INTRODUÇÃO
A temática do brincar na infância ocupa um importante espaço nas discussões e produções em diferentes linhas teóricas e campos profissionais. Cotonhoto, Rossetti e Missawa (2019) enfatizam o quanto as brincadeiras e os jogos se constituem como recursos pedagógicos para a aprendizagem e o desenvolvimento de habilidades na criança, sejam elas cognitivas, sejam elas sociais, motoras ou afetivas. Esses autores destacam que Frederico Froebel (1782–1852), criador do jardim de infância, foi o primeiro pedagogo a sistematizar uma proposta pedagógica para esta etapa de ensino, estabelecendo as brincadeiras e os jogos como elementos centrais da sua teoria educativa (Cotonhoto, Rossetti e Missawa, 2019). Diferentes estudiosos reconhecem o potencial pedagógico das brincadeiras/jogos de papéis para o desenvolvimento do psiquismo da criança, entre eles Leontiev (2004), Vygostky (2012) e Elkonin (2017).
A educação infantil (EI), enquanto primeira etapa da educação básica (EB), obrigatória desde os quatro anos de idade para todas as crianças (Brasil, 2013), inclusive as com transtorno do espectro autista (TEA) (Brasil, 2008; 2012), tem uma função fundamental na constituição do psiquismo infantil. Além do acesso da criança à escola, o que está em discussão é a questão dos conteúdos a serem ensinados para que cada criança consiga desenvolver suas máximas potencialidades psíquicas, bem como os procedimentos pedagógicos para que elas consigam se apropriar dos conhecimentos ensinados, considerando-se o período de seu desenvolvimento (Magalhães e Mesquita, 2014).
Compreendemos que não é qualquer brincadeira e/ou jogo que possibilitará o desenvolvimento do psiquismo, uma vez que ele é resultado da atividade humana. Autores como Leontiev (2004; 2016), Martins (2015), Elkonin (2017) e Vygostky (2008; 2012) defendem a ideia de que é pela atividade que o homem se adapta à natureza; ele a modifica em razão das suas necessidades (criam objetos, constroem habitações) e, nesse processo, transforma-se como pessoa humana. Leontiev (2004) ressalta que cada geração inicia sua vida num mundo de objetos e de fenômenos criados pelas gerações anteriores e apropria-se das riquezas do mundo participando no trabalho, na produção e nas diversas formas de atividade social, desenvolvendo, desse modo, as aptidões propriamente humanas.
Entendemos que é somente pela apropriação da cultura que a criança vai desenvolver as habilidades humanas, diferenciando-se dos animais pelo desenvolvimento das funções psicológicas superiores — FPS (Vygostky, 2008) ou neoformações (Leontiev, 2004), definidas por Pino Sirgado (2000) como "relações externas internalizadas". A principal característica do processo de apropriação é desenvolver no homem aptidões e funções psíquicas novas. Leontiev (2004) define neoformações cerebrais como "o substrato material das aptidões e funções específicas que se formam no decurso da apropriação pelo homem do mundo dos objetos e fenômenos criados pela humanidade, isto é, da cultura" (p. 271). De acordo com Leontiev (2004), as neoformações somente se desenvolvem na relação dos homens com outros homens por meio da atividade humana.
Ao estudar esse processo, o autor descreve alguns estágios de desenvolvimento psíquico e as atividades principais ou dominantes de cada um deles. Elkonin (2017), baseado nessas ideias, sistematizou uma teoria sobre a periodização do desenvolvimento humano. Ele nomeia cinco estágios desde o nascimento da criança, quais sejam: 1. a comunicação emocional do bebê (a atividade principal nesta fase consiste na comunicação emocional direta com os adultos); 2. a atividade objetal manipulatória da primeira infância (na qual tem lugar a assimilação dos procedimentos socialmente elaborados de ação com os objetos); 3. o jogo de papéis (idade pré-escolar em que a atividade principal é o brincar na sua forma mais expandida); 4. a atividade de estudo da idade escolar (possibilita a apropriação de novos conhecimentos); e 5. comunicação íntima pessoal e atividade profissional/estudo do período da adolescência (em que a atividade de comunicação está relacionada ao estabelecimento de relações com os colegas [normas morais e éticas]).
Os períodos descritos por Elkonin (2017) contribuem para refletirmos sobre o desenvolvimento da criança na sua interação com o meio social. O autor destaca que a transformação das atividades em principais, em determinados momentos, não elimina as que já existiam na criança, sendo um processo dinâmico e flexível. Ele defende a necessidade de superar o enfoque naturalista do desenvolvimento do psiquismo, o que implica mudança de compreensão sobre a inter-relação entre a criança e a sociedade.
Magalhães (2018) alerta que, se é pela atividade que satisfazemos as nossas necessidades, é também por intermédio dela que o psiquismo se desenvolve. Logo, a qualidade do desenvolvimento psíquico depende da qualidade do ensino oferecido à criança desde o seu nascimento, sendo fundamental que o professor tenha consciência, compreenda esse processo e desenvolva um trabalho educativo que possibilite o alcance de níveis mais elevados de desenvolvimento psíquico. Para Saviani (2012, p. 13), o trabalho educativo pode ser entendido como "o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens". Para o autor, o objeto da educação refere-se, "de um lado, à identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas mais adequadas para atingir esse objetivo" (Saviani, 2003, p. 13).
Seguindo essa linha teórica, Asbahr and Nascimento (2013) e Magalhães (2018) advertem que no processo de escolarização não cabe à escola esperar que a criança se desenvolva, mas ela precisa criar as condições necessárias para que ocorra esse processo, pois, como destaca Martins (2015), as atividades guia propostas pelos professores devem considerar a periodização do desenvolvimento. Assim, a EI, especialmente o período pré-escolar, é o momento em que a brincadeira (jogos de papéis) pode acontecer de forma mais plena, favorecendo o desenvolvimento das FPS.
Desse modo, não é qualquer ensino que atua na promoção do desenvolvimento. Saviani (2020) ressalta que, ao educarem, é necessário que os professores considerem a realidade física, biológica, psicológica e cultural da criança. A fase pré-escolar é um momento em que a realidade se abre mais para a criança. Em sua atividade, especialmente nos seus jogos, ela consegue ultrapassar os limites da manipulação, estabelecendo uma relação com maior atuação — por exemplo, faz de conta, cria histórias, guia um carro, aponta uma pistola — sem que isso seja possível na sua realidade objetiva, posto que ela ainda é criança. Ela também não se importa com essa questão, uma vez que suas necessidades básicas estão sendo atendidas pelos adultos (Leontiev, 2016).
Diante dessas considerações, neste estudo questionamos: quais são as compreensões sobre a atividade do brincar produzidas por professores que atuam na EI, e quais as implicações delas na organização e desenvolvimento da atividade de ensinar nas/em crianças com TEA matriculadas na pré-escola?
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico em Transtornos Mentais — DSM-5, o TEA é caracterizado como um transtorno do neurodesenvolvimento em que a criança, desde os primeiros anos de vida, apresenta prejuízos nas áreas sociocomunicacionais (comunicação e interação social) e nos aspectos comportamentais no que se refere aos padrões restritos e repetitivos de comportamento, atividades e interesses (APA, 2014). Por se tratar de um espectro, essas características estão presentes de formas e intensidades diferentes em cada pessoa, porém, em geral, acabam afetando a relação da criança com as demais pessoas e o modo como ela compreende e se relaciona com o meio social.
Esse questionamento é pertinente em razão do aumento de crianças com TEA matriculadas na EI, conforme dados da literatura (Salles, 2018; Araujo, 2019; Sarmanho, 2021), e também pela escassez de estudos nacionais que se dedicam a entender a temática do brincar, conforme demonstrado na revisão de literatura realizada por Albuquerque e Benitez (2020). A escola cumpre um papel fundamental para o desenvolvimento das FPS e/ou neoformações, sendo necessário que as crianças com TEA, nas situações de brincadeira, também entrem em atividade a fim de que ocorra o seu desenvolvimento.
Dainez, Smolka and Souza (2022) destacam que historicamente lhes foi dificultada a ocupação efetiva do seu lugar de aluno na sala de aula comum. Partindo de um pressuposto de incapacidade a priori, para essas crianças era reservado o espaço das instituições especializadas, em que permaneciam segregadas.
Foi com a promulgação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva — PNEEPEI (Brasil, 2008) que novas formas de inserção e participação nos processos de escolarização foram possibilitadas a esses alunos. Dainez, Smolka e Souza (2022) asseveram que a escola se distingue das instituições filantrópico-assistenciais, apresentando-se como um microcosmo da vida humana. Trata-se de um local de múltiplas relações e de apropriação de conhecimentos que possibilitam ampliar a atuação da pessoa com deficiência na prática social. Eles afirmam que "a posição de aluno traz, assim, implicada a posição de cidadão. Deste modo, as relações de ensino vivenciadas no meio escolar tornam-se força motriz do desenvolvimento humano" (p. 13).
A inclusão de crianças com TEA na EI é uma realidade educacional mundial. Com base em pesquisa realizada no Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES, 2022), da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD, 2022) e da associação dos descritores "transtorno do espectro autista" OR "autismo", com os termos brincadeira, funções psicológicas superiores, psiquismo e EI, constatou-se que são escassos os estudos que buscam compreender como ocorre o processo de desenvolvimento do psiquismo nessas crianças por meio da atividade do brincar (criança) e do ensinar (professor).
Um desses estudos foi o desenvolvido por Salles (2018), que buscou compreender como as formas de mediação pedagógica desenvolvidas pelo professor contribuem para a participação da criança com autismo em atividades lúdicas. Os participantes foram uma professora/brinquedista e uma criança com TEA. A autora concluiu que a mediação pedagógica pode favorecer o desenvolvimento da criança com autismo, possibilitando que ela amplie sua relação com o meio social.
Outro estudo foi o de Araujo (2019), que teve como foco os aspectos relacionais da criança com TEA. Participaram 17 crianças, sendo dez sem diagnóstico, seis com autismo e uma com síndrome de Down. Resultados mostram que, quando a criança com autismo não faz o vínculo com o adulto, sua ação no meio fica empobrecida e limitada somente aos seus interesses. A partir do vínculo com o adulto, no entanto, sua ação no meio se enriquece, ampliando suas possibilidades de ação e de interação com os pares, brinquedos e brincadeiras. A autora destaca que, na dimensão de ocupação pessoal no espaço social, há um distanciamento da criança com TEA em relação aos seus pares.
Já no estudo desenvolvido por Silva (2017), o foco foi no brincar de faz de conta da criança com autismo. A pesquisa foi desenvolvida numa classe especial frequentada por seis alunos com TEA de quatro a seis anos de idade, dentro de uma escola pública de EI do Distrito Federal. Fundamentada na análise microgenética, a autora destaca que, contrariando a literatura tradicional, foi possível verificar que a criança com autismo, de forma qualitativamente distinta, não somente brinca, mas também cria, imagina e assume papéis.
Destacamos que, apesar de os estudos realizados por Silva (2017), Salles (2018) e Araujo (2019) terem como perspectiva teórica a psicologia histórico-cultural, a questão que norteou a investigação foi distinta da presente pesquisa. Além desses estudos descritos, foram localizados, ainda, o de Mattos (2019), que teve como objetivo a construção de um caderno com atividades pedagógicas para professores a fim de contribuir para o processo de inclusão da criança com TEA. A pesquisa de Sarmanho (2021) objetivou conhecer as representações sociais das professoras e facilitadoras sobre as brincadeiras das crianças com TEA e de que modo elas se materializam nas práticas pedagógicas. A pesquisa revelou as dificuldades das professoras de se aproximarem e realizarem as mediações nas brincadeiras das crianças com TEA, o que a autora atribui às próprias representações sociais que as participantes tinham sobre a criança com TEA e a ausência de experiências e de formação inicial e continuada sobre a temática.
Justificamos a importância desta pesquisa considerando que a brincadeira no período pré-escolar se constitui como a atividade principal para o desenvolvimento da criança. Buscamos contribuir para o entendimento de como acontece o desenvolvimento psíquico das crianças com TEA, qualificando, assim, a formação/atuação profissional dos sujeitos incluídos nesse processo, tendo em vista o movimento de ação/reflexão/ação que o estudo se propôs a realizar. Nossos objetivos foram investigar as compreensões sobre a atividade do brincar produzidas por professores que atuam na educação infantil e analisar as implicações delas na organização e no desenvolvimento da atividade de ensinar em crianças com TEA matriculadas na pré-escola.
MÉTODO
DELINEAMENTO
Este estudo é de natureza qualitativa, modalidade pesquisa-ação. Com relação à pesquisa-ação, Carr e Kemmis (1988) destacam que ela oportuniza a compreensão da prática dos professores, suas teorias, interpretações e sentidos com base em suas experiências docentes, possibilitando a reflexão e a produção de novos significados e ações para o seu fazer pedagógico. Conforme Marie Thiollent e Colette (2014), a pesquisa-ação pode ser entendida como estratégia de autoformação que envolve a participação dos próprios interessados, garantindo melhor efetividade das soluções.
PARTICIPANTES
Os participantes do estudo foram dois meninos com diagnóstico de TEA matriculados na EI da rede municipal de um município da região noroeste do estado do Rio Grande do Sul, duas professoras e duas monitoras dessas crianças, que naquele momento atuavam como acompanhantes especializadas para os alunos com TEA, conforme preconizado na lei 12.764 (Brasil, 2012). Destaca-se que todos os nomes utilizados na identificação são fictícios, a fim de preservar a identidade dos participantes.
COM RELAÇÃO ÀS CRIANÇAS
Adriano é um menino de quatro anos que recebeu o diagnóstico de TEA aos três anos de idade quando estudava no maternal II da Escola Amor. Desde os seus seis meses frequenta a escola de EI, em que estava matriculado no turno da manhã na pré-escola I no momento das observações. Ele é filho único e reside com seus pais. Além do turno de escola, Adriano é acompanhado pela professora do Centro de Atendimento Educacional Especializado (CAEE) da EI municipal. Na área da saúde tem acompanhamento com terapeuta ocupacional, fonoaudióloga e psicóloga. Seu interesse é pelas letras e números; conhece e repete o alfabeto em português, inglês e russo. Sua comunicação é verbal, tendo foco no inglês.
Leandro é um menino de cinco anos que recebeu o diagnóstico de TEA aos três anos de idade quando estudava no Maternal II da Escola Liberdade. Desde os seis meses frequenta a escola de EI em que estava matriculado no turno da manhã na pré-escola II no momento das observações. Leandro é filho único e reside com seus pais. Além do turno de escola, ele é acompanhado pela professora do Centro de Atendimento Educacional Especializado (CAEE) da EI municipal. Na área da saúde tem acompanhamento com terapeuta ocupacional e fonoaudióloga. Seu interesse é pelos jogos de lógica, quebra-cabeça, memória e jogos de computador. Sua comunicação é verbal em assuntos do seu interesse.
Destacamos que, no início das observações, as duas turmas das crianças participantes estavam sendo intercaladas, com redução do número de alunos em virtude da pandemia da COVID-19. Situação que posteriormente se reestabeleceu, possibilitando o retorno de todos os alunos de forma presencial à escola. Ao longo das observações com Adriano e Leandro foram construídos momentos de interação entre esta pesquisadora, as crianças e as profissionais do contexto escolar.
NO QUE SE REFERE ÀS PROFISSIONAIS PARTICIPANTES
Profissionais da Escola Amor: a professora Aline tem formação em magistério, licenciatura em educação física e especialização na área da educação. Atuou dez anos como monitora e está há seis anos no cargo de professora de EI. No início da produção de dados, ela estava afastada da sala de aula, por ser grupo de risco em decorrência do coronavírus, situação que logo se regularizou possibilitando seu retorno à sala de aula. A monitora Andréia possui magistério e licenciatura em matemática. Atua na escola de EI e como professora de inglês particular. Na EI possui cinco anos de experiência profissional. Aline e Andréia, no período desta pesquisa, estavam vinculadas à turma de Adriano na pré-escola I.
Profissionais da Escola Liberdade: a professora Lígia tem magistério e bacharelado em psicologia. Atuou dez anos como monitora e está há seis anos como professora de EI. A monitora Letícia possui magistério e licenciatura em pedagogia, tendo nove anos de experiência profissional. Lígia e Letícia estavam vinculadas à turma de Leandro na pré-escola II.
PROCEDIMENTOS DE PRODUÇÃO DE DADOS E ASPECTOS ÉTICOS
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade em que as autoras estão vinculadas, sob o número 34635520.0.0000.5350 do Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE). A produção dos dados ocorreu no período de fevereiro a dezembro de 2021, com base na observação e intervenção, desta pesquisadora, com as professoras e com as crianças. Foram realizados diferentes momentos de observação em aulas, com o objetivo de analisar as brincadeiras propostas pelas professoras e a forma como as crianças realizavam as atividades, com que intencionalidade pedagógica as atividades são propostas e os indícios de desenvolvimento psíquico dos alunos. Além disso, foram observadas e analisadas as produções dos alunos relacionadas às falas, brincadeiras propostas por eles, desenhos, registros gráficos, entre outras.
As observações das crianças foram registradas por intermédio de filmagem e fotos, com o objetivo de analisar e registrar suas interações na brincadeira e como esta acontece em sala de aula. Ainda, foi utilizado o diário de campo (DC), o qual consiste em um caderno no qual foram anotados e registrados fatos, observações e informações importantes para a compreensão da temática de estudo.
Com as duas professoras e as duas monitoras da turma, além do contato individual foi realizado um encontro de grupo focal (GF), que aconteceu via Google Meet (em virtude da COVID-19). Para a realização desse encontro de GF levamos em consideração as ideias de Barbour (2009), que destaca a importância da preparação do pesquisador, que deve desenvolver um roteiro e selecionar estímulos que incentivem a discussão e a interação do grupo. Neste estudo o grupo focal foi composto de quatro participantes, além da pesquisadora, com o intuito de refletir sobre a brincadeira e o seu papel no desenvolvimento psíquico das crianças com TEA na EI.
ANÁLISE DE DADOS
Os dados produzidos foram organizados considerando-se os pressupostos teóricos da análise textual discursiva (ATD), que se caracteriza como metodologia de análise das informações que objetiva produzir novas compreensões com base nos discursos e fenômenos (Moraes e Galiazzi, 2020). A análise tem o seu início com a unitarização (desmontagem dos textos, em que eles são separados em unidades de significado); na sequência há o estabelecimento das relações, em que os significados semelhantes são agrupados mediante categorização, podendo gerar vários níveis de categorias de análise. No terceiro momento há a produção do novo emergente, em que, desde a análise, é possibilitada a transformação não somente dos conhecimentos e teorias do pesquisador, "mas também de seus entendimentos e paradigmas de ciência, o que implica de forma intensa a transformação do pesquisador e da sua realidade" (Moraes e Galiazzi, 2020, p. 15). A interpretação dos resultados foi realizada com apoio teórico de autores da psicologia histórico-cultural e da pedagogia histórico-crítica.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Neste item apresentamos resultados construídos com base na ATD, da qual emergiram duas categorias: a primeira trata das "compreensões sobre o brincar", e a segunda aborda "o brincar e o ensinar na EI em crianças com TEA". Na sequência apresentamos essas duas categorias.
COMPREENSÕES SOBRE O BRINCAR
Nesta categoria buscamos compreender como a atividade do brincar é concebida pelas professoras de EI, a fim de contextualizar sua atividade em sala de aula. Leontiev (2016) e Elkonin (2017) destacam que a brincadeira, especialmente os jogos de papéis, são fundamentais para o desenvolvimento do psiquismo infantil nessa fase pré-escolar. Lazaretti (2017) alerta que não é qualquer brincadeira que atua na promoção do desenvolvimento psíquico da criança. Assim, é fundamental que as professoras tenham consciência da intencionalidade pedagógica das atividades que propõem em suas aulas (Lazaretti, 2017).
Lígia, ao ser questionada sobre o papel da brincadeira no desenvolvimento da criança, assim se manifestou: "Eu também penso como é bom ouvir essa coisa do brinquedo, sabe, porque várias vezes a gente se questiona: será que eles vão aprender mesmo brincando?" Ela segue relatando: "(…) na pré-escola, às vezes, a gente se sente um pouco cobrado em relação ao trabalho com registro; parece que tu tem que provar no papel que a criança está aprendendo, e como que faz isso quando a criança está brincando?" (GF, 2021).
Essa preocupação com o currículo e o registro também é expressa por Aline, quando expõe: "(…) porque o currículo não é só a folha da educação infantil, o registro em si, por isso agora estamos trabalhando com o portfólio, que é tirar as fotos do momento que acontece, o que que tá acontecendo naquele momento" (GF, 2021). É importante destacar o quanto o brinquedo em aula na pré-escola pode ser questionado, como a professora Lígia coloca, uma vez que, de certa forma, há uma valorização das letras e do registro; e, também, o quanto a insegurança do professor, pelo fato de ser cobrado quanto ao registro, faz com que ele "duvide" do seu potencial e do potencial da criança que está aprendendo por meio e pelo brincar.
Lígia continua contando: "eu lembro de uma professora na formação na minha faculdade; ela dizia muito do papel fundamental do brinquedo, da importância do brinquedo como se fosse o trabalho da criança, um trabalho de adulto, mas que o trabalho da criança é o brinquedo (…)" (GF, 2021). Essa fala revela a importância da formação e do estudo da professora, possivelmente relacionados a um componente curricular da psicologia histórico-cultural, uma vez que, nesta perspectiva, o brinquedo na etapa pré-escolar é a atividade principal da criança (Leontiev, 2016; Elkonin, 2017). Apesar, contudo, desse conhecimento de Lígia sobre a importância do brinquedo nesta fase, em uma visita na sua sala de aula ela relata sua preocupação afirmando: "eu tenho a sensação que a minha sala é a mais bagunçada da escola, porque, assim, eles vão pegando, eles vão brincando e quem entra assim pensa: meu Deus do céu! Essa sala aqui não tem nem profe; mas dentro daquela bagunça tem uma organização deles" (DC, 2021).
Esse mesmo entendimento sobre a atividade do brinquedo já tem, de forma distinta, a professora Aline, que, na sua fala, dá ênfase ao brinquedo enquanto objeto, que, de maneira autônoma, seria capaz de fazer a criança se desenvolver. Isso fica claro quando ela assevera:
(…) é o brinquedo que faz a aprendizagem com eles, da troca entre os colegas. Então, assim, eu acredito, assim, e a Andréia bem sabe, eu produzo muita coisa, né, porque não é professora aqui das coisas; brinquedo que faz a aprendizagem, a troca faz a troca entre os colegas, ele sim (…). Eles adoram esse tipo de coisa, não só tudo pronto. Claro, é lindo, é maravilhoso, mas, enfim, pensar nessa troca que eles podem mexer, pode até estragar para construir e reconstruir eles de novo; então, assim, tu investir na tua sala, no material da tua sala, já é meio caminho andado (…). (Aline, GF, 2021)
Como relatado por Aline, sua sala de aula é repleta de materiais que possibilitam aos alunos interagir com eles, como artefatos de madeira, de plástico e uma série de jogos que ela mesmo produz. Andréia segue contando sobre essa forma de trabalho e ressalta a importância de deixar as crianças pegarem e explorarem os brinquedos. Ela entende que com o uso do brinquedo muitas questões podem ser ensinadas às crianças, como dividir, e menciona: "(…) o brinquedo acaba sendo essa troca, de você aprender tanto questões cognitivas, mas tanto sociais, emocionais (…) é simplesmente a vida da criança, de como ela pode aprender; do como é que é em casa; muitas vezes ela acaba nos trazendo situações de casa através do brincar e do brinquedo" (Andréia, GF, 2021).
A fala de Andréia remete-nos às ideias de Lazaretti (2017), a qual destaca que o conteúdo das brincadeiras tem sua origem social, histórica e cultural, uma vez que os motivos que incitam as crianças a entrarem em atividade por intermédio do brincar são as reproduções das relações humanas. A autora adverte que o conteúdo dessas brincadeiras representa uma síntese de atitudes, valores e comportamentos que medeiam a relação da criança com as demais pessoas em determinadas circunstâncias sociais. Desse modo, é necessário que haja ações educativas que promovam o surgimento, o desenvolvimento e o direcionamento da atividade do brincar e do jogo de papéis nas crianças, possibilitando, com a intervenção, que o conteúdo dessa atividade "avance nos processos de relações criança-mundo, com possibilidades humanizadoras" (Lazaretti, 2017, p. 134).
Lígia, ao tratar do brinquedo, lembra: "Então, eu acho que o brinquedo, ele vem para dizer que a criança, assim, ela tá se desenvolvendo mesmo que ainda o registro não apareça, que vai ser uma próxima etapa, né, então, da parte cognitiva" (GF, 2021). Destacamos o quanto a atividade lúdica coloca em funcionamento uma complexidade de funções psíquicas, uma vez que, ao brincar, a criança utiliza a memória, a atenção, o pensamento, a imaginação e a linguagem (Lazaretti, 2017).
Num dos momentos do GF, Lígia compartilhou uma experiência vivenciada no ano anterior, 2020, em que tinha preocupação com relação aos conteúdos e ao modo como poderia trabalhar a cultura africana com seus alunos. Ao planejar esse momento, Lígia decidiu conversar com a coordenadora pedagógica da escola, que sugeriu a brincadeira do Minuê. Sobre essa experiência, ela relata:
Eles amaram. Eu pensei: tá aí; é uma brincadeira, né; eu vou trabalhar o conteúdo que eu preciso trabalhar e vou envolver as crianças e desenvolver (…) então, assim, o quanto isso, também, o que a gente oferta né, a criança vai e faz, né, porque, às vezes, a gente fica aí… será que vai gostar, se vai dar certo, né, mas a criança tem potencial para fazer tudo que for ofertado. (GF, 2021)
Nesta perspectiva, destacamos de acordo com as ideias de Saviani (2019, p. 62) que, desde a EI, é necessário ter a consciência de que "a escola diz respeito ao conhecimento elaborado e não ao conhecimento espontâneo; ao saber sistematizado e não ao saber fragmentado; à cultura erudita e não à cultura popular". A professora Lígia relata outro exemplo que contempla essa abordagem dos conteúdos e do raciocínio matemático, que pode ser desenvolvido e potencializado já na EI: "Eu lembro também… um ano eu trabalhei com o Tangram para trabalhar as questões do raciocínio da matemática (…) é pensar de que forma que isso vai ser uma brincadeira para criança, né, para que ela consiga acessar esse conteúdo de maneira lúdica" (GF, 2021).
Essas compreensões sobre o brincar são fundamentais, posto que elas repercutem nas ações do professor em aula. Apesar de se expressarem de formas distintas, as professoras de EI, envolvidas neste nosso estudo, reconhecem a importância do brincar na EI, como expressa Aline: "Eu acho, assim, que se tu tens objetivo o brincar é todo momento (…)" (GF, 2021). Lígia coloca: "(…) Então, eu vejo o brincar assim nas suas mais diferentes faces que perpassam todas as situações na educação infantil desde o berçário até o pré II" (GF, 2021).
Diante dessas falas percebemos que não há clareza nos discursos das professoras sobre as diferenças das atividades principais de cada fase do desenvolvimento humano. É o que ocorre, por exemplo, quando a professora Lígia se refere à brincadeira desde o berçário até a pré-escola II, o que ilustra a importância da formação acadêmica e continuada para os professores da EI. É certo que a pessoa pode brincar em qualquer etapa da sua vida, contudo as brincadeiras de jogos de papéis, especialmente o brincar enquanto atividade principal, ocorrem e precisam ser desenvolvidas na criança no período pré-escolar, momento que antecede a atividade de estudo.
Outro aspecto que pode ser questionado é quando Lígia explica: "Então, eu, assim, eu trago comigo e sinto [que] mais importante mesmo é um brincar nessa fase, né, aí eles explorarem e deixar eles criarem que eles vão aprender dessa maneira também" (GF, 2021). Nesta fala não há menção sobre a importância do professor nesse processo, o que nos leva a questionar: como essa professora compreende a ação do professor nesse percurso? A professora intermedia a brincadeira? Ela é planejada, é sistemática, é intencional? Ela é pedagógica?
Lazaretti (2017) alerta que é necessário superar a perspectiva naturalizante do desenvolvimento humano, destacando que o vir a ser, a transposição das funções elementares para as funções psicológicas superiores na criança, não resulta de um processo espontâneo, mas é produzido pelo trabalho educativo. Para a autora, a escolarização é que atua na promoção da formação de comportamentos complexos.
Como proposto pela teoria que embasa este estudo, a intencionalidade pedagógica é fundamental para o desenvolvimento do psiquismo da criança. É necessário que haja o planejamento do que se propõe desenvolver na criança com todas as atividades propostas. Essa intencionalidade pôde ser observada quando Lígia relatou um exemplo prático de utilização dos jogos de papéis em sala de aula, com temáticas que são fundamentais para o desenvolvimento das crianças, como as profissões. A preocupação da professora estava voltada à forma como apresentar às crianças, de forma lúdica, os conteúdos a serem trabalhados, de modo a oportunizar essa vivência. Nesse contexto, assim ela se manifestou:
(…) A gente fez o dia do confeiteiro, né; porque ali, ele, você trabalha um monte de conteúdos; você trabalha matemática, você trabalha medidas, você trabalha o próprio trabalho em grupo né, o esperar… eles vão modelar os biscoitinhos, né. Então um dia a gente fez uma atividade no pátio — o dia do pintor de Jundiaí —; eles estavam de pintor e eu colei papel pardo nas paredes, né. E eles foram pintar ao som da música, né; então eu trouxe um pouco da música junto com a atividade em si, né, que tinha toda aquela intencionalidade, mas não deixou de ser uma brincadeira. (GF, 2021)
Lígia trata da atividade de ensino na EI e como ela pode ser potencializada pela intencionalidade pedagógica da atividade do brincar. São brincadeiras que envolvem os papéis sociais e as relações humanas, em que a criança experimenta e vivencia atividades do trabalho humano. Lazaretti (2017, p. 135) afirma que a intervenção do professor nessas situações pode ser "a de incrementar com materiais, recursos, conhecimentos a respeito dessas atividades laborais, compartilhando com as crianças, brincando junto, instigando o enredo, levantando hipóteses de direcionamento das ações e operações."
Nessa categoria destacamos o potencial pedagógico da EI para o desenvolvimento da criança nas suas diferentes dimensões: cognitiva, afetiva e psíquica. Como destacado pelos autores da psicologia histórico-cultural, contudo, é necessário que haja uma atuação intencional e planejada do professor em sua atividade de ensino. Não se trata de esperar que a criança se desenvolva (Asbahr e Nascimento, 2013; Martins, 2015; Lazaretti, 2017; Magalhães, 2018), mas de intervir intencionalmente nesse processo via prática pedagógica. É nessa linha de pensamento que apresentamos a segunda categoria.
O BRINCAR E O ENSINAR NA EDUCAÇÃO INFANTIL EM CRIANÇAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA
Com base nas compreensões sobre o brincar e no potencial pedagógico dessa atividade na EI, expressos na categoria anterior, nesta categoria investigamos como ela acontece em crianças com TEA (atividade do brincar) e analisamos as suas implicações na organização e execução das atividades pelas professoras (atividade de ensinar) no contexto desta investigação. Apesar de o nosso estudo considerar as características do diagnóstico, o foco está na busca pela potencialidade humana da criança com TEA e na dimensão constitutiva do meio e, especialmente neste caso, do ambiente escolar para o desenvolvimento, como proposto por Vygostky (2012) ao tratar da compensação cultural. Esse autor defende que a deficiência não pode ser entendida como sinônimo de fraqueza ou incapacidade, mas precisa ser compreendida pelos professores também como uma vantagem, uma fonte de forças.
No episódio que segue contextualizamos alguns aspectos da rotina escolar de Adriano na Escola Amor.
Episódio 1 de Adriano: "Quando chego na sala Adriano está com letras móveis montando o alfabeto no chão, as verbaliza em inglês, organizando-as em ordem alfabética. Ele permanece cerca de 15 minutos, tempo em que as demais crianças estão brincando pela sala. Ao completar o alfabeto, Adriano se levanta e repete as letras em voz alta, dá um sorriso e vai até os colegas que estão envolvidos na brincadeira de tiro ao alvo. Pega um dardo e vai na frente do painel. Um colega se aproxima e solicita para ele se retirar. A monitora intervém, e eles brincam juntos por alguns instantes. Cinco crianças estavam presentes na sala de aula no momento da brincadeira livre. Adriano percebe minha presença, pega a coroa de uma boneca e coloca em minha cabeça, olha rapidamente e segue caminhando pela sala. É um momento de adaptação escolar. Com frequência Adriano se retira da sala, caminha pelo corredor que dá acesso à sala da diretora. Enquanto Adriano caminhava outra professora o encontra e fala com ele. A monitora Andréia olha para mim e diz: ‘ele vai dar uma volta’. Em seguida, ela vai até ele e o convida a voltar para a sala de aula. Na sequência, Adriano se interessa por uns blocos tipo dominó de frutas, no qual ele busca e seleciona as peças iguais; alguns colegas também pegam as peças do jogo e ele não se incomoda. A monitora conversa com ele a partir da nomeação em inglês das frutas e ele as repete. Após finalizar esse processo de separação das peças, Adriano se envolve com os blocos de montar, começa com uma peça e vai organizando as demais em fila, numa sequência lógica até o número seis" (DP, 2021).
Como descrito no episódio, a monitora Andréia, ao falar sobre Adriano, ressalta que a paixão dele é o alfabeto. Conta que ele gosta de letras e também tem um vínculo com ela por meio do inglês, uma vez que ela também atua como professora da língua inglesa. Em muitos momentos a interação entre eles se dá por intermédio dessa língua, conforme observado em aula. Ao falar sobre o aluno, Andréia expõe: "Particularmente o nosso Adriano (…), ele brinca com algumas outras coisas, (…) mas a paixão dele é o alfabeto, então tudo que tiver letras ou números ele brinca (…)" (GF, 2021). Percebe-se que o interesse dele pelas letras favorece o processo de inclusão, uma vez que ele é reconhecido pelo seu potencial cognitivo, o que também acaba sendo valorizado na escola. Destacamos, contudo, a importância de ele entrar na atividade do brincar neste período pré-escolar, a fim de que ocorra o desenvolvimento das suas FPS.
Nesta perspectiva, ao tratar da socialização de Adriano, Andréia relata que percebe que ele não possui a inciativa de buscar os colegas para brincar, mas que "ele não se importa de, às vezes, um colega vir ajudar; então, às vezes, ele se interessa pela brincadeira do colega e acaba participando um pouquinho também, sabe." E reafirma: "Eu vejo isso como brinquedo, como essa ferramenta de troca, né, de aprendizado e de troca, e deles nos mostrarem como eles estão e o que eles querem através do brinquedo" (GF, 2021).
Ao observar-se a naturalidade com que a professora e os colegas convivem com Adriano, fica claro o quanto sua individualidade é reconhecida e aceita nesse contexto. Seu comportamento, de interesses restritos (no caso dele letras e números) e suas estereotipias (balanceio de mãos) não são vistos como problemas, mas como parte da sua individualidade.
Alertamos, todavia, que, a fim de que ocorra o desenvolvimento do psiquismo, é necessário que essa atividade de brincar tenha intencionalidade e seja orientada pelo professor. Como destacado por Leontiev (2004; 2016), a criança deve entrar em atividade de brincar por meio da sua ação com os objetos.
Ao observar-se a rotina da sala de aula de Leandro e da professora Lígia, em vários momentos ficou evidente o papel ativo dela enquanto intermediadora da brincadeira e do trabalho pedagógico com a sua turma, a exemplo do episódio relatado a seguir.
Episódio 1 de Leandro
Quando cheguei na escola a professora estava com a turma organizada em fila para um passeio nas vizinhanças. Os alunos estavam animados e vão caminhando pelas quadras da cidade. Todos querem falar e a professora vai organizando para que todos tenham vez e voz. Durante o passeio foram feitas perguntas, e, nesses momentos, a professora instigava os alunos para que observassem o que havia ao redor deles. Diante de uma plantação de mandioca/aipim os questiona sobre a alimentação e fala sobre as plantas. Em sala de aula, questões relacionadas ao passeio ainda seguem sendo pauta da aula, e, a partir dele, a turma é conduzida a atividades de imaginação, música e brincadeiras, em que podem exercer sua atividade sobre os objetos presentes em sala de aula. Num desses momentos, Leandro, um dos estudantes da turma, conta uma história sobre um cachorro; a professora dá espaço e voz para ele e incentiva que os colegas o escutem até que ele finaliza sua história. Nesta história ficam nítidos alguns elementos que fazem parte da sua criação. (DC, 2021)
Vygotsky (2018), ao tratar da criação, do ato de criar, afirma que isso só é possível graças à realidade, e que é desde a realidade que se constituem os elementos da criação humana. Para o autor, toda vez que o homem imagina, modifica, cria algo novo, combina, é a criação acontecendo, mesmo que pareça algo pequeno comparado às grandes invenções. Assim, é na infância que, desde as suas brincadeiras, a criação começa a emergir na criança, posto que a imitação, nesse processo, ocupa um papel fundamental para o desenvolvimento da criança, preenchendo um lugar nesta atividade. Ao brincar, contudo, a criança dificilmente reproduz exatamente o que aconteceu na realidade, mas faz uma reelaboração criativa das impressões vivenciadas por ela, ao criar uma realidade nova baseada em suas aspirações e anseios. Tais aspectos também podem ser observados na forma como as crianças atuam nas suas brincadeiras em sala de aula, como exposto na sequência do Episódio 1 com Leandro:
Neste mesmo dia, enquanto eu acompanhava a rotina de sala de aula, a professora propôs um momento em que as crianças podiam brincar de maneira livre. Leandro monta uma rampa (com EVA), um banquinho de madeira e uma caminhoneta da polícia e faz um trajeto com essa caminhoneta. Enquanto ele organiza essa brincadeira, alguns colegas organizam uma cabana em um cantinho da sala com uma infinidade de brinquedos, como ursos de pelúcia, super-heróis, bonecas e carrinhos. Leandro, ao observar os colegas, também se envolve em alguns momentos nessa brincadeira. Os alunos brincam de forma amigável e a professora e a monitora permanecem atentas às necessidades apresentadas pelas crianças. Após esse período, a professora convida todos para guardarem seus brinquedos, uma vez que estava próximo ao horário do lanche. (DC, 2021)
Constatamos, assim que em ambas as salas de aulas há uma organização das professoras que favorece esse ambiente para a criação, a imaginação e as trocas baseadas no brincar. Enquanto pré-escola, há letras e trabalhos realizados pelos alunos expostos e, também, há espaços específicos para o brincar. Nesse sentido, destacamos a importância do meio para potencializar esses processos nas crianças com TEA, uma vez que, como nos ensina Vygostky (2018), quanto mais rica as experiências da pessoa haverá mais material disponível para a sua imaginação. A atividade de ensino é fundamental a fim de que nesse brincar seja possibilitado o desenvolvimento da criança, a exemplo dos dois episódios que seguem.
Episódio 2 de Adriano: "Há seis alunos na sala neste dia. Quando eu cheguei na sala de aula as crianças estavam todas sentadas no chão em formato de roda. A monitora estava realizando uma atividade pedagógica do ‘bom dia’. Na sequência, ela contou a história do livro Meu coração é um zoológico, de autoria de Michael Hall. Durante a história, Adriano fica sentado com os colegas, e, na maior parte do tempo, fica desenhando as letras no ar. Andréia faz perguntas sobre a história e as demais crianças da turma respondem animadas. Na tentativa de envolver Adriano, ela conta os numerais em português e inglês, estimula a turma toda a falar e eles participam. Ela diz: ‘Quantos hipopótamos tem? Vocês lembram da história do hipopótamo que subiu na teia da dona aranha?’ E as crianças falam (estimulando a memória, criatividade, imaginação, cores, formas). ‘O urso também mora no zoológico?" ‘Não’ (crianças). ‘Então o que ele está fazendo aqui?’ ‘Veio para comer’ (crianças). Em determinada parte, a monitora pede para as crianças: ‘Onde fica o coração?’ E todas mostram rapidamente. Adriano permanece como está e, nesse momento, enquanto pesquisadora, intervenho e pergunto: ‘Adriano, onde está o seu coração?’ Imediatamente Adriano coloca a mão no peito e mostra onde está o coração (a professora me olha surpresa com a resposta imediata da criança). Neste mesmo dia as crianças seguem brincando com os animais e brinquedos da sala. De uma forma muito natural elas interagem comigo, contando fatos sobre o seu dia a dia. Adriano permanece escutando, mas fica calado, não demonstrando iniciativa em compartilhar fatos sobre a sua vida" (DC, 2021).
No GF Andréia retoma a cena do livro para ressaltar os avanços de Adriano a partir da sua inclusão na escola e mostra o quanto, ao ver ele colocar a mão em seu coração, respondendo à pesquisadora, se emocionou. Nas palavras dela: "Naquele momento, né, eu cheguei a ficar emocionada, assim, dele; ele sentar hoje na rodinha, participar, sabe. E deu para ver vários colegas e eu vejo que ele tá cantando e acompanhando a música no exato momento dos outros colegas também" (GF, 2021).
Essa fala expressa o olhar dessa monitora sobre as possibilidades de Adriano e também sobre o desenvolvimento das suas FPS, em que a questão da imitação, atenção, memória e linguagem é colocada em ação por meio de uma atividade pedagógica. O livro utilizado é um instrumento pedagógico potencializador das aprendizagens, que, se bem explorado, possibilita às crianças ampliarem suas visões de mundo e relacionarem um conteúdo científico, partindo dos seus aspectos culturais. Tais aspectos do desenvolvimento também ficam patentes na participação de Leandro em sala de aula.
Episódio 2 de Leandro: "Quando entro na sala de aula as crianças estão sentadinhas nas suas cadeiras/mesas esperando o café da manhã. Leandro está com sua cadeirinha do lado da professora. Ela me olha diz que naquele momento ele precisava ficar um pouco perto da professora; na sequência (orientado por ela), ele levanta e volta ao seu lugar na turma. Uma criança me questiona: ‘Você vai cuidar de nós hoje?’ Na sequência, a professora organiza a turma para o café. Leandro senta na mesa do lanche como os demais colegas e espera — não quer comer pão. No retorno, a professora relembra os alunos das atividades da Dona Aranha e diz que naquela aula o trabalho seria sobre a letra A. Todos se envolvem na atividade. A sala é organizada em duas carreiras de classes (dois grupos). Na folha A4 impressa há uma atividade de completar a aranha (desenhar a outra metade), e a professora propõe que eles completem a letra A com massinha de modelar. Todos se envolvem na atividade e Leandro também faz a sua. Quer uma cor específica (vermelho) e a professora negocia com ele. Neste momento, um menino pega a massinha, coloca no lápis e diz: ‘Quem quer um picolé’. Leandro imediatamente responde: ‘Isso é um lápis’. Após a conclusão da atividade, a professora deixa os alunos brincarem com massinha de modelar. Imediatamente Leandro começa a fazer movimentos estereotipados e reproduzir ecolalias (características de algumas crianças com TEA). A professora, ao percebê-lo naquele movimento, intervém chamando-o pelo nome e diz: ‘Leandro, vou te dar umas formas’. Ela busca em um armário e disponibiliza para a turma moldes/forminhas das massinhas, rolinhos, facas de plástico, e os alunos se envolvem na brincadeira.
Na condição de pesquisadora, aproximo-me e começo a brincar com as crianças. Falo com o Leandro e começo a incentivá-lo a dar sentido à sua brincadeira, até que, após minha insistência, ele diz: ‘Estou fazendo um peixe superdelicioso’. Pergunto a ele sobre o que precisaríamos para assar o peixe. Ele, prontamente, pega o prato e faz de conta que coloca no forno (sem ter um forno). Olho para ele e digo: ‘Não ficou muito quente?’, e ele responde: ‘Não, nasceu quente e gostoso’. Na sequência, incentivo a professora a entrar na brincadeira, falando para ela: ‘Olha que delícia que o Leandro fez’, e ele diz para a professora: ‘Olha a bolacha que eu fiz’. A professora pede para provar a bolacha e ele dá para ela; coloca tempero no peixe e diz: ‘Duas coxinhas, uma bolacha e um milho.’ Durante a brincadeira, adverte: ‘Isso não é de verdade’, mas segue brincando. Neste momento, também concorda em emprestar algumas formas para os amigos. Depois, a professora solicita que todos guardem a massinha e os auxilia, começando a preparar a turma para o momento do almoço. Ela convida a todos a deitarem no chão da sala e conta uma história da sementinha que as crianças adoram. Leandro faz os gestos e imita em conjunto com a turma" (DC, 2021).
Vygostky (2012) ressalta que, quando o caminho direto do desenvolvimento está impossibilitado pela deficiência, é necessário buscar o caminho indireto, de forma que, para o autor, a distinção entre os dois planos de desenvolvimento do comportamento, o natural e o cultural, é fundamental para uma nova teoria da educação. Assim, para ele, o desenvolvimento das FPS nas crianças acontece perante a necessidade. Se a criança nunca tiver a necessidade de pensar, ela não irá fazê-lo, devendo os adultos produzir essa necessidade.
Nesta mesma linha, Leontiev (2004) elabora uma crítica às teorias que associam as capacidades/aptidões apenas às questões biológicas e considera que, para além das estruturas cerebrais, as aptidões e funções correspondentes à aquisição especificamente humanas não podem se fixar morfologicamente. O autor defende que as propriedades biologicamente herdadas do homem constituem apenas uma condição da formação das FPS (neoformações), e que a outra condição "é o mundo dos objetos e de fenômenos que rodeiam o homem, criado pelo trabalho e pela luta de inumeráveis gerações humanas. É este mundo que fornece ao homem o que ele tem de verdadeiramente humano" (Leontiev, 2004, p. 257). Assim, ao estudar os processos psíquicos superiores do homem pode se distinguir, por um lado, a sua forma, isto é, a função que eles exercem e a sua estrutura. Leontiev (2004) considera que o primeiro elemento é determinado biologicamente e o segundo socialmente. Nesse sentido, o sujeito apropria-se do mundo e dos objetos por meio das suas relações sociais e, ao entrar em atividade, se desenvolve.
Assim, ao propor a atividade de jogos de papéis na EI é possibilitado a todas as crianças (com e sem TEA) exercerem suas habilidades cognitivas, afetivas e sociais. Lazaretti (2017) afirma que a transição da atividade objetal manipulatória para a atividade de jogos de papéis acontece no momento em que conhecer, manipular e apropriar-se das operações e procedimentos com os objetos já não é mais suficiente para a criança, de modo que ela quer apropriar-se do mundo, das relações humanas e, assim, seu interesse recai sobre o significado social das ações com os objetos. A criança quer fazer o que o adulto faz no interior das suas relações sociais. Desse modo, a brincadeira de papéis sociais, como atividade lúdica, começa pela ação isolada com determinado objeto para, posteriormente, a criança estender essa ação, de maneira diversa, a atividades ligadas entre si e que refletem as práticas reais cotidianas na vida das pessoas (Lazaretti, 2017).
Para Adriano, essas dificuldades com relação às brincadeiras são mais evidentes, como relata sua monitora: "O Adriano (…), eu percebi, assim, a característica principal dele acho que é essa; é se concentrar na brincadeira dele; acho que a característica principal deles é se concentrar no que eles estão fazendo (…)" (Andréia, GF, 2021). Ela, porém, ressalta, também, a importância dos colegas e da inclusão escolar neste processo:
E vai fazer é muito; assim ele entra na rotina (…) Hoje ele já vai na fila junto com os outros, né; vai bonitinho; ele percebe a brincadeira e vai cantando uma musiquinha, vai fazendo gesto com as mãos e acaba acompanhando… então, eu acho que a questão principal deles é essa interação; ele se concentra na brincadeira dele e ele brinca sozinho. (…) eu vejo que isso é o principal foco da brincadeira; é essa concentração e fazer o que eles estão fazendo, e os outros estão conversando e eles estão ali imersos nessa brincadeira deles, mas brincam (Andréia, GF, 2021).
Com base na psicologia histórico-cultural e na pedagogia histórico-crítica, entendemos ser necessário analisar o processo de desenvolvimento da atividade da criança e como essa atividade se constitui nas condições concretas da sua vida, o que possibilitará elucidar tanto o papel das condições externas da sua vida quanto das suas potencialidades (Leontiev, 2004; 2016). Com essa análise também será possível entender o papel condutor da educação e da criação para o seu desenvolvimento, operando na sua atividade e em sua realidade, determinando sua psique e consciência (Leontiev, 2016).
O aluno deve se sentir incluído e, ao mesmo tempo, motivado para que se envolva nas atividades propostas pela professora. Lígia conta:
E o Leandro, assim, eu vejo que ele teve uma evolução muito (entonação da voz, de destaque) grande nessa questão do brincar, né, porque aí ele era muito focado só na mesinha dele, só que aquele brinquedo que ele chegava, ele pegava, né, que era meio que sistemático (…), mas hoje ele entra no jogo simbólico, sabe, hoje ele entra no circuito da brincadeira, ele entra na brincadeira dos colegas; então, assim, ele teve um desenvolvimento muito grande nessa questão do brincar e eu tenho até os registros do passado, e daí a gente estava trabalhando com pecinhas, né. E ele disse: ‘Olha, eu montei uma cidade…’, né, coisas que, porque eu estou com ele o segundo ano, né, tem coisas que tempo atrás ele não faria, né, ele só montaria pecinha, ele só ia empilhando empilhando, empilhando. Então, ele teve essa coisa ‘olha eu montei uma cidade’, sabe; então, são coisas assim que eu percebo que ele evoluiu muito nessa questão do brincar de entrar nesse jogo simbólico da brincadeira (GF, 2021).
Neste momento, Andréia também compartilhou sobre o Adriano: "(…) na semana passada, ele preparou uma comidinha para mim e veio me dar (risos). Então, (…) estava ali brincando e ele vai circulando pela sala, se interessando pelas coisas e aí que ele fez a comidinha, deu para mim e fazia mamamama (…)" (GF, 2021).
Esses aspectos descritos pelas professoras remetem-nos à importância que a escola ocupa no desenvolvimento das FPS dos alunos com TEA. Como evidenciado nas pesquisas de Salles (2018) e Araujo (2019), o adulto, por meio da intermediação pedagógica e do vínculo com a criança com TEA, possibilita que o seu desenvolvimento aconteça de forma mais qualificada. Ao analisar as brincadeiras dessas crianças, Silva (2017, p. 107) ressalta a importância de que "o mediador (adulto) esteja atento (sensível) à produção visual, isto é, ao cenário no momento de vivências lúdicas. E isso não é um detalhe para a criança com autismo, é uma necessidade". Assim, é somente por meio desse olhar atento e intencional nas brincadeiras de faz de conta dessas crianças que vai ser possível que elas ajam para além das suas possibilidades habituais.
As crianças com TEA precisam ser ensinadas a brincar, conforme constata a pesquisa realizada por Albuquerque e Benitez (2020). Essas autoras afirmam que tais comportamentos precisam ser desenvolvidos nas crianças com TEA em um ambiente que favoreça as condições necessárias para o brincar. Elas destacam a importância dos estudos na área a fim de instrumentalizar os profissionais e familiares sobre os recursos necessários para auxiliar no ensino desse comportamento às crianças com TEA, considerando a importância da mediação do adulto e do ambiente para a aquisição de comportamentos adequados relacionados ao brincar (Albuquerque e Benitez, 2020).
Esse entendimento não é algo dado para os professores, como fica claro quando Andréia fala sobre seu aluno: "(…) Mas acho que nesse interesse, nesse desenvolvimento do Adriano; para mim ele é autodidata; aí vai ser tipo aquela série The Good Doctor, sabe, que ele vai ter um futuro esplêndido porque ele aprende rápido (…)" (GF, 2021). Andréia segue verbalizando o que ela entende do papel do adulto nesta situação, e declara: "Só que nossa questão é essa, sabe, de trazer, de contextualizar, que eu vou usar essa palavra, né, de contextualizar tudo que ele sabe, tudo que ele aprende, e trazer para esse momento, como é que a gente vai começar a trabalhar isso" (GF, 2021).
Nessa perspectiva, muitas crianças com TEA possuem habilidades em algumas áreas do conhecimento, contudo é necessário "contextualizar", como lembra a professora. Com essa palavra queremos destacar a força do contexto histórico-social para o desenvolvimento do humano. Como expresso e defendido nesta escrita, o desenvolvimento das FPS somente se dá na relação com o outro. É quando a criança com TEA entra em atividade, no período pré-escolar, que ela poderá, por intermédio da brincadeira de papéis, apropriar-se da cultura humana.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como objetivo investigar as compreensões produzidas por professoras que atuam na EI sobre a atividade do brincar, analisando suas implicações na organização e execução da atividade de ensinar em crianças com TEA matriculadas na pré-escola. Apoiadas nos resultados e das ideias da psicologia histórico-cultural, destacamos o potencial que o brincar ocupa na EI, especialmente no período pré-escolar.
O contexto analisado possibilitou compreender, de forma mais específica, de que modo o brincar é entendido pelas professoras, como expresso na categoria 1, "compreensões sobre o brincar". Nessa categoria constatamos que há, ainda, uma preocupação com o registro e em como evidenciar o desenvolvimento da criança. Nas falas, contudo, ficou clara a potencialidade que a prática das brincadeiras e dos jogos de papéis apresenta para e no crescimento das crianças e do conteúdo científico, contribuindo para a constituição das FPS da criança.
Já na categoria 2, intitulada "o brincar e o ensinar na educação infantil em crianças com TEA", pelas observações e pelo grupo focal foi possível analisar os benefícios da inclusão dessas crianças na EI e o quanto o meio contribui para o desenvolvimento do psiquismo dessas crianças, que, ao entrarem em atividade nas suas salas de aulas, exercitam, por meio da imitação, suas funções, como atenção, memória, planejamento (esperar a vez), linguagem, criatividade e as questões relacionadas ao simbólico. Amparadas em autores da perspectiva histórico-cultural, destacamos o papel do adulto enquanto intermediador desse contexto nas relações adulto-criança e crianças-crianças. Com base nos estímulos do meio e da atividade da criança, possibilita-se que ocorra a sua aprendizagem, e, consequentemente, o seu desenvolvimento.
De modo geral, ressaltamos a importância da exploração da atividade principal em cada fase da criança, a fim de promover o desenvolvimento do seu psiquismo, como proposto por Vigotski nas suas FPS ou neoformações em Leontiev. Destacamos, também, a força do meio para que esse processo seja efetivo; daí a importância da educação inclusiva para o desenvolvimento das crianças com TEA. Por meio da convivência com as demais crianças e das oportunidades oferecidas com o ensino planejado, estruturado e intencional, é possibilitada uma outra via de desenvolvimento: a cultural.
Como visto nas falas das professoras, esse entendimento não está dado de forma automática. O professor, muitas vezes, questiona-se e se vê questionado sobre a sua prática pedagógica. Acreditamos que o caminho para a mudança, nesse sentido, se dará mediante a formação inicial e continuada.
Destacamos que a rede de ensino em que aconteceu a produção de dados já possuía uma caminhada na área da educação inclusiva, com rede de apoio ao professor, ao professor do atendimento educacional especializado (AEE), ao serviço de psicologia escolar e à rede de saúde (profissionais do Centro de Reabilitação Intelectual — CER II). Sendo assim, estes dados são um recorte pequeno da temática e da realidade em termos da inclusão das crianças com TEA em âmbito brasileiro e mundial.
Por fim, ressaltamos a importância dos fundamentos teóricos da psicologia histórico-cultural para a compreensão da teoria da atividade, do desenvolvimento do psiquismo infantil e do potencial pedagógico imenso da EI nesse processo. Há habilidades que, ao serem desenvolvidas no período pré-escolar, por meio das atividades do brincar e do ensinar, farão toda a diferença na vida dessas pessoas e de suas famílias. Por isso, a importância de um olhar e de investimentos em pesquisas e formações nesta área.