1 INTRODUÇÃO
A Licenciatura em Enfermagem foi criada pela Portaria Ministerial nº 13, de 10 de janeiro de 1969, do Ministério da Educação e Cultura (MEC) e ofertada na maioria das Instituições de Ensino Superior (IES), em associação com o Bacharelado em Enfermagem (BAGNATO, 1994). Essa configuração demandou organização dos cursos de Licenciatura e Bacharelado em Enfermagem (LBE) para contemplar as políticas direcionadas à formação de professores e de enfermeiros. Dessa forma, diferentes perspectivas, questionamentos e ressignificações permeiam a implementação dos cursos de LBE, uma vez que uma série de agentes assumem diferentes papéis no processo de implementação das políticas (VILLANUEVA, 2014).
No entanto, os marcos regulatórios e avaliativos direcionados às licenciaturas, como a instituição do sistema e-MEC, em 2007 e a criação da Lei nº 12.089, de 11 de novembro de 2009, que institui que o acadêmico não pode ocupar duas vagas simultaneamente, em instituições públicas de educação superior, seja no mesmo curso ou em cursos diferentes, se interpõem à construção histórica realizada pelos cursos de LBE, ao direcionarem a cisão entre o Bacharelado e a Licenciatura. Todavia, a manutenção da oferta associada da Licenciatura e do Bacharelado em Enfermagem, verificada nas Universidades Públicas Estaduais (UPE), demonstra que não houve adesão da sociedade ao modelo proposto de graduações separadas para a formação docente de cursos profissionalizantes. Apesar de a política ter se pautado em práticas incrementalistas, estas não foram suficientes para alterar a memória e a tradição do ensino profissional no Brasil.
Dessa forma, a associação da oferta dos graus de Licenciatura e de Bacharelado deve ocorrer a partir da composição curricular amparada nas Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores, bem como das diretrizes curriculares específicas das áreas de formação. Segundo Gimeno Sacristán (2017, p. 16)2, o exercício da construção curricular “é uma prática na qual se estabelece um diálogo, por assim dizer, entre agentes sociais, elementos técnicos, alunos que regem frente a ele, professores que o modelam”. Nesse sentido, os agentes locais, denominados como microimplementadores, assumem a responsabilidade pela interpretação, reinterpretação e aplicação da legislação educacional ao materializá-la por meio do currículo, ou seja, pela construção do Projeto Pedagógico (PP) do curso.
Entre os diversos elementos constitutivos do PP, a matriz curricular assume um papel centralizador, fornecendo uma síntese da proposta de implementação de determinado curso, ao demonstrar quais interpretações foram elencadas para a sua construção.
É nesse sentido que este artigo busca apreender e discriminar as características das matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura e Bacharelado em Enfermagem das Universidades Públicas Estaduais, com relação à carga horária, à relação teoria-prática e à organização dos conteúdos curriculares, em especial, os pedagógicos. Dessa forma, compreende-se que, por meio da análise do currículo, sintetizado em sua matriz curricular, possa se desvelar a lógica implícita aos processos de implementação que as instituições propuseram, a partir da relação de interseção que se estabelece entre os contextos macro e micro das políticas de educação, que se constituem em cada curso.
Buscou-se, como recorte, os sistemas estaduais de ensino, considerando as suas especificidades em relação ao sistema federal, em que a legislação vigente é diretamente ligada. A apreensão dos princípios e marcos normativos pelos sistemas estaduais originados nos órgãos gestores da educação e vinculados ao poder executivo ocorre de forma transversal, uma vez que se considera a autonomia das universidades dos sistemas estaduais em relação ao sistema federal (RANIERI, 2000). Nesse sentido, as universidades estaduais, a partir dos condicionantes da microimplementação3, poderiam promover interpretações e, consequentemente, implementar cursos de Licenciatura em Enfermagem de forma mais particularizada em relação ao que a literatura apresenta para as instituições vinculadas ao sistema federal.
A partir da definição desse recorte, realizou-se um levantamento no sistema e-MEC no mês de agosto de 2017, a fim de identificar as universidades públicas estaduais em atividade no país, sendo encontradas 38 instituições. Na sequência, procedeu-se à pesquisa nos sites das instituições em questão, a respeito da oferta de cursos de graduação em enfermagem, presenciais e seus respectivos graus acadêmicos. Das 38 universidades públicas estaduais brasileiras, 34 ofertam a graduação em enfermagem, presenciais. Destas, 29 oferecem apenas o Bacharelado em Enfermagem e cinco ofertam a Licenciatura e o Bacharelado em Enfermagem, a saber: a Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, a Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, a Universidade Estadual de Campinas, a Universidade de São Paulo e a Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Ao total, as cinco UPE oferecem nove cursos de LBE. Destes, oito se encontram em atividade e um em processo de extinção.
Todos os nove cursos de LBE aceitaram participar da pesquisa. Dois Projetos Pedagógicos (PPs), com suas respectivas matrizes curriculares, que não estavam disponíveis nas homepages dos cursos, foram enviados via e-mails pelos coordenadores à pesquisadora e, em um caso específico, foi autorizado pelo coordenador o registro fotográfico, in loco, do PP e da matriz curricular do curso. Os demais PPs se encontravam disponíveis nas homepages de seus respectivos cursos.
Dessa forma, prosseguindo na análise do processo de implementação da Licenciatura em Enfermagem pelas UPE, foi realizado o estudo documental das matrizes curriculares das instituições que ofertam o referido curso. Tal estratégia também foi utilizada no estudo realizado por Gatti et al. (2010), denominado “Formação de professores para o ensino fundamental: instituições formadoras e seus currículos”. No referido estudo, as autoras utilizaram a matriz curricular dos cursos, com embasamento em seus respectivos Projetos Pedagógicos, para verificar qual foi o desenho estratégico adotado pelo curso para a distribuição e para a inserção das disciplinas pedagógicas e específicas, bem como a relação entre elas.
Dessa forma, o estudo documental realizado na matriz curricular dos nove cursos de LBE, embasaram-se nos aspectos elencados pelo estudo de Gatti et al. (2010), como a distribuição dos conteúdos por área de conhecimento, a carga horária total e fragmentada das áreas de formação específica e pedagógica, a carga horária dos componentes curriculares teóricos e práticos e, em especial, os conteúdos pedagógicos. A discussão a respeito das disciplinas pedagógicas dos nove cursos de LBE pautou-se a partir das quatro categorias de análise citadas, acrescidas de uma categoria específica para a docência na área da Enfermagem. Justifica-se a inserção dessa categoria uma vez que foi possível observar a recorrência na oferta de tais conteúdos nos currículos analisados. Ressalta-se que, além desses aspectos, observou-se de que forma os cursos implementam a relação entre a formação do bacharel e do licenciado, a partir de componentes curriculares articulados aos dois graus acadêmicos.
Vale ressaltar que todas as análises se respaldaram nas Diretrizes Curriculares para os cursos de graduação em Enfermagem, de 2001, e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de Licenciatura, de graduação plena, de 2002, uma vez que ambas estavam vigentes no decorrer dos anos 2000, período de organização das matrizes curriculares analisadas.
Para além da introdução e das considerações finais, o artigo se encontra dividido em três seções que abordam os fatores caracterizadores da relação estabelecida entre o Bacharelado e a Licenciatura nos cursos participantes deste estudo. A primeira seção aborda a distribuição da carga horária dos componentes curriculares; a segunda, a relação teoria e prática e a terceira seção, a organização dos conteúdos curriculares, em especial, os pedagógicos, respectivamente. Ao final, as reflexões colaboram para a discussão a respeito de como vem sendo organizada, dentro das matrizes curriculares dos cursos de LBE das UPE, a relação entre o Bacharelado e a Licenciatura em Enfermagem.
2 A MATRIZ CURRICULAR DOS CURSOS DE LICENCIATURA EM ENFERMAGEM: UMA ANÁLISE A PARTIR DA COMPOSIÇÃO DA CARGA HORÁRIA
Os nove cursos estruturaram suas matrizes a partir de um enfoque tradicional de organização pedagógica, pautado em disciplinas. No entanto, alguns cursos agregaram as disciplinas em módulos ou unidades temáticas, por vezes articulando conteúdos de formação específica e de formação pedagógica, conforme demonstram os trechos retirados dos PPs:
A proposta curricular é organizada predominantemente em Módulos, que explicitam as articulações dos diferentes saberes, constituídos por conjuntos de disciplinas ou disciplinas individuais. A construção curricular em torno de eixos integrativos e em módulos constitui iniciativa pioneira na E1, ao aglutinar os conteúdos essenciais das diferentes áreas de conhecimento, dos diferentes departamentos [...] e de outras unidades, na articulação dos saberes necessários para compor o módulo, o que evidencia a tessitura do currículo em matriz integrativa (E1).
[...] princípios gerais originaram cinco eixos temáticos (Educação e Saúde; Enfermagem; Processo do Cuidar; Comunicação; Contexto e Cenário) que têm conduzido a organização das disciplinas agrupadas em torno de unidades temáticas, que compõem as cinco séries do curso. As unidades temáticas reúnem as disciplinas afins, procurando desenvolver o processo educativo de forma integrada (interdisciplinaridade), sequenciada e contextualizada (E4).
De acordo com Zabala (1998), a organização dos conteúdos pode ser orientada pela perspectiva da multidisciplinaridade, da interdisciplinaridade ou, ainda, pela transdisciplinaridade. A análise dos nove PPs revela que todos utilizaram a interdisciplinaridade para a organização dos conteúdos e como justificativa para os arranjos realizados entre os componentes curriculares, especialmente os que se referem às diferentes formas de prática. No entanto, apenas um curso traz em seu PP a explicação de como procurou articular os conteúdos pedagógicos de maneira interdisciplinar, incluindo a teoria e a prática. Os demais PPs carecem de contextualização da relação estabelecida.
Para compreensão mais ampla dos desenhos curriculares, mapeou-se a organização das matrizes. Dessa forma, para a análise das áreas de conhecimento, utilizou-se a divisão das grandes áreas proposta pelas DCEnf, de 2001, que compreendem Ciências Biológicas e da Saúde, Ciências Humanas e Sociais e Ciências da Enfermagem, sendo esta última fracionada em fundamentos de enfermagem, assistência de enfermagem, administração de enfermagem e ensino de enfermagem.
O ensino de enfermagem, segundo as DCN de 2001, refere-se aos conteúdos pertinentes à capacitação pedagógica do enfermeiro, independentemente da Licenciatura em Enfermagem (BRASIL, 2001a). Cabe destacar que, para análise da matriz curricular, os conteúdos relacionados à área pedagógica foram computados dentro da área da educação/ensino, conforme demonstrado na Tabela 1, com identificação dos cursos como LE1 até LE9.
Embora as diretrizes da enfermagem não estabeleçam proporções ou porcentagens com relação às áreas a serem ofertadas na graduação, verificou-se que os nove cursos acataram as DCEnf de 2001 no que se refere à oferta de conteúdos obrigatórios das diferentes áreas.
Com relação aos conteúdos que compõem as matrizes curriculares, observou-se que os nove cursos oferecem a maior concentração na área das Ciências da Enfermagem, seguida pelas Ciências Biológicas e da Saúde. Na sequência, estão os conteúdos de Ensino e, por último, as Ciências Humanas e Sociais, conforme observa-se na Tabela 1.
Curso de LBE | Disciplinas | Carga Horária Total | |||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Ciências Biológicas e da Saúde | Ciências Humanas e Sociais | Enfermagem | Educação/Ensino | ||||||
N | % | N | % | N | % | N | % | N | |
LE1 | 915 | 15,55 | 180 | 3,06 | 1.905 | 32,37 | 450 | 7,65 | 5.885 |
LE2 | 810 | 16,96 | 165 | 3,46 | 1.800 | 37,70 | 750 | 15,71 | 4.775 |
LE3 | 885 | 20,14 | 135 | 3,07 | 1.875 | 42,66 | 315 | 7,17 | 4.395 |
LE4 | 878 | 19,50 | 170 | 3,77 | 1.524 | 33,83 | 397 | 8,81 | 4.505 |
LE5 | 1.054 | 21,09 | 170 | 3,40 | 2.040 | 40,82 | 272 | 5,44 | 4.997 |
LE6 | 918 | 16,82 | 102 | 1,87 | 2.567 | 47,03 | 289 | 5,29 | 5.458 |
LE7 | 750 | 15,71 | 270 | 5,65 | 1.650 | 34,55 | 480 | 10,05 | 4.775 |
LE8 | 750 | 15,91 | 315 | 6,68 | 1.575 | 33,40 | 435 | 9,23 | 4.715 |
LE9 | 750 | 15,97 | 270 | 5,75 | 1.620 | 34,50 | 435 | 9,27 | 4.695 |
Fonte: elaborado pelas autoras a partir das matrizes curriculares dos cursos de LBE, 2018.
O estudo conduzido por Gatti et al. (2010), a respeito da caracterização dos cursos de Licenciatura em Pedagogia, Língua Portuguesa e Ciências Biológicas do país, averiguou que a proporção de carga horária destinada aos conteúdos referentes à área específica, encontravam-se em torno de 30%, 51,4% e 65,3%, respectivamente. Os cursos de Letras apresentam 11% de sua carga horária destinada aos conteúdos de formação pedagógica e as licenciaturas em Ciências Biológicas, em torno de 10%. Entre os cursos de LBE, observou-se uma variação de 32,37% a 47,03% na porcentagem destinada aos componentes específicos da área da enfermagem, sendo que as disciplinas de cunho pedagógico, concentraram-se no intervalo de 5,29% a 15,71% do total da carga horária curricular.
Em outro estudo, realizado com nove cursos de licenciatura em Química de IES públicas no estado de São Paulo, houve grande discrepância entre a carga horária destinada aos conhecimentos específicos, variando entre 390 e 1350 horas e os conhecimentos pedagógicos apresentaram uma baixa porcentagem comparados ao total dos componentes científico-culturais (KASSEBOEHMER; FERREIRA, 2008).
Entre os nove cursos de LBE das IES estaduais participantes desta pesquisa, os conteúdos pedagógicos não são predominantes nas matrizes curriculares analisadas. Dessa forma, observa-se que a proporção de carga horária destinada aos componentes pedagógicos apresenta correlação com outros cursos de licenciatura, de acordo com as pesquisas citadas.
Destaca-se que, com relação à carga horária total, as DCN de 2002 determinam que as licenciaturas devam contemplar um mínimo de 2800 horas. Destas, 1.800 horas devem ser direcionadas a conteúdos curriculares de natureza científico-cultural. Ainda, os incisos IV e V do Parágrafo 3º do Art. 6º, que tratam dos conhecimentos exigidos, indicam que estes devem contemplar, dentre outras questões, os conteúdos das áreas de conhecimento que serão objeto de ensino e os conhecimentos pedagógicos para o exercício da docência. Respeitando a flexibilidade curricular e as diretrizes específicas das áreas de conhecimento, as DCN de 2002 não estipulam a carga horária mínima para os conteúdos de formação específica. Entretanto, as DCN de 2002 delimitam a carga horária mínima para as dimensões pedagógicas de formação nas licenciaturas, de acordo com o Parágrafo Único do Art. 11, conforme segue:
Nas licenciaturas em educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental deverão preponderar os tempos dedicados à constituição de conhecimento sobre os objetos de ensino e nas demais licenciaturas o tempo dedicado às dimensões pedagógicas não será inferior à quinta parte da carga horária total(BRASIL, 2002, p. 5, grifos das autoras).
Dessa forma, a Tabela 2 traz subsídios para a análise da carga horária adotada pelos cursos de LBE, no que se refere aos graus acadêmicos ofertados. Com relação à carga horária total dos cursos, verifica-se que os nove atenderam às orientações da carga horária mínima determinada pelas DCN de 2002, uma vez que devem ser considerados os componentes pedagógicos e específicos na matriz curricular das licenciaturas.
Com relação à carga horária destinada ao Bacharelado, a Resolução CNE/CES nº 4, de 6 de abril de 2009, determina que para o Bacharelado em Enfermagem a carga horária mínima deva ser de 4.000 horas, na modalidade presencial, em hora do relógio. Entre os seis cursos que apresentam informações específicas na matriz e no PP sobre a carga horária destinada aos componentes do Bacharelado e da Licenciatura, de forma a permitir a análise em separado, verifica-se que dois contemplam a Resolução nº 4, de 2009, apenas contando os conteúdos do bacharelado. Os demais quatro cursos, atendem o mínimo de 4.000 horas preconizadas ao associarem os conteúdos de ensino e de educação à formação do enfermeiro bacharel. Infere-se que tal constituição, observada na matriz curricular dos cursos, seja consequência dos ajustes estabelecidos entre a Licenciatura e o Bacharelado a fim de atender as diretrizes da área de formação de professores e da enfermagem.
Vale ressaltar que esse processo não se constituiu como uma simples somatória de carga horária destinada ao Bacharelado e à Licenciatura. Ao contrário, verifica-se que os cursos constituíram suas matrizes curriculares a partir de acréscimos e articulações entre os graus acadêmicos, no que se refere à carga horária, organização curricular e conteúdos, realizados no sentido de atender às diretrizes da educação e da enfermagem, conforme será discutido adiante.
Aprofundando o olhar para o cenário desenhado pelas matrizes curriculares, destaca-se, novamente, a composição estabelecida pelos cursos no delineamento de uma matriz única, para a formação do enfermeiro licenciado, sem cisões, mas utilizando conhecimentos da área da educação e da enfermagem na constituição desse profissional.
Dessa forma, os dados evidenciam que a base histórica e material na qual os cursos de LE se constituíram no Brasil foi construída e alicerçada na associação entre o bacharelado e a licenciatura. A Tabela 2 contribui na elucidação da distribuição da carga horária das dimensões pedagógicas e dos componentes do bacharelado dos cursos de Licenciatura e Bacharelado em Enfermagem.
Curso de LBE | Carga horária das dimensões pedagógicas | Carga horária dos componentes do bacharelado | Carga Horária Total do Curso |
---|---|---|---|
LE1 | 1.255 | 4.170 | 5.8854 |
LE2 | 1.170 | 3.605 | 4.775 |
LE3 | - | - | 4.395 |
LE4 | 1.251 | 3.254 | 4.505 |
LE5 | 1.072 | 3.925 | 4.997 |
LE6 | 1.097 | 4.361 | 5.458 |
LE7 | 1.305 | 3.470 | 4.775 |
LE8 | - | - | 4.715 |
LE9 | - | - | 4.695 |
Fonte: elaborado pelas autoras a partir das matrizes curriculares dos cursos de LBE.
No que se refere à oferta de um quinto da carga horária total dos cursos às dimensões pedagógicas em seus currículos, de acordo com as DCN de 2002, verifica-se que os seis cursos que oferecem informações precisas sobre a carga horária de tais componentes, alcançaram a determinação das diretrizes, conforme demonstrado na Tabela 3.
Curso de LBE | Disciplinas de Educação/Ensino | Prática como Componente Curricular | Estágio Licenciatura | Carga Horária Total das dimensões pedagógicas | Carga Horária Total do Curso | A Quinta parte da Carga Horária Total |
---|---|---|---|---|---|---|
LE1 | 450 | 400 | 405 | 1.255 | 5.885 | 1.177 |
LE2 | 750 | 4955 | 420 | 1.170 | 4.775 | 955 |
LE3 | 315 | Sem informações no PP | 300 | - | 4.395 | 879 |
LE4 | 397 | 429 | 425 | 1.251 | 4.505 | 901 |
LE5 | 272 | 400 | 400 | 1.072 | 4.997 | 999,40 |
LE6 | 289 | 400 | 408 | 1.097 | 5.458 | 1.091,60 |
LE7 | 480 | 405 | 420 | 1.305 | 4.775 | 955 |
LE8 | 435 | 420 | 1.2756 | - | 4.715 | 943 |
LE9 | 435 | 420 | 1.3207 | - | 4.695 | 939 |
Fonte: elaborado pelas autoras a partir das matrizes curriculares dos cursos de LBE.
Todavia, se forem considerados apenas os conteúdos teóricos, nenhum dos cursos atinge o percentual proposto de um quinto do quantitativo geral de horas dos cursos. Destaca-se que é necessária a soma das cargas horárias das disciplinas teóricas e das dimensões práticas curriculares, como a prática como componente curricular (PCC) e o estágio curricular de licenciatura, para a contemplação de um quinto da carga horária total dos cursos destinados às dimensões pedagógicas.
Nesse formato de organização curricular, os conteúdos teóricos acabam não alcançando destaque na composição geral curricular, mas a posição privilegiante se concentra nos componentes teórico-práticos, conforme demonstram os dados da Tabela 3. A partir dessa perspectiva, ressalta-se a expressividade que os componentes que retratam a relação entre teoria e prática alcançam na composição destinada às dimensões pedagógicas nos currículos, o que será melhor detalhado na próxima seção.
3 A RELAÇÃO ESTABELECIDA ENTRE A LICENCIATURA E O BACHARELADO A PARTIR DOS COMPONENTES TEÓRICO-PRÁTICOS CURRICULARES
Com relação aos componentes teóricos e práticos, as DCEnf de 2001 expressam a necessidade de formação do enfermeiro a partir da relação entre a teoria e a prática desenvolvida ao longo do curso. No entanto, a diretriz da enfermagem não determina carga horária e/ou local para o desenvolvimento das atividades práticas, estipulando apenas a carga horária mínima a ser realizada no estágio curricular supervisionado. De maneira contrária, as DCN, de 2002, detalham em seu Art. 1º a composição de carga horária dos componentes curriculares, conforme segue:
A carga horária dos cursos de Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, será efetivada mediante a integralização de, no mínimo, 2800 (duas mil e oitocentas) horas, nas quais a articulação teoria-prática garanta, nos termos dos seus projetos pedagógicos, as seguintes dimensões dos componentes comuns: I - 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular, vivenciadas ao longo do curso; II - 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do início da segunda metade do curso; III - 1800 (mil e oitocentas) horas de aulas para os conteúdos curriculares de natureza científico-cultural; IV - 200 (duzentas) horas para outras formas de atividades acadêmico-científico-culturais (BRASIL, 2002).
Destaca-se que os nove cursos de LBE das IES estaduais utilizam as práticas específicas da enfermagem e as PCCs enquanto componente curricular em suas respectivas matrizes, sendo desenvolvidas ao longo do curso, dissociadas do estágio curricular supervisionado, que tem a sua própria dimensão de prática, de acordo com a solicitação das DCN de 2002, conforme demonstrado na Tabela 3.
No entanto, oito cursos apresentam em seus respectivos PPs a carga horária destinada às PCCs e apenas um curso não traz outras informações a respeito da sua implementação. Ressalta-se que o curso LE2 desenvolve as PCCs apenas nas disciplinas relacionadas à parte pedagógica, além de ser o curso que apresenta a maior carga horária destinada às disciplinas teóricas pedagógicas e às PCCs. Sete cursos implementam as PCCs em disciplinas direcionadas à formação do bacharel e à formação do licenciado, concomitantemente, variando a oferta entre 400 e 435 horas. Todavia, apenas seis cursos discriminam a carga horária das PCCs dentro das disciplinas, conforme demonstrado na Tabela 4.
Curso | Disciplina | Carga Horária de Teoria | Carga Horária de Prática | Carga Horária da Prática como Componente Curricular | Carga Horária Total |
---|---|---|---|---|---|
LE4 | Didática | 34 | - | 34 | 68 |
Sistematização da Assistência de Enfermagem e Semiotécnica | 41 | 51 | 10 | 102 | |
LE5 | Didática | 102 | - | 102 | 102 |
Políticas de saúde e prática assistencial em saúde coletiva | 68 | 34 | 68 | 102 | |
LE8 | Didática | 45 | - | 15 | 60 |
Enfermagem no Processo de Reprodução Humana | 165 | 15 | 30 | 210 |
Fonte: elaborado pelas autoras a partir das matrizes curriculares dos cursos de LBE.
O estudo desenvolvido por Baldaquim (2019), baseado em catorze PPs dos cursos de Licenciatura em Química, demonstrou que a PCC também se encontrava inserida em disciplinas pedagógicas e em conteúdos específicos da área de química. Além disso, o autor constatou que os cursos implementaram a PCC de acordo com o seu perfil de formação do licenciado em química, a partir do ensino, da pesquisa e da extensão.
Evidencia-se que os cursos de LBE das IES estaduais procuram fomentar a reflexão da prática profissional, a partir da relação entre teoria e prática, sob o enfoque da interdisciplinaridade. Um dos cursos que utilizam a prática como componente curricular nos módulos da licenciatura e do bacharelado justifica sua implementação “[..] uma vez que articulação entre teoria e prática no desenvolvimento do ensino de Enfermagem e a prática como lócus de geração de questões de aprendizagem constituem-se princípios do novo Projeto Pedagógico do Curso” (LE1). Dessa forma, é possível observar, desde o início do PP do referido curso, a utilização do termo Prática Integrada para a identificação das atividades práticas realizadas durante a graduação.
Ressalta-se que, embora a maioria dos cursos implemente a PCC em disciplinas de formação específica e em disciplinas de formação pedagógica, incluindo disciplinas que possuem práticas inerentes à enfermagem, os cursos não evidenciam, ao longo da matriz curricular e/ou do PP, como se articulam tais saberes dentro de uma única disciplina. Compreende-se que esse seja um ponto para outras discussões dentro da área, uma vez que não havendo um direcionamento, para docentes e discentes, a implementação das PCCs pode não contemplar o objetivo proposto pelo curso.
Infere-se que os cursos organizaram seus currículos sob essa configuração, a partir de discussões e reinterpretações das DCN e de seus pareceres relacionados. O Artigo 12 das DCN de 2002, em seu parágrafo 3, indica que “no interior das áreas ou das disciplinas que constituírem os componentes curriculares de formação, e não apenas nas disciplinas pedagógicas, todas terão a sua dimensão prática” (BRASIL, 2002, p. 5). Sobre o mesmo tema, o Parecer CNE/CP nº 9, de 8 de maio de 2001, ressalta que “uma concepção de prática mais como componente curricular implica vê-la como uma dimensão do conhecimento [...] presente nos cursos de formação no momento em que se trabalha na reflexão sobre a atividade profissional” (BRASIL, 2001b, p. 23).
Contrapondo-se a essa perspectiva, o estudo de Gatti et al. (2010) demonstrou que os cursos de licenciatura em Língua Portuguesa, Ciências Biológicas e Matemática, assim como os de LBE, distribuem as PCCs em diversas disciplinas, mas não informam em seus PPs especificações a respeito de como operacionalizá-las. Essa conjuntura pode interferir no objetivo pedagógico de articular teoria e prática, na construção da práxis, uma vez que esse movimento deve ser alicerçado na visão crítica e reflexiva dos acontecimentos, que devem ser experenciados, discutidos e ressignificados à luz da teoria, constituindo o profissional docente em formação.
Cabe destacar que a forma de organização e aplicação da PCC se deve, em especial, aos agentes responsáveis pela sua microimplementação, que apresentam diferentes vivências, interpretações, questionamentos e até mesmo diferentes conceitos a respeito da prática como componente curricular.
Na área da Saúde a prática propicia a reflexão e o estabelecimento de elo entre os conhecimentos teóricos e os constituídos no exercício da atividade em si, incorporando o saber da experiência (GARCIA; FAGUNDES, 2010). Missio (2007) afirma que, ao mesmo tempo em que não se pode hipervalorizar as experiências trazidas do campo da prática profissional como saberes suficientes para a docência na Educação Superior, não se pode esquecer da importância que a experiência problematizada, refletiva, traz para o ensino na área da saúde. Em sua tese de doutoramento, a autora trabalhou com enfermeiros docentes de uma IES pública estadual, investigando sua constituição enquanto docentes. Um dos fatores apontados em sua pesquisa foi a importância conferida à perspectiva da experiência da prática pelos enfermeiros para a constituição de sua identidade docente.
Tardif (2014) discute a relevância da prática para a construção dos saberes docentes, ancorados em uma pluralidade de saberes, os saberes profissionais, os saberes disciplinares, os saberes curriculares e os saberes experienciais. Além de tais saberes implicarem o desenvolvimento profissional dos professores, o autor também aponta que o docente necessita dominar o conteúdo a ser abordado, bem como a sua disciplina e o seu programa, e adquirir determinados conhecimentos da área da Educação e da Pedagogia.
Nesse sentido, de construção de conhecimento a partir da experiência vivenciada entre a teoria e a prática, outro componente curricular que recebeu destaque na legislação, garantindo a sua representatividade, foi o estágio curricular supervisionado (ECS).
Destaca-se a importância que esse componente vem assumindo dentro da formação dos profissionais, ressaltada em estudos realizados por Andrade (2013), Sabino, Lima e Silva (2013), Pimenta e Lima (2019), inclusive na área da enfermagem, como apontam os trabalhos de Lopes (2011), Meira e Kurcgant (2016) e Guedes et al. (2016). De acordo com as DCN de 2002, o ECS da licenciatura deve contemplar o mínimo de 400 horas e ser realizado em escolas de educação básica a partir do início da segunda metade do curso, ou seja, nos cursos de LBE devem ser ofertados a partir do quinto semestre.
Todos os cursos de LBE das UPE informam em suas matrizes curriculares a realização de estágios para o bacharelado e a licenciatura, com suas respectivas cargas horárias totais. A partir das especificidades na organização dos ECS nos cursos de LBE, entende-se que seja necessário apresentar as dinâmicas utilizadas por cada curso separadamente, sintetizadas nos Quadros 1 e 2, apresentados a seguir.
Curso | Disciplina | Local | Carga Horária | Período |
---|---|---|---|---|
LE1 | ECS de Licenciatura em Enfermagem | Instituições de saúde e em escolas de ensino profissionalizante durante três meses consecutivos | 405 | 9º sem. |
LE28 | ECS Promoção da Saúde na Educação Básica | Escolas de educação básica | 180 | 8º sem. |
ECS em Educação Profissional em Enfermagem | Escolas de educação profissionalizante na área da enfermagem | 240 | 9º sem. | |
LE3 | Estágio supervisionado I | Sem informações no PP | 90 | 7º sem. |
Estágio supervisionado II | Sem informações no PP | 120 | 8º sem. | |
Estágio supervisionado para a Enfermagem | Sem informações no PP | 90 | 9º sem. | |
LE4 | Estágio curricular Supervisionado obrigatório de Licenciatura I | Espaços escolares de educação básica e não escolares e em cursos de ensino profissionalizante na área da saúde | 189 | 4ª série |
Estágio curricular Supervisionado obrigatório de Licenciatura II | Espaços escolares de educação básica e não escolares e em cursos de ensino profissionalizante na área da saúde | 165 | 5ª série | |
LE5 | Prática de Ensino I | Escolas de ensino fundamental e médio | 136 | 3ª série |
Prática de Ensino II | Cursos específicos de formação de profissionais de enfermagem | 264 | 4ª série | |
LE6 | Prática de ensino I | Escolas de ensino fundamental e médio | 136 | 3ª série |
Prática de ensino II | Cursos específicos de formação de profissionais de enfermagem | 272 | 4ª série | |
LE7 | Estágio em Prática de ensino I | Rede de atenção básica e hospitalar | 105 | 6º sem. |
Estágio em Prática de ensino II | Espaços não escolares como creches, rede de atenção básica, grupo de idosos, associações de moradores, Conselhos Municipais, ONGs | 105 | 7º sem. | |
Estágio em Prática de ensino III | Educação permanente em saúde/enfermagem9 | 105 | 8º sem. | |
Estágio em Prática de ensino IV | Formação de recursos humanos na área de saúde/enfermagem10 | 105 | 9º sem. | |
LE8 | Estágio Curricular Supervisionado I | Rede de atenção básica e hospitalar | 105 | 6º sem. |
O Estágio Curricular Supervisionado II | Rede de ensino básico | 105 | 7º sem. | |
Estágio Curricular Supervisionado III | Serviços de saúde | 105 | 8º sem. | |
Estágio Curricular Supervisionado IV | Educação profissionalizante | 105 | 9º sem. | |
LE9 | Estágio Curricular Supervisionado I | Rede de atenção básica e hospitalar | 105 | 6º sem. |
Estágio Curricular Supervisionado II | Rede de ensino básico | 105 | 7º sem. | |
Estágio Curricular Supervisionado III | Serviços de saúde | 105 | 8º sem. | |
Estágio Curricular Supervisionado IV | Educação profissionalizante | 105 | 9º sem. |
Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do PP dos cursos de LBE das UPE, 2018.
O curso oferecido por LE3 não traz informações a respeito de como o estágio da licenciatura deve ser implementado, oferecendo suporte apenas para o desenvolvimento do estágio do bacharelado. Os demais cursos apresentam, em seus PPs os objetivos, a organização e a concepção de avaliação dos estágios, alguns de forma mais concisa, outros de forma mais detalhada.
Cotejando os dados coletados com os encontrados na pesquisa de Gatti et al. (2010), realizada com os cursos de Pedagogia, Matemática, Ciências Biológicas e Língua Portuguesa, considera-se que os cursos de LE tenham avançado no sentido de apresentar outras informações no PP a respeito do desenvolvimento do ECS. Pondera-se que tal perspectiva esteja associada à vivência de aulas práticas de Enfermagem nos serviços de saúde e no próprio estágio do bacharelado, situações que exigem dos cursos informações e planejamento detalhados para a negociação com as instituições cedentes dos campos de estágio, ou seja, secretarias municipais de saúde e hospitais públicos e/ou privados, sendo essa experiência projetada para o ECS da Licenciatura em Enfermagem. Corroborando tal afirmação, observa-se que a maioria dos cursos contemplou as orientações das DCEnf, de 2001 e as DCN de 2002, com relação à carga horária e aos campos de estágio.
Dessa forma, todos os cursos procuram desenvolver o ECS do bacharelado em unidades de saúde da atenção básica e da área hospitalar. Conforme direcionado pelas DCENf, de 2001, em oito cursos o ECS do bacharelado é desenvolvido nos dois últimos semestres e apenas um curso o concentra no décimo semestre. No curso em que a licenciatura e o bacharelado possuem PPs diferentes, as disciplinas do Bacharelado em Enfermagem se encerram no oitavo semestre, sendo o ECS do bacharelado ofertado, então, no sétimo e oitavo semestre, embora o curso se estenda até o nono semestre para os discentes que optam pela LE.
Apenas um curso concentra o ECS da licenciatura no último semestre, os demais, o fragmentam entre dois e quatro semestres. Enquanto sete cursos apontam em seus PPs a realização do ECS da licenciatura em escolas da educação básica, dois cursos não fazem menção a esse procedimento, entretanto, os nove cursos implementam o ECS da licenciatura nas escolas de ensino técnico profissionalizante. Cumpre destacar que, pela descrição das ementas dos cursos, conforme exemplificados no Quadro 2, a referência feita às escolas de educação básica remete àquelas que ofertam o ensino fundamental e o ensino médio, embora o ensino profissional técnico de nível médio seja um dos componentes da educação básica, garantido na LDB de 1996, podendo ser ofertado de maneira integrada, concomitante ou subsequente ao ensino médio (BRASIL, 1996).
Analisando as matrizes curriculares e as ementas pode-se inferir que todos os nove cursos de LBE estaduais contemplam a oferta de ECS em escolas de educação básica, conforme o preconizado pelas DCN de 2002, uma vez que as diretrizes não restringem, em seu texto, o universo para a realização dos estágios da licenciatura em escolas de educação básica nos níveis fundamental e/ou médio.
Os cursos delinearam o ECS da licenciatura de forma a iniciarem as atividades nos espaços escolares, ou seja, nas escolas de ensino fundamental e/ou médio e em espaços não escolares, como creches, rede de atenção básica, grupo de idosos, associações de moradores, Conselhos Municipais, Organizações Não Governamentais, a partir das atividades de promoção à saúde e prevenção de doenças, sob a perspectiva da educação em saúde. Posteriormente, alguns cursos indicam que passam a desenvolver o estágio da licenciatura por meio da implementação da educação permanente voltada aos serviços de saúde. Por fim, a educação profissionalizante é contemplada pelo ECS da licenciatura, sendo desenvolvida no ensino técnico profissionalizante, conforme apresenta a Quadro 2.
Curso | Disciplina | Ementa |
---|---|---|
LE3 | Estágio supervisionado I | Desenvolvimento de atividades de estágio, atividades de imersão no campo de trabalho, que propiciem ao professor em formação o contato com experiências, práticas e conhecimentos de natureza profissional. |
Estágio supervisionado II | Desenvolvimento de atividades de estágio, atividades de imersão no campo de trabalho, que propiciem ao professor em formação o contato com experiências, práticas e conhecimentos de natureza profissional. | |
Estágio supervisionado para a Enfermagem | Vivência de forma coparticipativa a aplicação dos conhecimentos teórico-práticos na organização, execução, avaliação e/ou proposição de mudanças no trabalho pedagógico desenvolvido nos cursos de nível médio de Enfermagem e nas escolas de ensino fundamental e médio. Desenvolve investigações nestes níveis de ensino, colaborando na análise e nas mudanças necessárias de elementos do processo pedagógico. | |
LE6 | Prática de ensino I | Atividade teórico-prática que promoverá a reflexão das concepções e práticas de ensino de saúde nas escolas de ensino fundamental e médio, bem como o desenvolvimento de práticas educativas em saúde. Modalidades do trabalho educativo em saúde. Métodos de ensino em saúde. |
Prática de ensino II | Atividade teórico-prática que visa reflexão e investigação da ação docente, bem como a atuação docente sistematizada em cursos específicos de formação de profissionais de enfermagem. Desenvolvimento histórico da educação profissional no Brasil. Legislação vigente e organização do ensino profissionalizante. Modalidades do ensino em saúde. Desenvolvimento e execução de projetos de educação continuada junto a instituições que desenvolvam atividades de saúde. | |
LE7 | Estágio em Prática de ensino I | Processo de trabalho do enfermeiro na Educação em Saúde. Desenvolvimento de competências na rede de atenção básica e hospitalar, com vistas à promoção da saúde. O cotidiano da prática educativa em saúde. Resgate das concepções de educação e saúde com ênfase na promoção da saúde. Plano de intervenção em Educação em saúde. |
Estágio em Prática de ensino II | Processo de trabalho do enfermeiro na Educação em Saúde desenvolvido na rede de atenção básica em comunidade e espaço não escolar com vistas a promoção, reabilitação, assim como a recuperação da saúde, quando possível ou a melhoria da qualidade de vida de portadores de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). O estágio será desenvolvido em espaço não escolares como creches, rede de atenção básica, grupo de idosos, associações de moradores, Conselhos Municipais, ONGs. | |
Estágio em Prática de ensino III | Processo de trabalho do enfermeiro na educação profissional em saúde/enfermagem. Desenvolvimento das competências do saber, saber fazer e ser nos processos de educar em saúde. A Educação Permanente em Saúde - EPS como estratégia para a promoção da saúde e a consolidação do SUS. O quadrilátero da EPS. Articulação ensino-serviço. Elaboração e execução de projeto de Educação Permanente em Saúde. | |
Estágio em Prática de ensino IV | O trabalho do enfermeiro na formação de recursos humanos na área de saúde/enfermagem. Organização e funcionamento das Escolas Técnicas de Enfermagem: Gestão, Projeto Pedagógico de Curso, organização curricular, avaliação do ensino aprendizagem. Políticas de educação profissional. |
Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do PP dos cursos de LBE das UPE, 2018.
As ementas ainda revelam que os cursos fracionam a oferta dos ECS da LE a partir da concepção de implementação da práxis adotada, o que proporciona diferentes etapas e campos de estágios utilizados, os quais são relacionados à área da enfermagem. A princípio, a perspectiva da educação em saúde permite que os cursos abordem, didaticamente, conhecimentos de saúde de forma mais geral a um público não específico da área da saúde, como estudantes da educação básica ou mesmo, um grupo de hipertensos inserido na atenção básica. No caminho de formação do enfermeiro educador ao enfermeiro professor, os cursos procuram avançar no processo de ensino-aprendizagem, focando no ensino profissional técnico de nível médio. Compreende-se que essa tônica constante, verificada nos ECS da licenciatura e nas práticas de ensino desenvolvidas nas PCCs dos nove cursos, se refere intimamente à própria concepção de quais são as habilidades e competências pertinentes ao enfermeiro, bacharel e licenciado, e qual será o seu lócus empregatício dentro da sociedade.
Destaca-se que os nove cursos organizaram suas PCCs e os ECS a partir da perspectiva da educação em saúde. Dessa forma, as PCCs foram inseridas nas disciplinas do bacharelado e da licenciatura e aplicadas no processo de ensino-aprendizagem, procurando articular os conhecimentos específicos da enfermagem às situações de orientação, educação e ensino, individuais e coletivas a determinado público.
A educação em saúde é compreendida como uma estratégia para a difusão da promoção da saúde, para além de um enfoque apenas informativo, mas aprofundando a relação entre o conhecimento, o usuário, o profissional e o contexto (SALCI et al., 2013).
Corrobora-se Silva et al. (2009), quando afirmam que a promoção da saúde vem sendo valorizada e utilizada enquanto estratégia privilegiante para as mudanças das práticas em saúde coletiva, reestruturando saberes e ações para a ampliação de possibilidades de qualidade de vida da população. Esse aspecto se torna evidente nos cursos de LBE, quando se verifica nas ementas das disciplinas direcionadas à saúde coletiva, que a educação aí focalizada será um dos temas a serem implementados, por meio das práticas educativas pertinentes à área.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), promoção de saúde é “o nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle deste processo” (OMS, 1986, p. 1). Esse discurso voltado para as políticas de saúde encontrou respaldo no Brasil, que procurou viabilizá-lo por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). E a mudança de enfoque na política de saúde brasileira desencadeou as transformações nos currículos dos cursos de graduação em Enfermagem no sentido de aproximar a formação do enfermeiro às demandas preconizadas pelo SUS.
Argumenta-se que os cursos procuraram se organizar a partir de sua realidade, embasados na educação em saúde já vivenciada na área da enfermagem, utilizando os conhecimentos aí previstos para implementar o ensino da licenciatura, pois partem da concepção do enfermeiro-educador em direção à formação do enfermeiro-professor. A próxima seção, que aborda a organização dos conteúdos pedagógicos implementados pelos cursos de LBE, colabora para outras discussões nesse sentido.
4 A ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS CURRICULARES ESPECÍFICOS E PEDAGÓGICOS NA FORMAÇÃO DO ENFERMEIRO LICENCIADO
Com relação ao campo disciplinar dos cursos de LBE, observa-se que as disciplinas das áreas das Ciências Biológicas e da Saúde e das Ciências Humanas e Sociais pouco sofrem modificações em seus títulos/nomenclaturas, de um curso para o outro, demonstrando que a base para a construção do conhecimento no bacharelado e na licenciatura em enfermagem se estrutura em conhecimentos específicos e primários dentro das referidas áreas.
Os títulos das disciplinas dos conteúdos específicos da enfermagem possuem maior variação entre os cursos. Apesar de se observar nas matrizes curriculares, resquícios de um processo histórico de formação na enfermagem com o direcionamento para as especialidades médicas, a partir de sua estrutura e do nome designado para algumas disciplinas, destaca-se o avanço no sentido de contemplar a perspectiva proposta nas DCEnf de 2001, com ênfase na promoção, prevenção e reabilitação da saúde, o que pôde ser verificado a partir da consulta às ementas.
No que diz respeito à formação do enfermeiro licenciado, todos os cursos iniciam as disciplinas relacionadas à área pedagógica a partir do primeiro ano letivo, seguindo a orientação das DCN de 2002 e a oferta destas disciplinas ocorre a cada semestre ou ano seguinte. Contrapondo-se ao observado nos cursos de LBE, o estudo de Chaves (2014), realizado com cursos de Licenciatura oferecidos em uma Universidade Federal localizada na Região Sul brasileira, verificou uma concentração de oferta das disciplinas com enfoque pedagógico entre o término da primeira metade e o início da segunda metade dos cursos. Ainda, segundo a autora, não havia uma distribuição uniforme da oferta desses conteúdos na matriz curricular dos cursos.
Na organização curricular, os componentes da formação específica, apresentam maior concentração nas séries iniciais das disciplinas que fundamentam a área, como as das Ciências Biológicas e da Saúde e as das Ciências Humanas que, progressivamente, vão sendo substituídas pelos conteúdos específicos da enfermagem, no avanço dos semestres e/ou anos letivos.
Assim como nos conteúdos direcionados à formação específica, as disciplinas pedagógicas ofertadas nos primeiros anos, de sete cursos, são as que embasam os fundamentos da área. Dessa forma, no primeiro ano desses sete cursos, as disciplinas predominantes da formação pedagógica são as categorizadas enquanto Fundamentos Teóricos da Educação e Conhecimentos relativos aos Sistemas Educacionais, relacionadas no Quadro 3.
Os outros dois cursos iniciam as atividades pedagógicas a partir de disciplinas categorizadas enquanto Conhecimentos específicos para a Docência em Enfermagem: Ações educativas na Prática de Enfermagem e Práticas Educativas em Saúde. Tais disciplinas têm como foco principal a questão da educação em saúde na formação do enfermeiro. Destaca-se que o curso que oferta a disciplina de Ações educativas na Prática de Enfermagem é o que apresenta as matrizes curriculares do bacharelado e da licenciatura separadas e, tal disciplina, consta nos dois PPs, ou seja, o curso a compreende e a implementa enquanto disciplina fundamental para a formação do bacharel e do licenciado em enfermagem.
Analisando as informações do Quadro 3, observa-se que determinadas disciplinas, embora com nomenclaturas diferentes, estão presentes em quase todos os cursos, como as relacionadas à Psicologia da Educação, à Didática, às Políticas e Organização da Educação Básica e à Língua Brasileira de Sinais. As três primeiras disciplinas citadas já eram indicadas como obrigatórias aos cursos de licenciatura ao final da década de 1960, por conta do Parecer CFE nº 672, e as disciplinas relacionadas ao ensino da Língua Brasileira de Sinais foram estabelecidas como obrigatórias nas licenciaturas após os anos 2000, por meio do Decreto Federal nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005.
Categorias | Títulos da disciplina | Número de cursos que ofertam |
---|---|---|
1.Fundamentos Teóricos da Educação | Psicologia da Educação; Psicologia da Aprendizagem | 8 |
Didática; Didática Geral e aplicada à Enfermagem; Didática aplicada à Enfermagem; Didática Geral | 7 | |
Filosofia da Educação | 3 | |
História e Filosofia da Educação | 1 | |
Fundamentos Filosóficos em Saúde e Educação | 1 | |
Sociologia da Educação | 3 | |
Educação e Sociedade | 1 | |
2.Conhecimentos relativos aos Sistemas Educacionais | Políticas e Organização da Educação Básica no Brasil; Políticas e Organização da Educação Básica; Política Educacional: estrutura e funcionamento da Educação Brasileira; Política Educacional brasileira; Organização da Educação Brasileira; Estrutura e Funcionamento do Ensino Básico; Bases Políticas e Legais para Educação Básica e Profissional em enfermagem | 8 |
3.Conhecimentos específicos para a Docência | Instrumentos Metodológicos do Processo Ensinar/Aprender | 1 |
Gestão do Processo Ensinar/Aprender | 3 | |
Escola e Cultura | 1 | |
4.Conhecimentos específicos para a Docência em Enfermagem | Metodologia do Ensino de Enfermagem I | 1 |
Metodologia do Ensino de Enfermagem II | 1 | |
Ensinar e aprender em Enfermagem: fundamentos teóricos-metodológicos | 1 | |
Seminário sobre a problemática do ensino e da Prática de Enfermagem | 2 | |
Práticas Educativas em Saúde | 2 | |
Educação profissional em Enfermagem I | 1 | |
Educação Profissional em Enfermagem II | 1 | |
Promoção de Saúde na Educação Básica | 1 | |
Ações educativas na prática da enfermagem | 1 | |
Educação em Enfermagem | 1 | |
Educação em saúde | 1 | |
Políticas de Educação e Saúde | 1 | |
5.Conhecimentos relativos às modalidades e níveis de ensino específicos | Língua Brasileira de Sinais; Educação Especial, Educação de Surdos e Língua Brasileira de Sinais; Educação especial e Libras na perspectiva da educação inclusiva; Fundamentos em Libras; | 8 |
Fonte: elaborado pelas autoras a partir dos projetos Pedagógicos dos cursos de LBE das IES estaduais.
A literatura da área destaca que, historicamente, os cursos de licenciatura implementaram o modelo 3+1 de formação com o último ano dedicado às disciplinas pedagógicas básicas, como a Estrutura e Funcionamento do Ensino, a Psicologia da Educação, a Didática e a Prática de Ensino (FERNANDES; CUNHA, 2013; SILVA; FALCOMER; PORTO, 2018).
Nos cursos de LBE, representados no Quadro 3, verifica-se um avanço com relação à oferta de disciplinas relacionadas aos fundamentos teóricos da educação, ao serem elencadas disciplinas relacionadas à Filosofia e à Sociologia da educação. Alguns cursos, refletindo a perspectiva da aproximação da Licenciatura e do Bacharelado em Enfermagem, oferecem tais disciplinas abordando, concomitantemente, as áreas da Educação e da Saúde.
Destaca-se outro avanço na implementação dos incrementos realizados pelas DCN de 2002, com relação ao Parecer CFE nº 672, com a adesão dos cursos às disciplinas cujo enfoque é direcionado aos conhecimentos específicos para a docência. Tais conteúdos, que têm por objetivo aprofundar a discussão a respeito das áreas da educação e do ensino, procuram instrumentalizar os professores enfermeiros para atuarem na educação básica, incluindo o ensino profissionalizante. Ou seja, ao associarem os conhecimentos teóricos e científicos à sua aplicação na prática pedagógica do enfermeiro, os cursos procuraram se organizar de forma a articular os conhecimentos da formação específica aos da formação pedagógica.
Esse panorama das disciplinas pedagógicas, ofertadas pelos cursos de LBE, contrapõe-se ao encontrado na pesquisa realizada por Gatti et al. (2010) a respeito dos currículos dos cursos de licenciatura no Brasil. A pesquisa das autoras citadas verificou um grande enfoque em disciplinas direcionadas às abordagens de teorias políticas, sociológicas e psicológicas, além das direcionadas aos enfrentamentos ocorridos nas redes de ensino e poucas referências às disciplinas metodológicas voltadas para a educação infantil, de jovens e de adolescentes, principal público das licenciaturas.
A tônica dos cursos de LBE, no entanto, direciona-se para a formação do enfermeiro licenciado que desenvolverá ações de práticas pedagógicas nas escolas profissionalizantes de nível técnico. Nesse sentido, as disciplinas de cunho específico para a docência apresentadas pelos cursos, direcionam-se de forma a atender essa clientela. Esse cenário demonstra a implementação das políticas educacionais no sentido da aproximação entre as instituições formadoras, ou seja, as universidades, e as escolas de educação básica, mais especificamente, as formadoras de auxiliares e técnicos de enfermagem.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verifica-se que, embora historicamente os cursos de LE tenham sido ofertados em associação com o bacharelado, sob o modelo “3+1” presente também nas demais licenciaturas, os incrementos realizados nas políticas educacionais, particularmente nas licenciaturas e a mudança de modelo de atenção à saúde proposto pelo SUS, a partir do final da década de 1980, propiciaram a articulação da formação do bacharel e do licenciado em enfermagem. Ao determinarem a construção de um perfil para o enfermeiro que articula as duas áreas de saber, a enfermagem e a educação, as políticas de educação e de saúde se encaminhavam para uma perspectiva favorável aos cursos de LBE.
Embora o MEC tenha buscado desenvolver, por meio dos acréscimos inseridos na política da Educação Superior, a perspectiva de que, a oferta em separado da Licenciatura, estimule e promova uma melhor formação para os licenciados, os cursos de LBE das UPE vêm demonstrando, a partir de suas propostas curriculares, que não possuem a mesma compreensão. Uma vez que os dados analisados demonstram construções curriculares embasadas em carga horária, relação teoria e prática e conteúdos específicos e pedagógicos, associados e articulados de forma a propiciar a constituição do enfermeiro, bacharel e licenciado. Destaca-se que os cursos se respaldam em sua construção histórica e social, a partir dos componentes curriculares da área da enfermagem articulados aos componentes de formação pedagógica, para a manutenção da oferta associada entre a Licenciatura e o Bacharelado em Enfermagem.
No entanto, é necessária uma leitura cuidadosa do contexto, a partir de sua base material, uma vez que as orientações do Estado são construídas por meio de movimentos, tensões, disputas e posicionamentos oriundos da sociedade. Embora se defenda que a práxis agrega o potencial transformador da relação teoria e prática, entende-se que seja um dever ético do professor, oportunizá-la a partir de experiências pautadas em processos de reflexão, críticos e analíticos. Esse é um desafio que os cursos de LBE enfrentam, uma vez que a teoria e a prática do enfermeiro licenciado devem ser tensionadas e refletidas a partir de uma concepção crítica e reflexiva para a construção de um profissional consciente, histórica, cultural e socialmente situado, que não atenda somente aos interesses do mundo do trabalho, uma vez que nele se encontra inserido, mas que disponha de recursos e ferramentas para a constituição da verdadeira proposta transformadora da práxis pedagógica.