O presente trabalho foi elaborado e concluído durante o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná com vigências de agosto de 2016 a julho 2017 e buscou investigar as contribuições da psicologia da educação para a formação de professores através da percepção destes profissionais.
A relação entre psicologia e educação não é recente, pois Antunes (2008) aponta que historicamente no Brasil há uma interdependência entre essas duas áreas, principalmente pela via da pedagogia. Esse processo se deu nas primeiras décadas do século XX, juntamente com a ampliação do debate educacional e pedagógico, sendo possível afirmar que psicologia e educação são mutuamente constituintes uma da outra. Os conhecimentos da Psicologia, assim como os de outras áreas como a sociologia, filosofia, antropologia, vêm sendo utilizados de forma sistemática pelo campo da educação no intuito de se "melhorar" o processo de ensino-aprendizagem, cabendo à psicologia da educação promover caminhos para contribuir para a formação de educadores com a compreensão e a interpretação dos fenômenos educativos e assim proporcionar novas estratégias de ensino em busca de uma educação de qualidade.
Segundo Coll (2004), a psicologia da educação é uma disciplina de natureza aplicada, que tem por objeto os fenômenos e processos educacionais. Ela encontra sua finalidade na elaboração de uma teoria que permita aos educadores compreender e explicar de maneira mais profunda e comprometida os seus próprios objetos de estudo (fenômenos e processos educativos). De maneira prática, a psicologia da educação ajuda a elaborar procedimentos, estratégias, modelos de planejamento e intervenção que orientem para uma mesma e pré-determinada direção. Além de ajudar na instauração de práticas educacionais mais eficazes, que sejam ao mesmo tempo satisfatórias e enriquecedoras para as pessoas que delas participem: alunos e professores.
Antunes (2008) ressalta ainda a importância da psicologia da educação na construção das políticas públicas educacionais, que devem ser necessariamente comprometidas com as classes populares, proporcionando-lhes uma educação de qualidade, isto é, democrática, inclusiva e transformadora. Uma educação capaz de compreender o processo ensino-aprendizagem e sua articulação com o desenvolvimento pessoal, fundamentada nas determinações sócio-históricas, para que assim forneça categorias teóricas e conceitos que permitam compreender os processos psicológicos que formam o sujeito do processo educativo.
Sobre as contribuições da psicologia para a formação de professores, alguns estudos abordam que há uma relação entre os conhecimentos da psicologia e os processos de aprendizagem (Duzzi, Rodrigues & Ciasca, 2013; Leonardo & Silva, 2013; Levandovski & Berbel, 2008; Tonus & Rodrigues, 2009), porém os mesmos autores que salientam sua importância, admitem que muitas vezes tais questões são negligenciadas na formação dos docentes. Segundo os pesquisadores, isso se deve em grande parte a uma abordagem inadequada durante a graduação, seja pela omissão do tema ou pela superficialidade com a qual é tratado.
Levandovski e Berbel (2008) apontam que a psicologia da educação como disciplina acadêmica, ministrada nos cursos de formação de docentes, busca contribuir para a formação de profissionais que compreendem os processos de desenvolvimento humano, além de compreender e aperfeiçoar os processos de aprendizagem em prol da qualidade do processo escolar, atuando como profissionais reflexivos, que articulam a teoria com a prática pedagógica. Ainda segundo a pesquisa de Levandovski e Berbel (2008), especialistas ressaltam a necessidade de melhoria da qualidade na formação inicial de professores e a importância da formação contínua, sendo que até mesmo os professores manifestam insatisfação com a formação recebida.
Leonardo e Silva (2013) realizaram uma pesquisa com o objetivo de investigar a compreensão de 14 professores do Ensino Fundamental de escolas públicas de uma cidade do Paraná sobre a relação entre aprendizagem e desenvolvimento humano. Os autores argumentam através dos seus dados que os docentes possuem uma compreensão superficial do processo de ensino-aprendizagem e nem mesmo se colocam como parte desse processo. Os autores concluem que não se trata de culpar individualmente o professor, mas, ao contrário, evidencia-se que nossa sociedade não valoriza o conhecimento científico e formações profissionais embasadas em fundamentos filosóficos mais aprofundados, o que culmina em cursos de graduação esvaziados e capacitações precárias, que não valorizam o conhecimento científico como propulsor de desenvolvimento.
Outro trabalho relevante é o de Schlindwein (2010), em que é discutida a associação teoria e prática no campo da psicologia da educação e suas implicações para a formação do educador. A autora afirma que os estudos apresentados na última década indicam que a aplicação da psicologia da educação é basicamente alimentada pela psicologia do desenvolvimento e, assim, os estudos sobre a subjetividade, identidade e constituição do sujeito ainda têm um enfoque muito psicológico, esquecendo-se de considerar contextos mais amplos. Por sua vez, Alencar (1995) salienta que no Brasil muitos pesquisadores vêm apresentando contribuições da psicologia para elucidar questões ligadas ao ensino e à aprendizagem, porém esses trabalhos ainda são pouco conhecidos e divulgados no país, e ainda menos nos cursos de formação docente.
Com base nesses referenciais, percebe-se como alguns autores já vêm há alguns anos pesquisando sobre as contribuições da psicologia para a educação, de modo especial nos processos de ensino e aprendizagem. Porém, as próprias pesquisas sobre o tema abordam que nas graduações os assuntos são tratados de forma superficial e com foco maior para a psicologia do desenvolvimento.
Reconhecendo a relação do campo da psicologia com o da educação, principalmente envolvendo os processos de ensino-aprendizagem e as metodologias utilizadas para a transmissão de conhecimentos para os alunos, entende-se a importância de investigar qual é a percepção que os educadores possuem sobre os conhecimentos da psicologia da educação em relação à atuação profissional e de que forma esses conhecimentos foram transmitidos em suas formações. Dessa forma, esta pesquisa buscou investigar a percepção que professores do ensino fundamental I (1º ao 5º ano) possuem sobre as contribuições dos conhecimentos da psicologia em sua formação e prática profissional, qual a trajetória formativa e profissional desses profissionais em relação aos conhecimentos da psicologia da educação e suas opiniões sobre suas formações e como os conhecimentos são utilizados na prática docente.
MÉTODO
O trabalho foi realizado através de uma pesquisa de campo, de caráter qualitativo, com coleta de dados por meio de entrevistas individuais semiestruturadas. A entrevista é reconhecida como uma técnica "caracterizada por uma comunicação verbal que reforça a importância da linguagem e do significado da fala" (Neto, 2003, p.57). Esta foi realizada utilizando-se de um roteiro semiestruturado, no qual, por meio de perguntas abertas, as entrevistadas discorreram sobre os temas propostos sem respostas ou condições prefixadas pelo pesquisador (Minayo, 2007).
Participaram desta pesquisa seis professoras do ensino fundamental I de uma escola da cidade de São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba/PR. As participantes foram selecionadas por meio não probabilístico convencional através de uma lista com os nomes, turnos, turmas que atuam e dias de hora atividade/permanência dos professores que lá trabalham. Como critério de inclusão, foram entrevistadas professoras que exercem suas funções como regentes de alguma turma, sendo pelo menos uma de cada ano escolar (1º, 2º, 3º, 4º e 5º ano) e uma de alguma disciplina específica como ciências, literatura, educação física ou artes. Como critério de exclusão, não foram entrevistados professores que não exercem suas funções como regentes de turmas, por exemplo, professores que exercem cargo de gestão escolar ou outras funções administrativas.
As entrevistas foram realizadas em uma sala reservada nas dependências da escola, tendo somente a presença da entrevistada e do pesquisador e seguiram um roteiro semiestruturado, que foi elaborado tendo em vista os objetivos a serem alcançados. As entrevistas foram gravadas para posterior transcrição dos dados coletados. O roteiro de entrevista semiestruturado abordou questões de: identificação geral das participantes, trajetória formativa, trajetória profissional, conhecimentos de psicologia presentes durante a formação e a percepção sobre as contribuições da psicologia para a educação e atuação dos educadores.
O procedimento de análise de dados utilizada foi a de Análise de Conteúdo. Segundo Bardin (1995), a Análise de Conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações. Esse procedimento visa organizar em categorias as informações contidas nas falas dos participantes, classificando-as por temas, para posterior interpretação com teorias e produções científicas já existentes. Sendo assim, os conteúdos das falas das participantes da pesquisa foram analisados e classificados de acordo com a articulação feita entre eles.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Todas as participantes eram do sexo feminino e elas serão chamadas de P1, P2, P3, P4, P5 e P6. A jornada de trabalho de todas elas era de oito horas por dia na escola em que a coleta de dados foi realizada e todas elas são concursadas. Nenhuma das participantes havia exercido cargo de gestão em alguma escola. A descrição das participantes quanto ao perfil, formação e trajetória profissional é apresentada na Tabela 1.
Participante | Idade | Magistério (ano) | Graduação (ano) | Especialização (ano) | Tempo de atuação como professora |
---|---|---|---|---|---|
P1 | 44 | Sim (1985) | Letras Português- Espanhol (1989) | Deficiência Mental (1989), Literatura (1990), Iniciação Séries Iniciais (1991) e Psicomotricidade (1992) | 26 anos |
P2 | 45 | Sim (1987) | Letras Português-Inglês (1992) | Tecnologia em Educação (2015) e Psicopedagogia Institucional (2015) | 13 anos |
P3 | 28 | Não | Pedagogia (2012) | Não possui | 04 anos |
P4 | 39 | Não | Pedagogia (2007) | Gestão Escolar (2016) | 08 anos |
P5 | 40 | Sim (não soube informar) | Pedagogia (2008) | Educação Infantil (não soube informar) e Psicomotricidade (2016) | 06 anos |
P6 | 30 | Sim (2005) | Pedagogia (2009) | Educação Especial e Inclusão (2011) e Gestão Escolar (2015) | 07 anos |
As participantes tinham entre 28 e 45 anos, sendo 38 a média de idade. Quatro das participantes cursaram o magistério (P1, P2, P5 e P6), quatro se graduaram em Pedagogia (P3, P4, P5 e P6), outras duas se graduaram em Letras, uma em Português-Espanhol (P1), outra em Português-Inglês (P2) e cinco das participantes possuem algum tipo de especialização (P1, P2, P4, P5 e P6). Em relação ao tempo de atuação como professoras, a que atuou na profissão há mais tempo foi P1, 26 anos, e a que atuou por menos tempo foi P3, 4 anos. A média de tempo de atuação como professoras das seis participantes foi de 12 anos.
A partir da classificação dos relatos das participantes, foram elaboradas três categorias: Formação em Psicologia; Contribuições da Psicologia para a Atuação; e Opiniões sobre Atuação e Formação de Professores.
Formação em psicologia
Na categoria Formação em Psicologia encontram-se relatos sobre se as participantes tiveram conteúdos envolvendo psicologia e educação; quais eram os conteúdos; acesso a conhecimentos da psicologia por procura própria; qual a opinião sobre a formação que tiveram envolvendo os conhecimentos da psicologia e o que poderia ter sido diferente.
Todas as participantes relataram que tiveram conteúdos de psicologia ao longo da formação e dentre as participantes que fizeram magistério, P6 foi a única que não mencionou conteúdos de psicologia nessa fase da formação. Sobre a relação que os conteúdos de psicologia passados tinham com a educação, cinco das participantes relataram que os conteúdos eram bem relacionados com a educação, como P2 que disse que era "bem voltado pra educação (...) foco maior na educação". Isso é demonstrado pelo nome das disciplinas que as participantes mencionaram, como P4 e P5 que comentaram que o nome da disciplina era "Psicologia da Educação". Apenas P3 afirmou que os conteúdos não tinham relação com educação por ser "bem teórico e abstrato (...) com a prática não teve relação".
Esses dados demonstram um ponto positivo em relação aos cursos e também como os conhecimentos da psicologia contribuem para a educação, pois, caso contrário, a psicologia não estaria presente no currículo da formação desses professores. Dessa forma, os relatos das participantes estão de acordo com o que é salientado por Tonus e Rodrigues (2009), de que grande parte dos cursos de formação de professores possui disciplinas que envolvem a psicologia com a educação, sendo normalmente Psicologia da Educação o nome da disciplina.
Em relação a quais eram os conteúdos de psicologia abordados na formação, as entrevistadas comentaram que prevaleciam conteúdos de desenvolvimento humano, processos de aprendizagem e dificuldades de aprendizagem. P1 comentou que "abordavam a educação, a aprendizagem, o aprender, o processo, dificuldades". Já P2 expôs que em toda sua formação, teve "bastante desenvolvimento, esse era o foco maior". P5 declarou que "abordava muito conteúdo de aprendizagem das crianças, como que elas aprendem, o nível de idade e o que que ela está aprendendo". Os autores mais citados pelas participantes foram Montessori, Wallon, Piaget, Vygotsky e Freud, indicando a ênfase em psicologia do desenvolvimento e nos processos de aprendizagem, principalmente voltados a esses autores clássicos; entretanto, pouco foi relatado sobre autores mais atuais e que contextualizam os processos de aprendizagem com as demandas atuais. P6 foi a única que mencionou que teve conteúdos de personalidade e subjetividade, por causa do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).
Conforme apontado por Schlindwein (2010), os estudos apresentados na última década demonstram que há um grande enfoque em estudos referentes à psicologia do desenvolvimento na área da psicologia da educação, mas que os estudos sobre a subjetividade, identidade e constituição do sujeito acabam sendo abordados de uma maneira muito psicológica e individualista, esquecendo-se de considerar tais conceitos em contextos mais amplos e em espaços de ensino. Da mesma forma mostram-se os relatos das participantes da pesquisa, em que na formação houve grande enfoque na psicologia do desenvolvimento e pouco sobre subjetividade, sendo que a única que mencionou ter tido acesso a conteúdos dessa natureza, foi por ter pesquisado por conta própria para o seu TCC.
Ainda sobre a formação em psicologia nos cursos de formação de professores, Alencar (1995) argumenta que grande parte das pesquisas sobre as contribuições da psicologia para a educação é abordada pela perspectiva da Análise do Comportamento, principalmente referente à potencialização dos processos de ensino e aprendizagem através do controle do ambiente de interação do aluno e das contingências presentes nele. Essa afirmação se confirma com o relato de duas das participantes: P4 que afirmou que "lembro muito da questão do reforço positivo, reforço negativo" e P6 que relatou que eram "muito comportamental" os conteúdos de psicologia que teve durante sua formação.
Questionadas sobre se tiveram acesso a conhecimentos de psicologia fora da formação formal, como leituras de livros, artigos e conversas com profissionais, cinco das participantes comentaram que tiveram esse contato e afirmaram que foi por curiosidade e para ajudar na prática quando possuem algum aluno com alguma característica ou dificuldade. P1 relatou que já teve conversas com psicólogos e que "fiz leituras também dependendo do aluno que eu pegava (...) livros e internet, procurava onde tinha". P2 contou que a pesquisa por conta própria "depende muito da nossa demanda também (...) se a gente recebe um aluno com tais dificuldades, daí que a gente vai atrás (...) a necessidade que faz você correr atrás um pouquinho, então é nessas horas que a gente se atualiza um pouquinho mais de acordo com a demanda", se referindo a todos os professores. P6 foi a única participante que comentou sobre uma professora que trabalha na escola que também é formada em psicologia e que "sempre a gente tem conversas (...) tenta tirar as coisas (dúvidas) da área da psicologia com ela".
Sobre suas opiniões em relação à formação que tiveram sobre os conhecimentos de psicologia, duas das participantes, P2 e P5, acham que a formação foi suficiente, P3 não soube opinar e as outras três afirmaram que foi insuficiente. P5 explicou que a formação foi suficiente, mas que em sua atuação percebe que precisaria de mais conhecimentos. Cinco das entrevistadas disseram que a formação foi muito teórica e ampla, como afirmou P4: "foi muito rápido, muito amplo, superficial (...) era muito teórico". Ainda assim, P2 e P6 salientaram que os conhecimentos de psicologia em suas formações foram "essenciais", demonstrando a importância desses conhecimentos para a formação de professores, independente se estes acham que a formação foi suficiente ou não. Destaca-se que duas participantes disseram que se sentem impotentes em sua atuação por conta de não acharem suficientes a sua formação em psicologia, como P1, que mencionou que "o emocional interfere, a criança não aprende, a criança fica agressiva (...) eu me sinto impotente", apesar de ter estudado autores e teorias. P4 e P5 pontuaram que possuíam boas professoras que explicavam bem os conteúdos, mas observou-se que nenhuma das participantes mencionou que seus professores eram formados em psicologia.
Esses dados corroboram as afirmações de Levandovski e Berbel (2008), de que os próprios educadores manifestam estarem insatisfeitos com a formação que receberam, principalmente envolvendo os conhecimentos de psicologia. Essa insatisfação é demonstrada principalmente por conta das participantes afirmarem que a formação é muito teórica, dificultando a aplicabilidade e a articulação dos conhecimentos da psicologia na atuação docente, e por julgarem que são conhecimentos importantes para a sua atuação. Importante pontuar que quando as participantes foram questionadas sobre se tiveram contato com conhecimentos da psicologia por pesquisas por conta própria, cinco afirmaram que tiveram, principalmente com o objetivo de ajudar na prática com determinados alunos com algumas características ou dificuldades, demonstrando que a demanda de sala de aula as faz pesquisar e ir atrás de mais conhecimentos, que não foram suficientemente sanados em suas formações, reforçando assim que os conhecimentos da psicologia são utilizados em uma tentativa de melhorar o ensino.
Complementando os dados acima a respeito da opinião sobre suas formações, cinco das participantes comentaram pontos que gostariam que tivessem sido diferentes. Quatro delas sugeriram uma formação mais prática, com mais estágios supervisionados, e uma disse que especificaria mais o papel do professor. P2 comentou que aumentaria "a parte prática" e acrescentou que a formação é muito "tradicional". P4 narrou que gostaria que sua formação tivesse sido mais "aprofundada", mais relacionada "com a realidade", pois sua formação "ficou muito no nível teórico". Tais afirmações também estão de acordo com o exposto por Tonus e Rodrigues (2009), de que os professores acabam não se apropriando devidamente das teorias apresentadas nas disciplinas de Psicologia da Educação por conta da forma superficial com que elas são abordadas nos cursos de graduação e pela falta de articulação com a prática docente, teorias que deveriam subsidiar o trabalho educativo.
Contribuições da psicologia para a atuação
Na categoria Contribuições da Psicologia para a Atuação, os relatos tratam sobre as percepções das participantes sobre quais são essas contribuições e como elas são identificadas na atuação. Todas as participantes comentaram que os conhecimentos da psicologia contribuem para a prática, principalmente para fundamentar as estratégias utilizadas no processo de aprendizagem e para compreender e ajudar os alunos com dificuldades. P2 afirmou que os conhecimentos de psicologia "auxiliam bastante no dia a dia", pois "até quando a gente estuda as dificuldades de aprendizagem, a gente percebe que a maioria das coisas estão relacionadas a essas fases (de desenvolvimento) e a maturação emocional". P5 declarou que as contribuições "estão presentes", mas também que sente "falta de conhecimentos (...) para poder ajudar aos alunos". P6 salientou que a atuação de professores "exige (os conhecimento de psicologia) (...) a partir do momento que você trabalha com a formação de qualquer ser humano, é essencial esse conhecimento (...) mas é falha (a formação)".
P3 além de ter afirmado que reconhece as contribuições, expôs que sente falta dos conhecimentos da psicologia e descreveu a situação narrando que "tem alguns alunos que realmente eu fico sem saber como agir, como ajudar, aquela situação, de entender realmente o porquê ele age daquela forma". P4, salientando que sente falta dos conhecimentos da psicologia, pontuou que "acho que é importante a psicologia; hoje a gente vê isso em sala de aula, o quanto é importante você ter a sensibilidade (...) por isso acho que faz falta esse conhecimento sim da psicologia".
Segundo Carraher (1997), a psicologia desenvolve estudos e pesquisas sobre muitos assuntos relevantes para a educação, principalmente envolvendo aprendizagem, linguagem, raciocínio, memória, percepção e pensamento. Dessa forma, fica evidente como a psicologia contribui ativamente para a prática dos educadores, visto que eles próprios percebem essas contribuições e até sentem falta de mais conhecimentos para desempenhar de uma maneira mais efetiva o papel de educadores, reafirmando o que já foi exposto anteriormente sobre a insatisfação com a formação, a falha que existe nela e o sentimento de impotência quando se deparam com situações em que não sabem o que podem fazer para ajudar determinado aluno com dificuldades a aprender da maneira esperada, tendo um olhar mais individualizado e subjetivo, ou de utilizar estratégias que potencializem a aprendizagem de todos os alunos.
Opinião sobre atuação e formação de professores
Na terceira e última categoria, Opinião Sobre Atuação e Formação de Professores, encontram-se relatos sobre opiniões pessoais das participantes no que se refere à atuação e formação de professores de modo geral. Cinco das participantes relataram que percebem um despreparo dos professores em lidar com determinadas situações de sua prática e acreditam que se os docentes "tivessem uma melhor formação", como declarou P1, estariam mais preparados. P1 também argumentou que para um melhor preparo seria preciso "os educadores lerem mais (...) e colocar em prática tudo que eles aprenderam". P2 enfatizou que os professores precisam de uma "reciclagem (...) porque as crianças se modificaram, mas a gente ainda está num padrão tradicional". P2 também comentou que crianças com microcefalia entrarão na escola daqui determinado tempo e que os professores não estão preparados para lidar com essas crianças. Isso se evidencia pelo fato que as participantes pouco abordaram diretamente uma formação em educação especial. P5 argumentou que a Secretaria de Educação disponibiliza cursos, mas que "fica muito no antigo (...) não sai muito de conteúdo, conteúdo, conteúdo" e acrescentou que esses conteúdos estão desatualizados em relação à realidade, enfatizando mais uma vez que a formação não é adequada para a demanda.
Duas das participantes fizeram críticas à formação a distância de professores. P2 foi uma delas e explicou que "eu vejo assim é que a maioria das pessoas que fizeram a formação a distância (...) vê os conteúdos, estuda para prova, mas não se aprofundaram. Acho que, assim, aula para mim é aquela que você conversa, que você debate (...) eu acho que a aprendizagem ela é mais significativa". P5, que fez parte de sua formação a distância, disse que "quando foi a distância, eu sinto (falta dos conhecimentos de psicologia) (...) se pudesse, seria mais presencial mesmo. Sinto essa falha nas aulas que eu fiz a distância". Continuou relatando que na parte de sua formação que foi presencial, "entendi melhor, tinha a professora ali explicando as dificuldades" e a distância "a gente até entende assim, mas não tem aquela coisa de tirar dúvida. Acho que a falha minha deve ter ficado ali".
Percebe-se que a maioria das participantes possui uma autocritica em relação a sua profissão e à forma como os professores atuam, principalmente voltado à insuficiência de suas formações. Apesar de alguns relatos pontuarem certo descomprometimento de alguns educadores, a grande maioria acredita que se os professores tivessem uma formação mais adequada, estariam mais preparados para atuar e lidar com as demandas de educar a eles destinados. Exemplificando essa insuficiência da formação, duas participantes fizeram críticas à formação a distância de professores, pois argumentaram que essa modalidade acaba não abordando os conteúdos adequadamente e consequentemente não realizando uma formação com a mesma qualidade do que a de um curso presencial.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista os relatos das participantes e a articulação entre as três categorias apresentadas, concorda-se com Leonardo e Silva (2013) de que não se trata de culpar individualmente o professor pela falha em sua formação, ao contrário, evidencia-se que nossa sociedade não valoriza o conhecimento científico e formações profissionais embasadas em fundamentos filosóficos mais aprofundados, o que culmina em cursos de graduação esvaziados e capacitações precárias, que não valorizam o conhecimento científico como propulsor de desenvolvimento e, assim, consequentemente, formam educadores com pouco embasamento teórico aprofundado e com preparação prática inadequada, quase como técnicos aplicadores de conhecimentos sem a possibilidade de fundamentarem novas formas de atuação e estratégias para uma melhor educação, o que acaba refletindo também na qualidade da educação brasileira e na dificuldade dos professores em se adaptarem à demanda social, como a questão da inclusão nas escolas e dos novos padrões familiares.
A partir dos resultados das entrevistas, têm-se indícios a pensar que os conhecimentos da psicologia contribuem para a atuação dos professores, que eles são abordados nas suas formações, mas ainda assim de forma insuficiente e inadequada, o que dificulta um melhor desempenho na função de educadores, visto que são profissionais que possuem o essencial papel de trabalharem diretamente com a formação de outros seres humanos e com a transformação e melhora da sociedade.
Dessa forma, é necessário refletir sobre a formação desses educadores e pensar em novas formas e no aperfeiçoamento da transmissão de conhecimentos da psicologia da educação nas graduações e especializações, buscando assim contribuir com a importante atuação profissional dos professores.