fracos, suas condições de aprendizagens e suas necessidades para atingir os objetivos” (Francisco & Moraes, 2013, p. 14971).
v. Avaliação on-line: utiliza-se da tecnologia digital para executar processos avaliativos; o professor pode fazer uso de plataformas educacionais ou criar seu próprio recurso digital como instrumento de avaliação; pode compreender quaisquer das avaliações descritas, entre outras.
vi. Avaliação integradora: constitui-se de todos os instrumentos avaliativos que integram o processo de aprendizagem; faz um resgate das atividades desenvolvidas; avalia a integração do conhecimento teórico com a aplicação prática; pode ser elaborada em caráter interdisciplinar.
Após conhecermos algumas características das concepções e formas avaliativas referenciadas por Moran (2019), é possível propormos uma concepção/forma avaliativa que contemple todas as fases envolvidas na aprendizagem realizada e vinculada ao uso intencional e pedagógico dos vídeos estudantis.
Definiremos a concepção avaliativa que estamos propondo, avaliação ampliativa, como: i) uma avaliação processual diagnóstica, mediadora e formativa no sentido de que o professor deve buscar conhecer seu aluno (suas aptidões, seus pontos fracos, facilidades/dificuldades, etc.) e intervir/auxiliar/direcionar sempre que se fizer necessário, ponderando as diferentes situações de aprendizagens; ii) uma avaliação da produção, que acompanhe os passos do aluno, utilizando, para isso, instrumentos organizacionais como planilhas, tabelas, portfólios, entre outros, de forma dialogada e atenta às necessidades de cada um; iii) uma avaliação descentralizada do professor, propiciando que outros membros da classe possam intervir com críticas construtivas nas atividades dos colegas; iv) uma autoavaliação do caminho percorrido durante o processo criativo e de produção dos vídeos, de modo a refletir sobre os resultados (aprendizagens) esperados e obtidos, tanto pelo professor quanto pelos alunos; v) uma avaliação final marcada pela participação coerente e ativa de todos os pares envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, visando a aprimorar novas propostas de práticas pedagógicas.
No que diz respeito ao quinto item, essa avaliação coletiva contribui para uma reflexão sobre o caminho percorrido durante a execução da proposta metodológica, registrando seus pontos fortes e fracos e toda sugestão de modificações que contribua para sua melhoria e, dessa forma, vindo a “construir e aplicar procedimentos de avaliação formativa de processo ou de resultado que levem em conta os contextos e as condições de aprendizagem, tomando tais registros como referência para melhorar o desempenho da escola, dos professores e dos alunos” (Ministério da Educação, 2018, p. 17).
Utilizamos um esquema para organizar nossa proposta avaliativa, sendo que as ferramentas apresentadas são meras sugestões, de forma que cada professor poderá adaptá-las à realidade de sua turma. O esquema está representado na Figura 1.
A concepção/forma avaliativa que estamos propondo tem cunho qualitativo e pode ser realizada com o auxílio de diferentes instrumentos para situações variadas. Segundo Batista (2011, p. 11, grifos da autora), “os medias da avaliação são os instrumentos, os documentos formais de avaliação. Porém o que os qualifica são os procedimentos que são influenciados pelas interações estabelecidas”. Por procedimentos, a autora se refere a todos os caminhos percorridos pelos estudantes, na busca por conhecimento/aprendizado.
Quanto ao conteúdo desenvolvido no período letivo, podemos nos valer das pastas de anotações individuais (ao que aconselhamos o uso de planilhas eletrônicas, compostas por abas individuais designadas para cada aluno), assim é possível anotar o andamento de cada trabalho, possíveis intervenções, correções, indicações de leitura, etc. Para uma apresentação prévia do trabalho à turma, sugerimos que se faça uma planilha com alguns tópicos que guiem os pares no momento de efetuarem suas avaliações e sugestões. Já na avaliação do vídeo finalizado, devemos observar se as normas que foram estabelecidas, em um roteiro inicial, foram respeitadas, por exemplo: tempo de vídeo, legendagem, terminologia matemática, definições e conceitos corretos, etc. Após todo o processo de avaliação, sugestões, correções, aprimoramentos, entre outros, o vídeo finalizado constituirá o produto final de todo o processo e poderá ser compartilhado (se for de comum acordo e forem respeitadas as normas éticas para exposição de áudio e imagem dos envolvidos) em plataformas virtuais de livre acesso, compondo um acervo de estudo complementar.
É importante que se perceba que o vídeo, como produto final, pode fazer parte do processo avaliativo (exemplos: avaliar a complexidade do vídeo, ou seja, quantos agentes foram movimentados para a sua consolidação; a qualidade de som e imagem, etc.), mas não deve ter o papel principal - talvez, inclusive, um papel adicional. O foco de todo o processo deve ser centralizado no aluno, sendo ele a parte principal, ativa e participativa do ciclo ensino, aprendizagem e avaliação.
Quanto ao resultado final da avaliação ampliativa de cada aluno, o professor deverá seguir o regimento e as normas da instituição educacional à qual pertence. Nossa preocupação e, portanto, nosso tema de pesquisa, é olhar para o desenvolvimento do aluno durante todo o processo de aprendizagem que permeia o desenvolvimento de uma metodologia ativa - neste caso, o vídeo estudantil.
QUARTA PARTE: OLHANDO ALGUNS ELEMENTOS DA AVALIAÇÃO AMPLIATIVA
Nesta seção, vamos comentar como alguns dos passos da avaliação ampliativa foram mobilizados para avaliarmos a proposta de produção de videoaulas estudantis de matemática, feita com uma turma do ensino médio do IFSul campus Pelotas, no segundo semestre de 2020.7
Para a realização da atividade proposta, elaboramos o seguinte roteiro de trabalho, que foi desenvolvido pelos alunos ao longo de dez semanas: i) produzir uma videoaula de quatro a seis minutos sobre o tema “X” (fazer um recorte sobre uma das unidades estudadas e, dentro dessa unidade, escolher um tópico); ii) pensar em um problema para ser desenvolvido dentro do tema escolhido; iii) criar um espaço para desenvolvê-lo (local a ser escolhido para contar a história - cenário); iv) utilizar, adequadamente, conceitos e notações matemáticas nos problemas; v) utilizar ferramentas (figurinos, figuras, vídeos, músicas, animações, etc.) que poderão ajudar na visualização e compreensão do problema (é o que chamamos de linguagem audiovisual, o que compõe a narrativa); vi) para a filmagem, usar o celular, gravação da tela do computador, filmadora ou o que tiver disponível; vii) editar o vídeo usando softwares gratuitos (ou mesmo on-line) ou qualquer outro do qual já tenha conhecimento; viii) salvar o vídeo em .mp4 e fazer o upload na plataforma YouTube, no modo “não listado” (assim o vídeo ficará visível apenas para quem tiver o link). Logo depois, enviar o link para a professora na pasta intitulada VIDEOAULAS; ix) normas para postagem do vídeo na plataforma YouTube.
Durante o acompanhamento do trabalho, a professora titular trocou e-mails e videoconferências com seus alunos, a fim de sanar suas dúvidas, intervir sobre uma ideia conflitiva e indicar material texto/vídeo que auxiliasse na execução da tarefa. Esses momentos foram compondo a avaliação do processo de produção. Nas figuras 2 e 3, temos um exemplo da ocorrência dessa troca de conversa.
Em alguns casos, essas trocas de mensagens entre um aluno/grupo e a professora ocorreram várias vezes, até que se chegasse a um resultado satisfatório para ambos.
Considerando o roteiro de trabalho que nós, professores, elaboramos e a avaliação ampliativa que nos guiava como concepção avaliativa, criamos uma planilha de rotina em que estabelecemos os principais passos da atividade, a descrição avaliativa e as ferramentas das quais nos utilizamos para acompanhar a evolução dos alunos.
Na Tabela 2, trazemos um resumo de nossa planilha.
PASSOS | AÇÕES | AVALIAÇÃO AMPLIATIVA | FERRAMENTAS |
---|---|---|---|
1 - Apresentar a proposta de atividade para a turma | Apresente a atividade e deixe- -os pensar sobre o assunto por uma ou duas semanas. | Avaliação diagnóstica Nesse período, de uma ou duas semanas, introduza conversas sobre atividades que se utilizem da tecnologia digital; indague sobre conhecimentos e experiências com produção de vídeos; faça um diagnóstico sobre definições e conceitos (pré-requisitos) para o conteúdo que irá desenvolver no período letivo. |
Utilize-se de conversas; questionários impressos ou digitais; testes impressos ou disponibilizados em plataforma de uso da escola. |
2 - Assistir e analisar vídeos estudantis | Apresente dois vídeos estudantis, de gêneros diferentes, e peça para que analisem os elementos narrativos. Apresente algumas técnicas de filmagem. | Avaliação diagnóstica, formativa e mediadora Durante a análise dos vídeos (procure pelos vídeos que tratem de assuntos pré- -requisitos para o conteúdo que você vai desenvolver no período letivo), atente-se para o entrosamento de seus alunos; analise como eles percebem os elementos da narrativa e como os descrevem. Poderá haver alunos que não se manifestem; indague-os, traga-os para o debate, estimule-os. Utilize os dados coletados no diagnóstico inicial e instigue seus posicionamentos sobre o assunto tratado no vídeo, suas compreensões e suas críticas. Anote as dificuldades encontradas e utilize-as nas etapas seguintes, de modo a facilitar a compreensão daquilo que não tinha ficado claro. Peça para os que conhecem alguma técnica de filmagem apresentarem-na para a turma, de forma simples e com sua interação. |
Utilize-se de planilhas eletrônicas, bloco de notas, portfólios, cartões individuais, caderno de anotações. Use questionários impressos ou digitais para saber como está o andamento das atividades. Exemplo: 1. Resuma os vídeos analisados. 2. Que elementos audiovisuais você percebeu nas narrativas? 3. A linguagem utilizada nos vídeos foi clara para você? 4. Teve algum conceito que você não entendeu? Qual(is)? |
PASSOS | AÇÕES | AVALIAÇÃO AMPLIATIVA | FERRAMENTAS |
3 - Pensar e escrever um roteiro | Peça para que se agrupem (ou não) e pensem em um tema e em um possível roteiro. Em seguida, peça para que escrevam suas ideias. | Avaliação diagnóstica, formativa e mediadora Observe os agrupamentos; cuide para que não haja discriminação de nenhuma espécie, mas, havendo, trate do assunto de forma a não constranger seus alunos; se preciso for, faça você a distribuição dos grupos. Durante o prazo combinado, elabore um questionário sobre o andamento da atividade, até o passo anterior, e peça que entreguem antes das apresentações. Assim, você manterá a atividade em constante andamento, evitando os trabalhos de última hora. Conforme receba os questionários, retorne-os para os alunos com suas contribuições e aproveite para fazer o resgate das dificuldades percebidas. É importante que seu aluno saiba que você está acompanhando o seu processo de aprendizado. |
Utilize-se de planilhas eletrônicas, bloco de notas, portfólios, cartões individuais, caderno de anotações. |
4 - Filmar, editar e apresentar o vídeo para o grupo | Converse com a turma sobre as funções que deverão ser desenvolvidas durante e após as filmagens. | Avaliação diagnóstica, formativa e mediadora Indague sobre habilidades e dificuldades de seus alunos com as ferramentas digitais de filmagem e edição. Destine algum tempo, no seu planejamento, para tirar dúvidas que surgirem. Faça anotações para acompanhar o processo de aprendizagem dessas tecnologias que serão utilizadas. Divida o tempo para as apresentações e os comentários sobre cada vídeo. Anote as contribuições de cada aluno e as distribua entre os grupos. Essa ação irá ajudar na fase de revisão e correções. |
Utilize-se de planilhas, portfólios, fichas… |
5 - Fazer as correções finais e compartilhar | Combine o meio de compartilhamento do vídeo: e-mail; drive; canal do YouTube… | Avaliação formativa e mediadora Confira se todos fizeram as correções necessárias e disponibilize um local de compartilhamento. |
Utilize-se de uma lista (de chamada, por exemplo), para certificar-se de que todos entregaram seus trabalhos. |
Fonte: Elaboração dos autores.
A Tabela 2 foi um exemplo de planejamento que utilizamos para acompanhar e avaliar cada etapa da atividade, porém, para fazer o fechamento da nota (o programa institucional que utilizamos exige uma nota numérica no fechamento das disciplinas), criamos um documento no Word, contendo uma tabela para cada grupo. Nessa tabela, a professora responsável pela turma fazia anotações sobre o resultado dos trabalhos (o resultado do vídeo finalizado) e também sobre dificuldades/curiosidades percebidas durante o processo de avaliação ampliativa. Um modelo dos dados de avaliação de um estudante pode ser analisado na Tabela 3.
ALUNO XX | |
---|---|
Duração | 10 |
Terminologia matemática | 8 |
Explicação | 10 |
Áudio | 10 |
Média | 9,5 |
Nota sobre peso 3 | 2,8 |
XX, em relação à terminologia, você usou as expressões “cortar”, onde, na verdade, está utilizando definição de equação exponencial, então não “cortamos” as bases, simplesmente analisamos os expoentes, visto que as bases são iguais. Outro cuidado que devemos ter é o de usar sempre a mesma notação para referenciar a mesma coisa. Exemplo: ora você usa “r” para razão, ora usa “R”. Você tem muita desenvoltura e simpatia. Ficou muito bom, parabéns! |
Fonte: Elaboração dos autores.
Para compor a nota final, a professora analisou se a duração do vídeo estava dentro do intervalo estabelecido de quatro a seis minutos, sendo descontada parte irrisória da nota caso estivesse pouco abaixo de quatro ou pouco acima de seis minutos; avaliou conceitos/definições e terminologias matemáticas no processo da narrativa; ponderou as explicações sobre o tema e o problema desenvolvido; considerou a qualidade de áudio e imagem para garantir a boa visualização e audição das narrativas expostas. Cabe salientar que os itens que fazem referência à terminologia e explicação foram analisados considerando todo o histórico de troca de ideias entre os alunos e a professora, conforme as anotações de cada etapa desenvolvida na atividade, referenciadas na Tabela 2.
Como a finalização dessa atividade coincidiu com o V Festival de Vídeos Digitais e Educação Matemática, a professora propôs, aos seus alunos, que lhe permitissem inscrever seus vídeos no festival. Assim, sete trabalhos foram inscritos e aceitos e, desses, cinco vídeos foram classificados para a fase final, embora nenhum tenha sido contemplado entre os três primeiros colocados. Os cinco vídeos finalistas podem ser assistidos no canal do Grupo de Pesquisa em Informática, outras Mídias e Educação Matemática (Gpimem),8 da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp).
Durante o processo de produção, a professora apontou a necessidade de se incorporar, aos vídeos, ferramentas digitais de tecnologias assistivas para alunos com deficiências auditivas e/ou visuais. Alguns grupos adicionaram legendas, mas a maioria não teve tempo ou condições de explorar (aprender a usar) essas ferramentas, que requerem uma certa prática de manuseio.
Com o entendimento de que a produção de videoaulas estudantis, bem orientada e acompanhada pelo professor, é uma metodologia ativa focada nas tecnologias digitais, portanto condizente com nossa atual realidade, e pensando em uma avaliação coerente para acompanhar a metodologia ativa e todos os seus desdobramentos, foi que nos dedicamos a tentar lapidar o arquétipo apresentado, no qual, de forma experimental, foram contempladas algumas das etapas avaliativas que incorporam a avaliação ampliativa proposta.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Trabalhar com metodologias ativas não é uma tarefa simples. Como vimos, requer uma mudança de hábitos e conceitos mais enraizados.
A visão de o ensino, a aprendizagem e a avaliação serem construídos de forma dialogada, atenta, flexível e refletida é um desafio que precisa ser vencido. E quando o professor permite que o aluno construa seu próprio aprendizado - utilizando seus saberes e potencialidades -, quando incentiva sua autonomia participando/intervindo/corrigindo, sempre que necessário, eles (professor/aluno/escola) aumentam a probabilidade de vencer esse desafio.
Não nos cabe, aqui, adentrar problemas específicos de estruturação física da escola, mas sim refletirmos, juntos, sobre a estrutura de nossos pensamentos e nossas ações enquanto educadores em uma era em que não cabe mais o professor se acreditar detentor do conhecimento.
A proposta da produção de videoaulas estudantis, considerando todas as etapas que a compõem (pensar em um tema a ser narrado, escolher a narrativa que será utilizada, escrever roteiros, encenar, filmar, editar, revisar, entre outros), satisfaz os conceitos de metodologias ativas que aqui foram trazidos: permite a interação, reflexão, envolvimento, descoberta, criatividade e orientação; proporciona uma postura mais participativa do estudante; possibilita a autonomia do aluno para escolher como fazer; sendo um método embasado na tecnologia digital, os alunos têm mais possibilidades de pesquisa, autoria, publicação, compartilhamento, etc.; as potencialidades criativas podem ser mais bem exploradas; e, por fim, pode haver uma aproximação maior entre professor e aluno e entre os próprios alunos, gerando um ambiente mais harmonioso de troca de conhecimentos (Andrade & Sartori, 2018; Moran, 2018; Sahagoff, 2019; Valente, 2018).
Talvez muitos alunos não tenham conhecimento de que, ao produzirem uma videoaula, eles precisam elaborar um roteiro, fazer decupagens (recortes de con- teúdos), resumos e sínteses, utilizar vários tipos de linguagem, usar da criatividade, tecnologias e trabalhar com múltiplas habilidades. Fazendo isso, têm a possibilidade de construir uma aprendizagem significativa, sendo eles próprios os agentes ativos das trocas de conhecimentos realizadas.
Todo esse processo requer acompanhamento contínuo do professor, por isso nossa preocupação em registrar cada passo, possibilitando a intervenção do educador, sempre que necessário, e a interação entre os pares (professor-aluno; aluno- -aluno), facilitando uma aprendizagem mais significativa e avaliando todo esse movimento que envolve o ciclo ensino-aprendizagem-avaliação.
A ideia de uma avaliação ampliativa foi aqui apresentada considerando-se a proposta de os alunos elaborarem vídeos sobre conteúdos matemáticos; entretanto, indubitavelmente, a avaliação ampliativa pode ser pensada para outras diferentes atividades que o professor vier a propor em suas aulas.