INTRODUÇÃO
O conjunto dos números irracionais possui especificidades sofisticadas que podem tornar seu ensino complexo, o que gera preocupações entre os professores e atrai a atenção dos pesquisadores no meio acadêmico (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017, 2019; ROCHA, 2018; RIPOLL, RANGEL, GIRALDO, 2016). Entre as grandes dificuldades e/ou insuficiências relacionadas ao ensino e à aprendizagem de números irracionais, Broetto e Santos-Wagner (2019, p. 729) apontam que a formação de professores de matemática é um dos aspectos cruciais das investigações científicas.
Ao abordarem o conceito de irracionalidade, muitos professores utilizam-se de atividades, por vezes propostas em livros didáticos ou materiais instrucionais, que apresentam estruturas conceituais falhas sobre a natureza dos números irracionais. A análise conceitual de atividades didáticas nem sempre é objeto de apreciação durante a formação inicial do professor de matemática, o que pode contribuir para que muitos docentes, no decorrer de suas rotinas, não atentem para possíveis falhas contidas na elaboração de materiais didáticos disponíveis.
O desenvolvimento de um olhar crítico e a capacidade de avaliar uma determinada atividade, de forma a perceber erros conceituais, podem estar relacionados ao domínio do conteúdo por parte do docente, assim como podem contemplar outros aspectos importantes e muitas vezes negligenciados no decorrer da formação dos professores. Diante de tais considerações, descrevemos neste artigo uma pesquisa de campo que se propôs a investigar os aspectos a serem considerados no ensino do conceito de irracionalidade, na formação inicial dos futuros professores de matemática da educação básica.
Um exemplo recorrente de número irracional é a relação entre o comprimento de uma circunferência e seu diâmetro, denominada número π. Não raras são as vezes em que esse número é apresentado aos estudantes como um exótico objeto matemático que mede 3,14, sem a devida exploração conceitual a respeito de sua natureza matemática, bastando memorizar seu valor para utilizá-lo nas fórmulas, quando necessário.
Estudado desde a Antiguidade, o número π possui uma história envolta em uma atmosfera de curiosidade e interesse que se desdobra ao longo do tempo. Inicialmente o fascínio girava em torno de descobrir seu valor o mais aproximado possível. Só recentemente, em meados do século XX, é que os matemáticos puderam perceber que, em vez de buscar o “[...] verdadeiro valor de π, poderiam mostrar que não há ‘valor verdadeiro’, ou que esse valor é impossível” (ROQUE, 2012, p. 347). O motivo para tal afirmação seria a gigantesca quantidade de casas decimais que esse número possui.
Valendo-se do número π e de sua trajetória histórica como eixo condutor, temos o intuito de investigar os aspectos a serem considerados no ensino do conceito de irracionalidade lançando mão de uma atividade inadequada, que aplicamos intencionalmente, a um grupo de 17 licenciandos. Para a produção de dados, adotamos a abordagem qualitativa e a observação participante em uma sala de aula da disciplina Matemática na escola de uma Universidade Federal, situada na cidade do Rio de Janeiro.
No estudo, os dados produzidos foram submetidos a um Estudo Sistemático de Vocabulário (BARDIN, 2009) e contribuíram para demonstrar que não se deve priorizar um aspecto em detrimento de outros. Além do conhecimento conceitual do conteúdo é preciso atentar, de maneira imprescindível, para as dimensões crítica e reflexiva ao se abordar esse conteúdo na formação inicial de professores.
NÚMERO Π: BREVE HISTÓRIA E CURIOSIDADES
Diversas publicações alegam que o Papiro Ahmes traz uma aproximação de 3,166 feita pelos egípcios, que do Tablete de Susa consta um valor de aproximadamente 3,125 calculado pelos babilônios e que o valor 3 é utilizado para se referir ao π em passagens da Bíblia. Esses seriam alguns dos registros históricos utilizados para comprovar que muitas civilizações antigas teriam se interessado pelo assunto e se debruçado em seus cálculos. Entretanto, concordamos com Roque (2012, p. 67) quando afirma que “[...] seria um tremendo anacronismo dizer que os povos mesopotâmicos e egípcios já possuíam uma estimativa para π, pois esses valores estavam implícitos em operações que funcionavam, ao invés de serem expressos por números considerados constantes universais”. Livre dessas controvérsias e trazendo uma concepção de π com a qual operamos atualmente, a obra de Arquimedes de Siracusa (287 a 212 a.E.C.) seria o documento mais antigo em que é encontrado o processo infinito “[...] utilizado para estabelecer limites para a razão entre a circunferência e o raio do círculo” (ROQUE, 2012, p. 170) e através do qual se obteve, em representação decimal, um valor aproximado de 3,1408 < π < 3,1429.
Utilizando o mesmo processo manual de Arquimedes, os cálculos de Ptolomeu (90-168 d.E.C.) permitiram uma aproximação de 3,14161616... para o valor de π. No século V, os chineses chegaram a 3,14159 e no século XVII, o holandês Ludolph van Ceulen e o austríaco Christoph Grienberger obtiveram um valor para π com 35 e 39 casas decimais, respectivamente. A partir de então, com o desenvolvimento do cálculo diferencial e integral e o abandono do processo manual, sucessivas aproximações foram obtidas para o referido valor. Contudo, foi somente no século XVIII que Johann Heinrich Lambert provou sua irracionalidade, e que a letra π - primeira letra da palavra perímetro em grego (περίμετρος) - passou a ser sua representação, por influência de Leonhard Eüler.
Com a participação dos computadores passou-se a conhecer uma quantidade de casas decimais de π sem precedentes. Essa trajetória iniciada pelo ENIAC (Electronic Numerical Integrator And Computer), em 1949, obteve 2.037 casas decimais e alcançou, em 2019, mais de 31,4 trilhões de dígitos gerados com as ferramentas de cálculo do Google Cloud, obtidos por Emma Haruka Iwao, uma das desenvolvedoras da nuvem. Em 2020, matemáticos suíços alcançaram 50 trilhões de casas decimais utilizando-se de um supercomputador, sendo que em 2021 eles se superaram, atingindo 62,8 trilhões de dígitos do número π.
Apesar de tantos avanços nas aproximações, segundo Broetto e Santos-Wagner (2017, p. 131-132) ainda há questões em aberto, como em Teoria dos Números: “[...] diz-se que um número é normal se todos os seus dígitos aparecem de forma completamente aleatória, isto é, a probabilidade de aparecerem é a mesma. Não se sabe ainda se π é um número normal”.
Sem atentar para essas questões formais, há quem se deixe encantar pela aura criada em torno desse número que tem um dia especialmente dedicado a ele, 14 de março. A data é grafada, na língua inglesa, como 3/14 e vem a ser o dia de nascimento de Albert Einstein (1879) e da morte de Stephen Hawking (2018). Entre outras curiosidades, podemos encontrar também a sequência de nossa data de nascimento, com dia, mês e ano, nas casas decimais de π, um serviço de localização que é oferecido por um site bastante visitado1.
Um outro movimento interessante é o pilish, uma prática centenária que consiste em um estilo de escrita de textos em que a quantidade de letras da sequência de palavras coincide com o valor de cada dígito de π, ou seja, a primeira palavra deve possuir três letras, a segunda, uma, a terceira, quatro e assim sucessivamente. Pode-se ficar surpreso com a quantidade e a diversidade de produções dos praticantes de pilish.
Embora algumas passagens de sua história possam criar uma imagem de natureza inacessível, envolta em mistérios, mostrando que o número π causa interesse e continua a despertar curiosidades desde a Antiguidade, pode ser que essas circunstâncias gerem atualmente um efeito diferente dentro dos muros da escola básica.
A QUESTÃO CONCEITUAL E A DUPLA DESCONTINUIDADE
A natureza misteriosa e inacessível do π, em vez de instigar a curiosidade, pode ser que cause um efeito contrário nos alunos, suscitando a ideia de estarem diante de um elemento obscuro. Ademais, dependendo da forma como for apresentado em sala de aula, compreender o número π poderá também se constituir em uma tarefa árdua e desafiadora.
Mas apesar de ter entrado entre as 20 primeiras colocadas no vestibular de Medicina de uma das universidades mais concorridas do meu tempo de juventude, entrei carregando o peso de ter tirado uma péssima nota em Matemática. Sim. Matemática era o meu maior terror. Apesar de estudar muito, de fazer todos os exercícios de todas as apostilas e livros, eu não tinha compreensão, nem entendimento dos processos matemáticos. [...] Uma vez, já adulta, lendo com minha filha uma revista, Ciência Hoje das Crianças, descobri por que o número π (pi) era igual a 3,1416...: Bastava medir qualquer circunferência e dividir por seu diâmetro, o resultado era esse. Como uma mágica. Não importava qual a circunferência, se uma roda de carro, um fundo de caneca ou o claro de uma bicicleta. Medimos juntas todas as circunferências da casa e fizemos as contas. Batata: 3,1416. Por que nunca tinham me ensinado isso na escola? Por que tive que decorar? E por que nunca me esclareceram por que um número era representado por uma letra, e ainda mais uma letra grega, e não russa ou chinesa? Quantas perguntas simples e loucas eu poderia ter feito se a Matemática me tivesse sido apresentada de outra maneira? Será que eu teria gostado mais de Matemática? Será que eu teria tido um melhor desempenho dos exames de Matemática?2 (BORBA, ALMEIDA, GRACIAS, 2018, p. 15-16)
Segundo Broetto e Santos-Wagner (2017), o π, objeto da Cena narrada, é um número notável. Dentre os motivos apontados pelos autores para que ele goze de tal status, destacam-se sua presença frequente nos livros didáticos, nas fórmulas matemáticas e o fato de ser um número irracional e transcendente. Ser transcendente implica que o π “[...] não é raiz de nenhuma equação algébrica com coeficientes inteiros, isto é, não pode ser obtido utilizando-se apenas régua e compasso”. (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017, p. 151)
Mas afinal, o que seria um número irracional? Se considerarmos as definições comumente encontradas nos livros didáticos, os irracionais podem ser definidos como: “[...] i) números que não podem ser representados como frações de inteiros; ii) números cuja representação decimal é infinita e não-periódica; iii) números reais que não são racionais” (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017, p. 34). Nota-se nessas três definições que o número irracional é caracterizado em termos do que ele não é: “Não é uma fração de inteiros, não é uma decimal finita, não é uma decimal infinita periódica e não é um número racional”, o que, segundo os autores pode vir a “[...] provocar sérios danos na estruturação dos conceitos matemáticos e na possível compreensão desses números pelos estudantes”. (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017, p. 34-35)
Essa caracterização, além de não contribuir para o entendimento do conceito, nos leva a uma outra controvérsia, apontada tanto por Broetto e Santos-Wagner (2017) quanto por Ripoll, Rangel e Giraldo (2016, p. XXI), que é a circularidade da definição: “[...] os reais são ‘todos’ os números, os irracionais são os números reais que não são racionais e os reais são os números que são racionais ou irracionais. Assim, a definição dos reais pressupõe a sua própria existência”. Uma trajetória cíclica de pensamento que se inicia com os reais, passa pelos irracionais e volta à definição dos reais, podendo ser processada dessa forma, continuamente. Embora haja outras definições pertinentes que Broetto e Santos-Wagner (2017) discutem em seu estudo, eles acreditam que, em se tratando da educação básica, não serão essas outras definições que poderão contribuir para tornar mais fácil a tarefa do professor de ensinar o conceito de número irracional para os estudantes.
Atrelado à questão conceitual, um outro aporte que vem a dificultar o ensino de números irracionais na educação básica pode estar relacionado à formação dos professores. É inegável, e importante demarcar, que os professores precisam possuir conhecimento sobre o conteúdo da disciplina que lecionam. Da articulação entre esse conhecimento e o saber pedagógico, resulta a noção que Shulman (1987) denomina de saber pedagógico do conteúdo. Este saber foi utilizado como referência por Ball e colaboradores para especificar o que chamamos, no campo da educação matemática, de conhecimento de matemática para o ensino (BALL, BASS, 2003; BALL, THAMES; PHELPS, 2008). A constituição desse conhecimento pode sofrer diversas interferências no processo de formação dos professores, dentre as quais, a descrita a seguir:
[O conjunto] R é construído como o completamento de Q via cortes de Dedekind ou sequências de Cauchy, deduzindo-se dessa estrutura as demais propriedades, e muito pouco (ou nada) é esclarecido sobre os conflitos normalmente existentes sobre este assunto. Daí, os licenciados voltam ao Ensino Básico, agora como professores, sem o devido esclarecimento sobre tal assunto (RIPOLL, 2004, p. 2)
O exposto por Ripoll, quando descreve como se desenvolve o processo de construção de R na universidade, se encaixa perfeitamente como parte de um cenário de ruptura que Klein qualifica como dupla descontinuidade:
Os jovens estudantes universitários são confrontados com problemas que nada têm a ver com as coisas que estudaram na escola e, naturalmente, esquecem-nas rapidamente. Quando, depois de completarem o curso, se tornam professores confrontados com a necessidade de ensinar a matemática elementar [...] não conseguem estabelecer praticamente nenhuma relação entre esta tarefa e a matemática que aprenderam na universidade [...]. (KLEIN, 2009, p. 1)
De um modo geral, esse cenário pode ser observado nos cursos de licenciatura em matemática, mas ao considerarmos a questão conceitual e a dupla descontinuidade, somos levados a uma indubitável constatação: desenvolver, construir ou ampliar o conceito de número irracional no ensino fundamental demonstra ser uma tarefa bastante complexa. Talvez seja esta a resposta para a pergunta “Por que nunca tinham me ensinado isso na escola?”. Os números irracionais não são apenas difíceis de compreender, mas igualmente, difíceis de ensinar. E difíceis de ensinar porque são difíceis de compreender, enredando alunos e professores num círculo vicioso difícil de romper (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2019).
METODOLOGIA, PRODUÇÃO E ANÁLISE DE DADOS
O presente estudo é o resultado de uma proposta de trabalho que surgiu a partir das reflexões geradas na disciplina de Análise real, do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PEMAT/UFRJ), da qual os dois primeiros autores participaram como alunos do terceiro autor, no segundo semestre de 2019.
Inspirados pelas discussões e reflexões advindas do envolvimento com o tema em nossa rotina de estudos na época, propusemo-nos a investigar que aspectos devem ser considerados ao se abordar o ensino do conceito de irracionalidade na formação inicial dos professores que atuarão na educação básica. Por meio de abordagem qualitativa e metodologia de observação participante, nossa investigação teve como contexto de produção de dados uma turma diurna de Matemática na escola, disciplina regular da estrutura curricular do curso de licenciatura em matemática de uma Universidade Federal situada na cidade do Rio de Janeiro. A turma era formada majoritariamente por jovens licenciandos do quarto período da graduação que ainda não haviam cursado a disciplina de Análise real.
A ementa da disciplina informava que durante as aulas de Matemática na escola os alunos iriam observar e discutir o conteúdo matemático desenvolvido em turmas de ensino fundamental e médio da rede oficial, analisando os principais pontos de dificuldades relacionados ao ensino de matemática nesses níveis de escolaridade, cumprindo uma carga horária total de 60 horas, sendo 75% teórica e 25% em práticas de estágio supervisionado na escola básica. Foi em uma das aulas teóricas, com duração de quatro horas, no contexto da rotina dos estudantes na própria universidade, que realizamos a atividade que delineamos previamente. O acompanhamento da aplicação da atividade foi feito através de registros escritos, quais sejam, os produzidos pelos 17 licenciandos presentes na aula e os provenientes das anotações em nosso diário de campo, que foram submetidos um tipo de Análise de Conteúdo, mais especificamente, ao estudo sistemático de vocabulário e à análise qualitativa da unidade de vocabulário (BARDIN, 2009).
Com o objetivo de investigar os aspectos a serem considerados no ensino do conceito de irracionalidade, na formação de professores de matemática que futuramente atuarão na educação básica, escolhemos nos ocupar do número π, por suas especificidades conceituais e, principalmente, por ser um número bastante recorrente nos conteúdos de outras áreas do conhecimento, não só de matemática. Durante o processo de delineamento e escolha, buscamos atividades que pudessem contribuir para que os alunos compreendessem o conceito e a natureza do π em seu primeiro contato, o que costuma acontecer no oitavo ano do ensino fundamental. Nessa busca, não encontramos uma atividade que se mostrasse mais atraente e que fosse diferente daquela que já conhecíamos, a qual é narrada na Cena.
Considerando-se o nível de escolaridade que escolhemos, a demonstração matemática de que π é irracional, estava fora de questão por motivos óbvios, dada a sua complexidade e a faixa etária dos alunos. Encontramos também outros dois métodos: a antifairese e o método da exaustão de Arquimedes (ROQUE, 2012). São métodos interessantes, mas não atendiam aos nossos objetivos de levar os participantes desse estudo a refletir sobre como ensinar, a um adolescente de 13-14 anos, os processos e significados formais relativos à irracionalidade de um número, neste caso, à irracionalidade de π. E mais, como recomendam Fiorentini e Oliveira (2013), esperávamos que a atividade fosse discutida e analisada criticamente pelos licenciandos, avaliando-se que limitações possuiria e que contribuições poderia trazer para o processo de entendimento do número π, pelos seus futuros alunos do ensino fundamental.
Cabe ressaltar que nem todo material produzido na aula, contexto da investigação, foi objeto de análise para este artigo, cujo foco é responder à questão norteadora, analisando os dados produzidos durante a realização da atividade lúdica de medição de circunferências. As respostas escritas, produzidas pelos próprios alunos, no decorrer da atividade, foram analisadas segundo um estudo sistemático do vocabulário (BARDIN, 2009) que distinguiu as palavras em duas unidades de vocábulos: palavras plenas e palavras-instrumento. As primeiras dizem respeito às palavras “portadoras de sentido”, já as palavras-instrumento são as “palavras funcionais de ligação” (BARDIN, 2009, p. 82) tais como preposições, artigos, pronomes, conjunções etc. Consideramos em nossa análise apenas a unidade de palavras plenas, composta por verbos, adjetivos, substantivos e advérbios, que passaram por análise de ocorrência e identificação de vocábulo, ou seja, cada conjunto de respostas dadas a uma determinada pergunta foi assim tratado.
Para que se tenha uma ideia geral de como se desenrolou o encontro, faremos aqui uma breve descrição até chegarmos à atividade objeto deste artigo e na sequência apresentaremos os dados produzidos com sua respectiva análise.
O encontro começou com uma exposição sobre a definição de números irracionais para além de complementar de Q em relação a R, problematizando-se a representação dos conjuntos numéricos na perspectiva do diagrama de Venn (RIPOLL, RANGEL, GIRALDO, 2016). Também foram feitas atividades de identificação de números irracionais entre uma variedade de numerais apresentados (BROETTO, 2017), assim como a demonstração da irracionalidade da raiz de dois, acompanhada de uma discussão histórica relacionada ao mito da crise dos incomensuráveis (ROQUE, 2012). Até aqui a aula se desenvolveu de forma a atender as necessidades de entendimento do conceito de irracionalidade por parte dos licenciandos. Na sequência, à luz da perspectiva da Educação Matemática Crítica (SKOVSMOSE, 2014) e do pensamento freireano (FREIRE, 1981), adotamos uma abordagem dialógica, no sentido de explorar, com base no conceito de números irracionais, a atividade que passaremos a narrar.
Introduzimos a atividade com um breve histórico e algumas curiosidades sobre o número π. Logo após, pedimos que se organizassem para trabalhar em duplas e distribuímos barbante, réguas, círculos de tamanhos variados e uma pequena ficha que continha a descrição da atividade (Figura 1). Foram formados sete duplas e um trio. Neste ponto faz-se necessário explicitar as limitações contidas nessa atividade e que assim são apontadas:
Todavia, é preciso ter consciência de que, tanto com uma moeda, quanto com uma lata de refrigerante, o resultado de cada uma dessas experiências será um número racional. O que se pretende mostrar com a realização desses tipos de experiências – que a razão entre o comprimento e o diâmetro de objetos circulares é uma constante irracional – traz consigo duas dificuldades intrínsecas: a primeira é mostrar que se trata de uma constante, pois a medida obtida para cada objeto utilizado é ligeiramente diferente; a segunda é mostrar que se obtém um número irracional, já que qualquer instrumento de medida sempre fornecerá um número racional para o comprimento e o diâmetro dos objetos, obtendo-se assim um quociente de números racionais, que é um número racional.
(BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2019, p. 736)
Ao realizarem as medidas, os diferentes grupos de alunos registraram variados valores finitos para o comprimento e para o diâmetro. Dividindo-se um valor finito por outro, obtém-se como resposta, outro valor finito. Apesar de chegarem a um valor aproximado a 3,14, evidentemente, tal resultado não se trata de um número irracional (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2019). Após a realização dessa atividade, tendo-se em vista as limitações supracitadas e considerando-se que os licenciandos puderam refletir sobre o conceito de irracionalidade momentos antes, durante o encontro, perguntamos por escrito, o que eles haviam achado da atividade proposta.
Houve aprovação unânime da atividade, o que pode ser percebido através da análise das respostas feitas através do estudo sistemático do vocabulário (BARDIN, 2009). Descartadas as palavras-instrumento, identificamos a respectiva ocorrência, indicada a seguir entre parênteses, de cada palavra plena: interessante (4), legal (3), aluno (2), atividade (2), estimular (2), lúdico (2) e muito (2). As demais palavras que tiveram ocorrência única e ajudaram a compor as respostas dos alunos foram: participação, noção, medida, mais, irracional, introduzir, interativo, ideia, forma, envolver, empiricamente, difícil, desenvolvimento, desenvolvedor, descobrir, construtivo, conceito, circunferência, bom, bastante, barbante, aula, ativo, aproximação, achar. Embora tenhamos olhado para a frequência das palavras, procedemos de acordo com o que BARDIN (2009) indica quando sugere que possibilidades de comparação com outros textos e uma análise qualitativa da unidade de vocabulário podem fornecer mais informações sobre o sentido do discurso.
Desse modo, observamos o conjunto de vocábulos e notamos a prevalência de palavras positivas para opinar sobre a atividade, as quais comparamos com as impressões e falas desse momento da aula, registradas em nosso diário de campo, tais como: “Os alunos se mostraram muito receptivos à atividade proposta”, “É desse tipo de atividade que eu gosto!” ou “Muito legal!” (DIÁRIO DE CAMPO, 2019). Essa comparação nos levou a inferir que, para os licenciandos, a atividade trabalhada seria indicada para se apresentar o π e estimular a aprendizagem dos alunos numa sala de aula do ensino fundamental.
Assim que recolhemos os registros da primeira, entregamos a segunda pergunta: Quais são as limitações da atividade que vocês terminaram de realizar? Ao lançarmos essa pergunta, imediatamente eles souberam identificar os problemas conceituais que essa atividade trazia, aproximando-se do que Broetto e Santos-Wagner (2019) bem destacaram e que pode ser notado nas respostas transcritas a seguir:
Alunos A e B: A limitação é que nem todos os alunos achariam 3,14 e, além disso, π seria escrito como fração sendo que é irracional. Logo, ficaria confuso para o aluno entender a definição de números irracionais.
Alunos C e D: Por π ser um número transcendental, ele nunca poderá ser definido como c\d por medidas empíricas. Será sempre uma aproximação.
Alunos E e F: A atividade é muito atrativa e didática, porém o problema é quanto as medidas poderem variar por conta de serem pessoas diferentes fazendo os processos. (DADOS DA PESQUISA, 2019)
Ao realizar o estudo sistemático do vocabulário das respostas escritas da segunda pergunta, foi possível perceber a emergência de um padrão diferente do que foi observado nas respostas dadas à primeira pergunta. As palavras plenas com mais de uma ocorrência foram: limitação (4), medir (4), número (3), não (3), medida (3), irracional (3), conseguir (3), como (3), circunferência (3), atividade (3), trabalhar (2), escrever (2), aproximação (2) e aluno (2). Identificamos um total de 62 palavras plenas, a maioria com ocorrência única, das quais informaremos apenas algumas que indicam a percepção dos licenciandos em relação às limitações percebidas na atividade: variar, racional, processo, problema, perímetro, medição, incapaz, exatidão, empírico, difícil, dificuldade, diferente, definição, criança, confuso etc.
Depois que recolhemos os registros feitos pelos participantes relativos à segunda pergunta, prosseguimos oralmente com alguns questionamentos e reflexões, dentre os quais:
a) Qual o valor encontrado nas medições? Vocês encontraram o valor de π?
b) Da maneira como foi aplicada aqui, que tipo de conceito, essa atividade poderia nos levar a desenvolver com os alunos do ensino fundamental?
c) Poderíamos fazer algum tipo de ajuste para que essa atividade pudesse ser aplicada eficazmente?
d) Que outras atividades seriam eficientes para que os alunos pudessem compreender o conceito de irracionalidade de π? (DADOS DA PESQUISA, 2019)
Nossa intenção foi suscitar o debate a respeito da atividade da qual haviam terminado de participar e se eles, como professores, aplicariam às suas futuras turmas.
DISCUSSÃO E REFLEXÕES
Para além das definições, o que poderá então, ajudar os professores da educação básica no ensino de números irracionais? Nesse sentido, nosso estudo corrobora a literatura que nos aponta dois importantes caminhos. Primeiro, quando indica a necessidade de se criar um ambiente problematizador que dê suporte e “[...] sentido à criação dos números irracionais, antes mesmo de sua definição” (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017, p. 40). Segundo, quando afirma que não se deve deixar de lado as “[...] reflexões sobre o ambiente problemático da gênese desses conceitos” (RIPOLL, RANGEL, GIRALDO, 2016, p. XXI). Os autores salientam ainda que essas “[...] reflexões podem nem mesmo se fazer explicitamente perceptíveis na sala de aula, nem serem visíveis aos olhos dos alunos, mas devem estar presentes como pano de fundo na reflexão dos professores” (RIPOLL, RANGEL, GIRALDO, 2016, p. XXI).
É nesse segundo caminho que vamos nos deter um pouco mais a partir de agora. Ao nos permitirmos refletir sobre os números irracionais, talvez sejamos tomados pela dúvida. Se nos deixarmos levar pela intuição, seguramente diríamos haver um modo de representar qualquer numeral em forma de fração, contrariando a primeira definição de irraconais descrita por Broetto e Santos-Wagner. Intuitivamente poderíamos pensar que entre uma infinidade de números, não é possível que não haja uma combinação de inteiros capaz de gerar o quociente que buscamos. Ledo engano, pois o que ainda hoje nos desafia os sentidos, foi objeto de estudo na antiga matemática grega e teve suas conclusões registradas em Os Elementos de Euclides.
Alheios à atribuição de um valor numérico para as grandezas geométricas, os gregos já sabiam que nem sempre seria possível subdividir uma grandeza, de forma que ela se ajustasse dentro de outra, uma quantidade finita de vezes. Essas grandezas, que não guardavam entre si uma relação de proporcionalidade, eram por eles entendidas, como incomensuráveis. Entre os exemplos mais recorrentes de grandezas incomensuráveis está a relação entre o quadrado de lado 1 e sua respectiva diagonal. Pode-se constatar, empiricamente, que a medida do lado desse quadrado cabe mais de uma vez, e menos de duas, dentro da medida de sua diagonal.
E se fôssemos dividindo o lado desse quadrado em unidades cada vez menores? Será que não encontraríamos uma subunidade que caberia um número finito de vezes dentro de sua diagonal? Se esse tipo de pergunta não emerge naturalmente entre os alunos em uma sala de aula, poderia fazer parte dos recursos provocativos de um professor que, em vez de optar por impor conceitos prontos, adotasse uma postura que buscasse privilegiar a “[...] produção e negociação de seus significados”(FIORENTINI, OLIVEIRA, 2013, p. 923).
Na Grécia, seus ancestrais utilizavam os números para contagem, mas não para medidas. Atualmente, tanto para contagem quanto para medidas, as grandezas e suas relações são traduzidas para um valor numérico. Em suma, o que os gregos tratavam como grandezas incomensuráveis, nós chamamos de números irracionais.
Quando pensamos em matemática escolar, poderíamos dizer que o número irracional é uma verdade da cultura matemática difícil de acreditar se apenas confiarmos em nossos sentidos e intuição. Talvez seja fácil acreditar que “[...] um dos maiores desafios do professor de Matemática pode ser o de convencer seus alunos a respeito da existência desses números” (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017, p. 38). Será que Nietzsche (2015, p. 30) tem razão ao afirmar que “Quanto mais abstrata é a verdade que queres ensinar, tanto mais deves enganar os sentidos”?
Apesar dos obstáculos, acreditamos que esse é um caminho que precisa ser percorrido. Iniciar pela definição do que venha a ser um número irracional talvez não seja uma boa ideia porque, em geral, as definições não dizem muito e pouco esclarecem a respeito da natureza desse número (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017). Logo, suscitar questões e levantar dúvidas que ponham em xeque sua natureza ou existência pode contribuir mais para a aprendizagem de números irracionais do que as apresentações convencionais dos motivos pelos quais se deva acreditar que eles, de fato, existam.
Como mediadores, nós professores, devemos evitar a tentação de somente produzir perguntas fechadas que façam com que nossos alunos transitem apenas por um caminho previamente traçado e limitado. Em vez disso, podemos provocá-los com perguntas que possam ser desencadeadoras de outras perguntas, provenientes dos próprios estudantes, e os façam duvidar de suas próprias certezas. Desestabilizar as certezas é, sem dúvida, uma ação mais profícua que convencer um aluno de um saber, mesmo que esse conhecimento já seja aceito e consolidado pela comunidade científica. Um estudante merece a chance de se surpreender com a descoberta de outros humanos. Repetir sem refletir e reelaborar nossa bagagem de conhecimento sem considerar sua construção histórica contribui menos do que poderia para nosso avanço social, cultural e científico.
Exemplo de número irracional, o π é recorrentemente identificado pelos estudantes apenas pela repetição do seu valor, como se o mesmo fosse o racional 3,14. Depois de adulta, a personagem da Cena, se surpreende ao descobrir o motivo pelo qual o número π media 3,1416... Essa Cena até poderia ser fictícia, mas não, ela é narrada por uma reconhecida pesquisadora3 no prefácio que redigiu para um livro. A surpresa dela ilustra uma, dentre as muitas reações, de pessoas que descobrem depois de muitos anos para quê serviria aquele conhecimento que tiveram que memorizar na escola. A Cena reflete também uma das concepções que os alunos têm sobre a natureza da matemática, a de que “[...] alunos médios não devem querer compreender a Matemática, mas apenas memorizá-la e aplicar aquilo que aprenderam de um modo mecânico” (AMADO, CARREIRA, FERREIRA, 2016, p. 39). Esta é uma concepção que se concretiza com feições de verdade, quando tomamos o π como referência.
Em função do desconhecimento de outra atividade que tenha o mesmo apelo lúdico, a maioria dos licenciandos participantes da nossa pesquisa concordou que fazer com que os alunos procedam à medição de diversos objetos com diferentes circunferências, relacionando-as aos seus diâmetros, pode ser uma boa maneira de iniciá-los no contato com o número π. Mas houve um consenso de que não se deve parar por aí. Como forma de ampliar e despertar questionamentos, seria necessário que o professor não deixasse de provocar seus alunos e de fazê-los pensar a respeito, tirando-os de sua zona de conforto. Buscando contribuir, ao longo da atividade, com novas perguntas que possibilitassem despertar a curiosidade dos alunos a respeito dos números irracionais: E se...?, Será que...?, Daria certo se...?, E se considerarmos...?, Por que isto...?, É possível que...?, Pode ser que...?, E se tentarmos...?. Perguntas que pudessem proporcionar uma possível instauração de um cenário para investigação, desafiando assim, os alunos a formularem questões e a procurarem explicações (SKOVSMOSE, 2014). Entendemos o cenário para investigação como um “[...] ambiente que pode dar suporte a um trabalho de investigação” (SKOVSMOSE, 2014, p. 98).
Sugerimos como exemplos algumas dessas perguntas, que poderiam ajudar a ampliar a reflexão em relação ao conceito da irracionalidade de π:
i) Se o número π é originário da divisão do comprimento pelo diâmetro, será que não existe uma circunferência cujos comprimento e diâmetro sejam números inteiros?
ii) Se fixarmos um valor inteiro para o diâmetro, o que acontece com o valor do comprimento da circunferência?
iii) E sendo o contrário? Se fixarmos um valor inteiro para o comprimento, o que acontece com o valor do diâmetro dessa circunferência?
iv) E se criássemos uma unidade de medida que fizesse com que um certo número de subdivisões coubesse tantas vezes no comprimento e tantas outras vezes no diâmetro? Ou seja, uma subdivisão u em que o comprimento fosse n. u e seu diâmetro m. u.
v) Será que não podemos subdividir o diâmetro de forma que essa subdivisão caiba um número finito de vezes dentro desse comprimento de circunferência?
É importante pontuar, que não esperamos que essas perguntas façam parte de um roteiro ou que busquem respostas únicas, mas o que sugerimos é que possamos deslocar nossos alunos para o campo das incertezas, para além das definições e trajetórias previsíveis.
Testar as diversas hipóteses em um software de geometria dinâmica também poderia contribuir para o surgimento de outras possibilidades não pensadas inicialmente e que talvez só se originassem no contato direto com esse tipo de recurso.
Fazê-los se interessar pela natureza do número π e pelo desenvolvimento de suas estruturas conceituais talvez evite que, no futuro, como na Cena, nossos alunos se perguntem “Por que nunca tinham me ensinado isso na escola? Por que tive que decorar? E por que nunca me esclareceram por que um número era representado por uma letra, e ainda mais uma letra grega, e não russa ou chinesa?” (BORBA, ALMEIDA, GRACIAS, 2018, p. 15).
Por que restringir possibilidades, se como professores, podemos ampliá-las? Ainda assim, talvez haja uma grande chance de não “convencermos” (BROETTO, SANTOS-WAGNER, 2017) boa parte dos alunos a respeito da existência dos números irracionais e de deixá-los com mais dúvidas que convicções. Mas uma coisa é certa, os faremos pensar a respeito.
Deixar o aluno instigado é o combustível certo para a produção de perguntas em série, podendo ser o ponto de partida para a instauração de uma boa relação dialógica em sala de aula, para o incentivo à autonomia na busca e ampliação do conhecimento, permitindo-nos, assim, criar possibilidades de quebra do ciclo da dupla descontinuidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao apresentar a história do número π, tomando-o como referência para pensar a dupla descontinuidade e o conceito de irracionalidade, nosso objetivo foi investigar os aspectos a serem considerados ao se abordar o ensino do conceito de irracionalidade, na formação inicial dos futuros professores da educação básica. Destacaram-se, sobretudo, os que se referem às dimensões crítica e reflexiva na formação de professores de matemática. Assim, ao refletirmos sobre tais aspectos, mostramos a importância de se proporcionar aos licenciandos a oportunidade de investigar o conceito de irracionalidade e de ampliar seu conhecimento para além dos limites impostos pelas definições e por atividades fechadas, que costumam induzir a respostas previsíveis.
Após realizada a aplicação, ao serem perguntados oralmente, os próprios licenciandos que participaram do estudo não souberam responder o porquê de não terem identificado ou exposto as limitações da atividade sobre o número π logo na primeira pergunta que fizemos. As limitações foram imediatamente identificadas por eles na resposta à segunda pergunta, sem dificuldades ou necessidade de explicações complementares.
Diante disso, acreditamos ser importante investigações que busquem compreender que razões levam professores com conhecimento conceitual de um determinado conteúdo a adotarem atividades inadequadas em suas práticas. Não podemos afirmar, mas gostaríamos de salientar como possibilidade, que a receptividade dos licenciandos ao que é lúdico pode também ter contribuído para embaçar a interpretação e desmobilizar sua capacidade de avaliação da atividade proposta.
Talvez, esses sejam alguns dos indícios de que os formadores não podem perder de vista a dimensão crítica e reflexiva na formação de professores. Principalmente, no que diz respeito à importância de se estimular os licenciandos a desenvolverem um olhar atento para avaliar os limites e as possibilidades de atividades que costumam ser utilizadas no ensino de conteúdos matemáticos, não só de números irracionais. Aos futuros professores, é preciso que se ofereçam oportunidades nas quais possam ser despertados para o desenvolvimento desse olhar atento, para avaliar atividades e tarefas com as quais irão se deparar no seu dia a dia profissional, em um movimento de resistência ao fazer automatizado.
Ficou evidente que o desenvolvimento de um olhar crítico e a capacidade de avaliar uma dada atividade, de forma a perceber erros conceituais, não estão relacionados apenas ao fato de o licenciando dominar, ou não, o conteúdo em questão. Mas sim, se ele passou pela oportunidade de ser despertado, no sentido de considerar e atentar para falhas conceituais. E isso não se alcança quando se privilegia um ensino eminentemente tradicional, no qual não se vivencia uma diversidade de ambientes de aprendizagem. Ressaltamos aqui a importância de se levar em conta a dimensão crítica da formação que comporte a análise e a desconfiança em relação ao que todo mundo faz e que se apresenta como comum, correto e definitivo, mas que, sem uma cuidadosa reflexão, pode nos induzir a contribuir para que apresentemos estruturas conceituais incorretas ou falhas aos nossos alunos.
O estudo evidenciou a importância do conhecimento conceitual do conteúdo, mas mostrou também que apenas essa dimensão não é suficiente. Suas fronteiras devem, não só serem ampliadas, mas extrapoladas na prática reflexiva sobre como os conceitos se constituem e nas formas como são ensinados.