INTRODUÇÃO
A qualidade de vida pode ser entendida como uma concepção subjetiva que abrange parâmetros das áreas de saúde, arquitetura, urbanismo, lazer, gastronomia, esportes, educação, meio ambiente, segurança pública e privada, entretenimento, novas tecnologias e tudo o que inclui o ser humano, sua cultura e seu meio (COLVER, 2008; ALMEIDA, GUTIERREZ, MARQUES, 2012). É, portanto, a percepção do indivíduo referente à sua posição na vida no contexto da cultura e do sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (THE WHOQOL GROUP, 1995).
Dentre os fatores que podem influenciar a qualidade de vida dos sujeitos, a prática de atividade física é considerada como um fator positivo, pois atua na prevenção de patologias, assim como na manutenção e na recuperação da saúde de diversas populações (FERREIRA et al., 2015; HÄFELE et al., 2017). Em relação às pessoas com deficiência, programas de atividades físicas possibilitam uma melhora no bem-estar e na qualidade de vida (DIAZ et al., 2019; KAPSAL et al., 2019) devido aos benefícios relacionados ao condicionamento físico (MANNS et al., 1999), às alterações metabólicas e cardiovasculares (SCHREIBER et al., 2018), à reabilitação, à inclusão social (COSTA E SILVA et al., 2013), à valorização pessoal, à prevenção de enfermidades secundárias e à melhora da autoconfiança para a realização de atividades diárias (BRAZUNA; CASTRO, 2001).
O esporte adaptado pode ser uma vivência que, além do alto rendimento, pode colaborar com a inserção a novas práticas sociais e alterar o seu entendimento de qualidade de vida, uma vez que oportuniza para as pessoas com deficiência um novo horizonte e novas perspectivas (CASTRO, 2005; YONG-SEOK et al., 2018), contribuindo com a reabilitação física, psicológica e social, bem como melhorando, de forma geral, a aptidão física, os ganhos de independência e a autoconfiança para a realização de atividades da vida diária; ademais, contribui para uma melhora do autoconceito e da autoestima dos praticantes (CARDOSO, 2011).
A paracanoagem, enquanto modalidade paralímpica, é um esporte náutico praticado em canoa ou caiaque destinado para pessoas com deficiência motora e está presente nos jogos paralímpicos desde 2016, com as provas de velocidade de 200 metros (INTERNATIONAL CANOE FEDERATION, 2015). Assim, a paracanoagem requer equilíbrio na posição sentada, força muscular e potência cardiorrespiratória (AROL & EROĞLU, 2018), podendo promover benefícios nos aspectos físicos, motores, psicológicos e sociais (BJERKEFORS; THORSTENSSON, 2006).
A modalidade contribui com a autonomia, oportuniza um estilo de vida mais saudável (ALBARELLO, 2014) e proporciona ganhos nas capacidades físicas de força, potência, resistência e controle postural (MICHAEL et al., 2008; CASTRO e CARNEIRO, 2010). Desse modo, sugere-se que a prática desse esporte adaptado possua uma influência positiva na qualidade de vida de seus praticantes; entretanto, não foram encontrados estudos que investigassem os efeitos da paracanoagem na qualidade de vida. Nesse sentido, o objetivo da presente pesquisa foi analisar a concepção de atletas de paracanoagem sobre as relações dessa modalidade paralímpica com a qualidade de vida.
MÉTODOS
Este estudo caracteriza-se como descritivo, transversal e qualitativo, pois buscou descrever as características de um determinado fenômeno que possa ocorrer em uma população ou amostra, sem realizar nenhuma intervenção e por meio de descrições, interpretações e comparações, sem analisar os aspectos numéricos em relação às regras matemáticas e estatísticas (FONTELLES, 2009).
Em relação aos aspectos éticos, obedeceu às diretrizes e normas que regulamentam a pesquisa com seres humanos (lei 196/96) e foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade Federal do Vale do São Francisco - Univasf (parecer n. 3.892.500). Todos os participantes consentiram em participar da pesquisa por meio da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).
A pesquisa foi realizada no Iate Clube de Petrolina - Pernambuco, local onde ocorrem as práticas de paracanoagem da presente amostra.
Amostra
A amostra foi composta por nove pessoas com deficiência motora, sendo oito homens e uma mulher, com faixa etária variando entre 24 e 43 anos, residentes na região de Petrolina - PE e Juazeiro - BA, matriculados no projeto de extensão de paracanoagem ofertado pelo colegiado de Educação Física da Univasf.
Para a participação no estudo, foram estabelecidos como critérios de inclusão apresentar o laudo médico atestando possuir deficiência motora, possuir idade mínima de 18 anos, ser praticante de paracanoagem por pelo menos quatro meses e dispor da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. Foram adotados como critérios de exclusão a não assinatura inicial do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e a retirada voluntária do TCLE a qualquer momento da pesquisa.
Coleta de dados
A entrevista é uma maneira de coletar dados que, por sua vez, podem ser transcritos para texto, caso seja necessário, e codificados, podendo essa codificação ocorrer em dois níveis: primeiro de significados e categorias, e segundo de temas e relações entre conceitos (SAMPIERI et al., 2013).
Foi utilizado um roteiro de entrevista semiestruturada o qual envolvia sete questões que abordavam o tempo de prática na paracanagem e as concepção da amostra sobre a influência desse esporte na qualidade de vida geral e em componentes específicos relacionados à qualidade de vida (capacidades físicas, atividades da vida diária e sono). Para auxiliar na transcrição e na análise dos dados, as entrevistas foram gravadas por meio de um gravador de voz instalado em aparelho celular (Samsung J7 Prime).
Para a coleta de dados, a pesquisadora responsável convidava individualmente os sujeitos para um local reservado no Iate Clube de Petrolina, que oferecia sigilo e conforto aos participantes. Inicialmente, foi apresentado aos voluntários o objetivo do estudo e o TCLE. Após aceitarem participar, eram iniciadas as entrevistas.
Análise dos dados
Nesta pesquisa, as entrevistas foram transcritas e, após a transcrição, foram submetidas à análise de dados por meio da Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011), sendo que a leitura flutuante e a análise temática foram os recursos recortados do método utilizados neste estudo.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Participaram deste estudo nove pessoas, sendo oito do sexo masculino e somente uma do sexo feminino. Entre os participantes, a maioria adquiriu a deficiência ao longo da vida, enquanto somente dois possuíam deficiência motora congênita. Os entrevistados possuíam entre 24 e 43 anos de idade e 1 a 43 anos de deficiência. Com relação ao tempo de prática da paracanoagem, todos os atletas treinavam há pelo menos 4 meses.
Segue, na tabela 1, uma descrição detalhada a respeito de cada participante, levando em consideração a sua idade, o tempo e a etiologia da deficiência, bem como o tempo de prática do esporte.
Sujeito | Deficiência | Classificação funcional | Faixa etária | Tempo de deficiência (anos) | Tempo de prática (meses) |
---|---|---|---|---|---|
01 | Poliomielite | KL3 | 43 | 42 | 6 |
02 | Amputação transfemoral esquerda | KL3 | 24 | 1 | 6 |
03 | Lesão medular | KL1 | 27 | 14 | 7 |
04 | Alteração Ortopédica no Joelho direto | - | 33 | 10 | 7 |
05 | Deficiência congênita nos membros inferiores | KL3 | 38 | 38 | 14 |
06 | Poliomielite | KL2 | 34 | 33 | 4 |
07 | Poliomielite | KL3 | 43 | 43 | 24 |
08 | Lesão medular | KL3 | 38 | 14 | 6 |
09 | Paralisia Cerebral | - | 31 | 31 | 24 |
Fonte: Autoria própria
Em relação à maior prevalência do sexo masculino na amostra, a deficiência motora apresenta incidência no sexo masculino do que no feminino. Um estudo realizado por Campos et al. (2008) analisou 100 pacientes com traumatismo na coluna vertebral e descobriu que 86% desses pacientes eram do sexo masculino, predominantemente jovens.
Porém, não se deve deixar de mencionar que diversos fatores socioculturais tornam o acesso das mulheres às práticas esportivas em geral, sejam elas adaptadas ou não, mais restrito. Pode-se citar como exemplo de agente complicador o fato de que, até 1975, era vedado às mulheres praticar “desportos incompatíveis com as condições de sua natureza” (ADELMAN, 2003, p. 447) e, de acordo com o imaginário de feminilidade da época, pode-se afirmar que a canoagem e a paracanoagem certamente não eram consideradas compatíveis com essa “natureza feminina” (OLIVEIRA; CHEREM; TUBINO, 2008).
Levantamentos como os de Carmona (2015) e Tonon (2016) demonstram que, além desses fatores já descritos, as mulheres com deficiência enfrentam outras barreiras para ingressar e se manterem no esporte brasileiro, como: falta de incentivo, baixas condições de treinamento, dificuldade de adaptação, pouco reconhecimento, preconceito, entre outros. No entanto, esta é uma visão que tem se alterado gradativamente no decorrer da evolução do esporte, mas ainda são necessários estudos e incentivos neste sentido.
No que se refere à percepção dos participantes com relação às mudanças em sua qualidade de vida após a prática da paracanoagem, foi realizado o seguinte questionamento: “Na sua percepção, a prática da paracanoagem apresentou algum tipo de influência na sua qualidade de vida? De que forma?”. Todos os entrevistados responderam que a prática do esporte teve influência positiva em suas vidas.
“Sim, não tem como não influenciar, tanto na sua autoestima, que você acaba ficando com ela elevada, como no desafio, desafio de você se equilibrar no barco, desafio de você vencer a cada dia, de você melhorar, então, assim, ela influencia muito.” (Sujeito seis).
“Muito, influenciou em questão de ganhar mais equilíbrio, ganhar mais controle do tronco e mais força nos braços, porque a gente trabalha muito os braços e o tronco, e cada dia a tendência é melhorar cada vez mais a qualidade de vida da gente.” (Sujeito oito).
“Influenciou, sim. Do primeiro dia que eu entrei num caiaque, senti uma liberdade, achei bacana; paracanoagem, amei mesmo, senti liberto, livre, de novo.” (Sujeito nove).
Corroborando esta constatação, um estudo realizado por Comerlato (2003) demonstrou que a canoagem proporciona significativo aumento da independência, maior compreensão da deficiência, maior abertura para diálogos sobre seu quadro, diminuição do sentimento de autopiedade e rejeição, sentimento de reconhecimento, respeito e orgulho perante a sociedade, resultando em uma mudança positiva na forma de compreender a vida.
Por meio da análise das entrevistas da presente amostra, foi possível destacar oito categorias de benefícios que o esporte os proporcionou, as quais são apresentadas na tabela 2.
Categorias | Frequência (n) | Prevalência (%) |
---|---|---|
Sono | 2 | 22,2 |
Equilíbrio corporal | 5 | 55,5 |
Saúde | 2 | 22,2 |
Força muscular | 4 | 44,4 |
Digestão | 1 | 11,1 |
Autoestima | 1 | 11,1 |
Coordenação motora | 1 | 11,1 |
Respiração | 1 | 11,1 |
Fonte: Autoria própria
De acordo com a tabela 2, o conjunto de benefícios que os participantes apontaram como resultantes da prática da paracanoagem abrange o sono, o equilíbrio corporal, a força muscular, a digestão, a autoestima, a coordenação motora e a respiração. Também foi mencionada a saúde, porém, esta nada mais é do que o agrupamento de todos esses outros quesitos.
Dos fatores citados pela amostra, ao serem indagados sobre a melhoria do equilíbrio corporal, os entrevistados responderam:
“Sim... situação de equilíbrio... uma delas ajudou até... pra você ter a noção, soltei a muleta. Eu iniciei, tava usando as duas, passei pra uma, agora tô sem nenhuma. Melhorou muito a questão de estabilidade, controle.” (Sujeito quatro).
“A principal diferença que eu senti foi na postura mesmo. Porque lembra que na outra cadeira tinha um encosto que eu falei que usava ele porque minha coluna ficava doendo? Depois que eu comecei a usar essa cadeira nova que eu to usando sem, não tá mais doendo a coluna, eu acho que é por causa da minha postura, que melhorou.” (Sujeito três).
Segundo Milosevic et al. (2017), isto se deve ao fato de que os caiaques de velocidade apresentam como uma das principais características a instabilidade, o que obriga os atletas a realizarem ajustes de controle corporal durante a execução dos movimentos, resultando em notáveis melhoras no equilíbrio de seus praticantes.
Além disso, para Arol e Eroğlu (2018), em razão da instabilidade da superfície do caiaque no meio líquido, o equilíbrio em posição sentada viabiliza estímulos sensório-motores que se associam ao equilíbrio em todos os demais movimentos corporais.
Bjerkefors et al. (2007) analisaram os efeitos do treinamento no caiaque ergômetro no controle postural de pessoas com lesão medular. Foram avaliados 10 sujeitos de ambos os sexos por meio de uma plataforma optoeletrônico de análise de movimento Selspot II (Selcom, Partille, Suécia); a intervenção foi composta por 30 sessões de treinamento por um período de 10 semanas e os resultados demonstraram um menor deslocamento nas posições anteroposterior e médio lateral após a intervenção. Com isso, os autores concluem que o treinamento em caiaque ergômetro melhorou o controle postural da amostra.
Quando questionados no que diz respeito à força muscular, quatro participantes relataram sentirem alterações positivas, como ganho de força de grupos musculares específicos, que facilitam afazeres diários, como as transferências da cadeira de rodas.
“Sim, também. A gente percebeu que a paracanoagem desenvolve alguns músculos específicos: a questão do peitoral, a questão dos bíceps, dos tríceps; então, assim, costas trabalha bastante, além de fortalecer a cintura do abdômen, que é onde sustenta o corpo.” (Sujeito um).
“A força, eu senti que deu uma melhorada na transferência; melhoram os braços e, porque a gente vai melhorando a qualidade de vida, para a gente se transferir para a gente fazer as coisas e a força nos braços vai se fortalecendo a cada dia.” (Sujeito oito).
Taylor e Mc Gruder (1996) corroboram esta afirmação com sua investigação qualitativa sobre praticantes tetraplégicos de canoagem no mar. Esses autores concluíram que, além dos benefícios previamente citados, como o controle postural, o equilíbrio e a rotação de tronco, este esporte também propicia estímulo motor de movimento e acréscimo da força e da resistência muscular. Corroborando com este estudo, Zoppi et al. (2014), com o objetivo de determinar as melhorias fisiológicas e de desempenho dos remadores paralímpicos brasileiros durante uma temporada de treinamento de 32 semanas, demostraram uma melhora na composição corporal, força muscular, capacidade anaeróbia e desempenho do exercício de remadores adaptáveis do sexo masculino com deficiências motoras.
Skucas e Pokvytyte (2018) examinaram os efeitos de doze semanas de treinamento, combinados de força em terra e de natação de resistência para aumentar a força da parte superior do corpo em dezesseis sujeitos, sendo possível observar a melhora nos parâmetros de força da amostra.
A melhora da qualidade do sono também foi um fator relevante percebido por dois dos participantes, melhora esta descrita da seguinte forma:
“Agora eu durmo mais, acordo mais disposto; antes eu não acordava tão disposto como hoje, depois que eu comecei a praticar o esporte da paracanoagem... melhorou, durmo bem; no horário certo, dá aquele sono mesmo.” (Sujeito sete).
“Cansaço, um cansaço a mais, mas é um cansaço sadio, sabe? Você chega e toma um banho; alimentação também tem que mudar, porque não vai comer muito à noite, aí deu uma melhorada, eu estou dormindo melhor. Melhorou e muito.” (Sujeito oito).
O sono, de acordo com Halson (2014), é um processo natural e biológico imprescindível para a regeneração física e cognitiva dos atletas após os treinamentos e competições. Para indivíduos com lesão medular, uma atividade proporcional a uma caminhada gera um gasto energético três vezes maior do que o experimentado por uma pessoa que não possui lesão na medula espinhal (NOREAU et. al., 1993). Esse maior gasto de energia pode justificar o cansaço e, consequentemente, melhora a qualidade do sono (MARTINS; MELLO; TUFIK, 2001).
Uma revisão literária realizada por Ropke et al. (2018), que analisaram o efeito da atividade física na qualidade do sono e na qualidade de vida, aponta que há evidências da melhora na percepção subjetiva e objetiva na qualidade do sono, sendo um ótimo tratamento terapêutico isolado ou coadjuvante para o distúrbio do sono.
No que tange à coordenação motora e à respiração, um participante relatou que a paracanoagem proporcionou melhoria nesses quesitos.
“Sim. Assim... em respiração, em musculação, coordenação motora e, assim, na qualidade de vida.É... a respiração mudou muito. Não tenho o cansaço como tinha antigamente.” (Sujeito sete).
Conforme estudo realizado por Jacobs et al. (2001), em que se avaliou o impacto de 12 semanas de treinamento em circuito na capacidade cardiorrespiratória e força muscular em indivíduos com paraplegia, foi possível verificar aumentos significativos no consumo máximo de oxigênio e na potência de pico durante a realização do teste em ergômetro de braço. Corroborando com esses resultados, Flores et al. (2013) analisaram a influência do treinamento de rúgbi em cadeira de rodas nos aspectos fisiológicos e na capacidade funcional dos indivíduos com lesão medular, observando que houve melhora nos valores referentes à variável fisiológica volume de oxigênio máximo após o período de treinamento. Ainda no estudo de Kim et al. (2015), com o objetivo de determinar o efeito de seis semanas de exercício em uma hand-bike quanto aos níveis de insulina, em jejum, e quanto ao perfil cardiometabólico, músculo-esquelético, bem como os níveis de aptidão cardiopulmonar em pessoas com lesão medular, os autores verificaram que, depois do período de intervenção, o volume de oxigênio pico dos sujeitos apresentaram melhora significativa.
A melhoria da autoestima foi observada por um dos participantes, quando apontado que:
“Sim, não tem como não influenciar, tanto na sua autoestima, que você acaba ficando com ela elevada... a questão da autoestima é muito importante, pra qualquer pessoa, porque você, com uma autoestima elevada, você tem mais vontade de seguir em frente...” (Sujeito seis).
O crescimento da autoestima, na verdade, é um resultado da união de todos os demais quesitos, já que, como conclui o já mencionado estudo de Ropke et. al. (2017), a atividade física melhora a qualidade de vida, isto é, ocorre o aumento do equilíbrio, da qualidade do sono e da força muscular, além de uma maior facilidade de digestão e do aperfeiçoamento da coordenação motora e da respiração, proporcionando uma melhora considerável na saúde do indivíduo; e isso, por si só, já gera um aumento da qualidade de vida das pessoas com deficiência motora. Quando a isso se acrescentam novas experiências, aprendizados e amizades, consequentemente se tem também um aumento na autoestima desse atleta (MATHERI; FRANTZ, 2009).
De acordo com Gorgatti e Costa (2005), o esporte adaptado melhora a aptidão física, a independência e a autoconfiança de pessoas com deficiência motora para a realização de tarefas diárias, além de impulsionar o autoconceito e a autoestima. Os autores ainda afirmam que, mais do que terapia, o esporte, para essa população, caminha para o alto rendimento. O índice geral técnico dos atletas impressiona o público e, com frequência, também os estudiosos da área da atividade física. Pode-se considerar que o esporte adaptado produz consequências positivas no indivíduo que o pratica, não somente a nível fisiológico, mas social também, visto que a atividade proporciona ao praticante maior funcionalidade, o que acarreta em ganho de independência e interação social (EPHIPHANIO et al., 2018).
É importante ressaltar que os eventos nacionais e internacionais de paracanoagem são realizados, em sua maioria, concomitantemente com os eventos da Canoagem velocidade, o que também coloca essa atividade como uma modalidade inclusiva, pois, segundo Marques (1997), o esporte adaptado tem um potencial de inclusão social, sendo contrário às práticas de desvantagem, permitindo, assim, as pessoas com deficiência transporem barreiras restritivas ou impeditivas da sociedade. Para Celestino & Pereira (2015), o esporte adaptado tem ganhado notoriedade como um agente importante da inclusão e da socialização. Uma das formas de manifestação do esporte adaptado é por meio do esporte paralímpico que, segundo Goodwin et al. (2009), pode ser um agente facilitador para a inclusão social, pois dá a possibilidade do atleta estar em um grupo de pessoas nas mesmas condições e ter seus feitos valorizados não pela superação da deficiência em si, mas por critérios esportivos.
No que se refere à saúde, dois participantes responderam que a paracanoagem favorece esse aspecto em suas vidas.
“Sim, é... melhoria postural, ganho de massa muscular, saúde, né?! Também melhorou.” (Sujeito dois).
Como já enfatizado anteriormente, o termo saúde é muito abrangente e abarca todas as categorias já analisadas. Todas as melhorias relatadas permitem que a saúde em geral evolua. É por este motivo que pessoas com deficiência procuram fazer algum esporte: no intuito de melhorar a saúde. Neste sentido, um estudo de Buffart et al. (2009), realizado com 16 jovens com deficiência motora da Holanda, destacou que os principais motivos para a prática da atividade física são a diversão, a interação e o apoio social, além da melhoria da saúde e da aptidão física. Nahas (2006) afirma que as atividades físicas e desportivas regulares podem reduzir os sintomas de ansiedade e depressão, promover a socialização e aumentar os níveis e o bem-estar geral das pessoas com deficiência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio da análise da concepção dos atletas da paracanoagem sobre a influência dessa modalidade na qualidade de vida, conclui-se que existe uma relação positiva entre essa prática paralímpica com os componentes da qualidade de vida analisados no presente estudo (sono, equilíbrio corporal, saúde, força muscular, digestão, autoestima, coordenação motora e respiração), demonstrando que a paracanoagem pode ser utilizada como ferramenta para promover a qualidade de vida de pessoas com deficiência motora.
Os resultados do presente estudo podem ser utilizados como um meio de apresentar os benefícios desse esporte e também de expressar as percepções dos seus praticantes sobre essa atividade física, o que contribui para difundir essa modalidade pelo país, a fim de que mais pessoas conheçam, tenham acesso e pratiquem a paracanoagem. No entanto, a amostragem reduzida do estudo dificulta que esses resultados possam ser extrapolados, fazendo-se necessário a realização de novas pesquisas, com amostragem maior, que permitam uma análise mais pormenorizada da população estudada.