Introdução
A presença de estudantes com deficiência na rede regular de ensino já é uma realidade no Brasil. Em virtude dessa nova demanda, nas últimas décadas, a Educação Inclusiva mudou consideravelmente em resposta às políticas públicas brasileiras (BRASIL, 1988, 1990, 1996, 2014, 2015), garantindo a educação como direito de todos os brasileiros.
Diante do contexto da Educação Inclusiva, o artigo 208 da Constituição Federal afirma que é dever do Estado garantir “atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino” (BRASIL, 1988). A Lei Brasileira de Inclusão, por sua vez, prevê em seu artigo 27, que “a educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida” (BRASIL, 2015).
No Brasil, Mendes, Vilaronga e Zerbatto (2014) realizaram pesquisas sobre os modelos de Educação Inclusiva existentes em outros países (Itália, Inglaterra, Estados Unidos, Espanha etc). Em seus estudos identificaram alguns autores (WOOD, 1998 e FEDERICO; HERROLD; VENN, 1999) que sugerem a utilização de estratégias reconhecidas e bem-sucedidas no atendimento à diversidade, em que afirmam que os modelos de colaboração são considerados um aspecto importante e crescente para promover a inclusão escolar, mediante sua efetivação entre professores, pais e demais profissionais das escolas.
De maneira geral, Hansen e Bjørnsrud (2018), Molbæk et al. (2019) e Schmidt et al. (2018) ressaltam que os profissionais da educação possuem diferentes entendimentos sobre a inclusão, e consequentemente se posicionam de maneira distinta nos processos colaborativos, devido aos diferentes conhecimentos, interesses e objetivos, além da própria formação.
Entretanto, identificou-se um modelo de estratégia promissor com viés colaborativo voltado para as práticas inclusivas escolares, o Ensino Colaborativo, no qual o professor de ensino regular e o professor especializado trabalham juntos (WEST; IDOL, 1990; WALTHER-THOMAS, 1997; CAPELLINI, 2004).
Diante desse contexto, neste artigo, buscou-se realizar uma pesquisa bibliográfica, a fim de analisar como são as políticas de inclusão em alguns países (Estados Unidos e Itália), nos quais o Ensino Colaborativo ocorre, e a partir disso, verificar se os documentos oficiais da política brasileira permitem que a prática possa ser desenvolvida no país.
Ensino colaborativo
Os avanços e as conquistas educacionais existentes, voltados para a Educação Inclusiva, possuem como base norteadora alguns documentos internacionais importantes: a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948), a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (ONU, 1989), a Conferência de Jomtien (UNESCO, 1990), a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), a Convenção de Guatemala (OEA, 1999), a Carta para o Terceiro Milênio (REHABILITATION INTERNATIONAL,1999) e a mais recente, Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência adotada pela Assembleia Geral da ONU por meio de sua Resolução 61/106 de 13 de dezembro de 2006, que entrou em vigor em 3 de maio de 2008.
Diante disso, segundo Paganelli (2016), a compreensão sobre Educação Inclusiva passou por mudanças significativas em muitos países, nos níveis das leis e normas nacionais, dos sistemas de ensino e das escolas e comunidades. Sendo assim, a partir da aceitação de que a Educação Inclusiva pode ocorrer em ambientes de educação geral surge o conceito de Ensino Colaborativo, sob a influência de tais acordos internacionais (BAUWENS; HOURCADE; FRIEND, 1989).
A origem do “Ensino Colaborativo” (co-teaching - termo utilizado na Língua Inglesa) ocorreu durante a segunda metade do século XX. Profissionais da educação dos Estados Unidos da América (EUA) e de outros países desenvolvidos estavam questionando a eficácia dos modelos tradicionais de ensino, no início da década de 1950 (HANSLOVSKY; MOYER; WAGNER, 1969).
No final da década de 1980, Bauwens, Hourcade e Friend (1989) foram os primeiros autores a descrever efetivamente o Ensino Colaborativo, destacando algumas características que diferem este modelo de ensino dos anteriores. Na proposta do Ensino Colaborativo, o professor geral e o professor especializado trabalham juntos na mesma sala de aula, havendo uma parceria direta entre eles, compartilhando das mesmas responsabilidades no processo educacional, de modo a instruir um grupo heterogêneo de alunos (BAUWENS; HOURCADE; FRIEND, 1989).
Para Friend, Reising e Cook (1993) um dos benefícios do Ensino Colaborativo ocorre durante o processo de elaboração de estratégias de ensino, isto é, momento no qual ambos os professores planejam as atividades a serem executadas, o que não seria viabilizado se apenas um desses professores estivesse presente na sala de aula. Para além disso, Friend e Cook (1996) destacam seis estruturas presentes na proposta de Ensino Colaborativo:
Um ensina, um observa: um dos professores dá instruções, enquanto o outro professor observa o aprendizado do aluno. Normalmente, o professor observador faz registros sobre a compreensão do aluno durante a aula, para que posteriormente os dois professores possam realizar um planejamento melhor. Às vezes, alguns alunos são observados de perto para que os docentes possam determinar novas estratégias para serem utilizadas com eles.
Ensino por estação: ambos os professores estão envolvidos e instruem os estudantes sobre a atividade a ser realizada em cada estação. Os alunos são divididos em pequenos grupos e passam de uma estação para a outra. Os estudantes podem trabalhar de maneira independente ou com a ajuda do professor nas estações.
Ensino paralelo: os professores planejam juntos os conteúdos a serem trabalhados com os alunos. A turma é dividida em dois grupos, de modo que cada professor fique responsável por metade da turma dentro de uma mesma sala de aula. O mesmo material é fornecido para ambos os grupos, sendo apresentado simultaneamente por ambos os professores.
Ensino alternativo: um dos professores apresenta instruções para o grande grupo de alunos, enquanto o outro professor trabalha com um pequeno grupo de alunos e fornece-lhes uma instrução mais específica ou para reforçar o que foi ensinado.
Ensino em equipe: os dois professores fornecem instruções e ensinam o conteúdo para todos os alunos ao mesmo tempo, de modo a interagir em conjunto com o grande grupo.
Um ensina, um auxilia: os professores atuam juntos em sala de aula, no entanto, um dos professores assume a liderança instruindo a turma, enquanto o outro professor auxilia os alunos que apresentam alguma dificuldade. O professor que auxilia os estudantes está à disposição de qualquer aluno da turma que precise de apoio.
Percebe-se assim que o Ensino Colaborativo pode ser colocado em prática utilizando uma variedade de abordagens. Segundo Friend e Cook (1990), o sucesso escolar dos norte-americanos está associado ao trabalho envolvendo a colaboração entre professores.
Neste sentido, serão analisadas as políticas públicas que dão suporte ao Ensino Colaborativo nos EUA, na Itália e no Brasil. Nos EUA, por ser referência nos estudos sobre este modelo de ensino e, na Itália, em virtude de ser considerada um país pioneiro em termos de Educação Inclusiva.
Educação inclusiva nos Estados Unidos
A Educação Inclusiva teve início nos EUA, em 1975, por meio da Education for All Handicapped Children Act (Lei de Educação para Todas as Crianças com Deficiência, Lei n. 94-142/75), uma lei federal que orienta a formulação de políticas de Educação Especial no país, que foi renomeada em 1990 como Individuals with Disabilities Education Act (Lei de Educação de Indivíduos com Deficiências, Lei n. 101-476/90) e alterada em 1997, conhecida como Individuals with Disabilities Education Act of 1997 (Lei de Educação de Indivíduos com Deficiências de 1997, Lei n. 105-17/97) (ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, 1975, 1990, 1997). Além disso, de acordo com Farrell (2009), citado por Francisco, Hartman e Wang (2020, p. 06):
Sempre há espaço para melhorias e, assim, a Lei de Educação de Indivíduos com Deficiências de 1997, foi reautorizada em 2004, como a Lei de Melhoria da Educação de Indivíduos com Deficiência (Lei n. 108-446). Algumas alterações incluem a exigência de que os professores obtenham uma certificação de ensino completo em educação especial e qualquer assunto principal que eles estivessem ensinando, bem como uma licença estadual. Também houve algumas mudanças na composição de equipes multidisciplinares, com os pais cada vez mais envolvido no processo de decisão.
Em relação às versões anteriores, a Individuals with Disabilities Education Improvement Act (Lei de Melhoria da Educação de Indivíduos com Deficiências”, Lei n. 108.446/2004), é composta por seis pilares principais (ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, 2004):
Direito à Educação Pública Gratuita e Apropriada (Free Appropriate Public Education - FAPE);
Permanência em Ambiente Menos Restritivo (Least Restrictive Environment - LRE) com seus pares sem deficiência;
Programa de Educação Individualizado (Individualized Education Program - IEP);
Processos de Avaliação Apropriados (Appropriate Evaluation Processes);
Possibilidade de recursos judiciais (Procedural safeguards);
Participação dos representantes legais do estudante em situação de deficiência e, quando possível, do próprio estudante (Cross collaboration).
Além disso, também é importante destacar que a qualidade do ensino fornecida pelos docentes dos EUA é monitorada, desde 1700, por meio da avaliação dos professores (SNYDER; PUFPAFF, 2021). De acordo com os mesmos autores, a evolução no processo de avaliação dos professores nos EUA coincide com a legislação federal do país (No Child Left Behind (2001), Race to the Top (Department of Education, 2009), the Elementary e Special Education Act (2012), e Every Student Succeeds Act (2015)), cujo objetivo é melhorar o resultado de aprendizagem dos alunos.
Portanto, para que a inclusão seja bem sucedida nas escolas, ambos os professores, de educação geral e especializado, devem ser capacitados para promover a inclusão de alunos com deficiência. Além disso, de acordo com Friend (2008), citado por Chitiyo (2017, p. 57) “houve um aumento significativo do número de escolas que adotaram o Ensino Colaborativo como seu modelo de prestação de serviços, que agora é uma das práticas escolares mais utilizadas no país”.
Nos EUA, salienta-se os objetivos por trás do Ensino Colaborativo, que incluem um “Ambiente Menos Restritivo” para os alunos com deficiência (QUIRK, 2000).
[...] Ambiente Menos Restritivo - um ambiente de sala de aula inclusivo no qual um aluno com necessidades especiais pode alcançar o maior sucesso acadêmico. (GLOBAL, University of Massachusetts, 2020, grifo das autoras).
Nesse sentido, a Lei n. 108.446/2004 expressa uma preferência, na medida apropriada, pela educação de alunos com deficiência no espaço em que ocorre a sua escolarização, a sala de aula, denominado de “Ambiente Menos Restritivo", garantindo que todos os alunos tenham a oportunidade de aprender neste ambiente.
De maneira geral, o objetivo desta lei é fornecer aos alunos com deficiência a mesma oportunidade de educação que os alunos sem deficiência no país. No entanto, segundo Montgomery e Akerson (2019), apesar dos benefícios existentes na proposta do Ensino Colaborativo, este modelo também apresenta alguns desafios, que incluem: a falta de treinamento, compatibilidade e tempo de planejamento dos professores.
Atualmente, os EUA defendem uma cultura colaborativa, para promover a inclusão nas escolas, amparado pelas políticas públicas vigentes. Desta forma, percebe-se que nos EUA, assim como em outros países, existe uma ampla normatização relativa às políticas voltadas para a inclusão escolar, garantido em suas respectivas constituições a escolarização voltada às pessoas com deficiência.
Educação inclusiva na Itália
A Itália é considerada um país pioneiro na promoção da inclusão de pessoas com deficiência na Europa, em função da promulgação da Lei n. 118/1971, que garantia o acesso de todos os alunos às salas de aula. Sendo o primeiro país europeu a garantir o acesso de pessoas com deficiência à escola de ensino regular,desde então, a legislação e as políticas públicas italianas promovem a inclusão de pessoas com deficiências nas escolas.
Na Itália, a inclusão de pessoas com deficiência é um direito consagrado com a promulgação da Lei n. 517/1977, que dispõe a respeito das normas sobre a avaliação dos alunos e sobre a abolição dos exames complementares, e outras normas de modificação do sistema escolar (ITÁLIA,1977).
Para além desta lei, existe a Legge-quadro per l'assistenza, l'integrazione sociale e i diritti delle persone handicappate (Lei-quadro de assistência, integração social e direitos das pessoas com deficiência, Lei n. 104/1992), que atualmente orienta todo o processo de inclusão do país, isto é, sanciona as modalidades de inserção e integração social das pessoas com deficiência (ITÁLIA, 1992).
Diante disso, a inclusão de alunos com deficiência no sistema educacional de ensino regular italiano influenciou a redefinição dos papéis do professor especializado e do professor de ensino regular. Vale ressaltar que, a Lei n. 104/1992, apresenta em seu texto a distinção entre o professor especializado e o professor de classe regular no sistema educacional italiano.
Segundo Ianes, Demo e Dell’Anna (2020, p. 254) “esses dois grupos de professores têm tarefas diferentes, mas são considerados iguais em sua responsabilidade por todos os alunos da classe”. Ou seja, ambos são vistos como professores da sala de aula e, portanto, professores de todos os alunos, como ocorre no Ensino Colaborativo.
Ainda segundo Ianes, Demo e Dell’Anna (2020), a mais recente expansão da legislação italiana em favor de pessoas com deficiência garante o acesso a mais recursos e implementa medidas indispensáveis para garantir o sucesso educacional dos alunos. Sendo assim, estes autores ressaltam que as oportunidades de colaboração entre os diferentes profissionais envolvidos e os recursos de apoio previstos nas políticas públicas são numerosas e dessa forma, podem permitir a implementação de uma oferta de educação adequada para os alunos com deficiência.
Além disso, é importante destacar o artigo 15 da Lei n. 104/1992, que estabelece a criação de Grupos de Trabalho, cujos membros pertencentes são responsáveis por trabalhar de maneira colaborativa em atividades organizadas para integrar alunos com deficiência. Ianes, Demo e Dell’Anna (2020) ainda enfatizam que teoricamente, na Itália, os diferentes Grupos de Trabalho estabelecidos para o desenvolvimento de práticas inclusivas não atuam apenas em prol dos alunos com deficiência de maneira individualizada em suas aulas, ou seja, existe colaboração entre estes profissionais nas atividades desenvolvidas.
De acordo com Ghedin (2013), o Ensino Colaborativo é a principal medida implementada para promover a inclusão na Itália. Corroborando com as ideias de Ghedin (2013), segundo Grassi (2022) esta prática pode proporcionar o pleno acesso à aprendizagem de todos os alunos da turma, sendo o modelo mais utilizado na escola italiana.
Portanto, pode-se observar que apesar de ambos os países (EUA e Itália) serem signatários em acordos internacionais voltados para a inclusão, cada país possui sua própria normatização relativa às políticas voltadas para a inclusão escolar; o mesmo ocorre com o Brasil, de modo a garantir em sua constituição a escolarização voltada às pessoas com deficiência. No entanto, segundo Giangreco, Doyle e Suter (2014):
Embora tanto a Itália quanto os EUA tenham um histórico de legislação nacional que apóia a educação de alunos com deficiência e seu acesso a ambientes e currículos de educação geral, essas leis por si só não são suficientes para garantir oportunidades educacionais de qualidade (GIANGRECO; DOYLE; SUTER, 2014, p. 126).
Para estes autores, é difícil fazer progressos substanciais em direção à equidade para alunos com deficiência, sem o apoio dos profissionais da área da educação, dos familiares e dos membros da comunidade que apoiam esses estudantes discutindo as ideias e práticas a fim de buscar qualidade na sua educação.
Além disso, embora muitas pessoas na Itália e nos EUA possam ter justificativa para se sentirem otimistas sobre o progresso feito para incluir mais alunos com deficiência nas salas de aula de educação geral, é importante reconhecer que esse progresso é temporal e relativo - ainda há muito trabalho a ser feito para garantir oportunidades educacionais totalmente inclusivas, equitativas e de qualidade e resultados para todos os alunos (GIANGRECO; DOYLE; SUTER, 2014).
Educação inclusiva no Brasil
No Brasil, a Educação Especial é contemplada na promulgação da Constituição Federal de 1988, na qual, em seu texto é citado o termo “atendimento educacional especializado” (AEE). Nesse sentido, vale ressaltar que o princípio da Educação Inclusiva somente foi adotado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9394/96), oportunizando a todos os alunos com deficiência a matrícula na rede regular de ensino. Além disso, é nesta lei que a Educação Especial é definida como modalidade de ensino, sendo efetivada por meio do oferecimento do AEE.
Em 2001, aparece pela primeira vez o termo “Sala de Recursos” nas Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica. Além disso, consta neste documento que o AEE deve ser realizado nas “salas de recursos, nas quais o professor da educação especial realiza a complementação e/ou suplementação curricular, utilizando equipamentos e materiais específicos” (BRASIL, 2001b, p.47). O documento define a Sala de Recursos:
“[...] realiza-se em escolas, em local dotado de equipamento e recursos pedagógicos adequados às necessidades educacionais especiais dos alunos, podendo estender-se a alunos de escolas próximas, nas quais ainda não exista esse atendimento. Pode ser realizado individualmente ou em pequenos grupos, para alunos que apresentem necessidades educacionais especiais semelhantes, em horário diferente daquele em que frequentam a classe comum. (BRASIL, 2001b, p.50)
Nessa perspectiva, de acordo com as análises realizadas por Baptista (2011), ao resgatar aspectos que constituem a história da Educação Especial brasileira, identificou-se que houve um grande investimento na Sala de Recursos como o espaço prioritário para a oferta do AEE, entre os anos de 2005 e 2010.
Dessa forma, o Ministério da Educação (MEC) instituiu um programa federal, denominado: “Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais” (SRM), por meio da Portaria Nº. 13, de 24 de abril de 2007 (BRASIL, 2007), com o intuito de apoiar as redes públicas de ensino regular na organização e na oferta do AEE de modo a contribuir com o fortalecimento do processo de inclusão educacional.
Nesta portaria, está previsto que este ambiente “é um espaço organizado com equipamentos de informática, ajudas técnicas, materiais pedagógicos e mobiliários adaptados, para atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos” (BRASIL, 2007, p. 01). Para além disso, ao consultar o portal do MEC, identifica-se uma informação referente à organização das SRM:
A Secretaria de Educação Especial oferece equipamentos, mobiliários e materiais didático-pedagógicos e de acessibilidade para a organização das salas de recursos multifuncionais, de acordo com as demandas apresentadas pelas secretarias de educação em cada plano de ações articuladas (PAR). (BRASIL, 2010).
No entanto, é importante destacar que apesar das políticas públicas já existentes, segundo Jesus (2011), o AEE ganhou significação de centralidade em termos legais e orientadores, somente a partir de 2008. Sendo assim, a Resolução 04/2009, que institui as Diretrizes operacionais para o AEE, em seu artigo 5º, estabelece a SRM como lócus dessa forma de atendimento:
O AEE é realizado, prioritariamente, na sala de recursos multifuncionais da própria escola ou em outra escola de ensino regular, no turno inverso da escolarização, não sendo substitutivo às classes comuns, podendo ser realizado, também, em centro de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, conveniadas com a Secretaria de Educação ou órgão equivalente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios (BRASIL, 2009, p. 02, grifo das autoras).
Cabe destacar, que nesta resolução, está prevista como uma das atribuições do professor do AEE "orientar professores e famílias sobre os recursos pedagógicos e de acessibilidade utilizados pelo aluno” (BRASIL, 2009, p. 03 grifo das autoras). Portanto, percebe-se que este documento oficial não converge para que o professor de classe regular e o profissional do AEE trabalhem em colaboração, como se espera no Ensino Colaborativo, conforme Mendes et al. (2020).
Além disso, o Decreto n. 7.611/2011, que dispõe sobre a Educação Especial, o AEE e dá outras providências, estabelece que o AEE “é compreendido como o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucional e continuamente” (BRASIL, 2011, p. 02).
Nesse sentido, a Resolução nº 2, de 11 de setembro de 2001, que institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, em seu artigo 8º, inciso IV, preconiza que as escolas de ensino regular devem fornecer os serviços do AEE, realizado na classe regular de ensino, mediante atuação colaborativa do professor especializado em educação especial (BRASIL, 2001a). A Política de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva (2008), por sua vez, orienta que a organização curricular da escola de ensino regular favoreça o desenvolvimento de práticas colaborativas (BRASIL, 2008).
Nessa perspectiva, Ponte e Serrazina (2009) afirmam que dependendo do ponto de vista, a palavra colaboração pode admitir diferentes significados, podendo ser considerada um trabalho em parceria ou um trabalho com características específicas. Diante desse contexto, Damiani (2008) afirma que no processo colaborativo, os professores almejam atingir objetivos comuns pré-estabelecidos, com parceria e responsabilidade, em uma relação que não tende a uma hierarquia de trabalho.
É importante ressaltar que não há orientação de como deve ser construída tal parceria (atuação/práticas colaborativas), nem como outros serviços de apoio poderiam contribuir com a inclusão escolar (CAPELLINI; ZERBATO, 2019). Sendo assim, é importante mencionar que “atuação/práticas colaborativas” não significa a efetivação do Ensino Colaborativo, pois o Ensino Colaborativo ocorre no local em que o estudante com deficiência passa a maior parte do tempo durante a sua escolarização, a sala de aula.
Tendo em vista que no Brasil, o AEE é o único modelo de serviço de apoio à inclusão assegurado nos documentos oficiais da política (BRASIL, 2001b, 2009, 2011, 2015), no qual estabelece a SRM como lócus dessa forma de atendimento (BRASIL, 2009), Mendes et al. (2020) afirmam que “o Ensino Colaborativo ainda não está previsto em legislações como um serviço obrigatório”.
Para além disso, segundo Mendes (2006), apesar de já existirem pesquisas sobre a teoria do Ensino Colaborativo no Brasil, o foco desses estudos no país inicialmente concentrou-se na defesa do uso desta estratégia e não nas formas de como implementá-la.
Considerações finais
Por meio dessa pesquisa foi possível conhecer o conceito de Ensino Colaborativo como uma estratégia promissora para favorecer a inclusão escolar. O objetivo do Ensino Colaborativo é fornecer para todos os alunos uma educação de qualidade, podendo assumir diferentes configurações na sala de aula. Além disso, averiguou-se como os documentos oficiais da política dão suporte para que o Ensino Colaborativo ocorra em outros países, como os EUA e a Itália, por exemplo.
Os processos de inclusão escolar, na rede regular de ensino, foram implementados em momentos e formas diferentes nestes três países. Verificou-se que os acordos internacionais (UNESCO, 1990, 1994 e ONU, 2006) impulsionaram os países signatários à normatização relativa às políticas voltadas para a inclusão escolar, mas estes processos foram implementados em momentos e formas diferentes em cada país. Nos EUA e na Itália, por exemplo, já havia políticas voltadas para os processos de inclusão escolar, antes de tais acordos serem firmados, enquanto que no Brasil, ocorreu somente após tornar-se signatário.
Nessa perspectiva, no contexto da Educação Inclusiva, é importante ressaltar que os modelos tradicionais de ensino começaram a ser questionados pelos profissionais da educação dos EUA e de outros países desenvolvidos no início da década de 1950, período próximo da origem do Ensino Colaborativo, durante a segunda metade do século XX.
Em 1971, com a promulgação da Lei n. 118/1971, a Itália foi o primeiro país europeu a garantir o acesso a todos os estudantes nas escolas de ensino regular; por esse motivo é conhecida como pioneira da Educação Inclusiva na Europa. Em 1975, com a promulgação da Lei de Educação para Todas as Crianças com Deficiência (Lei n. 94-142/75), foi a vez dos EUA conceder aos alunos com deficiência o direito a uma educação na rede regular de ensino.
Em 1988, o Brasil contemplou a Educação Especial, com a promulgação da Constituição Federal de 1988. No entanto, o princípio da Educação Inclusiva somente foi adotado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9394/96), oportunizando a todos os alunos com deficiência a matrícula na rede regular de ensino. Ainda assim, foi apenas em 2008 com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, que foi formalizada a inclusão escolar no país.
Dessa maneira, apesar do progresso adquirido no contexto da Educação Inclusiva por estes países, ainda há muito trabalho a ser feito para que haja a garantia de oportunidades educacionais inclusivas, equitativas e de qualidade. Sendo assim, é preciso reconhecer que esse progresso é relativo, sendo necessário considerar que existem diferenças que variam de um país para o outro, para além das políticas públicas, tais como: as influências geográficas e culturais, por exemplo.
Ainda que nos EUA e na Itália o Ensino Colaborativo aconteça no espaço em que ocorre a escolarização do aluno, isto é, a sala de aula, foi possível averiguar que tais medidas são possíveis nestes países, devido ao amparo da legislação vigente de cada país, além dos recursos disponíveis. Entretanto, apesar dos desafios, percebe-se que atualmente estes países defendem uma cultura colaborativa nas escolas para promover a inclusão.
No entanto, no Brasil, o Ensino Colaborativo não está previsto como um serviço obrigatório, sendo o AEE o único modelo de serviço de apoio à inclusão assegurado nos documentos oficiais da política. Além disso, apesar de já existirem pesquisas no Brasil sobre a teoria do Ensino Colaborativo, inicialmente o foco desses estudos concentrou-se na defesa do uso desta estratégia e não nas formas de como implementá-la. Portanto, para além da defesa do uso desta estratégia, é necessário conhecer a realidade do país para averiguar a viabilização para implementá-la.
Além disso, averiguou-se que apesar da menção dos termos: atuação colaborativa ou desenvolvimento de práticas colaborativas, nos documentos oficiais da política do Brasil, não há orientação sobre como deve ser construída tal parceria entre o professor especializado e o professor do ensino regular. Ainda, percebe-se que o significado da palavra colaboração pode ser interpretado de diversas maneiras, conforme a situação.
À vista disso, uma conversa na sala dos professores sobre uma prática a ser realizada na SRM ou uma troca de ideias sobre uma atividade a ser desenvolvida, por exemplo, também podem ser consideradas uma forma de colaboração e, não necessariamente uma prática contínua e efetiva em sala de aula de ensino regular, como ocorre no Ensino Colaborativo, visto que esta estratégia não é uma ação isolada.
Nessa perspectiva, é importante destacar que no Brasil, está previsto nos documentos oficiais da política, que na ausência da SRM na escola em que o aluno com deficiência está matriculado, o serviço do AEE pode ser realizado na SRM de outra escola de ensino regular, no turno inverso da escolarização do aluno com deficiência. Ou seja, no Brasil, a própria legislação permite que o professor especializado não trabalhe prioritariamente no local em que o estudante com deficiência passa a maior parte do tempo durante a sua escolarização, a sala de aula.
Apesar disso, é importante destacar que no contexto da Educação Inclusiva, existe o entendimento da necessidade da colaboração entre os profissionais da educação, mas isso não significa efetivar o Ensino Colaborativo, visto que no Brasil, o atendimento do professor especializado não ocorre prioritariamente no local em que o estudante com deficiência passa a maior parte do tempo durante a sua escolarização, e que as atividades propostas na maioria das vezes não atingem todos estudantes.
Nesta perspectiva, é importante mencionar que os três países citados apresentam desafios a serem superados no contexto da Educação Inclusiva, mesmo que exista o incentivo às salas de aula mais inclusivas, na qual todos os alunos podem aprender juntos. Dessa forma, percebe-se que é preciso cautela ao replicar modelos de inclusão escolar já adotados, pois isso não garante a eficácia da implementação de igual maneira, sendo necessário considerar que existem diferenças que variam de um país para o outro, para além das políticas públicas, como por exemplo, as influências geográficas e culturais.