1 INTRODUÇÃO
A alfabetização em saúde representa as habilidades cognitivas e sociais que determinam a motivação e a capacidade dos indivíduos para obter acesso, compreender e usar informações de maneiras que promovam e mantenham uma boa saúde (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1998). Também conhecida por letramento em saúde, vai além da habilidade de ler, escrever e compreender os números no ambiente de saúde, representando
[...] a capacidade cognitiva de compreender e interpretar o significado da informação de saúde escrita, falada ou em formato digital, o que permite que as pessoas sejam capazes de considerar ou não ações relacionadas à saúde e tomar decisões saudáveis em seu contexto de vida diária
(ADAMS et al., 2009, p. 144, tradução livre).
A população mundial vem envelhecendo rapidamente; e enquanto, em 2015, a participação de idosos na população brasileira era de 11,7%, estima-se que, em aproximadamente 24 anos, dobre para 23,5% (UNITED NATIONS, 2018). Como consequência desse perfil epidemiológico, abordagens diferenciadas devem ser pensadas para melhor atender às necessidades desse grupo etário, a fim de que ele passe pelo processo do envelhecimento de maneira ativa, integrado ao contexto no qual está inserido, mantendo o equilíbrio biopsicossocial e a capacidade funcional, possibilitando, assim, bem-estar e melhor qualidade de vida (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2005; FERREIRA et al., 2012).
A qualidade de vida e o estado cognitivo em idosos podem ser melhorados por meio de práticas em grupo, realização de atividades físicas e de lazer (ANTUNES et al., 2005; SILVEIRA, PORTUGUEZ, 2017) e pela inclusão digital, entendida como a democratização do acesso à informação e uso de tecnologia na rotina diária (WANZINACK et al., 2013). Com base em reflexões anteriores, conceitua-se a inclusão digital pelo:
[...] uso efetivo de determinado ambiente digital, abrindo, assim, a possibilidade da inserção do indivíduo que o utiliza em seu conteúdo e a possibilidade do real usufruto dos benefícios a serem viabilizados através desse ambiente
(ALBERTIN, 2007, p.8).
É notório que a inclusão digital também melhora o conhecimento tecnológico, possibilita integração entre comunidades, acesso a informações, descoberta de novas oportunidades, facilita o aprendizado, melhora a qualidade de vida, a relação entre o idoso e a família além de maior independência e autonomia (FRANCO, SOUZA, 2015). Estar incluído digitalmente assemelha-se à ideia de ser um alfabetizado digital; e ter o entendimento de como funciona a tecnologia digital, saber fazer uso de ferramentas para ouvir músicas, assistir a filmes, pesquisar, interagir com o outro permitem a diminuição das diferenças sociais (CABRAL FILHO, 2006).
Entretanto, são diversas as barreiras que dificultam a aprendizagem das tecnologias digitais pelos idosos. Entre elas, encontram-se: declínios sensoriais, problemas motores, físicos, vista cansada decorrentes do avanço da idade, sendo necessária a manutenção de um aprendizado contínuo, para interagir com autonomia com os aparatos tecnológicos (FEBRÔNIO, 2017).
É importante salientar que a internet é uma ferramenta que facilita a vida das pessoas, tanto no contexto profissional quanto nas interações socioculturais, havendo a necessidade de indivíduos de variadas idades terem conhecimento tecnológico (WANZINACK et al., 2013). A linguagem da informática faz-se necessária na sociedade moderna como fator de inclusão social, empoderamento, comunicação, educação; e o idoso que não está atento a essa realidade acaba se exilando do mundo atual (BEZ et al., 2006).
Nesse contexto, ainda é pouco conhecida a influência da inclusão digital no nível de alfabetização em saúde de idosos. Dessa forma, verificar como essas variáveis se relacionam contribuiria para o empoderamento na tomada de decisões quanto ao autocuidado e à manutenção do bem-estar geral desse grupo etário.
2 OBJETIVO
O objetivo deste estudo foi avaliar se os fatores sociodemográficos e a inclusão digital favorecem a alfabetização em saúde de idosos.
3 MÉTODO
3.1 Aspectos Éticos
Este estudo epidemiológico observacional transversal foi conduzido de acordo com os preceitos determinados pela Resolução nº 466/12 para estudo com seres humanos do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde, em projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade São Leopoldo Mandic, conforme CAAE: 08055119.0.0000.5374. Os participantes que concordaram com a pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e a autorização.
3.2 Local do Estudo e grupo amostral
O estudo foi realizado em Campinas-SP e em Juiz de Fora- MG, cidades da região Sudeste, caracterizadas por ter a longevidade como variável que mais contribui para o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) (IBGE, 2010).
A amostra foi dimensionada com o auxílio do programa EpiInfo, sendo detectado que uma amostra de 297 participantes garantiria poder de teste de 0,80 (β=0,20) com nível de significância de 0,05 (α=0,05) para Odds Ratio (OR) mínimo detectável de 2,0, taxa de não exposto: exposto = 0,8 e porcentagem de resposta no grupo não exposto de 35,6% (obtida no estudo piloto), para variável possui computador em casa ou smartphone. Foram convidados a participar do estudo 300 indivíduos com mais de 60 anos, de ambos os sexos, não institucionalizados provenientes de grupos de terceira idade organizados nos municípios.
3.4 Coleta dos dados
A coleta dos dados ocorreu entre os meses de março de 2019 e janeiro de 2020. Os dados referentes ao perfil sociodemográfico, ao nível de alfabetização em saúde e à inclusão digital foram coletados por meio de questionários aplicados por dois examinadores treinados e calibrados. As entrevistas foram realizadas e duraram aproximadamente 30 minutos cada.
O perfil sociodemográfico da amostra foi avaliado por meio de 11 questões para identificação do sexo, data de nascimento, estado civil, se possui filhos, grau de escolaridade, situação de moradia, prática de atividade física ou atividade de lazer, renda mensal, se possui computador em casa ou smartphone.
O nível de alfabetização em saúde, variável desfecho do presente estudo, foi avaliado pelo instrumento Health Literacy Scale-14 (HLS-14), proposto por Suka et al. (2013), validado no Brasil por Marques (2017). É composto por 14 perguntas em escala Likert de 5 pontos, sendo que: concordo muito vale 5 pontos; concordo vale 4 pontos; nem concordo nem discordo vale 3 pontos; discordo vale 2 pontos; e discordo muito vale 1 ponto, porém, as 5 primeiras questões têm a pontuação invertida. As pontuações variam de 14 a 70.
Para mensurar o nível de inclusão digital dos idosos, foi utilizado questionário criado e validado por Bolzan et al. (2013), composto por 40 perguntas voltadas à percepção do indivíduo quanto a sua capacidade de realizar ações com nível de dificuldade crescente, permitindo a análise do comportamento e o desenvolvimento das habilidades e competências no uso de tecnologias de informação e comunicação. As questões em escala do tipo Likert geram pontuações que variam de 0 a 100 pontos.
3.5 Forma de análise dos resultados
Foram realizadas análises descritivas dos dados. Para as variáveis categóricas, foram calculadas as frequências e as porcentagens; e para a idade, o número de filhos, o escore de inclusão digital e o escore de alfabetização, foi calculada a média, o desvio padrão, a mediana, os valores máximo e mínimo. A seguir, as associações entre as variáveis independentes (perfil sociodemográfico e inclusão digital) e o desfecho, nível de alfabetização (alto e baixo, dicotomizados pela mediana 46), foram analisadas por modelos de regressão logística simples, estimando-se os Odds Ratio brutos com os respectivos intervalos de 95% de confiança. As variáveis com p<0,20 nas análises simples foram testadas em modelos de regressão logística múltipla, permanecendo no modelo final aquelas com p≤0,05. O ajuste dos modelos foi avaliado pelo Critério de Informação de Akaike (AIC) e -2 Log L (log likelihood). As análises foram efetuadas com auxílio do programa R.
4 RESULTADO
Participaram da pesquisa 300 idosos, entre os quais os dados de 9 foram desconsiderados por não terem aceitado finalizar as entrevistas. Como pode ser observado na tabela 1, a idade média dos idosos foi de 68,2 (+7,5), a maioria era do sexo feminino (54%) e tinha até 9 anos de estudo (50,5%). Houve predomínio na renda mensal de até dois salários mínimos (72,5%) e de idosos que residiam com outras pessoas (62,9%). A maioria não tem computador em casa (58,1%), mas possui smartphone (67,4%). O escore médio de inclusão digital identificado foi igual a 36,4 (±13,9); e o de alfabetização em saúde foi de 47,5 (±8,3), com, respectivamente, 50,2% e 52,6% dos idosos classificados no maior nível.
Variável | Categoria | Frequências |
---|---|---|
Sexo | Feminino Masculino |
157 (54,0%) 134 (46,0%) |
Estado civil | Solteiro Casado Divorciado Viúvo Outro |
70 (24,1%) 96 (33,0%) 48 (16,5%) 73 (25,1%) 4 (1,4%) |
Escolaridade | Sem Fundamental incompleto Fundamental completo Médio incompleto Médio completo Superior incompleto Superior completo |
17 (5,8%) 62 (21,3%) 68 (23,4%) 19 (6,5%) 63 (21,6%) 23 (7,9%) 39 (13,4%) |
Renda (Salários mínimos) |
Até 2 De 2 a 4 De 4 a 7 Acima de 7 Não respondeu |
211 (72,5%) 44 (15,1%) 20 (6,9%) 15 (5,2%) 1 (0,3%) |
Moradia | Sozinho Acompanhado |
108 (37,1%) 183 (62,9%) |
Atividade física | Não Sim |
155 (53,3%) 136 (46,7%) |
Tem computador em casa | Não Sim |
169 (58,1%) 122 (41,9%) |
Tem celular / smartphone | Não Sim |
95 (32,6%) 196 (67,4%) |
Inclusão digital | Baixo Alto |
145 (49,8%) 146 (50,2%) |
Alfabetização em saúde | Baixa Alta |
138 (47,4%) 153 (52,6%) |
Média (desvio padrão) |
Mediana (mínimo – máximo) |
|
Idade | 68,2 (7,5) | 67,0 (60,0; 98,0) |
Número de filhos | 1,9 (1,8) | 2,0 (0,0; 9,0) |
Escore de inclusão digital | 36,4 (13,9) | 30,4 (0,0; 90,5) |
Escore de alfabetização em saúde | 47,5 (8,3) | 47,0 (22,0; 70,0) |
Fonte: autores da pesquisa, 2020.
Na Tabela 2, são apresentados os resultados das análises de associação entre o nível de alfabetização em saúde e as variáveis independentes. As análises individuais, sexo, estado civil, escolaridade, renda, com quem mora, prática de atividade física, possuir computador, possuir celular e inclusão digital apresentaram associação significativa com o nível de alfabetização (p<0,05). Entretanto, quando essas variáveis foram estudadas no modelo múltiplo, permaneceram no modelo final as variáveis escolaridade, com quem mora, se tem celular e inclusão digital (p<0,05).
Idosos com escolaridade até o ensino fundamental completo têm 2,06 (IC95%: 1,02- 4,18) vezes mais chance de apresentar baixo nível de alfabetização em saúde do que os idosos com escolaridade até nível superior (p<0,05). Idosos que moram acompanhados possuem 2,12 (IC95%: 1,22-3,68) vezes mais chance de apresentar baixo nível de letramento em saúde do que aqueles que moram sozinhos (p<0,05). Idosos que não dispõem de celular têm 2,98 (IC95%: 1,66-5,38) vezes mais chance de apresentar baixo nível de alfabetização em saúde do que aqueles que possuem (p<0,05). Idosos com baixo nível de inclusão digital têm 2,17 (IC95%: 1,21-3,88) vezes mais chance de apresentar baixo nível de alfabetização em saúde do que aqueles com alto nível de inclusão (p<0,05)
Variável | Categoria | N (%) | Nível de alfabetização em saúde |
$OR bruto (#IC95%) | p-valor |
$OR final (#IC95%) |
p-valor | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
*Baixo | Alto | |||||||
n (%) | n (%) | |||||||
Sexo | Feminino | 157 (54,0%) | 66 (42,0%) | 91 (58,0%) | Ref | |||
Masculino | 134 (46,0%) | 72 (53,7%) | 62 (46,3%) | 1,60 (1,01-2,55) | 0,0470 | |||
Idade | Até 67 | 160 (55,0%) | 72 (45,0%) | 88 (55,0%) | Ref | |||
Acima de 67 | 131 (45,0%) | 66 (50,4%) | 65 (49,6%) | 1,24 (0,78-1,97) | 0,3606 | |||
Estado civil | Solteiro | 70 (24,1%) | 36 (51,4%) | 34 (48,6%) | 1,69 (0,90-3,15) | 0,0996 | ||
Casado | 96 (33,0%) | 37 (38,5%) | 59 (61,5%) | Ref | ||||
Divorciado/Viúvo/Out | 125 (43,0%) | 65 (52,0%) | 60 (48,0%) | 1,73 (1,01-2,97) | 0,0474 | |||
Número de filhos | Até 2 | 202 (69,4%) | 91 (45,0%) | 111 | Ref | |||
Mais de 2 | 89 (30,6%) | 47 (52,8%) | 42 (47,2%) | 1,36 (0,83-2,25) | 0,2226 | |||
Escolaridade | Até fundamental | 147 (50,5%) | 93 (63,3%) | 54 (36,7%) | 3,36 (1,80-6,27) | 0,0001 | 2,06 (1,02-4,18) | 0,0455 |
Médio | 82 (28,2%) | 24 (29,3%) | 58 (70,7%) | 0,81 (0,40-1,64) | 0,5554 | 0,56 (0,26-1,22) | 0,1472 | |
Superior | 62 (21,3%) | 21 (33,9%) | 41 (66,1%) | Ref | Ref | |||
Renda | Até 2 salários | 211 (72,5%) | 112 | 99 (46,9%) | 2,44 (1,41-4,22) | 0,0013 | ||
Acima de 2 salários | 79 (27,1%) | 25 (31,6%) | 54 (68,4%) | Ref | ||||
Não respondeu | 1 (0,3%) | 1 (100,0%) | 0 (0,0%) | - | ||||
Moradia | Sozinho | 108 (37,1%) | 43 (39,8%) | 65 (60,2%) | Ref | Ref | ||
Acompanhado | 183 (62,9%) | 95 (51,9%) | 88 (48,1%) | 1,63 (1,01-2,64) | 0,0465 | 2,12 (1,22-3,68) | 0,0077 | |
Tem computador | Não | 169 (58,1%) | 93 (55,0%) | 76 (45,0%) | 2,09 (1,30-3,37) | 0,0024 | ||
Sim | 122 (41,9%) | 45 (36,9%) | 77 (63,1%) | Ref | ||||
Tem celular | Não | 95 (32,6%) | 67 (70,5%) | 28 (29,5%) | 4,21 (2,48-7,15) | <0,0001 | 2,98 (1,66-5,38) | 0,0003 |
Sim | 196 (67,4%) | 71 (36,2%) | 125 | Ref | Ref | |||
Inclusão digital | Baixo | 145 (49,8%) | 92 (63,4%) | 53 (36,6%) | 3,77 (2,32-6,13) | <0,0001 | 2,17 (1,21-3,88) | 0,0092 |
Alto | 146 (50,2%) | 46 (31,5%) | 100 | Ref | Ref |
*Categoria de referência para a variável de desfecho.
$Odds ratio.
#Intervalo de confiança.
AIC (modelo vazio)=404,64; AIC (modelo final)=347,57; -2 Log L (modelo vazio)=402,64; -2 Log L (modelo final)=335,57.
Fonte: autores da pesquisa, 2020.
5 DISCUSSÃO
Entre as variáveis avaliadas neste estudo, o nível de escolaridade, morar ou não acompanhado, possuir ou não smartphone e estar ou não incluso digitalmente apresentaram-se associados ao nível de alfabetização em saúde.
No presente estudo, a maioria dos idosos (67,4%) relatou possuir celulares smartphones em vez do computador doméstico. A popularização do uso de dispositivos móveis, entre eles o smartphone, vem aumentando significativamente nas últimas décadas; e, em relação aos idosos, é relatado que o acesso a essa tecnologia favorece o autocuidado, proporciona um estilo de vida ativo, aumenta a segurança, proporciona maior independência, aumenta a interação social, auxilia na prática da alfabetização digital e satisfação pessoal (BLACKMAN et al., 2016). Em contraponto, a literatura expõe que a maioria dos idosos utiliza o celular para funções básicas, como fazer chamada, receber ligações, enviar mensagens, e preferem celular com tela grande e funções fáceis de entender (ANJOS, GONTIJO, 2015; ZAINE et al., 2017).
A inclusão digital de idosos favorece a aproximação das pessoas, melhora a qualidade de vida e facilita a aquisição de novos conhecimentos (JANTSCH et al., 2012; FRANCO, SOUZA, 2015). Em consonância, os resultados do presente estudo contribuíram para o achado de que melhores níveis de inclusão digital e possuir um smartphone mais do que dobram a chance do idoso em apresentar melhor nível de alfabetização em saúde. Nesse contexto, a ausência ou a baixa alfabetização em saúde mostram-se associadas à população de maior idade (MARQUES, 2017) e às maiores taxas de prevalência de doenças crônicas e de mortalidade, quando comparadas à de idosos com um melhor nível de alfabetização (SUDORE et al., 2006), que, por sua vez, favorece o envelhecimento ativo, prolongando anos de vida com qualidade, bem-estar físico mental e social (BARBOSA, 2013).
Na sociedade moderna, saber utilizar as mídias digitais torna-se necessário como fator de inclusão social, empoderamento, comunicação, educação; e o idoso que não tem acesso a essa realidade acaba se exilando do mundo atual (BEZ et al., 2006). A internet facilita a vida das pessoas, tanto no contexto profissional quanto nas interações socioculturais, e cada vez mais a tecnologia e a informatização vêm sendo disseminadas, levando à necessidade de que indivíduos de variadas idades tenham conhecimento tecnológico (WANZINACK et al., 2013).
Em uma revisão de literatura sobre as contribuições da internet para os idosos, chegou-se à conclusão de que idosos que têm computador em casa utilizam a internet como ferramenta útil, dando-lhes empoderamento para tomada de decisões associadas a saúde e atividade física além de outros benefícios, tais como: manutenção dos níveis cognitivos, estímulo da atividade cerebral, interação social e prevenção de depressão (MIRANDA, FARIAS, 2009). A inclusão digital também melhora o conhecimento tecnológico, possibilita integração entre comunidades, acesso a informações, descoberta de novas oportunidades, facilita o aprendizado, melhora a qualidade de vida, a relação entre o idoso e a família além de maior independência e autonomia (FRANCO, SOUZA, 2015).
Neste estudo, ter escolaridade até ensino fundamental completo aumentou em até duas vezes a chance de apresentar baixo nível de alfabetização em saúde – que é um fator condicionante do autocuidado pela menor habilidade de ler e compreender informações e aplicar tais conhecimentos no autocuidado da saúde (SANTOS, PORTELLA, 2016). A baixa alfabetização funcional relaciona-se com escolaridade inferior a 4 anos, baixa renda, pouco conhecimento sobre a doença, falta de compreensão das orientações médicas e falta do hábito de questionamento sobre suas dúvidas aos profissionais de saúde (CHEHUEN NETO et al., 2019).
Além disso, a literatura mostra que a falta de conhecimento em saúde associada ao baixo nível socioeconômico aumenta a morbidade em pessoas idosas e que o analfabetismo em saúde é associado com o aumento de quase duas vezes na taxa de mortalidade, além da maior prevalência de doenças crônicas quando comparada à de pessoas com um nível adequado de alfabetização em saúde (SUDORE et al., 2006). Baixa escolaridade, baixa renda, baixa alfabetização em saúde têm relação significativa com o aumento na prevalência de doenças não transmissíveis, transtorno depressivo e baixa adesão a tratamento medicamentoso (ABBOTT et al., 2018). A adesão adequada a protocolo de tratamento de saúde mostra-se relacionada com um melhor nível de escolaridade e melhor nível de alfabetização em saúde (BAZARGAN et al., 2017; ALI et al., 2019; TURKOGLU et al., 2019).
É sabido que a população idosa no Brasil é menos escolarizada do que as gerações mais jovens, sendo significativo o número de analfabetos e daqueles que possuem dificuldades na leitura e escrita. Assim, para que haja mudanças nesse cenário, faz-se necessária não apenas a garantia do acesso à educação ao longo da vida, mas também o domínio das novas tecnologias e a participação em outras gerações, na produção de bens e cultura (SERRA, FURTADO, 2016). Investir na escolaridade dos idosos melhora as condições de saúde e contribui para longevidade deles (CASTRO et al., 2019); e, nesse contexto, a Educação de Jovens e Adultos (EJA), modalidade de ensino criada pelo Governo Federal, constitui-se uma oportunidade da retomada das atividades escolares nas modalidades presencial e a distância, dando oportunidades à terceira idade a manter-se em educação, promovendo aprendizagem, inserção social, delongando suas habilidades cognitivas, melhorando a qualidade de vida.
Verificou-se, no presente estudo, que idosos que moram acompanhados têm maior chance de apresentar menor nível de alfabetização em saúde quando comparados àqueles que moram sozinhos. Esse achado corrobora os de Alves et al. (2010) que afirmam que idosos que moram sozinhos são mais saudáveis e independentes e que morar acompanhado pode ser um fator determinante para a incapacidade funcional, caracterizada pela probabilidade de não conseguirem realizar algumas atividades físicas, como subir ladeira ou escada, comparado aos que moram sozinhos. Por outro lado, a falta de convivência familiar é favorável à liberdade em relação a horários, entretanto, a falta de uma pessoa por perto no dia a dia pode deixar esses idosos suscetíveis a riscos, o que poderia ser exacerbado ao longo dos anos de vida sozinho; além da possibilidade de fazer o que se quer na hora que bem entender pode ser desfavorável para o autocuidado e manutenção da própria saúde (CAMARGOS, RODRIGUES, 2008).
A presença de idosos no domicílio representa participação na renda familiar, principalmente quando eles recebem algum benefício previdenciário ou assistencial e são ativos nos afazeres domiciliares (ARANTES et al., 2010). A corresidência familiar representa aspectos positivos e negativos na avaliação dos idosos, e esse convívio reforça o vínculo afetivo, o cuidado, o amor, porém, pode representar atrito entre os membros devido à diferença entre as gerações. Muitas vezes, o idoso é o provedor emocional e financeiro do domicílio, além de assumir o papel de cuidador dos netos, o que acarreta um acúmulo de tarefas que podem deixá-lo preocupado e estressado (SAMPAIO et al., 2019).
O estudo apresentou como limitação o seu caráter transversal, que impossibilita o estabelecimento de relações de causa e efeito entre os fatores estudados. Todavia, em vista das associações encontradas, seus achados são validos e indicam aspectos que devem ser valorados para que o idoso possa ter sua alfabetização em saúde otimizada.
6 CONCLUSÃO
O conhecimento sobre tecnologias de informação e comunicação é cada vez mais importante ao idoso para amenizar a solidão, permitir acesso às mídias digitais e possibilitar que se mantenha informado, ativo e incluso no cotidiano da vida moderna.
A inclusão digital de idosos é de extrema importância por possibilitar poder de acesso às informações variadas, que perpassam do entretenimento à educação, proporcionando aos mesmos uma gama de conhecimentos que os empoderem para a tomada de decisões a respeito da própria saúde.
No presente estudo identificou-se que o baixo nível de inclusão digital, menor escolaridade, não possuir celular e morar acompanhado favorecem negativamente a alfabetização em saúde.
Os achados desta investigação sugerem a necessidade de estudos longitudinais que correlacionem a inclusão digital de idosos com o grau de alfabetização em saúde, buscando identificar seus efeitos benéficos e sua contribuição para melhoria da qualidade de vida dos idosos. Deve-se avaliar a implementação de estratégias multiprofissionais da gerontologia com o propósito de acrescentar, na educação continuada dos idosos, o uso de computadores e celulares, assim como a criação de aplicativos e games personalizados com o desígnio de melhorar as capacidades motoras e cognitivas, no sentido de aprimorar a alfabetização em saúde para promoção do autocuidado dos idosos.