Introdução
O mundo pós-revolução técnico-científico-informacional, em constante transformação, tem gerado demandas cada vez mais urgentes, complexas e globalizadas (Santos, 2018), exigindo dos pesquisadores o desenvolvimento de saberes que possibilitem a realização de pesquisas que correspondam a essas demandas (Nóbrega, 2018; Sánchez-Lima; Labarrere-Sarduy, 2015). No Brasil, os programas de Pós-Graduação Stricto Sensu (PGSS) tem como uma de suas finalidades a formação de pesquisadores para a docência, para a pesquisa e para a produção de ciência, inovação e tecnologia (Costa; Sousa; Silva, 2014), visando a produção e o aprofundamento do conhecimento, além do desenvolvimento do país (Brasil, 1975).
Embora algumas pesquisas apontem que a PGSS tenha surgido a partir da criação do doutorado em Direito na Universidade de Minas Gerais (futura Universidade Federal de Minas -UFMG), em 1930, ou ainda da fundação da Universidade de Brasília (UnB), em 1961(Cury, 2020), adota-se, nesta pesquisa, o marco da institucionalização e da regulamentação da PGSS no Brasil, no ano de 1965, a partir do lançamento do Parecer no 977, de 3 de dezembro de 1965 (Brasil, 1965).
A PGSS, no Brasil, desde sua fundação, apresentou evolução em termos quantitativos em relação aos programas e às matrículas e, de igual maneira, evoluções qualitativas decorrentes de sua expansão e necessidade de consolidação na formação para o desenvolvimento de ciência e de tecnologia. A expansão numérica de cursos stricto sensu em instituições públicas e privadas ocorreu, sobretudo, a partir dos anos 2000 (Nóbrega, 2018). Esse aumento quantitativo da formação de mestres e doutores necessita vir acompanhado de uma avaliação cuidadosa da qualidade do processo formativo (Costa; Sousa; Silva, 2014).
No Brasil, a avaliação da PGSS é realizada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), com o objetivo de mensurar a qualidade da pós-graduação brasileira e identificar as assimetrias regionais, bem como de áreas estratégicas do conhecimento no Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG). A Capes avalia os programas levando em consideração os seguintes quesitos: I - Proposta do Programa; II - Corpo Docente; III - Corpo Discente; IV - Produção Intelectual; e V - Inserção Social.
O êxito do percurso formativo do orientando também está associado ao desenvolvimento de pesquisas de qualidade (Lopes; Costa, 2012; Teixeira; Marqueze; Moreno, 2020; Turpo-Gebera et al., 2021), à publicação em periódicos qualificados (Leite Filho; Martins, 2006; Lopes; Costa, 2012), ao cumprimento dos prazos (Mainardes; Stremel, 2019; Riolfi; Andrade, 2009) e à conclusão do Mestrado ou Doutorado (Manyike, 2017).
O campo da formação de pesquisadores na PGSS em Educação, objeto desta pesquisa, aparece no cenário da Educação Superior como um universo complexo. No centro desse processo, estão os orientadores e os pesquisadores em formação. O pesquisador pode ser definido como um acadêmico ou trabalhador do conhecimento científico que tem como núcleo de seu trabalho a produção de conhecimento, de acordo com requisitos científicos, direcionado à docência e ao diálogo com os pares e com outros agentes, no intuito de desenvolver e divulgar conhecimento (Maria-Gorostiaga, 2017).
No processo formativo, os pesquisadores em formação são orientados por um pesquisador experiente, denominado de orientador, e este tem a missão de conduzi-los para o desenvolvimento dos saberes necessários para a sua atuação futura como pesquisador e docente, no campo específico de sua pesquisa (Falaster; Ferreira; Gouvea, 2017; Nóbrega, 2018; Ramírez-Armenta; García-López; Edel-Navarro, 2021).
Esse processo é basilar na formação de pesquisadores, sendo definido como uma relação pedagógica que se estabelece entre orientando e orientador. Trata-se de uma relação que, apesar de resguardar características gerais de acompanhamento e orientação, por ser dinâmica e envolver pessoas, cada uma com suas subjetividades, também se estabelece em níveis diferenciados entre o orientador e o orientado, pois ambos possuem características pessoais e profissionais diferenciadas (Viana; Veiga, 2010).
Compreende-se a necessidade de definição do orientador, contudo, também em sua constituição ontológica. A reflexão sobre esse SER formador aparece escassa, tendo em vista que as pesquisas que abordam a temática o definem a partir de seu serviço e de sua atuação, mas sem alicerçar ontologicamente o orientador de pesquisadores.
Saviani (2000, 2012) e Severino (2012) refletem que o orientador está intimamente atrelado ao ser docente que, nesse caso, cumpre sua função na PGSS. Alinhada a essa proposição, Barnes e Austin (2009) o definem como um membro do corpo docente encarregado de acompanhar o doutorando em sua formação. Apregoa-se ainda que orientador de pós-graduação se refere a um membro do corpo docente que o aluno de pós-graduação consideraria no papel principal e formal de orientador acadêmico, coordenador de dissertação ou supervisor de pesquisa (Marijanovic et al., 2021).
O orientando é aquele que, no processo de formação inicial, está vinculado a um programa de PGSS, sendo acompanhado por um pesquisador experiente que o auxilia no processo de desenvolvimento de conhecimentos teóricos e práticos (Cruz-Flores; García-Campos; Abreu-Hernández, 2006; Pedraza Longi, 2018).
A prática do orientador se dá na formação de pesquisadores na PGSS, neste caso específico, no campo da educação. Ela pode ser entendida como o ensino da pesquisa, pela pesquisa, para a pesquisa. Independentemente da nomenclatura utilizada para a formação de pesquisadores, pressupõe-se que ela seja um processo explícito de preparação de pesquisadores (Pedraza Longi, 2018).
Aponta-se, ainda, que ao orientador compete não só desenvolver pesquisas, mas também formar para a pesquisa, exercer a docência, assessorar os orientandos em relação aos aspectos acadêmicos e administrativos, ser conselheiro, oferecer apoio psicossocial, demonstrando respeito, empatia e confiança. Além disso, cabe ao orientador estimular a autonomia dos orientandos e sua formação ética, além de adquirir recursos que garantam a permanência do orientando na pós-graduação e o desenvolvimento de pesquisas (Cruz Flores; Díaz-Barriga; Abreu Hernández, 2010). Ademais, compete ao orientador apresentar as potencialidades da utilização de novas tecnologias digitais para o desenvolvimento e o aprimoramento da pesquisa.
Na presente pesquisa, compreende-se que saberes podem ser entendidos como os conhecimentos, as competências, as habilidades ou aptidões e as atitudes, isto é, aquilo que muitas vezes foi chamado de saber, saber fazer e saber ser (Tardif, 2014). Esses saberes se constituem e se manifestam na prática dos orientadores.
Em relação à definição de pesquisador experiente, Elias-Hardy, Gonzalez-Olaguive e Martínez-Martínez (2015) elaboraram indicadores que permitem identificá-los como um profissional de alto nível, com reconhecida experiência em sua área, com um sistema atualizado de conhecimentos, habilidades, hábitos e valores que lhe permitem resolver problemas, além de produzir, conceber, julgar e liderar projetos, estratégias e tecnologias. São pessoas que participam da formação de outras categorias de pessoal, e seus resultados e contribuições dentro e fora dos limites de sua organização prestigiam, dão visibilidade, projeção e reconhecimento à própria instituição em que atuam.
No processo formativo, esses saberes dos pesquisadores experientes são passados para os pesquisadores em formação por meio de diversas atividades propostas pelos programas de PGSS, mediante acompanhamento dos orientadores, somados aos conhecimentos produzidos pelos avanços científicos e tecnológicos, com as características pessoais do pesquisador em formação (Sánchez-Lima; Labarrere-Sarduy, 2015).
A formação de pesquisadores envolve um processo complexo que acontece a partir da confluência de diversos contextos, inclusive, associados à missão da universidade (Moreno-Bayardo, 2011). Dentro desses contextos, está a relação entre orientandos e orientadores, a qual também se constitui de forma complexa, amparada e atenuada por diversos fatores relacionais, empáticos e de objetivos de pesquisa (Ferreira; Furtado; Silveira, 2009). Essa relação ocorre semelhante à de mestre e discípulo na concepção grega, por meio da qual, a partir da convivência e do amadurecimento, o discípulo adquire os saberes do mestre e busca superá-los (Moreno-Bayardo, 2011; Nóbrega, 2018; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008).
A relação entre orientandos e orientadores é um fator determinante para o sucesso ou insucesso na conclusão da formação na pós-graduação (Costa; Sousa; Silva, 2014; Elias-Hardy; Gonzalez-Olaguive; Martínez-Martínez, 2015; Lan; Williams, 2005; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008). No entanto, apesar desse reconhecimento, pouco se tem estudado sobre os saberes necessários aos orientadores ou ainda sobre a constituição desse processo relacional entre orientandos e orientadores (Leite Filho; Martins, 2006; Nóbrega, 2018).
Para que a formação de pesquisadores favoreça seu desenvolvimento, sobretudo, no campo científico, faz-se necessário que os orientadores disponham de um amplo arsenal de saberes em seu campo de atuação (Barnes; Austin, 2009; Barnes; Williams; Stassen, 2012; Moreno-Bayardo, 2007). A qualidade dos futuros profissionais depende, em grande medida, da qualidade dos professores que participam de sua formação (Elías-Hardy, 2019), pois os doutorandos aprendem tanto pelos exemplos como pelos contraexemplos que recebem de seus formadores (Moreno-Bayardo, 2007).
As pesquisas realizadas por Moreno-Bayardo (2007) e Nóbrega (2018) apontam que existe uma lacuna no que diz respeito à formação de pesquisadores para atuarem como orientadores. “O orientador, portanto, no início só pode se basear na experiência que teve como orientando, agindo intuitivamente, como um leigo” (Nóbrega, 2018, p. 1058). Diante disso, questiona-se: O que as pesquisas apontam sobre os saberes necessários aos orientadores na PGSS em Educação no século XXI?
Percurso metodológico
Para responder à questão proposta para esta pesquisa, optou-se pela realização de um estudo de revisão integrativa. Esse tipo de estudo determina o conhecimento atual sobre uma temática específica, uma vez que é conduzido de modo a identificar, analisar e sintetizar resultados de estudos independentes sobre o mesmo assunto (Souza; Silva; Carvalho, 2010). A Figura 1 apresenta as etapas da revisão integrativa.
A base de dados escolhida para a realização do estudo foi a Education Resources Information Center ― ERIC (https://eric.ed.gov). A opção por essa base de dados ocorreu em virtude de que ela reúne pesquisas no campo da educação no âmbito nacional e internacional. Na página inicial do repositório, foi inserido o descritor “advisor”, definindo como recorte temporal inicial o ano de 2000 e o final, 2022, levando em consideração que se almeja descortinar o orientador do século XXI.
Obteve-se o retorno de 1.961 trabalhos. Realizou-se a leitura dos títulos e dos resumos de todos eles e colocou-se como primeiro critério de exclusão pesquisas que não mencionavam em seu título ou resumo o orientador da PGSS. Foram excluídas 1.801 referências, restando 160 para análise do artigo na íntegra. Após essa fase, aplicaram-se os critérios de exclusão apresentados na Tabela 1.
PROCESSO | OPERAÇÃO | QUANTIDADE |
---|---|---|
Total encontrado a partir da palavra-chave | = | 1.961 |
Critérios de exclusão: não abordavam de algum modo o orientador da PGSS | - | 1.801 |
Resultado a partir do primeiro critério de exclusão | = | 160 |
Exclusão por serem publicados antes do ano 2000 | - | 18 |
Exclusão por serem manuais de produção de pesquisas | - | 6 |
Exclusão porque tratavam da orientação, mas não em educação | - | 103 |
Arquivo indisponível | - | 14 |
Total de arquivos (corpus de análise) | = | 19 |
Fonte: Elaborada pelos autores (2022).
Os 160 arquivos foram recuperados, inseridos no Mendeley e exportados para o software de análise de dados qualitativos ATLAS.ti, versão 23. Na sequência, realizou-se a leitura flutuante para identificação das áreas às quais as pesquisas estavam vinculadas, com o intuito de selecionar aquelas que abordavam a área da Educação e estavam incluídas no período de publicação selecionado. Nessa etapa também foram excluídas referências cujos arquivos estavam indisponíveis e aquelas que eram manuais de produção de pesquisas. Criaram-se códigos provisórios para tal finalidade.
Nesse processo, optou-se por incluir no escopo aquelas pesquisas que abordavam somente o campo da Educação ou que a traziam entre as áreas de estudos e atuação dos participantes da pesquisa. Desse modo, foram selecionadas 19 pesquisas para analisar (Quadro 1). A partir disso, foi realizada a análise dos documentos, visando obter dois resultados: o primeiro enfatiza as áreas das pesquisas e os participantes; o segundo diz respeito aos saberes necessários aos orientadores em Educação.
No segundo momento, foi realizada a codificação a partir das categorias de análise trazidas pelas pesquisas e, conjuntamente, a criação de códigos para agrupar as temáticas que emergiram dos resultados das pesquisas. Essas categorias foram agrupadas em cinco, a partir das atribuições do orientador apontadas por Cruz-Flores, García-Campos e Abreu-Hernández (2006) e Manyike (2017). Essas categorias foram subdivididas em ações atribuídas aos orientadores conforme os itens a seguir: acompanhamento/orientação (Quadro 2); desenvolvimento de pesquisa (Quadro 3); relacionamento (Quadro 4); docência (Quadro 5); e utilização de tecnologias (Quadro 6).
Nesse processo de agrupamento das categorias e temáticas, buscou-se apresentar os resultados dos estudos que fazem parte do escopo desta pesquisa, mantendo-se fiel àquilo que esses resultados atribuem como saberes necessários aos orientadores. Ressalta-se que, no dia a dia dos orientadores, essas categorias estão intrinsecamente relacionadas e optou-se por esse agrupamento por questões didáticas de análise e discussão.
Resultados
O Quadro 1 apresenta as áreas às quais as pesquisas estão vinculadas e os participantes das pesquisas. Reconhece-se que o quantitativo de pesquisas que abordam a temática da orientação somente em Educação é relativamente baixo, por isso optou-se por trazer para a discussão aquelas pesquisas que inseriam a educação em seu rol, juntamente com outras áreas.
ÁREAS | PARTICIPANTES | PESQUISAS |
---|---|---|
Educação | Orientadores | (Smith; Alston, 2019) |
Educação | Orientandos | (Rockinson-Szapkiw, 2012; Schroeder; Terras, 2015) |
Educação, Agricultura, Artes e Ciências, Administração de Empresas, Engenharia, Ciências Humanas e Arquitetura. | Orientandos | (Lan; Williams, 2005) |
Educação, Arquitetura, Artes e Ciências, Ciências Atmosféricas e Geográficas, Engenharia, Jornalismo, Estudos Internacionais, Estudos Liberais e Estudos Interdisciplinares. | Orientandos | (Hardré; Hackett, 2015) |
Educação, Artes, Comunicação, Negócios, Comunicação, Inglês, Engenharia, Ciências Físicas e Sociais. | Orientandos | (Wrench; Punyanunt-Carter, 2008) |
Educação, Ciências Sociais, Ciências Naturais, Matemática, Humanidades, Engenharia, Ciências Tecnológicas. | Orientandos | (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019) |
Educação, Engenharia, Ciências Naturais, Ciências Sociais, Humanidades. | Orientandos | (Shin et al., 2018) |
Educação, Engenharia, Humanidades e Belas Artes, Recursos Naturais e Meio Ambiente, Ciências Naturais, Matemática, Enfermagem, Saúde Pública, Ciências Sociais e Administração. | Orientandos | (Barnes; Williams; Stassen, 2012) |
Educação, Gestão de Saúde, Enfermagem, Administração, Planejamento Educacional. | Orientandos | (Kara; Can, 2019) |
Educação, Humanidades, Ciências Sociais, Negócios. | Orientandos | (Marijanovic et al., 2021) |
Educação, Pesquisa, Avaliação e Medição Quantitativa, Formação de Professores, Desenvolvimento da Força de Trabalho. | Orientandos | (Fletcher Jr.; Gies; Hodge, 2011) |
Educação, Psicologia, Sociologia, Antropologia, Estudos de Gênero, Inglês e Literatura, Computação, Direito, Negócios, Medicina, Saúde Pública, Matemática. | Orientandos | (Goldberg; Kuvalanka; Dickey, 2018) |
Educação, Psicologia, Ciências Biológicas, Ciências Físicas, Humanidades, Transporte, Arquitetura, Medicina, Engenharia, Comunicação, Interdisciplinares, Artes Visuais. | Orientandos | (German; Sweeny; Robbins, 2019) |
Educação, Ciências Sociais, Ciências e Humanidades. | Orientadores | (Barnes; Austin, 2009) |
Educação, Fisioterapia, Enfermagem, Saúde, Negócios. | Orientandos e orientadores | (Taylor et al., 2018) |
Educação, Ciências Sociais, Ciências e Humanidades. | Orientadores | (Barnes, 2009) |
Educação | Orientandos e orientadores | (Gammel; Rutstein-Riley, 2016) |
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).
Percebe-se que, embora os estudos tragam aspectos da orientação (Goldberg; Kuvalanka; Dickey, 2018; Schroeder; Terras, 2015) e considerem a orientação um elemento determinante na pós-graduação, podendo ser contributivo ou dificultador para a conclusão exitosa do processo (Barnes, 2009; Barnes; Williams; Stassen, 2012; Rockinson-Szapkiw, 2012; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008), muito do que se sabe sobre a natureza da relação orientador-orientando em geral e do papel do orientador em particular, tem sido baseado em pesquisas realizadas exclusivamente com doutorandos (Barnes; Austin, 2009), conforme demonstrado no Quadro 1, tendo em vista que, das 19 pesquisas apresentadas, apenas três refletem a visão dos orientadores e duas trazem essa visão em conjunto com a dos orientandos.
Em relação à distribuição temporal das pesquisas, apresenta-se o Gráfico 1.
A distribuição temporal das pesquisas demonstra que os anos de 2018 e 2019 são os que concentram mais pesquisas. Embora seja uma amostragem pequena, por se tratar de uma única base de dados, esse é um elemento importante a ser considerado e confirmado por meio de outras pesquisas sobre a temática, a fim de verificar se realmente há um crescimento no quantitativo de pesquisas nesse campo.
No que diz respeito aos saberes necessários aos orientadores, a primeira categoria traz os saberes agrupados no quesito acompanhamento/orientação. Dessa categoria, decorrem as temáticas constituintes do processo de acompanhamento e orientação (Quadro 2).
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).
Um dos elementos mais destacados entre as pesquisas refere-se ao fato de que se espera que os orientadores sejam capazes de olhar para seus orientandos a partir de suas individualidades e particulares, avaliando as necessidades de cada um dos orientandos (Barnes; Austin, 2009; Schroeder; Terras, 2015) e desenvolvendo uma orientação individualizada (Schroeder; Terras, 2015; Smith; Alston, 2019).
Outros elementos como o cuidado (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Lan; Williams, 2005) a preocupação (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Taylor et al., 2018), a generosidade, o carinho, o respeito, o apoio emocional (Cross, 2018; Goldberg; Kuvalanka; Dickey, 2018) e a elaboração de um percurso que considere as aspirações e realidades de cada um dos orientados, valorizando sua individualidade e unicidade, são características que possibilitam um processo de orientação menos massificado e mais holístico, incluindo, inclusive, o conhecimento dos alunos pelos nomes (Cross, 2018; Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Schroeder; Terras, 2015; Taylor et al., 2018).
Espera-se que os orientadores estejam dispostos a oferecer conselhos e orientação, visando auxiliar os orientandos em seus diferentes processos (Barnes, 2009; Barnes; Austin, 2009; Lan; Williams, 2005), dando sustentação para que eles possam progredir com sucesso como pesquisadores (Barnes, 2009; Barnes; Austin, 2009; Kara; Can, 2019; Taylor et al., 2018), direcionando para a elaboração de um cronograma de pesquisas (Fletcher Jr.; Gies; Hodge, 2011; Taylor et al., 2018) e para a escolha de projetos que sejam viáveis e significativos para a academia e para os orientandos, além de possibilitar que estes sejam, paulatinamente, pesquisadores independentes e autônomos (Barnes; Austin, 2009).
Os orientadores também são vistos como aqueles que auxiliam os orientandos em sua formação ética, corrigindo seus erros e comportamentos (Barnes; Austin, 2009; Schroeder; Terras, 2015), com confiança e responsabilidade (Kara; Can, 2019; Schroeder; Terras, 2015; Taylor et al., 2018). Ainda sobre isso, Cross (2018), Schroeder e Terra (2015) e Shin et al. (2018) destacam a necessidade de processos de orientações adequados, sob o risco de prejudicar o desenvolvimento do orientando.
Destaca-se que o comprometimento do orientador com o processo é fundamental (Barnes, 2009; Kara; Can, 2019; Taylor et al., 2018), proporcionando ao orientando encontros regulares, presenciais ou virtuais, individuais ou em grupo (Taylor et al., 2018), avaliando a progressão (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Schroeder; Terras, 2015), em regime colaborativo, nos quais, mutuamente, se sintam como pesquisadores responsáveis pela pesquisa, compartilhando objetivos comuns com o itinerário realizado (Gammel; Rutstein-Riley, 2016) e trocando informações sobre o campo de estudos (Cross, 2018; Kara; Can, 2019; Lan; Williams, 2005; Rockinson-Szapkiw, 2012).
A disponibilidade de tempo dos orientadores para acompanhar os orientandos em seus processos, sanar dúvidas, ouvir as queixas e direcionar os passos dos orientandos (Barnes; Austin, 2009; Barnes; Williams; Stassen, 2012; Kara; Can, 2019; Lan; Williams, 2005; Schroeder; Terras, 2015; Taylor et al., 2018; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008), e a exigência e responsividade também aparecem como elementos importantes no processo de orientação da pós-graduação (Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Kara; Can, 2019; Lan; Williams, 2005; Schroeder; Terras, 2015; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018)
No quesito comunicação aberta, sincera, rápida e contínua entre os orientadores e os orientandos (Kara; Can, 2019; Schroeder; Terras, 2015), compreende-se que a comunicação aberta sobre as expectativas do orientador, desde o início do processo, alinhando os objetivos em relação ao orientando e sua pesquisa, pode ser fator determinante para a conclusão da pesquisa (Barnes, 2009; Taylor et al., 2018). De igual maneira, percebe-se que esse é um elemento que facilita o acompanhamento do andamento da pesquisa e do processo do orientando (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Lan; Williams, 2005).
A comunicação positiva, na qual são ressaltadas as qualidades do orientando, e bom humor no processo de orientação (Hardré; Hackett, 2015; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008) são apontados como fundamentais para a satisfação dos orientandos e a conclusão do Mestrado ou Doutorado.
Nas devolutivas e conduções dos processos, sobretudo sobre o da escrita, espera-se que os orientadores sejam transparentes, concisos, claros e oportunos (Barnes; Austin, 2009; Barnes; Williams; Stassen, 2012; Cross, 2018; Esposito et al., 2017; Goldberg; Kuvalanka; Dickey, 2018; Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019; Schroeder; Terras, 2015) com seus orientandos, apontando-lhes os erros e auxiliando-os na superação das dificuldades assinaladas (Barnes, 2009; Barnes; Austin, 2009) Ressalta-se ainda que os orientadores devem ser proativos e criativos na busca de meios de comunicação que possibilitem o acompanhamento dos orientandos, mesmo a distância (Cross, 2018; Kara; Can, 2019).
Os orientadores devem auxiliar os orientandos no processo de descoberta vocacional no campo profissional, por meio da participação em grupos e eventos profissionais da área, inclusive com publicações de trabalhos, em vistas a seu desenvolvimento profissional, fazendo da pós-graduação um lugar de aprimoramento profissional (Barnes, 2009; Barnes; Austin, 2009; Barnes; Williams; Stassen, 2012; Hardré; Hackett, 2015; Shin et al., 2018).
Ainda nessa seara, compreende-se a necessidade de os orientadores estarem atentos às urgências do mercado de trabalho e de dialogar sobre elas com seus orientandos (Shin et al., 2018), alinhar as pesquisas e a orientação ao campo profissional do orientando (Barnes; Austin, 2009), considerando as aspirações pessoais de cada um (Schroeder; Terras, 2015) e auxiliando-os para que tenham sucesso no campo profissional (Barnes; Williams; Stassen, 2012).
Evidencia-se ainda que os orientadores prestem orientação também ao desenvolvimento profissional dos orientandos (Cross, 2018), além de auxiliá-los a montar programas pessoais no curso que o possibilitem esse desenvolvimento (Kara; Can, 2019; Taylor et al., 2018). Por fim, German, Sweeny e Robbins (2019) e Smith e Alston (2019) ressaltam que a boa experiência com os orientadores pode implicar a escolha profissional, levando-os a, inclusive, optarem pela docência.
O encorajamento, a defesa dos orientandos diante das dificuldades e a motivação também apareceram como saberes necessários aos orientadores. A formação na pós-graduação costuma ser um período de muita dificuldade (Pedraza-Longi, 2018); diante disso, espera-se que os orientadores encorajem e motivem seus orientandos (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Kara; Can, 2019; Lan; Williams, 2005; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008), sobretudo na superação dos fracassos com os resultados das pesquisas, caso não sejam os esperados (Barnes; Austin, 2009; Taylor et al., 2018). Esse apoio deve ir além das atividades acadêmicas, antes, deve-se estender ao universo pessoal e social do orientando (Cross, 2018; Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Goldberg; Kuvalanka; Dickey, 2018; Wrench; Punyanunt-Carter, 2008).
Ainda sobre esse aspecto, espera-se que os orientadores advoguem pelos orientandos nos momentos e nas situações de dificuldades internas da pós-graduação (Barnes; Austin, 2009; Cross, 2018). Esse tipo de apoio pode ser fator decisivo para a conclusão exitosa ou não do processo de pós-graduação (Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Taylor et al., 2018).
A formação de redes internas e externas à instituição e a inserção dos orientandos nelas, possibilitando que conheçam e troquem experiências com os especialistas em sua área, bem como o auxílio e a partilha com colegas, estão no mesmo momento formativo (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Fletcher Jr.; Gies; Hodge, 2011; Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018) e é fundamental. Esse processo pode ser incrementando ao compreender que o papel dos orientadores também está relacionado ao incentivo para que os orientandos participem de eventos acadêmicos, partilhem suas pesquisas e possam estar em contato com pesquisadores especialistas em suas áreas ou ainda com pós-graduandos que pesquisem temáticas afins (Barnes, 2009; Barnes; Austin, 2009; Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018).
Por fim, o conhecimento sobre as normativas e a política departamental (Barnes; Williams; Stassen, 2012), como prazos, formulários, créditos (Schroeder; Terras, 2015), matrículas e a estrutura dos programas de pós-graduação aparecem como necessário aos orientadores (Cross, 2018; Taylor et al., 2018) para que consigam direcionar os orientandos ao longo do percurso da pós-graduação.
O Quadro 3 apresenta as pesquisas que abordam as temáticas sobre os saberes dos orientadores em relação ao desenvolvimento de pesquisas.
TEMÁTICA | REFERÊNCIAS |
---|---|
Auxiliar os orientandos no desenvolvimento das pesquisas. | (Barnes; Austin, 2009; Barnes; Williams; Stassen, 2012; Fletcher Jr.; Gies; Hodge, 2011; Goldberg; Kuvalanka; Dickey, 2018; Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018) |
Auxiliar os orientandos na publicação das pesquisas. | (Barnes; Austin, 2009; Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018) |
Auxiliar os orientandos na busca de financiamento. | (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Cross, 2018; Marijanovic et al., 2021; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018) |
Ser referência na área de estudos e ser citado. | (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019; Taylor et al., 2018) |
Ser um bom metodologista. | (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019; Taylor et al., 2018) |
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).
Dentre os saberes necessários aos orientadores no campo do desenvolvimento de pesquisas, compreende-se que compete a eles “[...] ajudar os orientandos a se tornarem independentes em sua capacidade de planejar, conduzir e executar projetos de pesquisas, criando uma identidade de pesquisa” (Barnes; Austin, 2009, p. 305, tradução própria). Esse é um elemento interligado intimamente com a finalidade da pós-graduação e a centralidade do processo de orientação.
A pesquisa deve ser vista pelo orientador como um projeto colaborativo (Barnes; Austin, 2009), sendo ele fundamental para auxiliar os orientandos no desenvolvimento de suas propostas de pesquisas (Fletcher Jr.; Gies; Hodge, 2011), bem como na escrita de seus projetos (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Shin et al., 2018). Espera-se que esse seja um momento de interação ativa (Shin et al., 2018), o qual pode permitir ao orientador desenvolver com seus orientandos várias metodologias de pesquisa (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Shin et al., 2018).
Compreende-se, ainda, que os orientadores podem se utilizar da elaboração da pesquisa para formar pesquisadores de qualidade e apaixonados pela pesquisa. Para isso, é importante que estejam dispostos a compreender os objetivos das pesquisas de seus orientandos (Taylor et al., 2018), auxiliando-os na escolha do campo, na análise dos dados, na escrita e na correção dos textos produzidos, bem como na administração dos projetos de pesquisas (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Taylor et al., 2018). Além disso, devem ajudar os orientandos a aceitar os resultados de sua pesquisa, mesmo que estejam em discordância com aquilo que os pesquisadores esperavam anteriormente (Barnes; Austin, 2009; Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019)
No campo da publicação de artigos, os orientadores são apontados como aqueles que devem preparar seus orientandos para publicações individuais e coautorais, discutindo quais periódicos são adequados àquela publicação e incentivando-os a realizarem publicações individuais (Barnes; Austin, 2009; Taylor et al., 2018).
Recorda-se que as publicações, na maioria dos programas, são contadas como créditos que possibilitam ou não a defesa das teses ou dissertações; assim, a parceria com os orientadores é fundamental para o desenvolvimento de pesquisas que culminem em artigos, seja na escrita ou na publicação (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Shin et al., 2018). Outro elemento diz respeito aos orientadores ajudarem os orientandos no desenvolvimento da capacidade de buscar recursos financeiros para suas pesquisas e manutenção de laboratórios (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Cross, 2018; Marijanovic et al., 2021; Taylor et al., 2018).
Espera-se, ainda, que os orientadores “[...] conheçam bem a sua área [...]” (Kara; Can, 2019, p. 171, tradução própria), sejam “[...] líderes em sua área no campo do domínio da temática” (Taylor et al., 2018, p. 864, tradução própria) e produzam conhecimento que reconheça a “[...] literatura de qualidade relacionada a um tópico de pesquisa específico ou até mesmo […] interpretações errôneas da literatura” (Taylor et al., 2018, p. 864, tradução própria) e que sejam “[...] altamente citado[s] em outras pesquisas da área” (Taylor et al., 2018, p. 861, tradução própria).
Considera-se que o domínio do campo da metodologia de pesquisa também é um saber necessário. Taylor et al. (2018, p. 864, tradução própria) assinalam que os orientadores devem ser “[...] bons metodologistas, que ofereça[m] orientação no desenho do estudo, com experiência em pesquisa e em metodologias diversas”, em métodos de coletas e análise de dados (Gruzdev; Terentev; Dzhafarova, 2019; Kara; Can, 2019).
O Quadro 4 apresenta as pesquisas que abordam as temáticas sobre os saberes dos orientadores no campo das suas relações com os orientandos.
TEMÁTICA | REFERÊNCIAS |
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Ser amigável com os orientandos. | (Barnes; Austin, 2009; Cross, 2018; Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Kara; Can, 2019; Marijanovic et al., 2021; Shin et al., 2018) |
Dispor de simpatia e empatia com os orientandos. | (Barnes; Austin, 2009; Cross, 2018; Kara; Can, 2019; Lan; Williams, 2005; Marijanovic et al., 2021; Shin et al., 2018; Taylor et al., 2018) |
Ser respeitoso com os orientandos. | (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Lan; Williams, 2005) |
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).
No campo das relações entre orientadores e orientandos, as pesquisas apontam que os orientadores devem buscar desburocratizar as relações, criando clima de amizade, colegialidade e confiabilidade (Barnes; Austin, 2009; Cross, 2018), levando em consideração as opiniões dos orientandos (Kara; Can, 2019), de forma colaborativa, e estimulando o crescimento intelectual, em clima de colegialidade (Gammel; Rutstein-Riley, 2016; Marijanovic et al., 2021; Shin et al., 2018). Esse clima impacta positivamente a satisfação dos orientandos com o percurso da pós-graduação (Shin et al., 2018; Marijanovic et al., 2021).
Ressalta-se, também, a necessidade de os orientadores serem simpáticos e demonstrarem isso por meio da proximidade, do carinho, da abertura e da preocupação (Barnes; Austin, 2009; Cross, 2018; Kara; Can, 2019; Shin et al., 2018), sendo empáticos com seus orientandos nas diversas circunstâncias em que se encontram e que tendem a atravessar no período da pós-graduação (Taylor et al., 2018). Esse tipo de relação é apresentado como um fator contribuinte para a satisfação com o processo e possível conclusão exitosa (Shin et al., 2018).
A acessibilidade aparece como um elemento constitutivo importante da relação orientadores e orientandos (Lan; Williams, 2005). Essa abertura oferecida pelos orientadores aos seus orientandos sinaliza comportamentos positivos de receptividade (Cross, 2018), de prontidão para responder aos questionamentos e, sobretudo, de demonstrar que os orientandos podem procurar seus orientadores sempre que sentirem necessidade (Barnes; Austin, 2009; Cross, 2018; Marijanovic et al., 2021) Além disso, espera-se dos orientadores atitudes de respeito com seus orientandos (Barnes; Williams; Stassen, 2012; Lan; Williams, 2005).
O Quadro 5 apresenta as pesquisas que abordam as temáticas sobre os saberes dos orientadores em relação à docência.
TEMÁTICA | REFERÊNCIAS |
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Ter didática no campo das metodologias utilizadas em aulas e avaliações. | (Kara; Can, 2019) |
Auxiliar os orientandos a serem críticos. | (Kara; Can, 2019) |
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).
No quesito docência, na pesquisa desenvolvida por Kara e Can (2019), os orientandos relataram que se esperava dos orientadores aulas bem planejadas, com mais discussão e menos leitura de slides, capacidade de apresentar os conteúdos de forma profunda, mas de modo a torná-los mais fáceis de serem entendidos, com atividades para casa que fossem individuais, interessantes e úteis, e com avaliações claras.
Destaca-se, ainda, o desejo dos orientandos de que seus orientadores trouxessem tópicos importantes e interessantes para a discussão, além da utilização de várias estratégias para a condução das aulas, visando atender a diversas necessidades de aprendizagem dos alunos. A formação da criticidade dos orientandos também é apresentada como um dos elementos importantes no processo de orientação (Kara; Can, 2019). É importante salientar que essa pesquisa é realizada em um contexto de pós-graduação na modalidade a distância.
O Quadro 6 apresenta as pesquisas que abordam as temáticas sobre os saberes dos orientadores em relação à utilização de tecnologias.
TEMÁTICA | REFERÊNCIAS |
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Utilizar tecnologias para orientar e comunicar-se com os orientandos | (Cross, 2018; Kara; Can, 2019; Rockinson-Szapkiw, 2012; Schroeder; Terras, 2015; Smith; Alston, 2019; Taylor et al., 2018) |
Fonte: Elaborado pelos autores (2022).
No quesito tecnologia, destaca-se a utilização da plataforma SharePoint para a distribuição de tarefas e fórum de discussão, promovendo maior interação entre os orientandos e seus pares e com seus orientadores (Rockinson-Szapkiw, 2012).
A qualidade dos bons orientadores é associada a sua disponibilidade de utilização de recursos digitais para a orientação, sendo o mais utilizado o correio eletrônico (Schroeder; Terras, 2015) ou meios de comunicação alternativos, como o telefone (Cross, 2018). Além disso, sugere-se que os orientadores promovam atividades de correções de pesquisas em conjunto com os demais orientandos na modalidade on-line (Kara; Can, 2019; Smith; Alston, 2019). Esse recurso é visto por Taylor et al. (2018) como uma forma de manter um grupo, podendo estabelecer uma agenda de orientações que intercalem os encontros virtuais e presenciais.
Discussão
A partir da indicação de Costa, Sousa e Silva (2014) sobre a necessidade de avaliar o processo formativo da PGSS, evidencia-se a carência de estudos que estejam focados na temática da orientação em educação, visto o baixo quantitativo de pesquisas que fazem parte do escopo desta investigação. Os dados assinalam que o crescimento de pesquisas na área não tem acompanhado o da Pós-Graduação em Educação no Brasil.
Ao assinalar a importância da pós-graduação para a criação de ciência e inovação em tecnologia em prol do desenvolvimento do país (Brasil, 1965), compreende-se que se faz necessária também a realização de pesquisas que auxiliem os processos formativos na PGSS. O Parecer no 977/1965 assinala que a função do orientador é de acompanhar o estudante da pós-graduação no processo de desenvolvimento da pesquisa (Brasil, 1965), mas não desenvolve sobre as reais funções do orientador para formar recursos altamente qualificados, conforme exposto no próprio parecer.
Os dados demonstram que o processo de acompanhamento exige dos orientadores “[...] conhecimento em métodos de pesquisa e instrução de qualidade no processo de pesquisa” (Taylor et al., 2018, p. 860, tradução própria), “[...] que apoiem, motivem e orientem os alunos para publicação e os ajudem a preparar pesquisas para publicação” (Kara; Can, 2019, p. 172, tradução própria), que elaborem cronogramas realistas capazes de auxiliar ainda mais os alunos no planejamento de seus trabalhos (Manyike, 2017) e os instruam no processo de aquisição e administração de fomentos (Quadro 3).
A escassez de pesquisas que assinalem os percursos, as habilidades e as competências a serem desenvolvidas no processo de formação na PGSS podem comprometer o processo formativo do pesquisador. Ademais, dificulta aos orientandos e orientadores construir um planejamento e um cronograma que possibilitem a conclusão exitosa do processo, levando em consideração as particularidades dos orientandos e aquilo que é exigido pelos programas de PGSS, como apontado por Taylor et al. (2018).
Por um lado, os processos de avaliação desenvolvidos pela Capes priorizam o cumprimento dos prazos de conclusão da PGSS, bem como o desenvolvimento e a publicação de pesquisas de qualidade, mas, por outro lado, não delimitam e especificam sobre a qualidade em pesquisas (Rolim; Ramos, 2020). Para que esse processo seja desenvolvido e considere-o exitoso, o orientador é apontado como um grande contribuinte para o sucesso ou não do programa. Isso tem elevado o índice de publicações; contudo, também é apontado como estrangulamento dos professores e estudantes da PGSS, priorizando muitas vezes a quantidade em detrimento da qualidade das publicações (Evangelista, 2012).
Essa realidade se agrava com o quantitativo insuficiente de orientadores para atender aos orientandos e às demandas da PGSS, o que acaba por comprometer a formação dos pesquisadores (Teixeira; Marqueze; Moreno, 2020). Esses dados estão em consonância com os encaminhamentos dos critérios de avaliação da Capes apresentados (Rolim; Ramos, 2020), mas não se limita ao acompanhamento para a produção de pesquisas e cumprimento de prazos.
Espera-se ainda que o orientador seja alguém que, na construção do planejamento e do cronograma, considere as particularidades dos orientandos nas dimensões psicossociais, mas também de habilidade e competências já desenvolvidas e a serem desenvolvidas, acompanhando-os em seu processo de formação, dispondo de abertura para a comunicação, encorajando-os para a divulgação de pesquisas, proporcionando-lhes a formação de redes e focando no desenvolvimento profissional de seus orientandos, unindo pesquisa e carreira profissional (Quadro 2).
O campo relacional aparece como fator contribuinte para o êxito no processo, visto que se espera que ele seja amigável com seus orientandos, dispondo de simpatia e empatia, sendo respeitoso e acessível a eles (Quadro 4). Essas evidências corroboram as pesquisas de Costa, Sousa e Silva (2014), Elías-Hardy (2019), Lan e Williams (2005), Wrench e Punyanunt-Carter (2008).
A formação de pesquisadores pode ser concebida como um ambiente complexo e, por isso, exige dos orientadores saberes para além da metodologia de pesquisa, mas que sejam dotados de saberes relacionais capazes de auxiliar seus orientandos para que sejam exitosos no processo. Destaca-se, também, questões ligadas à docência e à tecnologia. Embora trate-se de professores orientadores que exercem a função no século XXI, as pesquisas abordam timidamente essas temáticas (Quadro 5 e Quadro 6). Percebe-se o crescimento das fontes de informações vinculadas pelos meios de comunicação digitais e assinala-se a necessidade do desenvolvimento de pesquisas nessa área.
Outro fator importante refere-se ao quantitativo de pesquisas que abordam a visão do orientador (Quadro 1). Esse resultado corrobora as pesquisas de Barnes (2009) e de Barnes e Austin (2009) e demonstra a necessidade de desenvolver pesquisas sobre a temática da orientação que tragam a visão dos orientadores sobre seu papel na pós-graduação e que enfatizem também as questões de docência e tecnologias.
Considerações
A PGSS em Educação no Brasil apresenta índices de crescimento nas últimas duas décadas. Diante disso, faz-se necessário que esse crescimento seja acompanhado por pesquisas que assegurem a qualidade da formação de pesquisadores em vistas ao desenvolvimento de conhecimento, ciência e tecnologia para o país, bem como a progressão e a manutenção da internacionalização, colocando a PGSS em Educação do Brasil nos patamares dos países desenvolvidos.
Assevera-se sobre a necessidade de que as pesquisas deem voz aos orientandos e orientadores, visto que são os componentes-chave da pós-graduação, para que, dessa forma, possa se construir um referencial de saberes essenciais, tanto aos orientadores como aos orientandos. Além disso, foi possível perceber a carência de pesquisas que considerem os aspectos da docência e da utilização da tecnologia no processo de orientação e formação de pesquisadores nesse nível de ensino.
Os orientadores desempenham um papel crucial para a formação do pesquisador, do momento do ingresso ao programa até sua conclusão. Desse modo, reafirma-se, a partir dos dados, que há necessidade de pesquisas que destaquem os saberes necessários aos orientadores do século XXI, discutindo-os.
O modo e as possibilidade de realizar pesquisas se modificou ao longo dos tempos. Atualmente, apresenta-se aos pesquisadores uma gama de metodologias para serem utilizadas, dependendo do tipo de pesquisa que se realiza em consonância com os objetivos que se pretendem alcançar. São vários os recursos digitais que podem facilitar o trabalho do pesquisador desde o momento da coleta de dados, passando pela organização e pelo auxílio para a coleta e para análise dos dados, até mesmo para auxiliar o pesquisador no processo de inclusão das referências bibliográficas na escrita do relatório final. É necessário, assim, um repensar sobre o currículo da PGSS, não com o intuito de engessar esse nível de ensino, mas para que ele possa ser refletido, verificando seu desenvolvimento e o que de fato está sendo ensinado nos referidos programas.
A necessidade de cursos de formação para orientadores é apresentada por Taylor et al. (2018, p. 866, tradução própria), uma vez que “[...] orientadores acadêmicos de doutorado precisam de orientação e preparação para se tornarem orientadores”. De igual maneira, Gruzdev, Terentev e Dzhafarova (2019) assinalam que não existem guias unificados para que os orientadores saibam organizar e direcionar a orientação. Na mesma perspectiva, Marijanovic et al. (2021, p. 419, tradução própria) destacam que “[...] a insuficiência de treinamento formal pode explicar por que os conselheiros frequentemente relatam estar despreparados para os fatores processuais e emocionais que acompanham o aconselhamento”. Barnes e Austin (2009, p. 312, tradução própria) demonstram que “[...] a maioria dos membros do corpo docente aprendeu sobre orientação confiando em suas próprias experiências como orientandos e observações de colegas”.
Os resultados apresentados por essas pesquisas, associados à necessidade de formar pesquisadores altamente qualificados, como apregoam os documentos norteadores da PGSS, sinalizam para a necessidade de aprofundamento na discussão dos saberes necessários aos orientadores e para a criação de um referencial que direcione as ações dos orientadores.
Esta pesquisa apresenta a limitação de ter sido desenvolvida a partir de uma única base de dados, tendo características de efeito-demonstração da necessidade de aprofundamento nesse tema de pesquisa, a partir do mapeamento em outras bases de dados. Compreende-se que um levantamento em outras bases podem ampliar os saberes dos orientadores e pesquisadores. Ademais, em virtude de que o quantitativo de pesquisas que trazem os orientadores como participantes ter sido baixo, apenas cinco (Quadro 1), os saberes estão condicionados, em sua maioria, à visão dos orientandos. Assim, pretende-se dar continuidade ao estudo, ampliando para outras bases de dados.
Outro elemento limitador da pesquisa refere-se ao fato de que, no processo de coleta, não apareceram pesquisas de origem brasileira. Acredita-se que isso ocorreu em virtude da escolha de uma única base de dados; por isso, apresenta-se a necessidade de aprofundamento do estudo em outras bases, visando a inclusão de pesquisas que retratem a realidade da PGSS no Brasil.