INTRODUÇÃO
A qualidade de vida (QV) é definida como a percepção que um indivíduo tem sobre a sua posição na vida, dentro do contexto dos sistemas de cultura e valores nos quais está inserido e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (World Health Organization, 1998). A autopercepção sobre saúde acontece ainda na infância e está relacionada à QV, conceitos estes, que são formulados a partir dos contextos socioeconômicos e culturais em que o indivíduo faz parte (Rezende, Lemos, Medeiros, 2017).
A pesquisa sobre QV não se restringe somente à área de saúde, mas, constitui um debate interdisciplinar para o diálogo entre os diversos setores, na busca de avanços significativos para os indivíduos das mais diferentes culturas. É de suma importância, estudos que tratem da QV nos vários aspectos da vida humana, inclusive, na educação formal.
Uma população saudável tem maiores possibilidades de apoderar-se de conhecimentos da educação formal e informal (Casemiro, Fonseca, Secco, 2014). Dessa forma, é importante a realização de estudos que ampliem o conceito de interdependência entre os bons resultados de avaliações formativas e a QV dos estudantes, uma vez que, para que o aluno desenvolva as habilidades relacionadas à aprendizagem formal, é importante que ele apresente bons índices de QV.
O sucesso acadêmico de um indivíduo depende de sua saúde, sendo assim, é necessário que haja intervenções da saúde pública no ambiente escolar para favorecer a saúde dos estudantes (Birch, Auld, 2019). Nesse sentido, o ambiente escolar é um importante espaço para o diálogo entre saúde e educação, oportunizando muitas possibilidades para a promoção da saúde aos escolares (Birch, Auld, 2019).
A educação de jovens e adultos (EJA) é uma modalidade de educação assegurada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) n. 9.394/96 para estudantes fora da faixa etária idade-série, e está dentro de amparos legais que caracterizam e definem objetivos para essa modalidade de ensino (Brasil, 1996). Dessa forma, pretende-se utilizar os resultados deste estudo como subsídio a políticas públicas, na busca de estratégias pedagógicas que valorizem a aprendizagem dos alunos fora de faixa etária idade-série, bem como, se pensar em intervenções que favoreçam a QV dessa população.
Nesse contexto, a metodologia freiriana orienta que, além de estimular a leitura da palavra, a escola deve estimular a leitura de mundo, auxiliando no desenvolvimento da gênese do sujeito crítico, do sujeito reflexivo, do sujeito que anseia por liberdade e vencer as cadeias do oprimido promovendo o exercitar de sua autonomia (Freire, 1979).
Em geral, os estudantes da EJA são pessoas que abandonaram os estudos cedo para poder trabalhar, indivíduos de classe financeira baixa, moradores de periferia, ou idosos que, após muitos anos distante da escola, resolvem retornar (Reis et al., 2017). Esse contexto, indica uma realidade social crítica daqueles que têm condições econômicas, sociais e culturais aquém daquelas pessoas que possuem índices de escolarização superior. Situações essas, que muitas vezes estão relacionadas a pouca QV, já que essa condição é a satisfação do indivíduo no que diz respeito à sua vida cotidiana (World Health Organization, 1998).
A relevância desse estudo está pautada na relação da qualidade de vida e o reflexo na aprendizagem do aluno da EJA. O estudante dessa modalidade não deve ser visto como vítima, mas como um indivíduo capaz de desenvolver suas competências, mesmo enfrentando os desafios de uma vida cansada e difícil (Soares, Giovanetti, Gomes, 2011).
Este estudo tem como objetivo: analisar a qualidade de vida de estudantes da EJA e o reflexo na aprendizagem.
MÉTODO
Trata-se de um estudo exploratório e documental, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros da Universidade de Pernambuco, com abordagem quantitativa e descritiva na construção e na análise de dados. O estudo foi realizado em duas escolas municipais: Escola Municipal Anália Barbosa de Souza, localizada na cidade de Juazeiro (BA) e na Escola Municipal Santa Terezinha, localizada em Petrolina (PE). Fizeram parte do estudo, 50 estudantes, acima de 18 anos, devidamente matriculados nas etapas: I, II, III, IV e V, e nas turmas de 3ª e 4ª fase, do turno noturno da EJA.
Os dados foram coletados por meio de três instrumentos de coleta: o primeiro foi um questionário estruturado com questões fechadas contendo dados sociodemográficos construídos pelos próprios pesquisadores; o segundo, foi um instrumento estruturado e organizado pela Organização Mundial de Saúde: Whoqol Bref. Este instrumento consta de 26 questões divididas em quatro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente (Fleck et al., 2000).
O Whoqol Bref trata-se de um instrumento curto, de rápida aplicação que pode ser utilizado em diversas populações, saudáveis ou não, podendo assim, contribuir para tomadas de decisões que melhorem a qualidade de vida das pessoas (Kluthcovsky, Kluthcovsky, 2009). O instrumento Whoqol Bref apresenta “[...] características satisfatórias de consistência interna, validade discriminante, validade de critério, validade concorrente e fidedignidade teste-reteste” (Kluthcovsky, Kluthcovsky, 2009). As questões apresentam-se em escala tipo Likert, com diferentes graus de intensidade (nada a extremamente), capacidade (nada a completamente), frequência (nunca a sempre) e avaliação (muito insatisfeito a muito satisfeito; muito má a muito bom). As pontuações de cada domínio foram transformadas numa escala de 0 a 100 e expressas em termos de médias, de acordo com o manual elaborado pela equipe do Whoqol, sendo que médias mais altas sugerem melhor percepção de QV.
O terceiro instrumento tratou-se de uma coleta de informações em um banco de dados sobre o rendimento escolar de cada participante, este realizado no Sistema de Informação Educacional Municipal utilizado pelos municípios: “Escola Presente” (Juazeiro-BA) e “Programa de Informatização da Gestão” (PROIG) (Petrolina-PE).
As variáveis relacionadas ao perfil sociodemográfico e econômico foram: Idade, sexo, estado civil, raça/cor, renda familiar, filhos, emprego e vínculo empregatício, moradia, carga horária de trabalho, hábitos de vida. As variáveis relacionadas ao processo ensino-aprendizagem foram: turma em que se encontra em curso: primeira, segunda e terceira etapas (ensino fundamental I), quarta e quinta etapa (ensino fundamental II), participação em projeto pedagógico ofertado pela escola, rendimento escolar.
As informações das questões objetivas do questionário com os dados sociodemográficos e do questionário Whoqol Bref foram organizadas e tabuladas em planilhas de Excel. Todos os dados foram analisados de forma descritiva. Os dados foram analisados, inicialmente, a partir da estatística descritiva (distribuição de frequência e medidas de tendência central e dispersão). Para as variáveis qualitativas foram realizados testes paramétricos t de Student e ANOVA oneway e Correlação de Pearson, considerando a normalidade da distribuição das variáveis numéricas pelo teste Shapiro Wilk.
RESULTADOS
Fizeram parte da pesquisa 50 estudantes da EJA, sendo 25 (50,0%) do sexo masculino e 25 (50,0%) do sexo feminino. A média de idade foi de 31,2 anos (DP 12,1). A maioria dos estudantes, 36 (72,0%), se declararam pardos. Em relação ao estado civil, 24 (48,0%) se declararam solteiros. Grande parte dos pesquisados declararam morar em casa própria, 40 (80,0%), com média de 4 (DP 2) moradores nessas residências.
Em relação a vida profissional, 26 (52,0%) declararam estar trabalhando no momento. No total, 39 (78,0%) pesquisados, declararam não ter vínculo empregatício de carteira assinada. A renda mensal, da maioria, 32 (64,0%), é de menos de um salário mínimo, sendo que, 16 (32,0%) alunos declararam viver com um salário mínimo (Tabela 1).
Média | DP | |
---|---|---|
Idade | 31,2 | 12,1 |
Número de pessoas na residência | 4 | 2 |
n | % | |
Sexo | ||
Feminino | 25 | 50,0 |
Masculino | 25 | 50,0 |
Cor | ||
Branca | 5 | 10,0 |
Preta | 7 | 14,0 |
Parda | 36 | 72,0 |
Amarela | 1 | 2,0 |
Indígena | 1 | 2,0 |
Estado civil | ||
Solteiro | 24 | 48,0 |
Casado | 20 | 40,0 |
Divorciado | 1 | 2,0 |
Separado | 2 | 4,0 |
Companheiro | 3 | 6,0 |
Tipo de moradia | ||
Própria | 40 | 80,0 |
Alugada, emprestada ou outros | 10 | 20,0 |
Está trabalhando atualmente? | ||
Não | 24 | 48,0 |
Sim | 26 | 52,0 |
Trabalho Formal | ||
Não | 39 | 78,0 |
Sim | 11 | 22,0 |
Renda mensal | ||
Menos de um salário mínimo | 32 | 64,0 |
Um salário mínimo | 16 | 32,0 |
De dois a três salários mínimos | 2 | 4,0 |
Fonte: as autoras, 2024
A maioria dos pesquisados, 12 (40,0%), declararam estar frequentando uma turma de EJA para melhorar sua condição de trabalho, sendo que 11 (22,0%) afirmaram que desejam ingressar em uma universidade, 10 (20,0%) declararam estar em uma turma de EJA para aprender a ler e escrever, 8 (16,0%) estudantes afirmaram querer concluir o ensino básico, e apenas 1 (2,0%) estudante declarou estar na EJA para ter um convívio social.
Grande parte dos pesquisados, 39 (78,0%), consideram a escola um ambiente agradável. A maioria, 28 (56,0%), declarou ser excelente a qualidade das aulas que eles assistem.
Quanto aos projetos pedagógicos, 27 (54,0%) dos estudantes afirmaram que as escolas desenvolvem. Contudo 36 (72,0%) não participam de projetos pedagógicos promovidos pela escola. A maioria, 42 (84,0%), considerou-se um estudante dedicado (Tabela 2).
n | % | |
---|---|---|
Propósito para frequentar o EJA | ||
Concluir o ensino básico | 8 | 16,0 |
Ingressar em uma universidade | 11 | 22,0 |
Melhorar a condição de trabalho | 20 | 40,0 |
Ter um convívio social | 1 | 2,0 |
Aprender a ler e escrever | 10 | 20,0 |
Como considera sua escola | ||
Um ambiente ruim | 2 | 4,0 |
Um ambiente nem bom nem ruim | 9 | 18,0 |
Um ambiente agradável | 39 | 78,0 |
Qualidade das aulas assistidas | ||
Ruim | 1 | 2,0 |
Regular | 3 | 6,0 |
Boa | 18 | 36,0 |
Excelente | 28 | 56,0 |
A escola desenvolve projetos pedagógicos? | ||
Não | 23 | 46,0 |
Sim | 27 | 54,0 |
Você participa de algum projeto? | ||
Não | 36 | 72,0 |
Sim | 14 | 28,0 |
Você se considera um estudante dedicado? | ||
Não | 8 | 16,0 |
Sim | 42 | 84,0 |
Fonte: as autoras, 2024
Em relação aos resultados de aprendizagem, nota-se que os melhores resultados são do componente curricular ciências da natureza (4,9) e os menores resultados são em matemática (3,9).
Ao analisar os scores de qualidade de vida geral e seus domínios, evidenciaram-se valores médios mais elevados para o domínio psicológico 66,9 (DP 16,4). Verificaram-se scores médios mais baixos para o domínio ambiente 54,8 (DP 17,6). O score de QV foi de 62,7 (DP 15,2) (Tabela 3). Analisando as correlações entre as notas do primeiro bimestre dos alunos e os scores de QV e seus domínios, não foi observada significância estatística na análise (p > 0,05).
Média | Desvio Padrão | Mínimo | Máximo | |
---|---|---|---|---|
Língua Portuguesa | 4,6 | 3,5 | 0,0 | 9,0 |
Matemática | 3,9 | 3,7 | 0,0 | 10,0 |
Ciências da Natureza | 4,9 | 3,9 | 0,0 | 10,0 |
História | 4,7 | 3,8 | 0,0 | 10,0 |
Geografia | 4,3 | 4,0 | 0,0 | 10,0 |
Domínio físico | 62,6 | 14,3 | 17,9 | 100,0 |
Domínio psicológico | 66,9 | 16,4 | 25,0 | 100,0 |
Domínio social | 66,3 | 25,6 | 0,0 | 100,0 |
Domínio ambiente | 54,8 | 17,6 | 9,4 | 90,6 |
Escore Qualidade de Vida | 62,7 | 15,2 | 13,1 | 96,6 |
Fonte: as autoras, 2024
Analisando as associações entre as características sociodemográficas dos alunos da EJA de Petrolina e Juazeiro, foi possível observar um pior score de QV no domínio social para aqueles que residiam em casa alugada (score médio 50,8) em comparação aos que tinham o tipo de moradia como casa própria (score médio 70,2; p-valor 0,031). As demais características não apresentaram diferenças significativas entre os scores de QV (Tabela 4).
QV | Domínio físico | Domínio psicológico | Domínio social | Domínio ambiente | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Média | p-valor | Média | p-valor | Média | p-valor | Média | p-valor | Média | p-valor | |
Sexo | ||||||||||
Masculino | 61,3 | 0,524* | 60,0 | 0,193* | 69,0 | 0,374* | 63,3 | 0,413* | 52,8 | 0,427* |
Feminino | 64,1 | 65,3 | 64,8 | 69,3 | 56,8 | |||||
Cor | ||||||||||
Branca | 62,0 | 0,967** | 60,0 | 0,909** | 61,7 | 0,771** | 73,3 | 0,956** | 53,1 | 0,760** |
Preta | 62,9 | 65,8 | 64,9 | 67,8 | 53,1 | |||||
Parda | 63,1 | 62,5 | 68,6 | 65,1 | 56,2 | |||||
Amarela | 59,7 | 67,9 | 58,3 | 75,0 | 37,5 | |||||
Indígena | 51,7 | 53,6 | 54,2 | 58,3 | 40,6 | |||||
Estado civil | ||||||||||
Solteiro | 62,1 | 0,983** | 61,5 | 0,955** | 66,1 | 0,721** | 64,2 | 0,472** | 56,4 | 0,768** |
Casado | 63,1 | 63,6 | 65,4 | 72,1 | 51,1 | |||||
Divorciado | 70,3 | 57,1 | 75,0 | 83,3 | 65,6 | |||||
Separado | 65,4 | 67,9 | 81,3 | 50,0 | 62,5 | |||||
Companheiro | 60,6 | 64,3 | 70,8 | 50,0 | 57,3 | |||||
Tipo de moradia | ||||||||||
Própria | 64,4 | 0,106* | 63,8 | 0,239* | 66,8 | 0,902* | 70,2 | 0,031* | 56,8 | 0,100* |
Alugada | 55,7 | 57,9 | 67,5 | 50,8 | 46,6 | |||||
Está trabalhando atualmente | ||||||||||
Não | 59,8 | 0,203* | 60,6 | 0,327* | 66,0 | 0,702* | 60,4 | 0,118* | 52,2 | 0,332* |
Sim | 65,3 | 64,6 | 67,8 | 71,8 | 57,1 | |||||
Seu trabalho é de carteira assinada | ||||||||||
Não | 61,1 | 0,183* | 61,3 | 0,201* | 66,2 | 0,589* | 64,3 | 0,299* | 52,7 | 0,126* |
Sim | 68,1 | 67,5 | 69,3 | 73,5 | 61,9 | |||||
Renda Mensal | ||||||||||
Menos de um salário mínimo | 60,2 | 0,305** | 60,8 | 0,488** | 66,4 | 0,856** | 62,2 | 0,265** | 51,5 | 0,211** |
Um salário mínimo | 67,5 | 66,1 | 68,5 | 75,0 | 60,4 | |||||
De dois a três salários mínimos | 63,0 | 64,3 | 62,5 | 62,5 | 62,5 |
Fonte: as autoras, 2024
*t de Student
**ANOVA oneway
Diante da análise de associação da QV com as atividades pedagógicas desenvolvidas pelos alunos da EJA e a percepção acerca da escola, foi possível identificar que os alunos que consideravam a escola um ambiente nem bom nem ruim apresentaram pior score no domínio psicológico (score médio 55,1; p-valor 0,049) (Tabela 5).
QV | Domínio físico | Domínio psicológico | Domínio social | Domínio ambiente | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Média | p-valor | Média | p-valor | Média | p-valor | Média | p-valor | Média | p-valor | |
Com qual propósito você frequenta uma turma da EJA | ||||||||||
0,840** | 0,851** | 0,989** | 0,516** | |||||||
Concluir o ensino básico | 66,9 | * | 61,6 | ** | 68,7 | ** | 75,0 | ** | 62,1 | 0,670** |
Ingressar em uma universidade | 59,3 | 60,1 | 66,7 | 59,9 | 50,6 | |||||
Melhorar sua condição de trabalho | 63,6 | 62,3 | 67,5 | 69,6 | 55,0 | |||||
Ter um convívio social | 67,3 | 60,7 | 62,5 | 83,3 | 62,5 | |||||
Aprender a ler e escrever | 60,7 | 67,1 | 65,0 | 58,3 | 52,2 | |||||
Como você considera sua escola | ||||||||||
Um ambiente ruim | 67,0 | 0,053** | 55,4 | 0,082** | 64,6 | 0,049** | 79,2 | 0,274** | 68,8 | 0,053** |
Um ambiente nem bom nem ruim | 51,7 | 54,0 | 55,1 | 54,6 | 43,1 | |||||
Um ambiente agradável | 65,0 | 65,0 | 69,8 | 68,4 | 56,7 | |||||
Como você avalia a qualidade das aulas que você assiste | ||||||||||
Ruim | 49,7 | 0,850** | 50,0 | 0,833** | 45,8 | 0,570** | 50,0 | 0,817** | 53,1 | 0,978** |
Regular | 60,5 | 64,3 | 65,3 | 58,3 | 54,2 | |||||
Boa | 63,4 | 62,1 | 65,7 | 69,4 | 56,3 | |||||
Excelente | 62,9 | 63,3 | 68,6 | 65,8 | 53,9 | |||||
A escola desenvolve projetos pedagógicos | ||||||||||
Não | 63,0 | 0,902* | 65,1 | 0,273* | 68,6 | 0,494* | 64,1 | 0,579* | 53,9 | 0,7679* |
Sim | 62,4 | 60,6 | 65,4 | 68,2 | 55,4 | |||||
Você participa de algum projeto pedagógico | ||||||||||
Não | 62,1 | 0,653* | 61,4 | 0,331* | 66,3 | 0,683* | 66,9 | 0,806* | 53,6 | 0,4459* |
Sim | 64,2 | 65,8 | 68,5 | 64,9 | 57,8 | |||||
Vocês se consideram um estudante dedicado | ||||||||||
Não | 54,2 | 0,086* | 55,4 | 0,116* | 57,8 | 0,087* | 52,1 | 0,086* | 51,6 | 0,5817* |
Sim | 64,3 | 64,0 | 68,6 | 69,0 | 55,4 |
Fonte: as autoras, 2024
*t de Student
**ANOVA oneway
DISCUSSÃO
Das características verificadas no estudo destacou-se a média de idade (31,2 anos) dos estudantes, prevalecendo o público adulto e não pessoas jovens como prevê o estatuto da juventude o qual estabelece a faixa etária entre 15 e 29 anos como pessoas jovens (Brasil, 2013). o que está relacionado ao perfil de alunos da EJA. Em relação ao sexo, não houve predominância, uma vez que não variou o percentual de participante. Segundo a Unesco, “[...] ainda há cerca de 758 milhões de adultos, incluindo 115 milhões de pessoas com idades entre 15 e 24 anos, que não são capazes de ler ou escrever uma simples frase” (UNESCO, 2016). Ademais, a EJA é marcada pela heterogeneidade e pela diversidade de vida, idades, perfis (Costa, Amorim, 2020). Segundo Almeida, Gutierrez e Marques (2012), a taxa de analfabetismo é um indicador educacional e ser ou não alfabetizado é fundamental para a qualidade de vida, já que a capacidade de ler e escrever dá acesso à informação, abre espaço em termos de oportunidade de emprego e possibilita uma integração social mais ampla. Ademais, a EJA é marcada pela heterogeneidade e pela diversidade de vida, idades, perfis (Costa, Amorim, 2020).
Predominou a cor parda entre os pesquisados, o que leva a um entendimento que, segundo Passos (2010), Indicadores educacionais como: anos de estudo, reprovação, evasão, distorção idade-série, o currículo escolar desenvolvido, entre outros, têm sido divulgados nos últimos anos, apresentando as disparidades entre brancos e negros no acesso, permanência e conclusão dos percursos escolares.
Em relação as condições de trabalho, notou-se que a maioria dos pesquisados não possui vínculo empregatício formal, o que pode fazer relação com a baixa renda apresentada, menos de um salário mínimo. Esses estudantes na maioria das vezes se apresentam com peculiaridades acentuadas, devido aos fatores socioculturais como raça/etnia, cor, subempregos, desempregos, trabalhos informais (Brasil, 2003). O estudante da EJA busca, em geral, esta modalidade de ensino para adquirir mais conhecimentos e habilidades e conquistar uma vaga de emprego ou melhorar a que se tem (Santos, Cordeiro, 2020). Fato este, que comprova o percentual apresentado, em relação ao propósito do jovem / adulto buscar uma turma da EJA, que é o de melhorar as suas condições de trabalho.
Uma das especificidades próprias da EJA, está relacionada a seu público, já que, segundo Costa e Amorim (2020), são pessoas de baixa renda que vivem em condições difíceis, que se encontram desempregadas ou subempregadas. De acordo com Silva (2021), a transformação da realidade dos sujeitos passa necessariamente pela tomada de consciência, de que se encontram em subcondições de vida em função das situações de desigualdade e injustiça social a que são colocados.
O estudante da EJA, por se tratar de um indivíduo que já pode ingressar no mercado de trabalho, busca esta modalidade de ensino para adquirir mais conhecimentos e habilidades e conquistar uma vaga de emprego ou melhorar a que se tem (Santos, Cordeiro, 2020). Fato este, que comprova o percentual apresentado, em relação ao propósito do jovem / adulto buscar uma turma da EJA, que é o de melhorar as suas condições de trabalho.
De acordo com Freire (2007, p. 47), é importante que haja um processo permanente de conscientização política e epistemológica que possibilite aos estudantes, especificamente dos grupos populares (marginalizados), que eles não estão apenas no mundo, mas com o mundo: “Estar com o mundo resulta de sua abertura à realidade, que o faz ser o ente de relações que é”.
Foi possível constatar que os pesquisados valorizam o ambiente escolar, gostam das aulas ministradas e se considerem alunos dedicados. Essa perspectiva reforça a ideia que a inserção dos alunos na EJA acompanha projetos de vida relacionados ao desenvolvimento não somente cultural, mas também econômico (Santos, Cordeiro, 2020).
Apesar dos pesquisados demostrarem valorizar a escola e se considerarem bons estudantes, as médias bimestrais não foram satisfatórias, uma vez que os componentes curriculares apresentaram resultados abaixo da média. De acordo com a literatura, o estudante da EJA enfrenta grandes desafios na aprendizagem, já que a escola não está preparada para esse aluno, uma vez que o horário das aulas, o calendário escolar, a proposta curricular, o cansaço dificultam esse processo (Santos Filho, Couto, Vinal Júnior, 2021).
Freire permite relembrar que a função do educador não é transmitir conhecimento, mas ser um mediador na sua construção ajudando os educandos a refletirem sobre seus contextos de vida, de forma a não serem massa de um sistema opressor (Morais et al., 2023). Dessa forma, a formação dos educadores deve ser pautada nesse saber necessário. A sua concepção de educação libertadora tem como intenção emancipar o sujeito e torná-lo capaz de tomar suas próprias decisões de forma consciente, participando ativa e democraticamente das decisões políticas, lutando por seus direitos e deveres sociais (Almeida, Fontenele, Freitas, 2021).
Os resultados de QV evidenciaram que não houve correlação significativa com os baixos resultados de aprendizagem, entretanto apresentaram um score baixo para QV. De acordo com o estudo, o score médio mais elevado foi o do domínio psicológico. Esse resultado indica o modo como o indivíduo aproveita a sua vida, como lida com os sentimentos, a concentração, autoestima, autoimagem e aparência (Santos, Silva, 2020). Aqueles que apresentaram um score baixo em relação a este domínio, psicológico, foram os que demostraram não ter uma opinião formada acerca do ambiente escolar, podendo direcionar para uma percepção de indiferença em relação a curso.
Dentre os domínios analisados, os scores foram menores para o domínio ambiente, quando comparado com os restantes dos domínios. Deve ser considerado que o domínio ambiente está relacionado com o local em que o indivíduo reside e a sua satisfação em habitar nesse espaço, e ao acesso aos serviços de saúde, transporte e lazer (Gomes, Mendes, Fracolli, 2016).
É importante considerar que aspetos presentes no domínio ambiente como segurança do cotidiano, ambiente saudável, dinheiro e recursos financeiros, informações do dia a dia, atividades de lazer, e o acesso aos serviços de saúde podem interferir na QV de um indivíduo (Silva et al., 2020).
De acordo com Masala et al. (2020), o domínio ambiente está relacionado com questões associadas a segurança, aquisição de informação, participação em atividades de lazer e recreação, transporte, questões ambientais e recursos financeiros. Esses foram os aspectos que demonstram melhor domínio em relação a QV dos estudantes pesquisados.
Normalmente, são diversos os fatores que influenciam na QV de um indivíduo, o que aponta a importância dada aos aspectos da segurança e proteção, dinheiro e recursos financeiros, acesso aos serviços de saúde e oportunidade de atividades de lazer e transporte (Ferigollo, Fedosse, Santos Filha, 2016).
Vale salientar que, foi possível observar um pior score de qualidade de vida no domínio social para aqueles que não possuem moradia própria. O público da EJA possui características bem específicas, uma delas está relacionada à classe social, uma vez que são indivíduos com rendas baixas, que vivem em condições precárias (Costa, Amorim, 2020).
Ter qualidade de vida é crê em práticas que o indivíduo considera melhor para viver, assim, o sujeito diz diferente quanto à forma de viver, mas semelhante quanto à espécie e esse aspecto é subjetivo, pois varia com preceitos de cada ser humano (Cruz et al., 2015). Dessa forma, associada à satisfação, inclui-se a elaboração de planos e concretização, como fator importante para realização pessoal.
De acordo com a pesquisa, esses estudantes apresentam resultados negativos e insatisfatórios com relação ao sono; a satisfação de desempenhar as atividades diárias; satisfação da capacidade para o trabalho; satisfação consigo mesmo; com as relações interpessoal; com o apoio que recebe dos outros e com as condições do local onde moram, fatores esses (domínio ambiente) que envolvem a sobrevivência, gerando um baixo score de qualidade de vida.
Segundo Almeida, Gutierrez e Marques (2012), uma boa percepção de qualidade de vida dependerá das possibilidades que tenham as pessoas de satisfazer adequadamente suas necessidades fundamentais e está relacionado a capacidade de realização individual, que é dependente das oportunidades reais de ação do fator social.
Ao refletir sobre a qualidade de vida dos estudantes da educação de jovens e adultos, constatou-se a necessidade de envolvimento das instituições de ensino no contexto social no qual os alunos estão inseridos.
CONCLUSÃO
Predominaram no presente estudo estudantes na idade adulta, com renda menor que um salário mínimo, pardos. A maioria estava trabalhando no momento da pesquisa, contudo em empregos não formais e buscam a EJA como uma forma de melhoria para o trabalho. Os estudantes consideram a escola um ambiente agradável, percebem a qualidade das aulas como excelente e se consideram bons estudantes. Apesar da escola ter projetos pedagógicos, a maior não participa. Quando ao rendimento acadêmico dos estudantes, a maioria apresentou um baixo rendimento escolar especialmente em matemática.
Quanto à QV, foi evidenciada maior média para o domínio psicológico da QV e a menor para o domínio ambiente e que estas não têm correlação com os resultados de aprendizagem, apesar destes, não serem satisfatórios. Percebeu-se ainda que o domínio social esteve associado ao tipo de moradia do estudante, com pior QV para aqueles que residiam em casa alugada. Apesar de alguns domínios de QV terem apresentado um baixo resultado, estes por sua vez, não estiveram associados aos aspectos relacionados a aprendizagem formal.
A EJA é formada por pessoas com idades, objetivos, e trajetórias de vida diferentes. Essa diversidade torna a modalidade de ensino ainda mais desafiadora, devido as várias formas de ver a vida e de aprender desses estudantes. Sendo assim, esses alunos precisam ser enxergados nos seus vários aspectos de vida: físico, social e econômico.
Avaliar a QV permite trazer uma reflexão sobre a saúde, e associá-la aos processos de aprendizagem, tendo como base o perfil dos estudantes da EJA, possibilitando reflexões para o desenvolvimento de novas pesquisas no âmbito da QV.
Diante destes resultados, recomenda-se a necessidade por parte das redes de ensino, instituírem ações voltadas para a promoção da saúde e qualidade de vida dos estudantes da EJA, a fim de trazer benefícios, para que estes consigam cumprir sua trajetória escolar de forma plena e significativa.