CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS
Ao mobilizar discursos considerados científicos sobre o corpo, imediatamente emerge uma dimensão normativa de análise (LATOUR, 2004). Desse modo, nesse texto, o recorte de pensamento teórico-analítico sobre o corpo parte de um sentido plural e holístico ou à luz do que Mauss (2003) chama atenção e que Daolio (2020) problematiza acerca das técnicas corporais: levar em consideração o fato social total, isto é, a integração de diferentes aspectos constituintes de dada realidade que influencia os usos do corpo. Assim, no sentido sociocultural, entende-se que as formas de pensar, sentir e agir se constroem ininterruptamente entre indivíduo e sociedade (LE BRETON, 2020).
Especificamente no âmbito formal da área de Educação Física, é possível detectar um avanço nas práticas e investigações fundamentadas pela ótica sociocultural sobre o corpo no espaço escolar (DAOLIO, 2010; NEIRA, 2020). Entretanto, quando se trata do âmbito não formal da área, como o espaço fitness das academias, o ritmo de produtividade das investigações pautadas pelas Ciências Humanas e Sociais não acompanha na mesma proporção do universo educacional (SILVA, 2017a).
Diante desse contexto teórico-empírico, vale indagar aqui como os professores de Educação Física constituem-se como profissionais de saúde e até que ponto a intervenção para/com/no corpo ocorre no interior das academias. Mais precisamente, questiona-se se a intervenção em saúde com os exercícios físicos nas academias está permeada por parâmetros físico-orgânicos que levem em consideração o frequentador como um ser social.
Sabe-se que a intervenção pedagógica do professor de Educação Física se estabelece de maneira multifacetada, pois abrange o âmbito escolar e outros espaços não-escolares. Destarte, parte-se do pressuposto que o profissional de Educação Física vem educando o corpo seja no âmbito formal ou não formal. Oliveira (2011, p. 139) argumenta que “O que é Educação Física? É uma prática social, como em última instância são todas as atividades humanas. O seu pano de fundo é a questão pedagógica, e não a médica”.
Assim, a relevância desse texto1 pauta-se nos seguintes argumentos: em primeiro lugar, fornece substrato argumentativo para pensar as maneiras como os professores de Educação Física lidam com os saberes e práticas voltados à saúde com os seus públicos. Em segundo lugar, contribui sobremaneira para pensar a atuação do profissional de Educação Física na interface entre os campos da Saúde e da Educação, o que corroboraria com a ideia de rompimento de fronteiras epistemológicas para compreensão ampla e aprofundada de como os professores lidam com o corpo nas academias.
Nesse ensaio, objetiva-se, portanto, analisar e problematizar como professores de Educação Física enquanto profissionais de saúde educam o corpo nas academias de ginástica.
CORPO “EDUCADO” ENTRE TRADIÇÕES E REPRODUÇÕES
No espaço das academias, pode haver os seguintes profissionais: nutricionistas, fisioterapeutas, médicos e aqueles formados em Educação Física (atuantes ou não como personal trainer). Delimita-se aqui a atuação do profissional de saúde, no caso do professor de Educação Física, que se posiciona como o principal responsável em supervisionar as práticas corporais nesses estabelecimentos.
Os principais argumentos para ingressar ou frequentar as academias se estabelecem pelo interesse comercial que há no contexto fitness (CALESCO; BOTH; SORIANO, 2013; SILVA; FERREIRA, 2020). Bastos (2013) analisa esta realidade a partir do que denomina de uma “epidemia de fitness” como uma questão de saúde pública na medida em que, por vezes, os sujeitos sentem-se obrigado a realizar regularmente uma prática corporal. O Sistema Body Systems de ginástica que sistematizava algumas aulas coletivas à luz de pressupostos avançados de marketing e de tecnologia (GOMES; CHAGAS; MASCARENHAS, 2010) e, recentemente, a marca Crossfit (DAWSON, 2015; SIBLEY; BERGMAN, 2017; FORTUNATO et al., 2019) são marcos emblemáticos desse mercado performático do fitness.
Assim, na maioria das ocasiões, os frequentadores se engajam nas práticas corporais em academias por meio de uma espécie de argumentos voltados à “estetização da saúde” ou à “saudabilidade da estética”. Enquanto a primeira expressão se refere à ideia de determinados atributos ligados à beleza do corpo que são utilizados para designar um possível estado ou julgamento sobre a saúde (AZEVEDO; CAMINHA, 2011); o segundo termo aponta para a noção de que o cuidado com a saúde supostamente aprimoraria a aparência do corpo (FEATHERSTONE, 2010). Entretanto, ainda há necessidade de explorar como os profissionais de Educação Física atuam especificamente no contexto do campo da Saúde, como ocorrem nas iniciativas acadêmicas e profissionais cada vez mais presentes na área (BENEDETTI et al., 2014; GOMES et al., 2015; WACHS et al., 2016).
Nesse sentido, embora seja evidente que a preocupação com a educação do corpo dito saudável foi um dos pilares de construção e desenvolvimento da Educação Física (NOGUEIRA; BOSI, 2017), o formado da área somente foi reconhecido legalmente como um profissional de saúde em tempos recentes. Haddad et al. (2006, p. 92) registram que a década final do século XX foi marcante para a categoria profissional em Educação Física “em decorrência da promulgação da nova LDB (Lei n° 9.394/96), o reconhecimento como profissional da área de saúde (Resolução nº 218/CNS/1997), a regulamentação da profissão em Educação Física (Lei nº 9.696/1998) e, consequente criação do sistema CONFEF/CREF”. O Conselho Nacional de Saúde (CNS) reconheceu os professores de Educação Física como profissionais de saúde apenas no ano de 1997 para atuar na prevenção, na promoção, na proteção e na reabilitação da saúde (HADDAD et al., 2006).
No entanto, Fraga, Carvalho e Gomes (2012/2013, p. 378) lembram que “Deste reconhecimento pelo CNS, a formação profissional seguiu majoritariamente centrada na epidemiologia do risco, no modelo clínico/prescritivo e na visão biomédica do processo saúde-doença, portanto, ainda distante dos princípios constantes dessa resolução”. Assim, a inserção dos profissionais de Educação Física em serviços de saúde atuando com as práticas corporais ainda precisa avançar teórica e instrumentalmente (WACHS, 2017).
Dessa forma, os professores da área de Educação Física ainda, por vezes, se utilizam do referencial biomédico, oferecendo a ideia do sujeito como um sistema exclusivamente orgânico (SILVA, 2017b). Assim, ao atuar em academias enquanto profissionais de saúde munidos do arcabouço técnico-científico, os professores prescrevem normas ou instruções e contribuem para a formação de juízos de valor acerca dos comportamentos que deveriam ser adotados ao longo da vida.
Esse contexto de atuação profissional em Educação Física vai ao encontro de Lupton (2000, p. 15) quando afirma que “As práticas de saúde pública e os discursos de promoção de saúde privilegiam um certo tipo de sujeito, um sujeito que é auto-regulado, consciente de sua saúde [...] Privilegiam também um corpo que é contido/coibido, que está sob o controle da vontade”. É nesse sentido que a área de Educação Física associada a outras instituições sociais operam uma forma pedagógica técnico-científica de educação do corpo como objeto a ser manipulado ou instruído (ZOBOLI; MEZZAROBA, 2019).
Em uma perspectiva de certo ethos da profissão, questiona-se a atuação do professor de Educação Física com seus públicos em academias. Tal profissional se articula aos sistemas de especialistas que constroem novas demandas de conhecimento e de necessidades consumistas na esfera da saúde (PICH et al., 2007). A reprodução dos discursos sobre determinados atributos corporais e suas relações com a questão do risco à saúde, por exemplo, é constantemente vivenciada por esses profissionais no cotidiano das academias. Nesses espaços, certas noções de corpo, muitas vezes, se proliferam de modo indiscriminado reforçando, assim, certas racionalidades quanto ao seu uso ou à sua educação.
Nessa direção, aquele que atua na Educação Física em academia com o relativo status de profissional de saúde acaba se tornando um dos responsáveis em lidar com essas demandas relativas ao corpo. Por isso, por vezes, esse profissional de saúde educa o corpo entre tradições e reproduções de caráter biologizantes da racionalidade biomédica.
CORPO “EDUCADO” ENTRE DIÁLOGOS E RELAÇÕES
Argumenta-se que o profissional de Educação Física exerce o papel pedagógico de educador em saúde, na qual a sua atuação laboral poderia respeitar o saber popular para integrar, solidarizar, conscientizar e tornar seus alunos cientes das melhorias de condições de vida (DA ROS; VIEIRA; CUTOLO, 2005). Melo (1981, p. 38) aponta que o profissional de saúde em geral “deveria diagnosticar, identificar as ‘barreiras’ sociais, econômicas e culturais oferecidas pela população e propor medidas ‘educativas’ que possa ‘quebrar’ essas barreiras”.
Assim, mais do que estar habilitado para orientar as práticas corporais ou sistematizar estratégias racionais de ensino de técnicas específicas voltadas ao corpo, entende-se que o professor de Educação Física nas academias pode atuar, acima de tudo, de modo crítico e reflexivo para educar para a promoção da saúde, o que é totalmente diferente de informar para a saúde (DA ROS; VIEIRA; CUTOLO, 2005). A relação entre o professor de Educação Física e o praticante, por vezes, pode se reduzir à “forma vertical, em que o profissional da saúde informa o paciente qual é a melhor forma de agir para garantir sua saúde, para que o paciente possa, enfim, decidir, sobre sua saúde” (HAESER; BÜCHELE; BRZOZOWSKI, 2012, p. 615).
É preciso levar em consideração, portanto, que a prática ou o próprio modo de adotar o exercício físico regularmente pode aumentar conforme a elevação de rendimentos, o nível educacional, a ocupação profissional, ou ainda, ter outras relações como a falta de tempo, motivação, companhia, apoio social, clima e locais inadequados (BAGRICHEVSKY et al., 2013; RECH et al., 2018). As condições de vida não são regidas apenas da forma com que os sujeitos se inserem no mundo como uma mera opção de permear os espaços de determinada maneira, mas também por todas as desigualdades ou iniquidades sociais que podem interferir em suas ações face às suas moradias, às formas de trabalho, aos tipos de alimentação, etc. (BARATA, 2009). Dessa maneira, as condições de vida delimitam a amplitude de escolhas individuais, estas, por sua vez, estão atreladas a determinados elementos simbólicos presentes na realidade cotidiana dos sujeitos e influenciam no ato de se movimentar (SILVA, 2017a).
Geralmente, o profissional de Educação Física privilegia os aspectos técnicos em detrimento de sua capacidade crítica de intervir em saúde nos diversos contextos socioculturais (SILVA, 2017b). Na pesquisa de Lupton (2003), por exemplo, detectou-se que os professores em contínua formação, ao tentarem esclarecer as relações entre educação em saúde e Educação Física, se remeteram à noção de saúde “holística”, ou ainda, a máxima “mente sã em um corpo são”, discursos estes incompreensíveis ou difíceis de serem colocados em prática.
Alguns autores já destacaram a importância da educação do corpo e da saúde em todos os ambientes coletivos de intervenção da Educação Física, seja no espaço de educação formal ou não formal, como nas academias (BAPTISTA, 2006; CAMARA et al., 2010; SILVA et al., 2013; LÜDORF, 2019). A atuação educativa do profissional de Educação Física junto aos frequentadores em academias se torna um momento de interação dialógica indelével para fundamentar as ideias acerca do corpo tão propaladas pela sociedade contemporânea.
Nessa direção, a atuação pedagógica do professor de Educação Física em academias pode se apropriar da ideia de que a própria adesão do indivíduo à prática de exercícios físicos é influenciada por fatores sociais, culturais e econômicos, o que aproxima a área do campo da Saúde Coletiva (WACHS et al., 2016; CARVALHO; CARVALHO, 2018). No ponto de vista de Hallal (2012, p. 243), “não podemos prosseguir vivendo em uma sociedade onde a escolha de ser fisicamente ativo é tão difícil por causa das barreiras ambientais, políticas e de conhecimento”.
Desse modo, partindo da ideia de que “A cultura dita as maneiras de utilizar ferramentas e de movimentar o corpo durante o trabalho” (RODRIGUES, 2006, p. 89), o próprio profissional de Educação Física de academia incorpora certos habitus ao exercer sua profissão face aos atributos corporais. Criam-se identidades profissionais que podem subsidiar certas racionalidades de atuação no campo da Saúde de como trabalhar com os alunos ao desenvolver hábitos e costumes específicos da área de Educação Física e do contexto social e cultural na qual está imerso. O habitus profissional de professores pode ser composto de:
[...] rotinas (que o professor constrói ao longo dos seus anos de trabalho); momento oportuno (a utilização de saberes e representações explícitas capazes de dirigir uma ação); ação racional (utilização de certos conhecimentos, aliados ao raciocínio rápido, em extrema urgência); improvisação regrada (parte imprevista na ação planejada, o agir na urgência). (BENITES; SOUZA NETO, 2011, p. 2)
Assim, é possível demarcar que os próprios habitus profissionais concretizam os ethos que permeiam a área de Educação Física, isto é, reitera atitudes, valores e estilos de comportamentos particulares ou emoções coletivas que compõem determinadas práticas e instituições sociais, no caso, determinados usos do corpo no campo da Saúde (FONSECA et al., 2009; GOMES; CAMINHA, 2014; SILVA, 2017a). É nessa direção que uma educação do corpo também pode ser estabelecida entre diálogos e relações no contexto das academias considerando o frequentador como um ser social.
AFINAL, O CORPO ESTÁ SENDO “EDUCADO” EM ACADEMIAS COM BASE EM QUAIS REFERENCIAIS ACADÊMICO-PROFISSIONAIS DA ÁREA DE EDUCAÇÃO FÍSICA?
Sem a pretensão de responder o questionamento de modo unívoco e, obviamente, longe de esgotar a discussão, entende-se que existe a necessidade de aprofundar as próprias perspectivas sobre os aspectos acadêmico-profissionais da Educação Física. Reformulações, discussões e reflexões no campo curricular da formação inicial da área auxiliariam sobremaneira os diferentes modos de educação do corpo, como já vêm sendo discutidas na literatura (BAGRICHEVSKY; ESTEVÃO, 2008; FRAGA; CARVALHO; GOMES, 2012/2013; OLIVEIRA, 2018; OLIVEIRA; GOMES, 2019). Carvalho, Guerra e Loch (2020) argumentam que a formação profissional em Educação Física se constitui por um dos maiores desafios da área, pois ainda se atrela predominantemente à lógica biomédica.
Atualmente, há uma multiplicidade da égide formativa do professor de Educação Física que pode ser vista em inúmeros estudos que denotam a pluralidade de visão de corpo e de saúde desde os graduandos de diferentes currículos, transitando em noções de cunho biológico e, em menor grau, de caráter sociocultural (SILVA et al., 2009; SILVA; SILVA; LÜDORF, 2011; ARANDA et al., 2012; FERREIRA; BAPTISTA, 2013; SILVA; SILVA; LÜDORF, 2014). Independentemente do âmbito de atuação, parte da prática do formado em Educação Física deriva dos saberes e das experiências adquiridas e vividas no âmbito da formação inicial (LÜDORF, 2019), embora não seja viável classificar determinados perfis profissionais pelo tipo de graduação (SILVA, 2017b).
Ressalta-se também que além de licenciados plenos e bacharéis em Educação Física que poderiam ser considerados profissionais de saúde, ainda há uma categoria da área à parte do viés formativo tradicional em graduação universitária e que constitui o grupo de profissionais denominados de provisionados. Durante o processo de profissionalização da Educação Física, institui-se que os sujeitos que trabalhavam e tinham uma experiência em algum ramo da área pudessem atuar exclusivamente naquele ofício como “práticos” por lei, caso complementassem sua formação com determinados e breves conhecimentos científicos propostos e dirigidos pelo Conselho Federal de Educação Física (RAMOS, 2009). Registra-se que “Uma das razões para este fato está na sua própria constituição como área de práticas culturais, onde o conhecimento é transmitido pela experiência e tradição, a começar pelos militares que difundiram a ginástica como instrutores, até os esportistas e mestres em artes marciais, que difundem os esportes e as diferentes lutas” (QUELHAS, 2012, p. 179).
Em termos gerais, estudos sobre os professores de Educação Física em academias são cada vez mais desenvolvidos por diferentes perspectivas de análise teórico-metodológica. No entanto, as pesquisas de caráter sociocultural parecem não privilegiar o questionamento do professor de Educação Física como profissional de saúde diante da educação do corpo, sobretudo nas academias. O trabalho de Silva, Freitas e Lüdorf (2019) detectou, por exemplo, as formas como os profissionais de Educação Física lidam com seus públicos em academias, ora vendendo seus serviços, ora orientando seus alunos.
Urge, portanto, cada vez mais a necessidade de ampliar frentes de investigação que aprofundem as análises até que ponto os professores de Educação Física enquanto profissionais de saúde educam o corpo nas academias. Em especial, as investigações acerca da formação acadêmico-profissional devem avançar para iluminar o campo de atuação pedagógica em Educação Física no âmbito não formal da área.
Cabe lembrar que é a partir da imagem de saúde que emerge a figura do professor como prestador de serviço: o personal trainer (CARMO JUNIOR; GOBBI; TEIXEIRA, 2013). O personal trainer cada vez mais se volta à intervenção no campo da Saúde, configurando-se por uma prática individualizada/ personalizada em busca de um suposto bem estar físico integral (ANVERSA; OLIVEIRA, 2011). O personal trainer exerce seu trabalho como profissional interno ou externo à academia, isto é, respectivamente, quando se tem vínculo com a empresa ou somente, de modo direto, com o cliente. Por isso, o trabalho do profissional de Educação Física com o treinamento personalizado (personal training) no ramo do fitness também já foi palco de discussão de alguns estudos (BOSSLE, 2008; BOSSLE; FRAGA, 2011; CARMO JUNIOR; GOBBI; TEIXEIRA, 2013; GOMES; CAMINHA, 2014; SILVA; BOSSLE; FRAGA, 2016).
Ressalta-se que estudos sobre academias voltados especialmente à articulação com a Saúde Coletiva parecem mais se aproximar de uma educação do corpo pautada no sujeito inserido em seu contexto sociocultural. Aponta-se que há um código de boas maneiras para viver e falar do corpo em cada grupo social em dado tempo histórico, realidade esta que a área de Educação Física pode compreender para intervir com seus públicos nesses tipos estabelecimentos.
Nesse contexto, pode-se afirmar que cresce o número de publicações e iniciativas que se dedicam às práticas corporais e à atividade física no que diz respeito ao campo da Atenção Básica do Sistema Único de Saúde (CARVALHO; NOGUEIRA, 2016). Por um lado, há uma sólida potencialização da produção de conhecimento e de implementação de práticas de atividades físicas/ práticas corporais em programas de academias vinculadas essencialmente à esfera pública (SÁ et al., 2016; DAHLKE; VAZ, 2020). Por outro, os estabelecimentos privados também precisam ser investigados, principalmente no que concerne à atuação do professor de Educação Física em diálogo com o campo da Saúde já que houve uma expressiva expansão do ensino superior particular nos últimos anos (BROCH et al., 2020).
Por fim, argumenta-se que indagar quais perspectivas o corpo está sendo “educado” em academias pelo profissional de Educação Física significa buscar os referenciais teórico-metodológicos que o fazem obter o reconhecimento de profissional de saúde. Ou ainda, este tipo de análise crítico-reflexiva remete a resgatar o próprio processo de construção epistemológica da área que se situa na interface entre o campo da Educação e da Saúde. Afinal, o fato da Educação Física se constituir por distintos e complexos campos de atuação faz com que o trabalhador da área se situe pelos diferentes referenciais que orientam a profissão (ANTUNES; KNUTH; DAMICO, 2020).
À GUISA DE CONCLUSÃO
Em síntese, foi possível analisar e problematizar como professores de Educação Física enquanto profissionais de saúde podem educar o corpo nas academias de ginástica. Ainda que pesem os saberes e práticas ligados essencialmente às “tradições e reproduções” da área, emerge, cada vez mais, a compreensão de uma educação do corpo em academias calcada entre “diálogos e relações”.
Na área de Educação Física, como acontece no campo da Saúde, o desempenho dos múltiplos papéis sociais dos diferentes perfis profissionais está intricado a uma série de aspectos de ordem institucional, legal, política, pessoal, social e formativa. Logo, aprofundar o lugar do formado em Educação Física como profissional de saúde em academias significa entendê-lo tanto por aspectos macroestruturais, quanto específicos da sua carreira ou trajetória na área.
Sendo assim, reconhece-se aqui, portanto, que, recentemente, cresceu o número de publicações relativas ao corpo em academias. No entanto, trabalhos voltados à intervenção educativa do professor de Educação Física, enquanto profissional de saúde, ainda são incipientes no cenário acadêmico da área, sobretudo pela ótica sociocultural acerca de que tipos de “pedagogias do corpo” são privilegiados nas academias.
Propositalmente, ao longo do texto, foi utilizado o termo “professor” e “profissional”, independente da formação inicial no sentido de esclarecer que a atuação educativa em Educação Física no campo da Saúde deve ser compreendida no contexto das interações sociais dos alunos engajados nas práticas corporais. Ainda que não esteja dando “aulas como professor” no espaço escolar, o profissional da área de Educação Física no ramo das academias assume um papel pedagógico central como profissional de saúde em “educar corpos”. Torna-se imperioso, portanto, pensar princípios e orientações educativas na Educação Física acerca das práticas corporais não somente nas unidades escolares, mas também em outras instituições da área que contêm um processo de ensino-aprendizagem com aqueles denominados de usuários, praticantes, frequentadores, clientes ou, até mesmo, alunos.