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Práxis Educativa

versão impressa ISSN 1809-4031versão On-line ISSN 1809-4309

Práxis Educativa vol.16  Ponta Grossa  2021  Epub 09-Fev-2022

https://doi.org/10.5212/praxeduc.v.16.17319.065 

Seção Temática: Ética e pesquisa em Educação: novas investigações

Ética em Pesquisa nas dissertações e teses da área de Educação: um olhar para a região Nordeste*

Ética de la Investigación en Disertaciones y Tesis del Área de Educación: una mirada a la región Noreste

João Batista Carvalho Nunes** 
http://orcid.org/0000-0002-1270-0026

**Doutor em Educação. Professor do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual do Ceará (PPGE/UECE). E-mail: <joao.nunes@uece.br>.


Resumo:

Esta pesquisa teve como objetivo geral analisar o registro dos procedimentos éticos utilizados em pesquisas de Mestrado e Doutorado na área de Educação, concluídas nos anos de 2013 e 2017, em Programas de Pós-Graduação da região Nordeste com nota 5, considerados de excelência nacional pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Empregou-se a abordagem mista e o método de pesquisa documental. Aplicou-se a análise estatística para os dados quantitativos e a análise de conteúdo para os qualitativos. Observou-se que, em 2013 e 2017, foram defendidas 679 dissertações e teses nos Programas analisados. Teve-se acesso a uma amostra de 657 (96,76%) dessas produções. Somente 151 (22,98%) foram aprovadas por Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e 279 (42,47%) fizeram referência ao uso de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Constatou-se, ademais, tendência de crescimento no número de pesquisas submetidas e aprovadas em CEP e que fazem uso de TCLE, nos trabalhos defendidos de 2013 para 2017.

Palavras-chave: Ética em Pesquisa; Pesquisa educacional; Metodologia

Resumen:

Esta investigación tuvo como objetivo general analizar el registro de los procedimientos éticos utilizados en las investigaciones de Maestría y Doctorado en el área de Educación, concluidas entre los años 2013 y 2017, en Programas de Posgrado de la región Noreste de Brasil con nota 5, considerados de excelencia nacional por la Coordinación de Perfeccionamiento del Personal de Educación Superior (Capes). Se utilizó el enfoque mixto y el método de investigación documental. Se aplicó análisis estadístico para los datos cuantitativos y análisis de contenido para los cualitativos. Se observó que, entre 2013 y 2017, se defendieron 679 disertaciones y tesis en los Programas analizados. Se tuvo acceso a una muestra de 657 (96,76%) de estas producciones. Sólo 151 (22,98%) fueron aprobadas por el Comité de Ética de Investigación (CEI) y 279 (42,47%) hicieron referencia al uso del Formulario de Consentimiento Informado (FCI). Además, se constató tendencia de crecimiento en el número de investigaciones presentadas y aprobadas por CEI y que utilizan FCI, en los trabajos defendidos de 2013 a 2017.

Palabras clave: Ética de la Investigación; Investigación Educativa; Metodología

Abstract:

The general objective of this research was to analyze the record of the ethical procedures used in Master’s and Doctoral research in the Education area, completed in 2013 and 2017, in Graduate Programs with grade 5 in the Northeast region of Brazil, considered to be of national excellence by the Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel (CAPES). The mixed approach and the documentary research method were used. Statistical analysis was applied for quantitative data and content analysis for the qualitative ones. It was observed that, in 2013 and 2017, 679 dissertations and theses were defended in the analyzed Programs. A sample of 657 (96.76%) of these productions was accessed. Only 151 (22.98%) were approved by the Research Ethics Committee (REC) and 279 (42.47%) referred to the use of Informed Consent Form (ICF). In addition, there was a growth trend in the number of research papers submitted and approved by REC and that use ICF in the works defended from 2013 to 2017.

Keywords: Research Ethics; Educational research; Methodology

Introdução

O Código de Nuremberg, elaborado em 1947 como resposta à crueldade presente nos experimentos realizados em seres humanos durante a Segunda Guerra Mundial, constou de um conjunto de orientações éticas para a investigação científica. Ele representa, segundo Guilhem e Diniz (2014, p. 19), a “[...] entrada definitiva de princípios da cultura dos direitos humanos na pesquisa científica”. No Brasil, somente em 1996, por meio da Resolução Nº 196, de 10 de outubro (BRASIL, 1996), do Conselho Nacional de Saúde (CNS), foi instituído o Sistema Comitês de Ética em Pesquisa/Comissão Nacional de Ética em Pesquisa ou, abreviadamente, Sistema CEP/Conep.

Embora existam críticas das áreas de Ciências Humanas e Sociais (CHS) ao modelo biomédico do Sistema CEP/Conep (CARVALHO; MACHADO, 2014; DE LA FARE; SAVI NETO, 2019; GUERRIERO; BOSI, 2015), debates, estudos e pesquisas sobre ética em pesquisa na área de Educação ainda são recentes no país (MAINARDES, 2016, 2017). De acordo com Amorim et al. (2019), o primeiro registro de debate sobre esse tema foi promovido pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) em 2007. Somente em 2015, a ANPEd criou uma Comissão de Ética em Pesquisa.

Nesse sentido, esta investigação centrou-se em um tema ainda pouco explorado nacional e internacionalmente. Seu objetivo geral foi analisar o registro dos procedimentos éticos utilizados em pesquisas de Mestrado e Doutorado na área de Educação, concluídas nos anos de 2013 e 2017, em Programas de Pós-Graduação da região Nordeste, considerados de excelência nacional pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Com base nele, foram definidos os seguintes objetivos específicos: a) identificar as dissertações e as teses da área de Educação, defendidas nos anos de 2013 e 2017, em Programas de Pós-Graduação da região Nordeste considerados de excelência nacional pela Capes; b) conhecer quais aspectos relacionados à ética em pesquisa (com destaque para aprovação por CEP e uso de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE) estão presentes nessas dissertações e teses; e c) analisar o relato da utilização da ética em pesquisa nessas dissertações e teses, tomando por base diferenças entre anos, programas, graus acadêmicos (Mestrado ou Doutorado) e sexo dos autores.

Este artigo procura sintetizar os achados da referida pesquisa. Está organizado em cinco seções, incluindo esta Introdução. Na próxima, é tecida uma breve discussão acerca do registro de procedimentos éticos em dissertações e teses. Em seguida, indica-se a metodologia empregada na investigação. Na quarta parte, explicitam-se os resultados encontrados. Para finalizar, as conclusões do estudo são destacadas.

Registro de procedimentos éticos em dissertações e teses

No Brasil, a Comissão de Ética em Pesquisa da ANPEd, como resultado do Seminário “Ética e Pesquisa em Educação”, realizado nos dias 29 e 30 de setembro de 2016, elaborou a minuta de um documento intitulado “Ética na pesquisa em Educação: documento preliminar”, aprovado pela Assembleia Geral da Associação, durante sua 38ª Reunião Nacional, em 2017 (ANPED, 2017). Dando prosseguimento a esse trabalho da Comissão, foi disponibilizado pela ANPEd, em julho de 2019, o documento “Ética e pesquisa em Educação: subsídios - volume 1”, que “[...] visa oferecer aos pesquisadores da área um conjunto de subsídios sobre o tema” (ANPED, 2019, p. 5). Esse novo documento foi aprovado pela Assembleia Geral da Associação, durante sua 39ª Reunião Nacional, realizada de 20 a 24 de outubro de 2019.

O documento ainda não se constitui como um código de ética que aporte um conjunto de orientações éticas para o desenvolvimento das investigações em Educação, como ocorre em associações de pesquisadores dessa área em outros países. Entre essas associações, destacam-se: Australian Association for Research in Education, American Educational Research Association, British Educational Research Association e Deutsche Gesellschaft für Erziehungswissenschaft1.

No documento, todavia, Mainardes e Carvalho (2019) mostram a necessidade do uso da autodeclaração de princípios e de procedimentos éticos em pesquisas da área de Educação. Segundo os autores, essa autodeclaração é “[...] a manifestação escrita pela qual o próprio pesquisador explicita os princípios, os procedimentos e as demais questões éticas envolvidas no processo de pesquisa” (MAINARDES; CARVALHO, 2019, p. 130). Além disso, ela traz importante contribuição para o fortalecimento da ética na pesquisa em Educação, pois sua adoção representará um espaço de descrição e de autorreflexão sobre a conduta ética do pesquisador, materializado em uma seção nos relatórios de pesquisa, o que favorece a análise dessa conduta pelos pares para além de normas do Sistema CEP/Conep.

Olhando para as pesquisas de Mestrado e Doutorado na área de Educação, relatadas na forma de dissertações ou teses, observa-se que a necessidade de maior atenção à ética em pesquisa não está limitada ao Brasil e à referida área. Como explicitam Holbrook et al. (2017, p. 324, tradução nossa), em uma investigação com dados obtidos de 14 instituições, sendo nove da Austrália, três da Inglaterra e duas da Nova Zelândia, “[...] são poucos os estudos que abordam como a ética é apresentada em teses ou dissertações”2. Segundo os autores, “[...] os resultados deste estudo sugerem que a ética em pesquisa causa pouca impressão nos procedimentos de exame e é mais uma nota de rodapé do que uma pegada”3 (HOLBROOK et al., 2017, p. 337, tradução nossa).

Ao se fazer uma busca, utilizando os descritores em inglês “research ethics” AND “dissertations” ou os descritores “research ethics” AND “theses”, para qualquer campo, em 25 de julho de 2019, na principal base de dados de resumos de artigos brasileiros – Scientific Electronic Library Online (SciELO), nenhum registro foi encontrado. A busca feita com os mesmos critérios, na base de dados de maior volume e prestígio, acerca de resumos da área de Educação – Education Resources Information Center (ERIC), resultou em sete registros para o primeiro par de expressões e oito para o segundo. Ao se ler o título e/ou o resumo, observou-se que nenhum registro encontrado tratava especificamente de como a ética em pesquisa é reportada nas dissertações ou teses.

Embora o foco da presente pesquisa seja a área de Educação, resolveu-se ampliar a busca para a maior base de dados multidisciplinar de resumos e citações revisada por pares (Scopus). Restringiu-se a consulta, contudo, às expressões “research ethics in dissertations” ou “research ethics in theses”. Foram encontrados nove registros para a primeira expressão e nenhum registro para a segunda. Após a leitura do título e/ou do resumo, identificou-se que apenas a pesquisa de Kjellström, Ross e Fridlund (2010) abordava como a ética em pesquisa era apresentada em teses de Doutorado. Todavia, esse estudo foi baseado em uma amostra de 64 teses de Doutorado da área de Enfermagem, defendidas em universidades da Suécia. Ademais, ele está relacionado à área da Saúde e não à área das CHS. Apesar de realizado em uma área de maior tradição, no debate acerca da ética em pesquisa, comparativamente à Educação, os autores concluíram: “[...] nosso estudo demonstra que a ética em pesquisa é insuficientemente relatada e inadequadamente descrita em muitas teses de Enfermagem”4 (KJELLSTRÖM; ROSS; FRIDLUND, 2010, p. 428, tradução nossa).

Em consulta ao Catálogo de Teses e Dissertações da Capes, no dia 26 de julho de 2019, utilizando o descritor “ética em pesquisa” e o filtro para a área de avaliação “Educação”, foram obtidos 32 registros. Depois da leitura do título e/ou do resumo, selecionou-se apenas a tese de Doutorado de Siquelli (2011). A autora buscou identificar aspectos éticos das pesquisas em Educação, com base na análise de 73 teses e dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), de janeiro de 2009 a dezembro de 2010. Entre suas conclusões, sobressai-se o fato de que 54 teses e dissertações analisadas (74% do total) não foram submetidas ao CEP.

Há, por conseguinte, a necessidade urgente de formação dos pesquisadores em ética na pesquisa, segundo aponta Nunes (2017), seja mediante o oferecimento de disciplinas, palestras ou outras ações formativas acerca do tema, seja por meio de seu orientador de dissertação ou tese. Essa formação deve prover ao pesquisador princípios éticos que, de acordo com a American Psychological AssociationAPA (2012, p. 28), “[...] visam atingir três metas: assegurar a precisão do conhecimento científico; proteger os direitos e o bem-estar dos participantes; e proteger os direitos de propriedade intelectual”.

A investigação realizada por Fisher, Fried e Feldman (2009) nos Estados Unidos, com 968 estudantes ou recém-formados de Programas de Doutorado em Psicologia, mostrou que a percepção deles de estarem preparados para implementar procedimentos éticos em suas pesquisas está associada, entre outros fatores, à conclusão das disciplinas que incluem ética em pesquisa e à orientação da tese.

Ao analisar o conjunto de 876 ementas de disciplinas de 11 Programas de Pós-Graduação em Educação, com notas Capes 4 e 5, da região Nordeste do Brasil, disponíveis em formato digital na Plataforma Sucupira5, Nunes (2016) encontrou que somente uma, de responsabilidade do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Piauí (PPGE/UFPI), trazia o assunto ética em pesquisa. Posteriormente, Nunes (2017) ampliou a pesquisa para todos os 171 Programas de Pós-Graduação em Educação em funcionamento no Brasil, em dezembro de 2016, independentemente da nota que possuíam junto à Capes. Do total de 8.892 disciplinas analisadas, apenas 69 (0,78%) incluíam o tema ética em pesquisa em suas ementas. Essas disciplinas estavam distribuídas por 37 Programas, representando 21,64% do conjunto.

Mesmo que o estudante de Mestrado ou Doutorado tenha cursado disciplinas sobre o tema ética em pesquisa, seu orientador o tenha ajudado a discernir os procedimentos éticos que deveria atender para a realização de sua investigação e seu projeto tenha sido submetido e aprovado por um CEP, não há garantias que ele tenha agido eticamente ao longo da pesquisa nem que tenha registrado adequadamente os procedimentos éticos empregados no texto final da dissertação ou tese.

Concorda-se com Kjellström, Ross e Fridlund (2010) de que é importante a inclusão de uma seção bem escrita sobre ética em pesquisa em dissertações e teses. Dentre as razões enumeradas pelos autores para justificar essa inclusão, destacam-se duas, mais alinhadas às áreas de CHS6: essa seção permitiria comparar os procedimentos éticos efetivados com os previstos quando da aprovação do projeto pelo CEP (caso tenha havido), assim como demonstrar a proficiência do pesquisador no campo da Ética em Pesquisa (MAINARDES; CARVALHO, 2019).

Abordagem e método de pesquisa

Empregou-se nesta investigação o que tem sido denominado na literatura como abordagem mista ou pesquisa com métodos mistos (“mixed methods research”). Segundo Johnson e Onwuegbuzie (2004, p. 17, tradução nossa), nesse tipo de pesquisa o “[…] investigador mistura ou combina técnicas, métodos, abordagens, conceitos ou linguagem de pesquisa quantitativa e qualitativa em um único estudo”7. Ao combinar-se as abordagens qualitativa e quantitativa, oferece-se melhor compreensão de um problema de pesquisa do que se empregasse cada abordagem isoladamente (CRESWELL; CLARK, 2013).

Distintos autores procuram classificar os diferentes tipos de delineamentos de pesquisas com métodos mistos. Tashakkori e Teddlie (2003), por exemplo, enumeraram aproximadamente 40 tipos encontrados na literatura científica. Nesta pesquisa, utilizou-se a classificação realizada por Creswell e Clark (2013), segundo a qual é possível distinguir seis grandes tipos de projetos (delineamentos) de pesquisas com métodos mistos: paralelo convergente, sequencial explanatório, sequencial exploratório, incorporado, transformativo e multifásico. Cada um desses tipos possui variantes. Em função dos objetivos da investigação, elegeu-se o projeto paralelo convergente. Segundo Creswell e Clark (2013, p. 76), esse tipo de projeto “[...] ocorre quando o pesquisador coleta e analisa tanto dados quantitativos quanto qualitativos durante a mesma fase do processo de pesquisa e então funde os dois conjuntos de resultados em uma interpretação geral”.

Dado o problema e os objetivos desta pesquisa, foi necessário recorrer, dentro da referida abordagem mista, ao método da pesquisa documental. Ele possibilita “[...] compreender uma dada realidade não em sua concretização imediata, mas de forma indireta, por meio da análise de documentos produzidos pelo homem a seu respeito” (MENDES; FARIAS; NÓBREGA-THERRIEN, 2011, p. 32).

A seguir, serão detalhadas a delimitação do contexto e as fases da pesquisa, incluindo as técnicas de coleta e a análise dos dados.

Delimitação do contexto

O método da pesquisa documental foi empregado utilizando, como documentos, dissertações e teses da área de Educação, defendidas nos anos de 2013 e 2017, em Programas de Pós-Graduação Acadêmicos8, da região Nordeste, considerados de excelência nacional pela Capes (GARCIA; YASUDA; BENE, 2020). Esses anos representam o ano inicial de dois ciclos avaliativos da Capes, desde quando foi implantada a periodicidade quadrienal (2013-2016 e 2017-2020). Outrossim, eles permitem observar a evolução do tema da ética em pesquisa ao longo desse período. Os resultados desta investigação poderão ser comparados, futuramente, com os obtidos sobre o ano inicial de períodos de avaliações posteriores.

Os Programas de Pós-Graduação de excelência nacional, segundo a Capes, são aqueles avaliados com nota 5 (HORTA; MORAES, 2005). A restrição a esses Programas justifica-se por duas razões. A primeira foi a necessidade de estabelecer um critério que possibilitasse tornar exequível a pesquisa no tempo disponível de 12 meses. Somente para ilustrar o tamanho do desafio, apenas no ano de 2013 foram titulados na região Nordeste, na área de Educação, 468 pessoas em cursos de Mestrado Acadêmico, 56 em Mestrado Profissional e 153 em Doutorado Acadêmico, totalizando, portanto, 677 dissertações e teses9. É inviável trabalhar, dado o tempo disponível, com essa quantidade, acrescida dos valores de mais um ano (2017), que tende a ser superior àquele. Por outro lado, no Nordeste, o percentual de Programas com nota 5, no quadriênio 2013-2016, é de aproximadamente 22% do total de 32 Programas da área de Educação existentes na época (CAPES, 2017), o que incidiu na diminuição do número de dissertações e teses utilizadas na pesquisa.

A outra razão está assentada no resultado da avaliação promovida pela Capes que, a princípio, atribui maiores notas a Programas que desenvolvem processos formativos melhores, com base nos indicadores estabelecidos. Supõe-se que isso também se reflete na preparação dos estudantes para adotarem procedimentos éticos em suas pesquisas assim como para saberem relatá-los em suas dissertações e teses.

Fases da pesquisa

✓ Fase 1 – coleta de dados quantitativos e qualitativos

Nessa fase, foi realizado, inicialmente, o levantamento na Plataforma Sucupira dos Programas de Pós-Graduação em Educação (Acadêmicos) com nota 5, na região Nordeste, que titularam nos anos de 2013 e 2017.

Identificados os Programas que atendiam aos critérios estabelecidos, foram obtidos arquivos no formato XLSX de discentes e de dissertações e teses defendidas nos anos 2013 e 2017, no site de dados abertos10, disponibilizados pela Capes. Isso possibilitou o acesso aos dados quantitativos dos Programas, incluindo anos, graus acadêmicos oferecidos (Mestrado ou Doutorado), sexo dos autores, entre outros. Esses dados foram organizados por meio do software de planilha eletrônica LibreOffice Calc, no formato XLSX.

Para a coleta dos dados qualitativos, na forma das dissertações e das teses defendidas, em formato PDF ou DOC/DOCX (quando não estava em PDF), foi realizado o acesso ao link constante nos arquivos obtidos para a página do texto no Catálogo de Dissertações e Teses ou se fez a consulta ao site do respectivo Programa. Posteriormente, os textos que estavam em formato DOC/DOCX foram transformados em PDF, a fim de padronizar seu manuseio no processo de análise. Esses arquivos foram organizados em pastas classificadas por ano, programa e curso (Mestrado ou Doutorado), totalizando 2,25 gigabytes de dados.

✓Fase 2 – análise e interpretação de dados quantitativos e qualitativos

Empregaram-se, neste momento, softwares especializados para auxiliar na análise dos dados. Os dados quantitativos, em formato XLSX, foram inseridos no software Stata 14 (FÁVERO et al., 2014) assim como foram utilizadas as ferramentas de elaboração de gráficos do LibreOffice Calc. Frequências e estatísticas descritivas (média, mediana, moda, desvio padrão etc.) foram calculadas, o que permitiu visualizar essas relações (AGRESTI; FINLAY, 2012). A partir disso, tabelas e gráficos foram gerados.

Na análise dos dados qualitativos, recorreu-se à análise de conteúdo (FRANCO, 2005; KRIPPENDORFF, 1990), de modo a extrair aspectos relacionados à ética em pesquisa – prioritariamente acerca da aprovação por CEP e uso de TCLE –, presentes nas dissertações e nas teses. Essa análise foi realizada com o apoio do software NVivo 11 Pro for Windows (CERVANTES et al., 2016; QSR INTERNATIONAL, 2017).

Em função do número de dissertações e teses e da impossibilidade de fazer-se leitura integral dos escritos, foi preciso utilizar o recurso de consulta do NVivo, denominado “Pesquisa de Texto”, que permite buscar palavras ou frases nos materiais importados para o software. Em seguida, o resultado dessa consulta era salvo como um nó (categoria) (QSR INTERNATIONAL, 2017). Essas categorias foram, em seguida, revisadas, o que possibilitou a geração de novas: junção, separação, supressão e constituição de relação entre categorias e subcategorias. Integrou-se, ao final, a análise dos dados quantitativos e qualitativos, formando uma interpretação geral do tema estudado, “[...] mediante comparação direta, inter-relação e análise adicional” (CRESWELL; CLARK, 2013, p. 83).

Procedimentos éticos

Apesar das críticas existentes à Resolução CNS Nº 510, de 7 de abril de 2016 (BRASIL, 2016), ela traz a dispensa de registro desta pesquisa no Sistema CEP/Conep, em função de utilizar informações de acesso público, nos termos da Lei Nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (BRASIL, 2011).

Os dados obtidos foram analisados de modo agregado e foi garantido o seu armazenamento seguro. Ademais, tomaram-se medidas para assegurar o anonimato das pessoas tituladas, quando do tratamento das informações, a fim de preservar-lhes a identidade. Para manter a confidencialidade das dissertações e das teses, atribuíram-se códigos a cada um desses textos (BROOKS; RIELE; MAGUIRE, 2017).

Análise dos dados

✓Programas, titulados e textos obtidos

Na região Nordeste, pela avaliação quadrienal de 2017 da Capes, referente ao período de 2013 a 2016, sete dos 3211 Programas de Pós-Graduação na área de Educação foram considerados de excelência nacional, pois receberam a nota 5. Como a avaliação dessa agência, referente ao período 2017-2020, somente deverá ser divulgada em 2021, esses Programas foram considerados como de excelência nacional para a realização desta pesquisa. Informações básicas, acerca dos Programas de Pós-Graduação, podem ser observadas no Quadro 1 a seguir.

Quadro 1 Programas de Pós-Graduação na área de Educação da região Nordeste, com nota 5, em 2020 

Nome do Programa Sigla do Programa Nome da IES Sigla da IES Status Jurídico Estado da IES
Programa de Pós-Graduação em Educação PPGEd Fundação Universidade Federal do Piauí FUFPI* Federal Piauí
Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE Universidade Estadual do Ceará UECE Estadual Ceará
Programa de Pós-Graduação em Educação PPGEd Universidade Federal do Rio Grande do Norte UFRN Federal Rio Grande do Norte
Programa de Pós-Graduação em Educação PPGEdu Universidade Federal de Pernambuco UFPE Federal Pernambuco
Programa de Pós-Graduação em Educação PPED Universidade Tiradentes – Sergipe UNIT-SE Privada Sergipe
Programa de Pós-Graduação em Educação PPGE Universidade Federal da Bahia UFBA Federal Bahia
Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade PPGEduC Universidade do Estado da Bahia UNEB Estadual Bahia

Fonte: Elaborado pelo autor.

Nota: *Manteve-se a sigla utilizada nos dados disponíveis na Capes.

Dos sete Programas listados, seis são ofertados em universidades públicas. Desse grupo de Programas de Instituições de Ensino Superior (IES) públicas, um terço está situado em universidades estaduais e o restante (dois terços) em universidades federais. Dos nove estados que formam a região Nordeste, dois terços (seis) possuem Programas de excelência nacional na área de Educação, sendo a Bahia o único estado com dois desses Programas (PPGE/UFBA e PPGEduC/UNEB). Todos os Programas são Acadêmicos.

Com base no levantamento realizado nos dados abertos, disponibilizados pela Capes12 e extraídos da Plataforma Sucupira, referentes aos anos de 2013 e 2017, foi possível identificar o número de mestres e doutores titulados em cada ano assim como obter os respectivos textos das dissertações e das teses defendidas, seja mediante acesso ao link para a página do texto no Catálogo de Dissertações e Teses, seja por meio de consulta ao site do respectivo Programa, conforme disposto na Tabela 1 a seguir.

Tabela 1 – Número de titulados e de textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, em 2013 e 2017 

Programas 2013 2017 Total
Mestrado Doutorado Total Mestrado Doutorado Total
Titulado Texto Obtido Titulado Texto Obtido Titulado Texto Obtido Titulado Texto Obtido Titulado Texto Obtido Titulado Texto Obtido Titulado Texto Obtido Percentual
PPGEd/FUFPI 43 42 - - 43 42 16 16 25 25 41 41 84 83 98,81
PPGE/UECE 24 24 - - 24 24 29 29 12 12 41 41 65 65 100,00
PPGEd/UFRN 15 15 23 23 38 38 37 36 21 19 58 55 96 93 96,88
PPGEdu/UFPE 53 49 8 7 61 56 50 49 29 29 79 78 140 134 95,71
PPED/UNIT-SE 21 21 - - 21 21 16 16 4 4 20 20 41 41 100,00
PPGE/UFBA 39 37 45 42 84 79 24 24 31 29 55 53 139 132 94,96
PPGEduC/UNEB 42 41 15 15 57 56 35 33 22 20 57 53 114 109 95,61
Total 237 229 91 87 328 316 207 203 144 138 351 341 679 657 96,76

Fonte: Elaborada pelo autor.

Em 2013, três Programas ainda não tinham titulados de Doutorado (PPGEd/FUFPI, PPGE/UECE e PPED/UNIT-SE). Os dois Programas com maior número de titulados, somando os anos de 2013 e 2017, são o PPGEdu/UFPE (140) e o PPGE/UFBA (139). O de menor número de titulados, por outro lado, é o PPED/UNIT-SE (41).

Os Programas de Pós-Graduação selecionados para esta pesquisa formaram, em 2013 e 2017, o total de 679 pessoas13, sendo 444 (65,39%) em cursos de Mestrado e 235 (34,61%) em cursos de Doutorado. Não se conseguiu, contudo, ter acesso a todas as dissertações e as teses defendidas nesse período, alcançando a quantidade de 657 produções, o que representa 96,76% do total. Esses textos obtidos estão constituídos por 432 (65,75%) dissertações e 225 (34,25%) teses, defendidas nos anos de 2013 (316 ou 48,10%) e 2017 (341 ou 51,90%). Somente dois Programas possuem todas as dissertações e as teses de seus titulados de 2013 e 2017 disponíveis para acesso (PPGE/UECE e PPED/UNIT-SE).

Dentre as situações encontradas que impediram a inclusão de 22 produções, no conjunto de textos analisados, o que gerou essa diferença entre número de titulados e de dissertações e teses, é possível citar: falta de autorização de divulgação do trabalho; existência apenas do resumo; texto incompleto, com somente algumas partes; projeto de pesquisa em vez do texto final; e texto informando que o trabalho está em fase de revisão e será disponibilizado “em breve”.

Em função dessa diferença de 22 produções, não se obteve a totalidade das dissertações e das teses dos Programas selecionados nos anos 2013 e 2017. O impacto no resultado final, todavia, foi muito pequeno. Considerando o intervalo de confiança de 95%, a proporção populacional de 0,5, o tamanho da população de 679 e o da amostra obtida de 657, a margem de erro alcançada foi de apenas 0,00689 ou 0,69%. Trata-se, por conseguinte, de uma amostra com alta representatividade da população da qual foi extraída.

De 2013 para 2017, observa-se decréscimo na média de titulados em cursos de Mestrado nesses Programas, caindo de 33,86 para 29,57; assim sendo, há diminuição na média de titulados de 12,67%. Movimento contrário acontece com os titulados em cursos de Doutorado, cuja média aumenta de 13 para 20,57, indicando acréscimo de 58,23% em relação à média de 2013. Somando-se os titulados de Mestrado e Doutorado, há crescimento na média de titulados, passando de 46,86 em 2013 para 50,14; dito de outra forma, acontece ampliação na média geral de titulados de 7% em relação a 2013, especificamente em função da expansão nos cursos de Doutorado nos Programas selecionados. Isso está expresso na Tabela 2 a seguir.

Tabela 2 – Estatísticas descritivas do número de titulados e de textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, em 2013 e 2017 

Variável Média Desvio Padrão Mínimo Máximo
M_Tit_2013 33,86 13,91 15 53
M_TO_2013 32,71 12,68 15 49
D_Tit_2013 13,00 16,63 - 45
D_TO_2013 12,43 15,74 - 42
Tot_Tit_2013 46,86 22,24 21 84
Tot_TO_2013 45,14 20,30 21 79
M_Tit_2017 29,57 12,26 16 50
M_TO_2017 29,00 11,75 16 49
D_Tit_2017 20,57 9,57 4 31
D_TO_2017 19,71 9,20 4 29
Tot_Tit_2017 50,14 18,44 20 79
Tot_TO_2017 48,71 17,69 20 78
TOT_Tit 97,00 37,04 41 140
TOT_TO 93,86 34,26 41 134

Fonte: Elaborada pelo autor.

Nota: M – Mestrado; D – Doutorado; Tit – Titulado; TO – Texto Obtido, Tot – Total; TOT – Total (Geral).

Tomando por base os dados obtidos da Capes em relação aos titulados, cujos textos compõem a amostra selecionada, pode-se afirmar que, também nesses Programas de Pós-Graduação da área de Educação, a presença feminina é majoritariamente superior à masculina, o que reforça resultados obtidos em outras pesquisas (DURÃES, 2012; PRÁ; CEGATTI, 2016). Dentre os 657 titulados integrantes da amostra, cujas defesas de dissertação e tese aconteceram nos anos de 2013 e 2017, há 479 (72,91%) pessoas do sexo feminino e somente 178 (27,09%) do sexo masculino. A distribuição por sexo entre as IES pode ser visualizada na Tabela 3.

Tabela 3 –Titulados da amostra de textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, por sexo, em 2013 e 2017 

IES Sexo Total
Feminino Masculino
FUFPI 68 15 83
10,35% 2,28% 12,63%
UECE 46 19 65
7,00% 2,89% 9,89%
UFBA 100 32 132
15,22% 4,87% 20,09%
UFPE 98 36 134
14,92% 5,48% 20,40%
UFRN 66 27 93
10,05% 4,11% 14,16%
UNEB 73 36 109
11,11% 5,48% 16,59
UNIT-SE 28 13 41
4,26% 1,98% 6,24%
Total 479 178 657
72,91% 27,09% 100,00%

Fonte: Elaborada pelo autor.

Da mesma forma, como ocorreu na população desta pesquisa, os dois Programas com maior número de dissertações e teses obtidas, somando os anos de 2013 e 2017, são o PPGEdu/UFPE (134) e PPGE/UFBA (132). O de menor número de textos coletados continua sendo o PPED/UNIT-SE (41), conforme se pode visualizar no Gráfico 1 a seguir.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Gráfico 1 –Número de textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, em 2013 e 2017 

✓Aspectos da ética em pesquisa presentes nos textos

No Brasil, estão em vigor duas resoluções do CNS que, ao seguirem um modelo biomédico, buscam regulamentar as pesquisas envolvendo seres humanos, inclusive em Ciências Humanas e Sociais: Resolução CNS Nº 466, de 12 de dezembro de 2012 (BRASIL, 2013) e Resolução CNS Nº 510/2016 (BRASIL, 2016). Independentemente de submeter-se a essas normas do CNS, todo pesquisador precisa ter comportamento ético antes, durante e depois da realização de suas investigações (BROOKS; RIELE; MAGUIRE, 2017; NUNES, 2017).

Defende-se, em consonância com Mainardes e Carvalho (2019), que os relatórios de pesquisa, incluindo dissertações e teses, reservem espaço para explicitar quais cuidados éticos foram tomados durante a investigação, mesmo que não tenha havido submissão ao Sistema CEP/Conep, seja por estar dispensado em função da natureza da pesquisa – ver exemplos de casos em Menezes, Lima e Nunes (2020) –, seja por não reconhecer a legalidade e a legitimidade do referido Sistema e, portanto, não aceitar submeter-se a ele. É possível ver argumentos contra a legalidade da Resolução CNS Nº 466/2012 (BRASIL, 2013) e da Resolução CNS Nº 510/2016 (BRASIL, 2016) para as CHS em Nunes (2019).

Apesar das críticas realizadas pelas áreas de CHS ao Sistema CEP/Conep (CARVALHO; MACHADO, 2014; DE LA FARE; SAVI NETO, 2019; GUERRIERO; BOSI, 2015), a análise das dissertações e das teses dos Programas de Pós-Graduação em Educação da região Nordeste, com nota 5, revelaram que 151 pesquisas de Mestrado ou Doutorado foram submetidas a um CEP14. Logo, somente 22,98% das dissertações e das teses incluídas na pesquisa tiveram seus projetos aprovados em um CEP. Embora várias pesquisas na área de Educação utilizem-se de métodos que não envolvem seres humanos, na condição de participantes da investigação, como a pesquisa bibliográfica, esse percentual revela a baixa preocupação de mestrandos e doutorandos com a submissão de seus projetos a um sistema de avaliação ética.

Com os instrumentos formatados e com o projeto de pesquisa cadastrado e autorizado pelo Comitê de Ética em Pesquisa [...], “mergulhou-se” no campo em busca de elementos que pudessem subsidiar a análise. (3A1_1515, p. 76).

Após conseguir o consentimento das instituições, o projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa [...]. (7B1_12, p. 58).

Vale ressaltar que, ainda como parte da montagem do processo de submissão do projeto de tese ao Comitê de Ética na pesquisa, a pesquisadora solicitou autorização do reitor da IES para concretizar a pesquisa. (7F2_05, p. 96).

Esse percentual não está distribuído de forma proporcional entre anos, Programas de Pós-Graduação, graus acadêmicos e sexo dos titulados. Conforme se pode observar no Gráfico 2, o Programa da FUFPI, apesar de responder por apenas 12,63% (83) das dissertações e das teses da amostra, responde por 39,07% (59) do total de projetos submetidos a CEP. Essa quantidade representa 8,98% do total de dissertações e teses obtidas dos anos de 2013 e 2017. O resultado encontrado pode estar associado ao achado da pesquisa de Nunes (2016). O autor, ao estudar as ementas das disciplinas de 11 Programas de Pós-Graduação em Educação, da região Nordeste, que ofereciam Mestrado e Doutorado em 2015, identificou que, de um total de 876 disciplinas registradas na Plataforma Sucupira, o tema da ética em pesquisa somente apareceu na disciplina “Epistemologia, Categorias e Análise de Dados na Pesquisa em Educação I”, ofertada pelo PPGEd/FUFPI.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Gráfico 2 –Textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, submetidos ao CEP, em relação ao ano de defesa (2013 e 2017), grau acadêmico e sexo do autor 

No geral, houve crescimento de 43,55% nas submissões de projetos ao CEP dentre as dissertações e as teses estudadas, passando de 62 em 2013 para 89 em 2017. Assim, esse crescimento acompanhou a ampliação do debate acerca do tema da ética em pesquisa na área de Educação, inclusive com a instituição da Comissão de Ética em Pesquisa da ANPEd (2015). Dois Programas (PPGEd/FUFPI e PPGE/UFBA), todavia, foram na contramão dessa tendência, ao mostrarem decréscimo nessa submissão de 2013 para 2017. Tal situação merece estudo posterior mais detalhado do que aconteceu com eles, particularmente a FUFPI, destaque em relação às demais instituições no tocante à submissão para o CEP. Isso pode ser observado no Gráfico 2 que segue.

Observa-se irrisória diferença nos percentuais dos textos de pesquisas de Mestrado (66,23% ou 100) e Doutorado (33,77% ou 51) submetidas ao CEP, quando comparados aos percentuais de textos obtidos de dissertações (65,75%) e teses (34,25%). Ao debruçar-se sobre os Programas, é possível visualizar que dois divergiram dessa maior submissão por parte de pesquisas de Mestrado. No PPGEdu/UFPE e no PPGE/UFBA, a maior submissão aconteceu nos projetos de Doutorado, embora com diferença de apenas um projeto em cada Programa.

Dada a maior presença das mulheres como autoras das dissertações e das teses, as quais são objeto desta pesquisa, essa situação também se refletiu nos textos que foram submetidos ao CEP. O percentual de 78,81% (119) desses trabalhos é de pessoas do sexo feminino e 21,19% (32) é de autores do sexo masculino. Embora somente 22,98% das dissertações e das teses incluídas na amostra fazerem referência à aprovação em CEP, 290 (44,14% do total) dissertações e teses utilizaram documentos para obter algum tipo de permissão junto aos participantes das pesquisas. Essa quantidade, contudo, não atingiu nem a metade das produções coletadas. Há textos nos quais se fez uso de mais de um tipo de documento na investigação. Como se pode observar no Gráfico 3, esses documentos foram classificados em oito categorias distintas:

Fonte: Elaborado pelo autor.

Gráfico 3 –Textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, em 2013 e 2017, por documentos para obter permissão aos participantes das pesquisas 

  • Carta de Cessão – Compreende a cessão de direitos autorais de uso de entrevista gravada e transcrita.

  • Declaração de Pesquisador – Declaração assinada pelo orientador e orientando, dirigida ao CEP, comprometendo-se com as normas do Sistema CEP/Conep.

  • Declarações Diversas – Constituídas por declarações que não pertencem às outras categorias de documentos.

  • Termo de Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (ver discussão neste artigo).

  • Termo (ou carta) de Anuência – Autorização institucional dada por pessoa responsável para permitir o ingresso do pesquisador na instituição e a coleta de dados junto aos sujeitos de pesquisa. No caso de uma pesquisa com indígena e outra com uma comunidade de capoeira, também foi usado esse instrumento com o coletivo investigado.

  • Termo de Assentimento (ver discussão neste artigo).

  • Termo de Compromisso – Envolve o compromisso assumido pelo pesquisador com a utilização de dados, sigilo e privacidade. Também aparece como Termo de Compromisso e Responsabilidade ou Termo de Compromisso e Confidencialidade.

  • Termo de Confidencialidade – Compreende o compromisso do pesquisador prioritariamente com a preservação da privacidade dos participantes da pesquisa.

Do conjunto de 151 dissertações e teses que fizeram referência a um CEP, 133 (88,08%) registraram o uso de algum desses documentos. Somente em dois desses textos acadêmicos não se empregou o TCLE: no texto 7D2_16, foi utilizada uma “Carta de Cessão”; já no texto 7D2_17, empregou-se documento denominado “Termo de Compromisso e Confidencialidade” e uma “Carta de Anuência”. A Resolução CNS Nº 510/2016 avançou em relação à exigência, constante em normas anteriores do CNS, de um TCLE que precisava ser assinado pelo participante da pesquisa ou por seu representante legal assim como pelo pesquisador responsável ou pela pessoa por ele indicada. A Resolução CNS Nº 466/2012 (BRASIL, 2013) especifica que o TCLE é um

[...] documento no qual é explicitado o consentimento livre e esclarecido do participante e/ou de seu responsável legal, de forma escrita, devendo conter todas as informações necessárias, em linguagem clara e objetiva, de fácil entendimento, para o mais completo esclarecimento sobre a pesquisa a qual se propõe participar. (BRASIL, 2013, p. 60).

Para as pesquisas em CHS, segundo a Resolução CNS Nº 510/2016, é necessário haver o Registro de Consentimento Livre e Esclarecido. Ele pode ser na “[...] forma escrita, sonora, imagética, ou em outras formas que atendam às características da pesquisa e dos participantes, devendo conter informações em linguagem clara e de fácil entendimento para o suficiente esclarecimento sobre a pesquisa” (BRASIL, 2016, p. 45). Nesta pesquisa, não fez parte da análise verificar se o TCLE, assim como os demais documentos citados anteriormente, possuía “linguagem clara e de fácil entendimento”, como tem sido objeto de outros estudos (MIRANDA et al., 2009; SOUZA et al., 2013). Centrou-se em observar se ele foi utilizado nas pesquisas da área de Educação.

O Gráfico 3, a seguir, mostra que, apesar de não submeterem suas investigações ao CEP, vários pesquisadores preocupam-se em fazer o registro do consentimento dos participantes de suas pesquisas, por meio de algum tipo de documento. Sobressai-se entre eles o TCLE, empregado em 279 dissertações e teses componentes da amostra, o que representa percentual de 42,47% do total de textos obtidos.

Na continuidade das atividades, apresentamos às professoras o Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE), fazendo uma leitura para esclarecimento acerca de seu conteúdo. Destacamos pontos importantes como o fato de não haver nenhuma obrigatoriedade e nenhum prejuízo, mesmo havendo desistência na participação. (7A2_08, p. 120).

Esclarecemos que não houve participante que tenha se recusado a assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), cujos documentos, devidamente assinados e arquivados, encontram-se sob nossa guarda e posse. (3C2_10, p. 20).

Durante a coleta dos dados e ao iniciar a análise, optamos pela não utilização dos nomes das interlocutoras envolvidas na pesquisa, conforme havíamos informado às mesmas no momento da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido [...]. (3G1_22, p. 65).

A segunda categoria que mais se destaca é a de Termo de Confidencialidade, utilizado em 33 textos (5,02% do total de produções obtidas), havendo em 32 deles referência ao CEP. Há, portanto, grande diferença (246 textos) na quantidade de dissertações e teses que fizeram uso de TCLE (279) se comparada a essa categoria, mesmo se alguns desses textos tenham ambos os documentos.

Alguns documentos, agrupados na categoria “Termo de Compromisso”, representam o conjunto com o menor número (dez) de dissertações e teses em que aparecem, o que compreende 1,52% do total de textos analisados, sendo sete desses submetidos ao CEP. Já a categoria de documentos denominada “Declarações diversas” compreende a segunda menor citação entre as dissertações e as teses analisadas, com apenas 11 ocorrências (1,67% do total de textos obtidos) e apenas cinco em que há utilização de CEP. Ela está formada por declarações que não pertencem às outras categorias de documentos, como: declaração institucional (um16), de consentimento (um), de sigilo (um), de concordância (cinco), de permissão (um), de compromisso (um) e para realização da pesquisa (um).

De modo similar ao TCLE, a Resolução CNS Nº 510/2016 também representou avanços nas áreas de CHS para o Termo de Assentimento, flexibilizando a forma de seu registro (BRASIL, 2016). Ele é, juntamente à “Carta de Cessão”, a categoria com a terceira menor frequência, com 12 registros (1,83% do total de produções analisadas). Segundo a Resolução CNS Nº 466/2012 (BRASIL, 2013), o Termo de Assentimento é um

[...] documento elaborado em linguagem acessível para os menores ou para os legalmente incapazes, por meio do qual, após os participantes da pesquisa serem devidamente esclarecidos, explicitarão sua anuência em participar da pesquisa, sem prejuízo do consentimento de seus responsáveis legais. (BRASIL, 2013, p. 60).

Em função da maior presença do TCLE comparativamente a outros tipos de documentos, que buscam o consentimento ou a anuência dos participantes das pesquisas, analisou-se sua distribuição em relação a anos, Programas de Pós-Graduação, graus acadêmicos e sexo dos titulados. De 2013 para 2017, o número de dissertações e teses pertencentes à amostra deste estudo, que fez uso de TCLE, cresceu quase 50% (precisamente 46,90%), saltando de 113 para 166 textos. Essa ampliação coincide com o aumento do debate acerca do tema da ética em pesquisa na área de Educação, inclusive com a criação da Comissão de Ética em Pesquisa da ANPEd (2015), conforme explicitado anteriormente. Somente dois Programas de Pós-Graduação (PPGEd/FUFPI e PPGE/UFBA) não acompanharam essa tendência, de forma similar ao que aconteceu em relação ao envio do projeto para um CEP. Essa situação pode ser observada no Gráfico 4 a seguir.

Fonte: Elaborado pelo autor.

Gráfico 4 –Textos obtidos de dissertações e teses em Programas de Pós-Graduação da área de Educação, na região Nordeste, com nota 5, que utilizaram TCLE, em relação ao ano de defesa (2013 e 2017), grau acadêmico e sexo do autor 

Em relação ao grau acadêmico, há mais dissertações do que teses entre as analisadas que utilizaram TCLE, na razão de 1,7353:1; assim sendo, o número de dissertações nessa situação (177) é 73,53% superior ao de teses (102). Ao olhar para os Programas, observa-se que apenas o PPGE/UFBA não tem esse cenário. Nesse Programa de Pós-Graduação, o número de teses que empregou TCLE (27) é superior ao de dissertações (19), na razão de 1,4211:1.

Quanto ao sexo dos autores dos textos que adotaram o TCLE, mantém-se a maior quantidade de pessoas do sexo feminino (223) em relação às do sexo masculino (56), perfazendo quase quatro vezes esse número (precisamente 3,98 vezes), o que é esperado considerando a distribuição da variável sexo no conjunto das dissertações e das teses que fazem parte da amostra.

Conclusões

A investigação realizada permitiu responder aos objetivos específicos estabelecidos e, por conseguinte, o objetivo geral. O primeiro objetivo específico foi identificar as dissertações e as teses da área de Educação, defendidas nos anos de 2013 e 2017, em Programas de Pós-Graduação da região Nordeste considerados de excelência nacional pela Capes. Verificou-se a existência de sete Programas que atendem a esse critério: PPGEd/FUFPI, PPGE/UECE, PPGEd/UFRN, PPGEdu/UFPE, PPED/UNIT-SE, PPGE/UFBA e PPGEduC/UNEB. Nos anos de 2013 e 2017, foram titulados 679 mestres e doutores nesses Programas de Pós-Graduação. Conseguiu-se o acesso a 657 (96,76%) dessas dissertações e teses.

O segundo objetivo específico foi conhecer quais aspectos relacionados à ética em pesquisa (com destaque para aprovação por CEP e uso de TCLE) estão presentes nessas dissertações e teses. Constatou-se que somente 151 (22,98%) pesquisas de Mestrado ou Doutorado foram aprovadas por CEP. Por outro lado, 279 (42,47%) dissertações e teses fazem referência ao uso de TCLE, das quais 131 também explicitam que os projetos de pesquisa foram submetidos ao CEP. Outros documentos, além do TCLE, embora em menor proporção, também foram usados nas investigações analisadas.

O último objetivo foi analisar o relato da utilização da ética em pesquisa nessas dissertações e teses, tomando por base diferenças entre anos, programas, graus acadêmicos (Mestrado ou Doutorado) e sexo dos autores. Ao longo da seção de análise foi possível discutir essas diferenças que, de forma resumida, são constituídas: pela tendência de crescimento no número de dissertações e teses cujos projetos de pesquisa foram aprovados em CEP e que fazem uso de TCLE, de 2013 para 2017; pelo maior destaque do PPGEd/FUFPI em relação à quantidade de textos cujos projetos foram submetidos a CEP e que utilizam TCLE, comparado aos demais; e pela maior proporção de dissertações e de autoras do sexo feminino entre as pesquisas que apresentaram registro junto a CEP e emprego de TCLE.

Há ciência de que o registro dos procedimentos éticos em pesquisa em dissertações e teses na área de Educação, especificamente em Programas de Pós-Graduação da região Nordeste, de excelência nacional, não se esgota nos aspectos analisados. Temas como conhecimento da legislação que fundamenta o Sistema CEP/Conep, privacidade, sigilo, descrição de procedimentos e cuidados éticos integrada a texto ou a capítulo de metodologia ou em seção específica, integridade científica, entre outros, poderiam ser explorados. Espera-se, contudo, dar continuidade a esta pesquisa, ampliando sua abrangência em relação à quantidade de dissertações e teses, regiões geográficas e temas.

*Este trabalho foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

1German Educational Research Association (GERA).

2No original: “Studies that address how ethics is presented in theses or dissertations are few” (HOLBROOK et al., 2017, p. 324).

3No original: “The results from this study suggest that research ethics makes little impression in examination proceedings and is more a footnote than a footprint” (HOLBROOK et al., 2017, p. 337).

4No original: “Our study demonstrates that research ethics are insufficiently reported and inadequately described in many nursing [PhD] dissertations” (KJELLSTRÖM; ROSS; FRIDLUND, 2010, p. 428).

5Ferramenta online para coletar informações dos Programas de Pós-Graduação do Brasil, realizar análises e avaliações e disponibilizar informações sobre o Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG).

6O artigo de Kjellström, Ross e Fridlund (2010) está relacionado à área da Enfermagem.

7No original: “[...] researcher mixes or combines quantitative and qualitative research techniques, methods, approaches, concepts or language into a single study” (JOHNSON; ONWUEGBUZIE, 2004, p. 17).

8Na última avaliação da Capes, referente ao período de 2013 a 2016, nenhum Programa Profissional da região Nordeste alcançou a nota 5 ou superior.

9Dados obtidos por meio do sistema Geocapes, da Capes.

10Disponível em: https://dadosabertos.capes.gov.br/. Acesso em: 19 abr. 2020.

11Dos 32 Programas, 20 são Acadêmicos e 12 são Profissionais.

12Disponível em: https://dadosabertos.capes.gov.br/. Acesso em: 19 abr. 2020.

13Para ser mais preciso, é necessário esclarecer que uma mesma pessoa pode ser contada duas vezes, desde que tenha defendido o Mestrado em 2013 e o Doutorado em 2017 em um mesmo Programa de Pós-Graduação ou em diferentes Programas desse grupo selecionado.

14Quatro dissertações e teses preferiram denominar de “Conselho de Ética”, mas foram incluídas nesse total, pois se referiam a um CEP.

15Cada dissertação ou tese recebeu um código específico para preservar o anonimato dos autores.

16Refere-se à quantidade de textos em que aparece esse documento.

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Recebido: 17 de Janeiro de 2021; Revisado: 15 de Junho de 2021; Aceito: 20 de Junho de 2021; Publicado: 06 de Julho de 2021

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