Introdução
No início dos anos 2000, a escolarização de estudantes do público da Educação Especial em classes comuns de escolas regulares no Brasil ganhou força. Duas décadas depois, constataram-se avanços significativos nas questões legislativas e de financiamento, reafirmando, assim, o direito de todos os estudantes à Educação Básica. Tal garantia culminou em um aumento expressivo no número de matrículas de estudantes com deficiência, com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e com altas habilidades/superdotação nas escolas brasileiras (Brasil, 2015). Rocha, Lacerda e Prieto (2024) ressaltam o aumento expressivo no último quinquênio das matrículas dos estudantes da Educação Especial na Educação Básica.
No entanto, estudos apontam que tais medidas pouco contribuíram para garantir a permanência desses estudantes na escola e assegurar a aprendizagem e a apropriação efetiva do currículo, constatações que trazem como pano de fundo inúmeras variáveis, como a formação dos professores, as condições de trabalho, a quantidade inadequada de estudantes por sala, insuficiência do financiamento, dentre outros fatores (Mendes; Vilaronga; Zerbato, 2014; Silva, 2020).
Um dos aspectos mais relevantes é o fato de a escola não ter se reorganizado o suficiente, nas últimas décadas, para atender com qualidade a heterogeneidade dos estudantes presentes nas salas de aula (Mendes, 2023). E, no caso de estudantes do público da Educação Especial, a escola ainda busca respostas individualizadas às especificidades, prática reforçada pelo modelo de Atendimento Educacional Especializado (AEE) extraclasse, preconizado pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008). Ainda que esse atendimento tenha emergido como um serviço necessário de apoio aos estudantes que adentraram a escola, favorecendo uma parcela desses estudantes com deficiência, ele não foi suficiente para respaldar a reestruturação da escola e melhorar as práticas desenvolvidas na sala de aula comum.
Para Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014), a individualização do ensino com atendimentos em contraturno escolar pouco favoreceu a interação entre os professores da Educação Especial e os do ensino regular, além de dificultar o planejamento de estratégias no contexto de sala de aula comum e, como consequência, distanciou o estudante do currículo padrão. No entanto, ao entrelaçarem a concepção de educação inclusiva ao desenvolvimento do ensino acessível e da aprendizagem como ações de apoio (e não centrado na deficiência), Booth e Ainscow (2011) definem uma nova concepção de suporte, entendida de forma mais coletiva e menos individual, abrangendo professores, estudantes e suas famílias bem como os demais funcionários da escola. Assim, as propostas educacionais passam a ser pensadas em como oferecer suporte para que todos os estudantes participem. Nessa óptica, a necessidade de apoio individual é minimizada, e o atendimento à diversidade em sala de aula passa a ser considerado e planejado para todos os estudantes, levando em conta os diferentes pontos de partida, dos interesses, das experiências e dos modos diferentes de acesso ao currículo (Booth; Ainscow, 2011).
O suporte aos estudantes também não pode se configurar como um apoio individualizado, como, por exemplo, quando se insere profissionais de apoio ou mediadores dentro da sala de aula que são responsabilizados por um único estudante, a quem são disponibilizadas atividades diferenciadas, adaptadas, modificadas e, na maioria das vezes, descontextualizadas do trabalho desenvolvido com a turma; e que privam o público da Educação Especial das valiosas interações com professores e colegas. Esse tipo de investimento, centrado na deficiência específica de um estudante, reforça uma prática baseada no modelo médico, isolada em um contexto coletivo, configurando-se como:
Uma resposta estereotipada à dificuldade educacional dada em termos de currículos separados, diferenciados, individualizados e a detida atenção dos professores assistentes que pode impedir relações com outras crianças e adultos. Quando a atividade de classe exige trabalho de grupo, um monitor, em geral menos qualificado que o professor, pode frequentemente encontrar-se trabalhando com as crianças agrupadas porque elas presumivelmente têm maior dificuldade. A persistência do modelo de pareamento para assistir as crianças que supostamente experimentam dificuldades, é um tributo ao poder do conceito das necessidades educacionais especiais, de restringir o pensamento criativo sobre como se deve administrar o suporte aos estudantes (Booth; Ainscow, 2011, p. 41).
Em resposta a esse modo de atuação pautado no modelo médico, centrado na criança com dificuldades, a literatura em Educação Especial tem apontado uma indicação promissora: o trabalho colaborativo entre os profissionais da Educação Especial e os do ensino regular (Mendes; Vilaronga; Zerbato, 2014). De fato, o foco das intervenções em sala de aula nas especificidades das deficiências dos estudantes parece não ter outorgado aos professores do ensino regular conhecimentos suficientes quanto à gestão da sala de aula e à inovação de estratégias pedagógicas inclusivas.
Salienta-se, ainda, que o modelo individualizado e personalizado se assemelha à educação em outros espaços, com as mesmas características, como nas classes e instituições especializadas, por exemplo. Nesse caso, podemos falar de uma pseudo inclusão na medida em que práticas típicas de contextos segregados são meramente transferidas para o contexto da classe comum.
Com o avanço das experiências de escolarização dos estudantes público da Educação Especial em classes comuns, uma demanda que se mostrou relevante foi a de incrementar a cultura inclusiva e colaborativa no espaço escolar como condição basilar para as demais práticas inclusivas. Seria a partir dessa nova concepção, de enfocar os valores e as políticas institucionais, que se estabeleceriam novas práticas no espaço escolar, especificamente na sala de aula, ampliando as chances de práticas inclusivas sustentáveis, pois, “[...] quando as políticas e práticas fizerem a diferença para a cultura da escola, provavelmente serão sustentadas” (Booth; Ainscow, 2011, p. 46). Significa instaurar um senso coletivo e ao mesmo tempo identitário em um espaço aberto à expressão de crenças, valores, conhecimentos, habilidades e valorização da diferença.
Nesse sentido, Silva (2020) investigou uma proposta de formação continuada focada na colaboração entre equipes de ensino com vistas a fomentar a cultura escolar colaborativa e potencializar estratégias e práticas pedagógicas inclusivas. Alicerçou-se na abordagem qualitativa e em fundamentos da pesquisa colaborativa e contou com a participação no estudo de 19 profissionais de uma escola pública de um município do estado do Amapá (AP), sendo 15 professores das classes comuns, uma professora de Educação Especial, uma professora da sala de leitura, uma cuidadora educacional e uma gestora escolar. Os resultados evidenciaram que os conhecimentos teóricos sobre culturas colaborativas e estratégias universais de ensino possibilitaram às equipes de ensino construírem novos conhecimentos, aumentarem as expectativas da aprendizagem dos estudantes da Educação Especial e ampliarem repertórios para elaboração de planejamentos mais adequados de atendimento a todos os estudantes.
Como sublinhado, para que seja materializada uma cultura inclusiva e colaborativa na escola, prevê-se uma reorganização desse espaço com necessárias alternâncias de ações, muitas vezes setorizadas e individualizadas para propostas coletivas, paritárias com tomadas de decisões intencionais. Costa et al. (2023) validaram o uso do Índex para a Inclusão (Booth; Ainscow, 2011) como um instrumento de mudança da cultura, das políticas e das práticas escolares, voltado a ressignificar a organização do ensino e manter o ideário da colaboração como base para o trabalho. Além do exercício coletivo e colaborativo priorizar um processo de autoavaliação de toda a escola, pareceu imperativo introduzir formas mais sistematizadas de trabalho colaborativo nas práticas escolares.
O Índex para a Inclusão é um instrumento de análise do contexto educacional operacionalizado por um conjunto de indicadores que subsidiam a autorrevisão coletiva de todos os aspectos de uma escola, sejam as atividades no pátio, as práticas desenvolvidas nas salas de professores e nas salas de aula, sejam aquelas que perpassam as comunidades e o entorno da escola e o (re)planejamento do contexto escolar, amparado em valores, políticas e práticas inclusivas.
No Brasil, Menino-Mencia et al. (2019) propuseram uma revisão teórica sobre a construção teórico-metodológica e a aplicabilidade do “Índex para a inclusão”. A coleta de dados deu-se em bases de dados nacionais e internacionais, com recorte temporário entre os anos de 2011 e 2016, resultando em 17 artigos. O estudo mostrou que o Índex para a Inclusão tem sido adaptado e desenvolvido no contexto educacional internacional e nacional, dando à rede pública de escolas mais autonomia no tocante às culturas, às políticas e às práticas inclusivas.
Santos, Lima e Oliveira (2020) buscaram estimular um processo de autorreflexão dentro da escola e, a partir disso, propuseram ações que ensejassem transformações quanto ao desenvolvimento de culturas, políticas e práticas de inclusão institucionais. Os resultados demonstraram que os sentidos atribuídos ao termo perpassam pelas ideias de ética como um valor “copiado”. Percebeu-se também que houve uma preocupação da instituição com a implementação de uma cultura que fizesse sentido com os personagens daquele contexto em vez de uma reprodução de uma cultura imposta pelos documentos legais.
Losada-Puente, Baña-Castro e Asorey (2023) investigaram a realidade das salas de aula da perspectiva inclusiva na Comunidade Autónoma da Galiza (Espanha), utilizando uma metodologia quantitativa, descritivo-exploratória, mediante a aplicação do questionário Índex para a Inclusão (Booth; Ainscow, 2011) a uma amostra de 211 estudantes da Educação Básica. Os resultados registraram uma percepção moderadamente boa dos estudantes sobre a inclusão em seus centros educacionais, e mais positiva ligada à cultura e às políticas inclusivas, e não à sua aplicação. Crianças mais novas avaliaram a escola de forma mais positiva quando comparadas às mais velhas. Tudo isso demonstra a capacidade de os estudantes, desde cedo, pensarem criticamente sobre o seu ambiente imediato e as injustiças que nele ocorrem. Os autores sugerem ser necessário dar voz aos estudantes como recurso fundamental na sensibilização para os problemas relacionados com a diversidade e na configuração da aprendizagem nas salas de aula.
O Índex para a inclusão é um guia orientador que tem três premissas centrais para a discussão nas escolas: a) as barreiras à aprendizagem e à participação dos estudantes nas propostas educacionais; b) os recursos de apoio à aprendizagem e à participação; e c) o suporte à diversidade, para romper com a visão de que a deficiência seja o principal gerador das dificuldades educacionais, valorizando a diversidade como um recurso para a aprendizagem e colocando luz sobre as barreiras que dificultam o acesso à escola e às necessidades diferenciadas de suporte.
Adotamos uma noção muito mais ampla de suporte, como sendo todas as atividades que aumentam a capacidade da escola de responder à diversidade das crianças e jovens de modo que sejam igualmente valorizados. Assim, os esforços para descobrir e reduzir as barreiras à aprendizagem e à participação, e a mobilização de recursos, são atividades de suporte (Booth; Ainscow, 2011, p. 44).
O documento “Índex para a Inclusão” está dividido em três dimensões e se estrutura em indicadores e questionários que aprofundam a reflexão e a análise do espaço escolar, orientam a implementação das mudanças e direcionam a avaliação das práticas.
A primeira dimensão propõe a criação de culturas inclusivas por meio do desenvolvimento de valores inclusivos. Esses serão os pilares para as mudanças no espaço escolar, convertendo e modificando esse cenário de individualismo institucionalizado que dificulta o crescimento e o aperfeiçoamento dos envolvidos, porque “[...] limitam o acesso às ideias e às práticas que poderiam oferecer maneiras mais eficientes de se fazer as coisas se fossem pensadas na coletividade” (Fullan; Hargreaves, 2000, p. 58). Serão esses valores que orientarão as políticas e as práticas a serem implementadas na escola.
A segunda dimensão incumbe-se de produzir políticas inclusivas, que garantem que a inclusão esteja presente em todos os planos da escola, incluindo toda a comunidade escolar e os demais serviços de suporte. Isso aumenta a capacidade institucional e estrutural de responder à diversidade existente nesse contexto.
A terceira dimensão refere-se ao ensino e à aprendizagem e ao desenvolvimento de práticas inclusivas nos processos e nas escolhas que envolvem o currículo, as metodologias, a didática, os diferentes estilos e possibilidades de aprendizagem e de representação dos conhecimentos e das aquisições. Tem como fundamento o reflexo das ações, os valores e as políticas inclusivas que marcam e orientam as decisões educacionais definidas nesse espaço.
No Brasil, as escolas já apresentavam dificuldades em desenvolver valores, políticas e práticas inclusivas, contexto que foi agravado pela pandemia da covid-19. Segundo a pesquisa “Resposta Educacional à Pandemia de Covid-19 no Brasil”, feita pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em parceria com as redes de ensino, nos anos de 2020 e 2021, 99,3% das escolas brasileiras suspenderam as atividades presenciais no primeiro ano de pandemia, e somente 9,9% delas voltaram às aulas presenciais no mesmo período, no qual houve em média 279 dias de suspensão das atividades presenciais (Inep, 2022). Em 2021, 82,6% das escolas adotaram atividades híbridas ou presenciais em algum momento do ano letivo, e houve aproximadamente 100 dias de aulas remotas.
Tal contexto ampliou as desigualdades educacionais, e, após a reabertura das escolas, os professores enfrentavam grandes desafios em lidar com a heterogeneidade dos estudantes. Para Morgado, Sousa e Pacheco (2020), o período de isolamento social impôs acentuadas dificuldades às escolas requerendo grande capacidade de colaboração, partilha e inovação entre os atores da comunidade escolar.
Foi a partir daí que emergiu uma proposta de investigação para verificar se um programa abrangente de desenvolvimento profissional de educadores, com base nas inovações sugeridas pela literatura sobre política de inclusão escolar, poderia contribuir para melhorar a capacidade de as escolas responderem à diversidade dos estudantes. Cinco módulos compuseram o programa, a saber: Fomento à Cultura Inclusiva e Colaborativa Escolar; Sistema de Suporte Multicamada; Desenho Universal para a Aprendizagem; Ensino Diferenciado; e Aprendizagem Cooperativa.
Os dados analisados neste artigo são provenientes do primeiro módulo do programa de formação: “Fomento à Cultura Inclusiva e Colaborativa na Escola”. Assim, o objetivo do estudo foi desenvolver coletivamente um Plano de Fomento à Cultura Colaborativa e Inclusiva (PLAFOCE) para uma escola-alvo específica. Destaca-se que a viabilidade deste estudo foi garantida pela possibilidade de construção coletiva proporcionada pelo programa de formação, o qual favoreceu a elaboração conjunta de um plano que fomentasse a cultura colaborativa e inclusiva na escola.
Procedimentos metodológicos
O delineamento baseou-se na Pesquisa-Ação Colaborativa, que dialoga com os objetivos do estudo em função de seu propósito duplo: produzir conhecimento e formar. A Pesquisa-Ação Colaborativa, como a define Tillotson (2000), é uma investigação que envolve professores e gestores com foco em um problema específico e significativo. Calhoun (2008) define a pesquisa-ação colaborativa como uma investigação sistematizada e contínua conduzida para informar e melhorar nossas práticas como educadores.
O projeto foi apresentado à Secretaria de Educação do município, obtendo aprovação e assinatura da Carta de Autorização, que comprovou o assentimento para a realização da pesquisa. Posteriormente, o projeto matriz foi submetido e aprovado pelo Comitê de Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de São Carlos - UFSCar (CAEE: 54848822.1.0000.5504). Após a aprovação, iniciou-se a seleção dos participantes, com a apresentação do projeto e obtenção da anuência mediante assinatura dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Vale ressaltar que, durante todo o processo, foi assegurada a autonomia e liberdade dos participantes na pesquisa, garantindo-se a confidencialidade e a privacidade de suas identidades.
A primeira etapa consistiu em estudar o Índex para a Inclusão, e os participantes tiveram acesso ao arquivo digital do documento. Três aulas online síncronas e dialogadas foram realizadas para apresentar e discutir a proposta.
A segunda etapa consistiu em coletar dados da comunidade escolar para subsidiar a construção coletiva do PLAFOCE. Para isso, foram aplicados três dos questionários listados na Seção 4 do Índex para a Inclusão. O questionário “Indicadores” foi aplicado aos 38 participantes do programa de formação. O questionário “A escola do meu filho” foi respondido por uma amostra de 75 pais ou responsáveis legais pelos estudantes dos 1°, 2° e 3° anos do Ensino Fundamental da escola-alvo; e o questionário “A minha escola” foi respondido por 207 estudantes da escola-alvo.
Na terceira etapa, pesquisadores e participantes analisaram os dados dos questionários ao longo de uma sessão virtual síncrona, e, a seguir, em reuniões na escola, para que os participantes definissem as metas que deveriam conter o PLAFOCE.
Na quarta etapa, em sessões síncronas e assíncronas, foram definidas as estratégias para alcançar cada meta do plano estratégico, que será descrito e analisado no próximo tópico desta investigação.
Resultados e discussão
O PLAFOCE foi elaborado a partir da estrutura proposta pelo Índex para a Inclusão. Para tanto, foram consideradas suas três dimensões (A, B e C), com seis indicadores (A1, A2, B1, B2, C1 e C2), como explicitado na Figura 1. Ao final, o PLAFOCE foi constituído por 18 metas e 108 estratégias a serem implementadas durante o ano letivo. Esse plano foi elaborado de forma colaborativa e embasado nos artefatos coletados pelos questionários, sistematizados, refletidos, selecionadas as prioridades e elaboradas as metas e as estratégias que deveriam ser implementadas ao longo do ano letivo. Portanto, o plano resultou de um processo descentralizado, democrático e emancipatório de tomada de decisões, tal como propõe Veiga (2002).
Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do Plano de Fomento à Cultura Colaborativa e Inclusiva elaborado pela escola.
A construção do PLAFOCE por meio de um processo participativo fortaleceu o caráter democrático da escola. Com apoio em Veiga e Silva (2018, p. 50), compreende-se que
[...] uma escola democrática se compromete com a instituição de processos dialógicos e participativos que rompam com práticas autoritárias e centralizadoras pouco contributivas para a consecução de um projeto educativo voltado à garantia de direitos, sendo as aprendizagens dos estudantes o principal deles, por representarem o sentido de ser e existir da escola, ou seja, a sua função precípua.
Santos et al. (2014) frisam que o princípio fundamental defendido no Índex para a Inclusão está na importância da tomada de decisões conjuntas, que se dá por meio de processos investigativos-ativos que ajudam a tomar decisões e ações compartilhadas. Os autores destacam também que não se faz inclusão por imposição e de maneira solitária, por isso defendem o envolvimento de todos e a construção coletiva. Nesse mesmo sentido, Booth e Ainscow (2011) sublinham que no Índex para a Inclusão não há uma receita para tornar uma escola inclusiva, e que o importante é que as escolas devem começar, onde e como puderem, por meio de planejamento coletivo, buscando apoios quando se fizerem necessários, trabalhando com evidências e registros, executando intervenções e revisando-as.
A seguir será apresentada uma síntese referente a cada uma das três dimensões e suas respectivas metas e estratégias elaboradas, considerando a realidade e necessidade da escola-alvo.
Dimensão A: Criando culturas inclusivas
Esta dimensão refere-se à criação de comunidades seguras, acolhedoras, colaborativas, estimulantes, em que todos são valorizados. Os valores inclusivos compartilhados são desenvolvidos e transmitidos a todos os professores, às crianças e suas famílias, gestores, comunidades circunvizinhas e todos os outros que trabalham na escola e com ela (Booth; Ainscow, 2011, p. 46).
Para a dimensão “Criando Culturas Inclusivas” do PLAFOCE, os participantes identificaram nove metas para a escola-alvo, o que corresponde a 50% do total das metas de todo o plano, como se observou na Figura 1. No tocante às estratégias, observa-se também que esta foi a dimensão mais concentrada, pois 50 das 108 estratégias, ou seja 46%, foram para essa dimensão, que foi a que mais pareceu mobilizar as ações futuras propostas pelos participantes para a escola, mostrando a relevância de mudar a cultura escolar. De fato, Booth e Ainscow (2011) consideram a variável cultura como base para o fortalecimento das políticas e práticas, já que é por meio dela que se visualizam e se sustentam as mudanças nas escolas. O Quadro 1 apresenta as metas, o número e uma síntese das estratégias estabelecidas pelos participantes para essa dimensão.
Dimensão A: CRIANDO CULTURAS INCLUSIVAS | ||
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Indicador A1. Edificando a comunidade | ||
Metas | N° de estratégias | Síntese das estratégias |
1. Estimular a ajuda mútua entre os estudantes na sala de aula | 10 | Trabalho colaborativo: uso de estratégias de ensino valorizando as situações problema, o diálogo, a participação, a diversidade e as atividades de autoconhecimento; participação na organização da rotina e dos espaços. |
2. Promover a colaboração dos pais na escola | 10 | Participação das famílias: familiares e responsáveis na gestão da escola, nos eventos, nos projetos, nas reuniões, nas instâncias de planejamento e decisão, no acompanhamento do trabalho de sala de aula e na comunicação permanente e direta entre escola-família. |
3. Promover a colaboração dos funcionários na escola | 6 | Participação dos funcionários na gestão da escola: nas ações educativas, nos eventos, no apoio ao trabalho de sala de aula, na avaliação do trabalho da escola e do Projeto Político-Pedagógico. |
4. Incorporar práticas democráticas dentro da escola | 8 | Gestão democrática: participação de estudantes e seus familiares nas instâncias de decisão, do diálogo, de assembleias e do compartilhamento de informações sobre organização e funcionamento da escola. |
5. Ampliar a compreensão da ligação entre os povos do mundo | 3 | Diversidade cultural: valorização, no ensino com pesquisa, da diversidade cultural. |
6. Praticar e valorizar o respeito a uma variedade de gênero | 3 | Diversidade de gênero: formação sobre questões da diversidade de gênero entre os estudantes, familiares, professores e funcionários. |
7. Envolver as comunidades locais e a escola no desenvolvimento mútuo | 3 | Parcerias: com a comunidade externa no desenvolvimento de projetos. |
8. Ampliar discussões envolvendo a cultura brasileira e local | 2 | Valorização da cultura: brasileira, regional e das personalidades locais. |
Indicador A2. Estabelecendo valores inclusivos | ||
9. Projetar altas expectativas de todas as crianças | 10 |
Diversificação de estratégias educacionais: uso de diferentes estratégias de ensino e de avaliação para promover experiências de sucesso e valorização do potencial de cada estudante. Reflexão: dos professores sobre suas impressões e expectativas em relação aos estudantes. Definição de metas: metas qualitativas de curto prazo para o enfrentamento das dificuldades apresentadas pelos estudantes. |
Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do Plano de Fomento à Cultura Colaborativa e Inclusiva elaborado pela escola.
Considerando que a dimensão tinha dois indicadores, observa-se que, para o indicador “Edificando a comunidade”, os participantes dedicaram oito das nove metas, com 45 estratégias, sendo esse o indicador que mais mobilizou os participantes dentro dessa dimensão. O maior número de estratégias desse indicador (10) foi dedicado tanto para fomentar a aprendizagem cooperativa, ou a ajuda mútua entre colegas, quanto para a colaboração escola-famílias.
No Índex para a Inclusão é dada ênfase na participação das crianças durante o processo de aprendizagem na escola: “[...] a ideia de que a diversidade pode ser um recurso para a aprendizagem dos estudantes, por meio da colaboração entre todas as crianças e adultos” (Booth; Ainscow, 2011, p. 43). Silva (2020) também considera como um dos principais papéis da escola, dentro de uma perspectiva colaborativa, o fortalecimento da parceria família-escola.
Outra meta destacada no PLAFOCE diz respeito a como fomentar a gestão democrática (8) e melhorar o relacionamento entre funcionários da escola (6). O Plano inclui uma compreensão do modelo de gestão adotado no ambiente escolar como um bom orientador das práticas, para além das orientações legais - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN (Brasil, 1996; Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica - DCNEB (Brasil, 2013); Plano Nacional de Educação - PNE (Brasil, 2014). Libâneo, Oliveira e Toschi (2007, p. 333) sinalizam que, ao fazer da escola uma “instância educadora” para todos, é preciso considerar a “[...] autonomia da escola e da comunidade educativa, a relação orgânica entre a direção e a participação da equipe escolar e o envolvimento da comunidade escolar”. Isso ajuda a democratizar a escola, tornando-a um espaço de participação, diálogo e construção coletiva, onde todos se sentem representados e respeitados, independentemente de sua origem social, cultural, de gênero ou econômica, como também da melhoria da qualidade da educação, garantindo que todos os estudantes tenham acesso a uma educação de qualidade, independentemente de suas condições.
Estratégias para ampliar a compreensão entre os povos do mundo, a diversidade de gênero e as diferenças culturais presentes na realidade brasileira também se fizeram presentes, mas em menor número de estratégias, bem como a meta de estabelecer parceria com a comunidade. Esse discurso apresenta as intenções do plano construído pelos participantes como uma oportunidade de mudança na cultura escolar, que, de fato, atenda a diversidade existente nesse espaço.
Para o segundo indicador, “Estabelecendo valores inclusivos”, os participantes fixaram como meta projetar altas expectativas para todos os estudantes. As estratégias que emergiram dessa meta relacionaram-se: a) à diversificação de estratégias educacionais quanto ao uso de diferentes estratégias de ensino e de avaliação para promover experiências de sucesso e valorização do potencial de cada estudante; b) ao processo reflexivo dos professores sobre suas próprias impressões e expectativas no que tange aos estudantes; c) à definição de metas qualitativas para o enfrentamento das dificuldades apresentadas pelos estudantes.
Xavier e Oliveira (2020) estudaram as relações entre o desempenho escolar e os elementos que caracterizam o ambiente na sala de aula, e se concentraram nos efeitos diretos e indiretos das atitudes docentes (relação professor-estudante percebida e expectativas docentes) sobre o aprendizado da Matemática de estudantes do Ensino Fundamental. As evidências permitiram concluir que os níveis de percepção associados na relação professor-estudante são capazes de potencializar os efeitos das expectativas sobre o desempenho escolar. Por exemplo, se o professor estabelecer baixas expectativas, é esperado que ele se esforce menos e interaja menos com os estudantes que ele julga ter um desempenho ruim. Os estudantes percebem esse modo de agir e se tornam menos motivados, o que acaba comprometendo seu aprendizado.
Projetar altas expectativas sobre os estudantes implica acreditar que eles são capazes de aprender e se desenvolver, independentemente de suas condições físicas, sensoriais, intelectuais, sociais, culturais ou econômicas. Nessa relação pautada em valores inclusivos, há uma comunicação de encorajamento e de valorização do potencial do outro em detrimento de suas possíveis limitações. Isso ajuda a compreender a necessidade de ampliar e diversificar as oportunidades de acesso aos bens que são comuns a todos. No caso da escola, significa remover as barreiras que impedem a melhoria do desempenho acadêmico e pessoal dos estudantes.
Em síntese, na primeira dimensão observaram-se, dentre os aspectos destacados, propostas para melhorar as parcerias na escola. Baseado nisso, entende-se que construir uma educação alicerçada nos princípios inclusivos nunca será a simples promulgação de uma lei, mas germinará com o esforço e envolvimento da comunidade escolar. Por isso, a consolidação de uma cultura inclusiva não se dará de forma improvisada, mas previamente fundamentada e muitas vezes edificada por meio de muitos esforços, debates e reflexões.
Dimensão B: Produzindo políticas inclusivas
Esta dimensão garante que a inclusão permeie todos os planos da escola e envolva todos. Todas as formas de suporte estão ligadas numa única estrutura que pretende garantir a participação no desenvolvimento sistêmico da escola. As políticas encorajam a participação das crianças e professores, desde quando estes chegam à escola. Elas encorajam a escola a atingir todas as crianças na localidade e minimiza as pressões exclusionárias. As políticas de suporte envolvem todas as atividades que aumentam a capacidade da ambientação de responder à diversidade dos envolvidos nela, de forma a valorizar a todos igualmente (Booth; Ainscow, 2011, p. 46).
Para fomentar a produção de políticas inclusivas, os participantes estabeleceram três metas, correspondendo a 17% do total das metas criadas (18), como se pode observar na Figura 1, apresentada anteriormente. Das 108 estratégias do PLAFOCE, cerca de 20 (18,5%) foram para essa dimensão, que foi a que menos pareceu mobilizar as ações futuras propostas pelos participantes para escola-alvo. O Quadro 2 apresenta as metas, o número e uma síntese das estratégias estabelecidas pelos participantes para essa dimensão.
Dimensão B: PRODUZINDO POLÍTICAS INCLUSIVAS | ||
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Indicador B1. Desenvolvendo a escola para todos | ||
10. Ampliar espaço para desenvolvimento de atividades | 8 | Utilização dos diferentes espaços da escola: valorização dos espaços externos da sala de aula e da escola como ambientes apropriados para ensinar e aprender. |
11. Garantir sistema de segurança dos espaços | 4 | Preservação e cuidado: individual e coletivo dos espaços da escola e cuidado com a segurança. |
Indicador B2. Organizando o apoio à diversidade | ||
12. Responder às necessidades de aprendizagem dos estudantes | 8 | Gestão do ensino: criação de condições necessárias para garantir a aprendizagem, a avaliação apropriada, o engajamento e a concentração dos estudantes, atendendo a diversidade e promovendo a igualdade de oportunidade para todos os estudantes. |
Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do Plano de Fomento à Cultura Colaborativa e Inclusiva elaborado pela escola.
Para essa segunda dimensão, o Índex propõe dois indicadores. O primeiro refere-se ao desenvolvimento de uma escola para todos, para os quais foram derivadas duas metas (ampliar os espaços de utilização e garantir segurança). O segundo indicador alude à organização de apoios a estudantes diversos, para o qual foi derivada uma meta e oito estratégias.
Essas metas visavam a melhor “utilização dos diferentes espaços da escola”, ou seja, tornar os espaços externos da sala de aula e da escola apropriados para ensinar e aprender, bem como ter responsabilidade pela “preservação, manutenção, cuidado” e a segurança individual e coletiva desses espaços. Algumas estratégias vincularam-se à questão de infraestrutura, como a “ampliação de espaços físicos para o desenvolvimento de projetos”, “melhorar a aparência da biblioteca” e “criar ambientes de lazer durante o recreio”. Outras refletiram a importância de atividades extraclasse e extracurriculares, como “utilizar outros espaços dentro da escola, como biblioteca e videoteca” e “vivenciar momentos externos com passeios culturais”. A noção de que os estudantes possam desenvolver diferentes propostas em diferentes espaços, durante uma mesma aula, é vista como uma parte essencial das experiências e da aprendizagem na escola (Booth; Ainscow, 2011).
Quanto à capacidade institucional em responder à diversidade presente neste espaço, a “gestão do ensino” foi apontada como uma necessidade de aprimoramento, especialmente a avaliação responsiva às diferenças dos estudantes. Há sugestões para aumentar o engajamento e a concentração dos estudantes nas aulas, atender à diversidade e promover a igualdade de oportunidades para todos por meio de avaliações apropriadas às condições de aprendizagem e diversificação de estratégias de avaliação.
A avaliação como um ato de investigação das aprendizagens dos estudantes, a fim de redirecionar o processo de ensino é ainda um ideal a ser alcançado pela escola e pelos professores. Luckesi (2011) menciona que geralmente esse processo é por etapas, iniciando-se na análise entre o que foi previsto no currículo (conteúdos) e os métodos para sua implementação (proposta pedagógica). A partir dessa análise, é possível qualificar os resultados obtidos pelos estudantes, comparando seu desempenho com os indicadores educacionais previstos no projeto político-pedagógico e nos planos de ensino dos professores. Por fim, se necessário, cabe elaborar intervenções para corrigir as ações com os estudantes, garantindo-lhes as aprendizagens que não puderam ser efetivadas. Assim configurada, a avaliação da aprendizagem apresenta as características de “diagnóstica, inclusiva, socializante” (Luckesi, 2012, p. 439), comprometida com a aprendizagem dos estudantes.
Tomlinson (2008) sugere organizar a avaliação mediante uma abordagem intencional, cíclica e contínua, voltada aos processos de aprendizagem dos estudantes. A ideia é que isso produziria informações mais personalizadas sobre os perfis de aprendizagem desses estudantes e seus interesses, viabilizando, por meio desse conhecimento, responder com diferenciações (representadas por metodologias, estratégias de ensino e avaliação eficazes), nas formas de acesso ao currículo.
Uma avaliação promotora de engajamento dos estudantes precisa ser vista como um “[...] instrumento que estimule o interesse e motive o estudante, e não uma arma de tortura ou punição” (Haydt, 1997, p. 27). Nesse sentido, a avaliação desempenha uma função energizante.
Dimensão C: Produzindo práticas inclusivas
Esta dimensão refere-se a desenvolver o que se ensina e aprende, e como se ensina e aprende, de forma a refletir valores e políticas inclusivas. Está ligada à aprendizagem, à experiência, local e globalmente, bem como a direitos, incorporando assuntos de sustentabilidade. A aprendizagem é orquestrada de modo que o ensino e as atividades de aprendizagem se tornam responsivos à diversidade de jovens na escola. As crianças são encorajadas a serem ativas, reflexivas, aprendizes críticas e são vistas como um recurso para a aprendizagem umas das outras. Os adultos trabalham juntos de modo que todos assumem responsabilidade pela aprendizagem de todas as crianças ((Booth; Ainscow, 2011, p. 46).
Como mostrou a Figura 1, para a dimensão “Produzindo práticas inclusivas”, os participantes elencaram seis metas, ou 1/3, além de 32 estratégias, ou 30% do plano total. O Quadro 3 mostra as metas, o número e uma síntese das estratégias estabelecidas para essa dimensão.
DIMENSÃO C: PRODUZINDO PRÁTICAS INCLUSIVAS | ||
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Indicador C1. Construindo o currículo para todos | ||
13. Explorar os ciclos de produção e consumo de comida | 6 | Alimentação saudável: orientação e vivências sobre alimentação saudável, produção dos alimentos, visando alimentação de qualidade e evitando o desperdício. |
14. Conhecer e empregar a aprendizagem sobre as tecnologias de comunicação e informação (TICs) | 3 | Uso das TICs: comunicação dos estudantes com a comunidade escolar por meio das tecnologias e redes sociais. |
15. Envolver as crianças no processo de criação da literatura, artes e música | 6 | Valorização da arte, cultura, literatura e música: vivências, oficinas e eventos envolvendo os estudantes e os familiares. |
16. Demonstrar e exercitar a aprendizagem da ética, poder e governo | 7 | Formação ética e cidadã: assembleias, dinâmicas, situações-problema, construção coletiva de princípios para convivência, discussões sobre acontecimentos do cotidiano da sala de aula. |
Indicador C2. Orquestrando as aprendizagens | ||
17. Compreender que as avaliações devem nortear o sucesso do aprendizado |
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Formação continuada: para os professores sobre avaliação formativa, diversificação de estratégias e de instrumentos na avaliação da aprendizagem dos estudantes. |
18. Proporcionar e garantir tempo para planejamento e revisão | 6 | Valorização do planejamento: coletivo, entre pares, entre professor da sala regular e profissionais de apoio, com o coordenador. |
Fonte: Elaborado pelas autoras a partir do Plano de Fomento à Cultura Colaborativa e Inclusiva elaborado pela escola.
A dimensão envolve dois indicadores, sendo quatro deles relacionados ao indicador “Construindo uma escola para todos”. Por meio de vivências sobre o tema, foram salientadas propostas atinentes à alimentação saudável, produção dos alimentos para alimentação de qualidade e sem desperdício. E ainda o “uso de tecnologias” melhores para a comunicação dos estudantes com a comunidade escolar por meio das redes sociais; “valorização da arte, cultura, literatura e música” por meio de vivências, oficinas e eventos com estudantes e familiares, além da “formação ética e cidadã” com assembleias, dinâmicas, construção coletiva de princípios para convivência, discussões sobre acontecimentos do cotidiano da sala de aula. Observou-se que, nesse indicador, as metas e as estratégias ressaltaram a importância de ampliar o protagonismo dos estudantes mediante experimentações e vivências.
Losada-Puente, Baña-Castro e Asorey (2023) enfatizam que a proposta do Índex para a Inclusão incentiva as escolas a serem mais inclusivas por meio de políticas educativas e práticas diárias, bem como propõem culturas escolares de participação, em que todos aprendem, pensam e tomam decisões em conjunto. Os autores frisam a relevância do ouvir as vozes dos estudantes para alavancar mudanças para uma educação mais inclusiva. Desse modo, entende-se que as políticas perpassam desde as normas em caráter nacional, estadual e municipal, como também se formam no dia a dia pela representação clara e intencional do processo de regulação da prática e das ações do cotidiano escolar.
Para o segundo indicador, “Orquestrando a aprendizagem”, foram estabelecidas duas estratégias. A primeira é a “formação continuada”, um meio de melhorar a avaliação formativa para a diversificação de estratégias e de instrumentos na avaliação da aprendizagem dos estudantes, e a segunda é a “valorização do planejamento” coletivo, entre pares, entre professor da sala regular e profissionais de apoio com o coordenador.
Mendes, Vilaronga e Zerbato (2014) mostram a importância de garantir a (in)formação permanente para professores, como uma das principais estratégias para superar as barreiras e fortalecer as práticas educacionais para atender a todos os estudantes. Silva (2020) frisa que a formação continuada alicerçada em uma proposta colaborativa, centrada nas demandas da escola, é eficaz para o desenvolvimento profissional. Também ajuda a quebrar os paradigmas antigos e desconstruir as culturas escolares marcadas pelo isolamento e solidão profissional.
Há um consenso entre especialistas, segundo Imbernón (2022) de que alguns critérios organizativos na formação do professor precisam ser considerados quando se propõe que haja mudanças na gestão da sala de aula. Dentre eles, destacam-se que: a) regimentos e normas escolares sejam assumidas de maneira colegiada e refletidas na prática; b) para uma formação de professores eficaz, é preciso que os formadores deixem claros os objetivos que pretendem com a formação e apoiem os esforços dos professores para mudar as práticas; c) os esforços nas mudanças curriculares, no ensino e nas práticas de sala de aula tenham como objetivo último melhorar a aprendizagem dos estudantes. E reafirma que uma formação permanente adequada contribui para que novas formas de atuação educativa se incorporem na prática de sala de aula. Imbernón (2022) entende como formação continuada aquela
[...] centrada na escola transforma a instituição educacional em lugar de formação prioritário em relação às demais formações. [...] baseia-se na pesquisa-ação, converte-se em um processo baseada no diálogo na medida que implanta um tipo de compreensão compartilhada pelos participantes sobre as tarefas profissionais e os meios para melhorá-las, e não um conjunto de papéis e funções aprimorados mediante normas e regras técnicas (Imbernón, 2022, p. 67-68).
Assim considerado, a produção decorrente da formação ofertada neste trabalho superou a perspectiva formal e técnica e fomentou um processo dialético de ação-reflexão-ação. Nesse processo de formação e pesquisa, fica evidente o potencial da produção acadêmica no campo da Educação Especial para o desenvolvimento do processo de inclusão escolar, corroborando o estudo de Casagrande e Oliveira (2024).
Considerações finais
A pesquisa que sustentou este estudo provocou a reflexão dos participantes acerca das metas indicadas no Índex para a Inclusão e para que criassem planos pensando a situação da escola. Como processo, o fomento à cultura inclusiva começou com a análise dos dados à luz das metas e da construção de estratégias por membros da comunidade escolar. Isso superou propostas padronizadas produzidas externamente à escola por empresas sem conhecimento da realidade escolar e sem compromisso com a qualidade da educação.
Para as 18 metas extraídas a partir do Índex, os participantes construíram um rol de 108 estratégias, sinalizando as ações possíveis e recomendadas por eles para aprimorar os processos educacionais no âmbito dos valores, políticas e práticas pedagógicas na escola. É possível concluir que os participantes consideram, na construção da cultura inclusiva, princípios da gestão democrática, como a cooperação, o diálogo, a participação e o respeito à diversidade. Além disso, ficou também demonstrado que o incentivo à ajuda mútua entre os estudantes da sala de aula por meio do trabalho cooperativo e a perspectiva participativa e dialogada repercute na organização da rotina e dos espaços da escola.
Os participantes acham que é importante que as famílias participem da gestão da escola, projetos, reuniões, eventos, planejamento e decisão, acompanhamento do trabalho de sala de aula e comunicação direta e constante entre escola e família. Assim, a construção de escolas inclusivas não tem receita, não se trata de algo pronto e acabado que pode ser alcançado quando se segue um check list; pelo contrário, trata-se de um ideal a ser buscado. Nesse sentido, qual o papel do Índex para fomentar a cultura inclusiva na inclusão?
O Índex para a Inclusão é um instrumento abrangente cuja finalidade é ajudar os diferentes atores presentes na escola a encontrarem os próprios caminhos em busca do desenvolvimento da escola. O Índex deve ser visto como uma proposta que levanta questões e gera reflexões-ações; no entanto, a tarefa de agir dependerá dos indivíduos envolvidos no processo.
Finalmente, destaca-se que parcerias colaborativas entre escolas e universidades são caminhos promissores e se constituem como lócus de formação para todos que têm demonstrado seu potencial em pesquisar, tanto para construir novos conhecimentos como para garantir formação de qualidade, por meio da pesquisa de formação. Essa é uma proposta teórico-metodológica direcionada pela Pesquisa Ação Colaborativa e pelo entendimento da escola pública como espaço de práticas educacionais, e que pesquisa se faz com e não sobre os professores.