Introdução
A pandemia causada pelo novo Coronavírus (Covid-19) marca a ‘pausa’ de um período caracterizado pelo rápido e intenso desenvolvimento tecnológico, e o consumismo excessivo pelas nações. Transformações significativas na política, economia e sociedade, em estágio inicial, são antecipadas em virtude da obrigatoriedade de distanciamento físico para conter o avanço do vírus. Na medida do possível, as pessoas se recolhem as suas casas, transformam seus hábitos e costumes, (re) inventando suas vidas, na busca do lazer, da alegria, do prazer da convivência e do conhecimento, na esperança de dias melhores. Indústrias, serviços e o comércio, em geral, paralisam. Grandes e pequenas empresas fecham suas portas, e residências se transformam emhome offices. A economia estagna, e os governos tentam evitar o colapso de seus sistemas de saúde e reduzir as taxas de letalidade. Nada mais é urgente, exceto salvar vidas; destruir o ‘inimigo comum’.
Com efeito, a Covid-19 nos coloca diante de muitas questões complexas, relacionadas à saúde, à finitude da vida, às teorias de conspiração, à recuperação da economia, à manutenção de empregos e à educação, em particular, já que a suspensão das aulas ou a mudança de modalidade de ensino, devido à pandemia, preocupa toda a sociedade em relação ao futuro de nossos estudantes, sendo fundamental criar estratégias para que as atividades escolares não sejam interrompidas.
A corrida contra o tempo, pelas Universidades e escolas particulares e públicas, em face da falta de infraestrutura tecnológica, e do preparo dos professores para a docência em ambiênciasonlineevidencia a indiferença de alguns gestores educacionais em relação às potencialidades do digital em rede. Nessa crítica situação, os alunos estão à deriva em um oceano revolto, já que grande parte deles sofre com o problema de acesso àInternete com a falta de computadores e de espaço físico adequado, em suas casas, para participarem de aulas virtuais.
Diante dessa realidade, empresas privadas, como Microsoft e Google, oferecem suas plataformas prometendo às secretarias governamentais, escolas e familiares, o ‘milagre da migraçãoonline’, ressuscitando termos como ‘ensino remoto, plataformas digitais, educação a distância, aprendizagem virtual e educação mediada por tecnologias, entre outros.
A transposição da aula presencial para ambiênciasonlinetem sido realizada, em geral, de forma síncrona, por meio de plataformas de webconferência, comoSkipe,Zoom, Hangouts, RNP (Rede Nacional de Ensino e Pesquisa), entre outros. Essas soluções, na medida do possível, têm sido utilizadas, por professores, respeitados os dias e horários de suas aulas, em atendimento às exigências institucionais. Ainda que desejável, na rede pública não há como garantir educaçãoonlinepara todos, em face da dificuldade de acesso ao digital em rede, bem como a ambiências formacionais para lidar com ele. Desse modo, o investimento na modalidade síncrona vem funcionando melhor na pós-graduação e nas escolas e universidades privadas, uma vez que a ‘inclusão digital’ é maior.
Esse problema tem sido minimizado com o uso de recursos assíncronos (não tem a necessidade de estar conectado em tempo real), ou mesmo, produção e envio de materiais impressos aos estudantes, na tentativa de democratizar a educação. No entanto, para que a inclusão digital se torne realidade, é necessário investimento do governo em infraestrutura tecnológica, que possibilite conexão de rede aberta e que os equipamentos cheguem às residências dos estudantes; o que implica vontade política e investimento público.
Com efeito, a pandemia tem exigido que as escolas e universidades (re) pensem o currículo no mundo digital. Assim, as experiências que circulam na rede trazem em seu bojo, uma intencionalidade pedagógica, por meio de diferentes expressões e concepções de currículo. Nessa perspectiva, podemos encontrar desde propostas que enfatizam o saber instrumental, reativo, centrado em conteúdos programáticos, e que tem o professor como protagonista do processo de‘aprendizaemensino’até as que oportunizam o diálogo, a interatividade, a criatividade e a colaboração, tendo em vista sair de um modelo de produção em massa, para o de produção, sob demanda personalizada, e, portanto, geradora de novas possibilidades para esse processo de aprendizagem (Silva, 2018).
Algumas webconferências reproduzem o paradigma tradicional, no qual o professor é responsável pela produção e transmissão de conhecimentos, e as interações, quando acontecem, são muito pobres: “A educação continua a ser, mesmo na tela do computadoronline, o que ela sempre foi: repetição burocrática ou transmissão de conteúdos empacotados” (Silva, 2003). Se, de um lado esses encontros, ao promoverem e forjarem vínculos virtuais, propiciam uma experiência enriquecedora, na medida em que despertam nos estudantes um sentimento de pertença a um grupo, por outro lado, possibilitam raras oportunidades de interatividade. Cocriar a mensagem, ou seja, buscar soluções, de forma coletiva, colaborativa, requer conversaonline, e tempo para pensar sobre diferentes questões, permitindo uma comunicação todos-todos, alerta o autor.
Migrar do presencial para oonline, sem considerar essas e outras variáveis é pura queima de energia. Nessa perspectiva, entender as possibilidades e limitações da EaD torna-se fundamental, dado que a Educaçãoonline, como enfatizaSilva (2003; 2018) não pode ser entendida como uma evolução das práticas de educação a distância convencionais. Trata-se de uma modalidade de educação que pode ser vivenciada e exercitada para potencializar situações de aprendizagem mediadas por encontros presenciais, a distância, ou ainda, de modo híbrido, combinando encontros presenciais com encontros mediados por tecnologias digitais. Isso exige metodologia própria, que pode inspirar mudanças profundas no modelo de ensino transmissivo-conteudista, tão comum na sala de aula presencial, e em muitas propostas de Educação a Distância (EaD). Nesse cenário, é preciso re (pensar) a educação, não numa perspectiva imediatista, que dure o tempo da pandemia, mas numa educação/formação humana, que possibilite aos sujeitos se assumirem como atores e autores, na cibercultura, ou seja, na cultura contemporânea mediada pelo digital em rede, que altera os modos de comunicação, produção, sociabilidade e as formas de‘aprenderensinar’(SANTOS. 2019).
Desse modo, apresentamos, neste artigo reflexões e argumentos amparados em posicionamentos acerca da Educaçãoonline, como possibilidade de criação do conhecimento sustentado em práticas implicadas, intercomunicativas e multidimensionais, que levam em conta as dimensões integrativas, formativas e tecnológicas do processo de aprendizagem, com vistas à formação de cidadãos, autores e autônomos, sujeitos da construção de seus próprios conhecimentos, na e para além da pandemia.
Re (invenções) docentes: bricolando dispositivos metodológicos no contexto da cibercultura
Mudanças históricas, sociais, econômicas, políticas e tecnológicas, ampliaram, superaram e ressignificaram concepções e práticas no campo da pesquisa, abrindo espaços a outros modos de compreensão da ciência moderna que, ao escolher caminhos próprios e totalizantes para a produção e validação de conhecimentos, valorizou tão somente o que é quantificável, visível e classificável, estabelecendo distinções entre os saberes científicos e os saberes comuns.
O rigor científico, porque fundado no rigor matemático, é um rigor que quantifica e que, ao quantificar, desqualifica; um rigor que, ao objectivar os fenômenos, os objectualiza e os degrada; que, ao caracterizar os fenômenos, os caricaturiza. É, em suma e finalmente, uma forma de rigor que, ao afirmar a personalidade do cientista, destrói a personalidade da natureza. Nesses termos, o conhecimento ganha em rigor o que perde em riqueza e a retumbância dos êxitos da intervenção tecnológica esconde os limites de nossa compreensão do mundo e reprime a pergunta pelo valor humano do afã científico assim concebido. (SANTOS, B.apudOLIVEIRA, 2008, p. 25).
Nesse contexto, na busca de um rigoroutro(Macedo, 2020), que considera os modos relacionais de compreender a experiência humana, distanciamo-nos da tirania de categorias metodológicas fixas, para repensar, de modo crítico, “a própria subjetividade, com um engajamento narrativo sempre parcial, permanentemente aberto com o texto e com o contexto” (KINCHELOE; MC LAREN (2006, p. 303). Desse modo, optamos pela bricolagem científico-epistemológica, ou seja, pela arte de tecer, juntamente com nossos praticantes culturais, métodos, maneiras de fazer, dispositivos e conhecimentos, considerando que as relações, nesse contexto, são sempre imprevisíveis e, certamente, complexas; condições que descartam a prática de planejar antecipadamente nossas estratégias.
As reflexões apresentadas neste artigo se fundamentam no paradigma da complexidade (Morin 2014), a partir das perspectivas: (a)formacional,no contexto da cibercultura, que não separa a docência da pesquisa e entende que ao formar o outro, o docente-pesquisador também se forma (Santos; 2019;Macedo, 2020); o que nos permite não apenas apreender e compreender a prática reflexiva, comprometida e implicada, mas construí-la em processo, contribuindo para a formação de sujeitos capazes de pensar com independência e coerência, compartilhando sentidos e significados; (b)heurística, que, voltada para as práticas, entende os cotidianos escolares como‘espaçostempos’de criações, de re (invenções), experiências e subjetividades, nos quais nos inserimos, e participamos, ativamente, acabando, por alterá-los, por mais neutros que desejemos ser (Certeau, 2018;Alves 2008;Andrade, Caldas e Alves, 2019); e (c)multirreferencial, que nos exige a adoção de um olhar plural, voltado também para as práticas, fatos e fenômenos educativos, a partir de sistemas de referências distintos.
Certeau (2018) afirma que nos cotidianos escolares é possível perceber microdiferenças, onde a maioria enxerga obediência e uniformização, o que demanda valorizar as ações dos praticantes, dando visibilidade à maneira como se apropriam e ressignificam os objetos de consumo culturais ou materiais, em suas práticas, exercendo e burlando a ordem, mediante astúcias sutis e táticas silenciosas. Nessa perspectiva é fundamental que, como docentes-pesquisadores estejamos abertos e prontos a incorporar, interrogar, analisar e buscar compreender tudo o que nos chega, dessas ambiências, sempre atravessadas pelos acontecimentos que, como afirmaGaleffi (2016, p. 13), não constituem “jogos-jogados, mas jogos-jogantes”, vidas-viventes, e simplesmente acontecem para aqueles que se permitem experenciá-los. Esses‘espaçostempos’de saber e criação,repletos de diversidade, mas também “de prazer, inteligência, imaginação, memória e solidariedade” como afirmaAlves (2008, p. 18), possibilitam que, mediante, um olhar compreensivo e uma ‘escuta sensível’, possamos melhor compreender o subentendido, nexos não explicitados, silêncios e silenciamentos possíveis, na relação com nossos praticantes, como enfatizaAmorim (2004). Oportunizam, ainda, o enfrentamento das incertezas inerentes a um método que “se faz fazendo”; no dizer deMacedo (2016), uma “aventura pensada”, que demanda experiência, criatividade, curiosidade e implicação, e nos convida a neles mergulhar com todos os sentidos, buscando referências de sons, variedades de gostos e odores, tocando pessoas e objetos, e nos deixando por eles tocar, para melhor compreensão da complexidade e da rede de saberes, poderes e fazeres tecidas nesses espaços, como enfatizaAlves (1998, p. 2),
[...] o modo de ‘ver’ dominante no mundo moderno deverá ser superado por um ‘mergulho’ com todos os sentidos’ no que desejamos estudar. Temos chamado, pedindo licença ao poeta Drummond, de o sentimento do mundo. (...) exige do/a pesquisador/a a isto dedicado que se ponha a sentir o mundo e não só a olhá-lo, soberbamente, do alto. Nós também estamos vivendo e produzindo conhecimento no cotidiano. Assumir, portanto, este nosso compromisso e comprometimento é garantia de que não vamos nos iludir com uma possibilidade inexistente. Não há outra maneira de compreender a lógica do cotidiano senão sabendo que nela estamos inteiramente mergulhados.
É nesse contexto, que a ciberpesquisa-formação multirreferencial, como opção metodológica e epistemológica (Macedo, 2012;Santos, 2019), favorece a construção colaborativa de práticas comunicacionais e a mediação docente, tanto no ensino presencial, como na modalidadeonline.Com efeito, trabalhar nas perspectivas formacional, heurística e multirreferencial, na tessitura do conhecimento, permite-nos “encarnar o objeto, tornar-nos membros do objeto investigado, possibilitando que o objeto se desvele no campo da pesquisa” (Silva, 2018, p. 259). Nessa ótica, não buscamos descobrir verdades, como se elas estivessem a nossa espera. O que pretendemos é ajuda-nos a compreender a sua construção e questionar como os sujeitos da pesquisa produzem e reproduzem o que lhes é imposto pelos discursos hegemônicos, vivenciando o contexto cultural, e interagindo com eles e seus objetos técnicos, suas produções culturais e seus etnométodos, como ressalta Santos (2019); vale dizer, suas maneiras de fazer, interpretar e compreender o mundo, que são construídas nos cotidianos, e não que não precisam de explicações e justificativas científicas para se constituírem e se legitimarem nas ações práticas no dia a dia. Ao traçarmos e trançarmos as redes dos diferentes relatos que acontecem no movimento ‘práticateoriaprática’,nos diferentes ‘espaçostempos’ de atuação, inserimos, sempre, como afirma (Alves, 2008), o nosso modo próprio de contar as conversas e narrativas textuais, imagéticas e sonoras que emergem, mediatizadas pelos atos de currículo que criamos, apoiados em diferentes dispositivos materiais e intelectuais.
Desse modo, enfatizamos que não existe um único caminho a ser seguido numa investigação, como nos ensinou a ciência moderna; mas um leque de possibilidades. Para compreendermos, sentirmos e analisarmos essa complexidade, temos de exercitar um ‘rigor teórico-metodológicooutro’, que rompa com as amarras do modelo cartesiano de pesquisa, o que “requer inúmeros mergulhos, mortes e ressureições. Caças não autorizadas. Idas e vindas”, como afirma Ferraço (2008, p. 113), além da coragem de nos lançarmos numa jornada desconhecida, experenciando movimentos caóticos de ordem e desordem, juntamente com os praticantes culturais, numa relação de implicação e coautoria.
A Educaçãoonlinecomo modalidade de ensino em plataformas digitais daWeb2.0, em tempo de pandemia
A educaçãoonlineemerge na cibercultura em uma lógica comunicacional interativa propiciada pela evolução e consolidação das redes telemáticas e das plataformas daWeb2.0 no dia a dia das pessoas (Santos, 2019). Com a evolução daInternet, daWeb1.0 (1991) para aWeb2.0 (2004), os usuários deixam de ser consumidores passivos de páginas estáticas para se tornarem produtores e colaboradores na construção e customização de serviços abertos e dinâmicos.
As principais potencialidades daWeb2.0, de acordo comKerres (2006), são:
? Usuário-autor - o usuário passa a (re) criar e modificar conteúdos, expressar suas opiniões;
? Dados remotos - os dados passam a ser armazenados em servidores remotos, podendo ser acessados, viaWeb,e reutilizados por outras pessoas;
? Arquivos compartilhados - arquivos privados são compartilhados na rede, tornando acessíveis às outras pessoas. Eles são mantidos e criados, de forma dinâmica, por comunidades de usuários.
É nessa geração que emergem os softwaressociais (ex: Facebook, Instagram),weblogs(Blogspot, Wordpress),microblogs(Twitter, Jaiku),podcasts, redes P2P (Napster, LimeWire),wikis (Wikispaces),AVA (Moodle),Massive Open Online Course- MOOC - (edX, Cursera),Aplicativos (APP), desenvolvidos para dispositivos móveis de telefonia (smartphones) etabletsde mensagens instantâneas e chamadas de voz (WhatsApp, Skype, Google Hangouts). Comunidades virtuais se formam, nessas ambiências, nas quais é esperado um grau de participação e engajamento dos indivíduos, em uma lógica baseada na troca de informações, mídias (ex: foto, vídeo, imagem, áudio, texto) e conhecimento), surgindo novas práticas culturais e educacionais, e novos aplicativos, que contribuem para seu aperfeiçoamento contínuo,
A modalidade de ensinoonlinepossibilita a articulação de plataformas daWeb2.0, tanto em sala de aula presencial, quanto em ambiências virtuais. Para tanto, os docentes precisam conhecer os recursos e as funcionalidades dessas plataformas, para que possam explorá-las de acordo com os seus objetivos e intenções pedagógicos. As plataformas e aplicativos daWeb2.0, quando articulados entre si, podem favorecer novas práticas pedagógicas, ao propiciarem a exploração do conteúdo e situações educacionais em diferentes nuances e dimensões.
Na educaçãoonline, as práticas pedagógicas são estruturadas em plataformas daWeb2.0, desenvolvidas, especificamente, para atender às necessidades educacionais. Muito utilizado por professores do ensino superior e de pós-graduação, o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA)Moodlese consolidou, por quase uma década, como referência para o desenvolvimento de atividades colaborativas complementares do currículo escolar. Dotado de recursos síncronos e assíncronos fáceis de manipular, oMoodlepermitiu que os professores organizassem suas aulas, a partir de ferramentas gráficas, sem exigir conhecimentos técnicos de programação.
Com a intensificação da participação do social nas plataformas e aplicativos daWeb2.0, os AVA perderam a centralidade, dando espaço aossoftwaressociais, aplicativos e MOOC (Massive Open Online Course) . Ossoftwaressociais são adotados como espaços educacionais, por meio de grupos fechados, ou páginas criadas especificamente para esse fim. Nesse caso, odesignpedagógico fica um pouco limitado, em razão de sua natureza, dado que as postagens mais novas são apresentadas antes das mais antigas, de forma sequencial e cronológica. Os aplicativos de mensagem instantânea e de voz são utilizados, em sua maioria, como dispositivos de apoio e de comunicação rápida.
Os MOOC emergem com a intensificação do movimento desoftwarelivre, e várias instituições educacionais internacionais começam a oferecer livre acesso a conteúdos abertos de cursos de graduação e pós-graduação para a comunidade acadêmica, em geral. Esses conteúdos são denominados Recursos Educacionais Abertos (REA), podendo ser materiais digitais de aprendizagem de cursos, planos de aulas, vídeos, imagens, livros, entre outros, devidamente licenciados (Creative Commons) para a sua reutilização ou reapropriação, com o objetivo de garantir a propriedade intelectual do autor. Em um movimento paralelo às plataformas abertas, emergiram as plataformas educacionais de grandes empresas comoGoogle, que aliam recursos dewebconference,uploadedownloadde arquivos e disponibilização de uma versão para dispositivos móveis, sendo necessária a compra de licenças para a utilização de todos os seus recursos.
No entanto, enfatizamos que, atuar na cibercultura com inovações pedagógicas, de forma interativa, contribuindo nas diferentes modalidades de ensino (presencial, semipresencial e híbrido), demanda formação continuada dos professores.Silva (2018) assevera que interatividade é a disponibilização consciente e complexa de um mais comunicacional e da promoção de interações. Nessa perspectiva, fundamenta-se em três binômios recursivos: participação-intervenção, bidirecionalidade-hibridação, permutabilidade-potencialidade. O primeiro está relacionado com a ação dos professores e discentes e, também, à abertura de janelas para instaurar a participação. O segundo diz respeito ao tráfego de informações (emissão e recepção) viabilizando a coautoria. O terceiro se refere à multiplicidade de tratamento dos conteúdos, das combinações e das criações realizadas durante a aula.
A interatividade para ser instaurada, precisa de um ambiente que proporcione mais e mais comunicação e trocas entre seus atores. Para isso, existem várias plataformas digitais que são responsáveis por disponibilizar um contexto de comunicação complexo, o qual permite a participação, a colaboração, a criação do conhecimento e o compartilhamento de saberes entre docentes e discentes.Silva (2003) sugere que seja adotada a metáfora do hipertexto, na qual o docente assume o papel de provocador do conhecimento, formulador de problemas, proponente de situações, arquiteto de percursos, mobilizador das inteligências múltiplas e coletivas. O conhecimento é disponibilizado em estado potencial, possibilitando ao discente experimentar e participar do desenvolvimento da sua aprendizagem. As trocas podem ser realizadas tanto com o professor quanto com os seus pares. Essas conexões abertas desenvolvem a autonomia docente e discente e favorece a permuta do conhecimento. Nada é estático e consolidado. O saber se (re) constroi e se ressignifica a cada interação entre os participantes.
Portanto, a educaçãoonlineadotada em plataformas daWeb2.0 tem um potencial transformador, interativo, colaborativo e emancipador para a docência e à aprendizagem. Para tanto, reiteramos, é necessário formar professores para essa nova modalidade de ensino com o objetivo de desenvolver concepções pedagógicas para docênciaonline.
Atos de currículo em ambiênciasonlineem tempos de pandemia
Grande parte das universidades e escolas públicas e privadas, surpreendidas pelas medidas de quarentena e, sem orçamento para adquirir uma plataforma educacional, passaram a encaminhar as atividades por meio dee-mails, mensagens instantâneas e disponibilização de material impresso. Outras, principalmente as públicas, suspenderam suas aulas em razão da desigualdade social de aproximadamente 40% dos alunos sem acesso àInternete a recursos digitais para participarem das atividades a distância.
Assim, podemos observar uma variedade de ações curriculares relacionadas diretamente à capacidade de as instituições de ensino se adaptarem rapidamente às mudanças sociais, econômicas, políticas e climáticas advindas de surtos e emergências, cada vez mais comuns em nossa sociedade globalizada. A proatividade curricular, portanto, requer investimento em infraestrutura tecnológica e, principalmente, na formação do corpo docente para a docência em ambiênciasonline.
O currículo formal brasileiro é composto por um modelo unitário e simplista sem qualquer preocupação com as práticas docentes realizadas em cada contexto educacional. O conhecimento é tratado como algo que pode ser transferido e reproduzido, massivamente, a partir de métodos e lógicas generalizados e hierarquizados que, ao mesmo tempo, controlam e excluem. Entendido como um conjunto de conhecimentos e atividades legitimados como ‘formativos’, esse currículo se revela como “uma das mais autoritárias invenções da história pedagógica, em face de sua concepção e implementação, até hoje, pouco ou nada democráticas”, enfatizaMacedo (2012, p. 5). Normatizado e regulado pelas políticas curriculares hegemônicas da ciência moderna, considera inferiores e por isso, despreza os conhecimentos tecido por múltiplas redes educativas que estão presentes nos cotidianos das escolas, nas cidades, no ciberespaço, dado que esses saberes não podem ser quantificados e controlados durante a sua prática, pois são singulares, ou seja, nunca se repetem.
É fato que o conhecimento faz parte de um processo complexo, dado que a aprendizagem envolve processos de significação e subjetivação dinâmicos que se alteram e se entrelaçam entre si. Nos atos de currículos, como afirmaCerteau (2018), táticas são colocadas em prática pelos docentes como uma forma de subverter a normatização e regulamentação na opacidade dos cotidianos, minimizando os efeitos totalitários da política curricular instituída.Macedo (2010) inspirado em Edgar Morin, ressalta que a compreensão entre os docentes e discentes precisa ser estimulada para que os mesmos se encontrem e se permitam compreender o que o outro está vivendo em seu contexto e culturas, a partir da projeção e identificação com os seus sentimentos, motivações e aflições. Quando compreendemos algo, a rejeição e a exclusão são substituídas pela argumentação, pelo diálogo, pela tolerância e respeito. Nesse sentido, a dinâmica curricular deve levar em consideração as diferenças e contradições para serem negociadas por meio de atos de currículo.
Os atos de currículo são responsáveis por orientar as práticas de ‘aprendizagemensino’socialmente construídas, nas quais todos os agentes implicados na relação são transformados em atores/autores curriculares (Santos, 2019; Macedo, 2013). Os atos de currículo propiciam a emergência de etnométodos não instituídos e heterogêneos, que se autorizam a mostrar as diferenças e as ambivalências obscurecidas pelo currículo hegemônico sustentado pelas políticas oficiais, buscando a emancipação curricular. As experiências vivenciadas no cotidiano são as bases de referências para novas aprendizagens, que precisam ser consideradas dialógica e dialeticamente.
A formação de professores na docênciaonlinevisa promover a circulação, a vivência e o habitar em outros espaços, além dos já instituídos formalmente (ex: escola e universidade). O planejamento de situações de ‘aprendizagemensino’em plataformas digitais, afirmaBakhtin (2011), requer professores atuantes com uma consciência reflexiva dotada de finalidades e valores políticos, sociais, estéticos e éticos, que mediam o ato docente.Pretto (2012), por sua vez, advoga que o trabalho do professor necessita se inspirar na “ética hacker”, na qual a autoria, a colaboração, o compartilhamento, a exploração, a criatividade e a remixagem façam parte da sua prática, com vistas a uma educação libertadora, enfatizando a necessidade de os docentes adotarem uma atitude mais crítica e ativista, capaz de planejar e oferecer uma educação plural, sintonizada com as diferenças.
Com efeito, o diálogo, a colaboração, o compartilhamento de saberes, a autoria coletiva, encontram nas plataformas daWeb2.0, ‘espaçostempos’ fecundos para a produção de conhecimentos, a partir do hipertexto, das linguagens hipermidiáticas e das mídias digitais. Os alunos criam conhecimentos à medida que interagem e participam nas ambiênciasonlinemediante recursos comunicacionais e de conteúdo. Quando articuladas a um currículo que se atualiza dinamicamente a partir de eventos históricos cotidianos locais e globais, as plataformas digitais configuram-se como ambiências formacionais, propiciando novas possibilidades de expressão e experimentação do conhecimento.
A materialização dos atos de currículo demanda arquitetar, por meio do desenho didático, os conteúdos e as situações de ‘aprendizagemensino’,levando em consideração as funcionalidades e potencialidades das plataformas daWeb2.0; o que envolve elementos estruturantes de construção do conhecimento, como: “[...] o planejamento, a produção e a operatividade de conteúdos e de situações de aprendizagem [...]”, como ressaltaSilva (2010, p. 219), contemplando, desse modo, o potencial pedagógico, comunicacional e tecnológico, bem como as disposições de interatividade inerentes aos ambientesonlinede aprendizagem.
Podemos observar nesse contexto de crise sanitária, a preferência pelos recursos de transmissão em vídeo oferecidos pelossoftwaressociais, como por exemplo,Youtube, InstagrameFacebook, para realizarlivesentre seus pares e alunos, e para discutir os desafios da educação a distância no Brasil. Essas discussões em tempo real podem ser gravadas e disponibilizadas em outras plataformas, configurando-se como material educacional. Em ambiênciasonlineinstitucionalizadas, identificamos que o desenho didático é oferecido previamente formatado, cabendo ao docente estruturar a sua prática; os conteúdos (textos, imagens, sons, vídeos) são previamente disponibilizados aos alunos para discussão nos encontrosonlinepor meio de serviços integrados de webconferência, como por exemplo, oGoogle Meet. Nesse caso, a arquitetura de novos percursos não é possível, pois é necessário seguir um roteiro padronizado e estático.
Em outras plataformas, como, por exemplo, oMoodle, esse desenho didático pode ser elaborado pelo docente, que tem mais liberdade para articular os mais variados recursos disponíveis, de acordo com os seus objetivos pedagógicos. Dotado de recursos de comunicação assíncrono (ex: fórum, glossário, wiki, diário) e síncrono (ex:chat, webconferência), destinados a promover a interatividade entre os participantes, e de recursos de conteúdo, que possibilitam a produção, a disponibilização e o compartilhamento dos materiais digitais em vários formatos e linguagens, oMoodlefavorece a descentralização do conhecimento e o compartilhamento de informações, configurando-se como um ambiente pedagógico e democrático.
No entanto, ressaltamos que a simples adoção de plataformas digitais na educação não promove, por si só, a interatividade e a criação do conhecimento. O silêncio dos microfones dos alunos ou a falta de diálogo entre docente e discentes reforçam a simples transposição do modelo expositivo de ensino ao mundo digital, e os benefícios das interações, em tempo real, são reduzidos ao autoestudo. Desse modo, as funcionalidades oferecidas pelas plataformas daWeb2.0, sem umdesenho didáticointerativo, articulado a uma mediação docente provocadora, poderão ser subutilizadas em sua potência. O engajamento e a colaboração dos alunos nas atividades pedagógicas estão diretamente relacionados à estruturação da situação de ‘aprendizagemensino’e aos recursos digitais.
Tendências da educaçãoonlinepós-pandemia
Mudanças organizacionais, muitas vezes dolorosas e, quase sempre geradoras de incertezas, demandam desafios institucionais voltados para a adaptação, a inovação, a reestruturação, o enquadramento, a flexibilização e/ou a liderança. Nessa perspectiva, e, diante do tsunami avassalador causado pela pandemia do Covid-19, o ensino remoto, (ministrado por professores, em sua maioria no mesmo horário convencional da aula presencial, mediante plataformas diversas), a EaD (em geral, oferecida de modo assíncrono, autoinstrucional e com apoio convencional da aula presencial, mediante plataformas diversas, como, por exemplo,: teleaula na TV aberta, implementada nas redes públicas de ensino, a EaD (em geral, oferecida de modo assíncrono, autoinstrucional e com apoio de tutores), e ohome schoolling(educação domiciliar) emergem como alternativas para muitas instituições de ensino superior, interrompendo, por ora, planejamentos escolares, expansão de ofertas, previsões de investimentos educacionais e, sobretudo, rompendo com o ensino presencial. Ações “apagam incêndio” são colocadas em prática, deixando expostas a questão cultural, a desigualdade social, além da precariedade de infraestrutura tecnológica e de investimento na formação de professores para a docênciaonline.É fato que, em sua grande maioria, essas abordagens de ensino não substituem completamente as aulas presenciais, pela fragilidade do próprio modelo de ensino que, ainda que apresente materiais bem estruturados e focados no conteúdo a ser ensinado, são utilizadas, com base na transmissão e na reatividade, num processo de estímulo/resposta, não possibilitando a colaboração, o diálogo e a interatividade ‘docentediscentes’ e‘discentediscentes’;o que nos alerta para a importância de essas “novas experiências” serem potencializadas para a formação de sujeitos autores-cidadãos autônomos.
Bem sabemos que crises devem ser vistas como oportunidades de (re) invenções. Desse modo, é preciso pensar para além da pandemia, dado que: (a) soluções de ensino remoto podem contribuir para mitigar as condições heterogêneas de acesso, em função da realidade dos alunos, mas seu efeito é limitado, na medida em que demanda normatização e coordenação nacional; (b) o professor não é formado para atuar como docenteonline; (c) o ensino remoto ou a educação a distância não é o mesmo que educaçãoonline; e (d) defasagens na aprendizagem, se não sanadas no retorno às aulas, podem ser determinantes da não aprendizagem futura.
Como, então, a EoL pode contribuir para responder aos desafios contemporâneos?
Falar de contemporaneidade e de cenários futuristas pode ser bem mais difícil do que tentar interpretar e descrever delineamentos históricos, ainda que não possamos desconectar um do outro. Nessa ótica, parece-nos necessária a aceitação de certas perdas (mortes, fins) para que possamos vislumbrar o novo, e fazê-lo emergir. Isso exige olhar, fixamente, para o nosso tempo, não para captar as luzes que insistem em ofuscar nossa visão, mas tornar visível aquilo que não tem visibilidade, pois todos os tempos são obscuros para quem deles experimenta contemporaneidade. Desse modo, torna-se urgente a busca de um olhar renovado, demarcar um ponto de interseção na relação presente e pretérita.
Aberto a uma multiplicidade de conexões, o digital em rede, ao produzir mudanças nos modos de pensar, ser ou agir, exige que os governos democratizem o acesso, adotando uma política que garanta aos indivíduos o direito à informação e aos seus benefícios, dado que mais que possuir uma moderna infraestrutura de comunicação e plataformas digitais inteligentes, é preciso transformar informação em conhecimento e, este, em resultados concretos de aprendizagem.
Sem que se subestimem as possibilidades e as limitações das diferentes modalidades de ensino e, levando-se em conta as tecnologias digitais, móveis e ubíquas, que integram o nosso modo de viver em rede, é fundamental ‘fazerpensar’ atos de currículos, a partir dos quais, docentes e discentes exercitem processos de interatividade, colaboração e autoria, flexibilizando as formas de criação do conhecimento, com o uso de textos, vídeos e imagens passíveis de serem remixados, criados e compartilhados em rede, como alternativas ao modelo transmissivo-conteudista, largamente utilizado em nossas instituições de ensino.
Nessa perspectiva, metodologias que conferem ao aluno o protagonismo da aprendizagem, a despeito da diversidade e da multiplicidade dos elementos inerentes a esse processo, vêm ganhando projeção, seja por meio de pesquisas realizadas para comprovar sua efetividade, seja em sala de aula, com a adesão dessas práticas, por professores e instituições de ensino superior, com diversas possibilidades de arranjos, tendo em vista o desenvolvimento da autonomia e a emancipação dos estudantes considerados sujeitos ativos, responsáveis por seus próprios aprendizados (mediados ou não por tecnologias). Entre essas metodologias, destacamos:
(a) a sala de aula invertida (flipped classroom), estratégia baseada no conceito de ensino híbrido que, apoiada em vídeoaulas,blogs, gamese/ou arquivos de áudios disponibilizados em rede, possibilita que o estudante prepare seus estudos, tornando o debate mais qualificado, devido a sua prévia reflexão a respeito do que foi abordado;
(b) aaprendizagem baseada em projetos (ABP), ou project based learning, fundamentada no emprego de temas transversais. Os alunos são desafiados a desenvolver um projeto alinhado a sua vida pessoal ou profissional. Nesse contexto, o foco da ABP recai sobre as competências que lhes são necessárias para a solução do problema relacionado com uma situação, o mais próxima possível de sua realidade e atuação profissional;
(c) aaprendizagem baseada em problemas (problems based learning(PBL), que convoca o aluno a construir seu aprendizado conceitual, procedimental e atitudinal por meio de problemas propostos que o desafiamaestudar, individualmente, determinado assunto, e a anotar suas dúvidas, ou dificuldades, que são discutidas em grupos, durante as aulas. Desse modo, a solução de problemas estimula diferentes estilos de aprendizagem do aluno, a leitura e o raciocínio lógico; aumenta seu senso de responsabilidade; e desenvolve o pensamento crítico, a habilidade do trabalho em equipee atroca de informações; e
(d) osjogos e a gamificação,por sua vez (uso de parte das características definidoras de jogos), cada vez mais presentes em diferentes áreas do saber e níveis de ensino, com sua linguagem de desafios, recompensas, competição e cooperação retira o aluno da condição de espectador, dando-lhe oportunidade de construir seu próprio conhecimento, constituem importantes estratégias de encantamento e estímulo para uma aprendizagem rápida e próxima da vida real.
Não há dúvidas de que, ao darem ao aluno o protagonismo do processo educacional, essas metodologias representam um avanço em relação às práticas mais conservadoras, construídas, pelos professores, a partir da transmissão de conteúdos prontos e inquestionáveis, apesar de a aula expositiva ainda imperar em sala de aula, sobrevivendo a todas ‘a inovações’. No entanto, nossas experiências cotidianas, nos últimos vinte anos, apontam para algumas fragilidades, que decorrem dos usos dessas metodologias, como, por exemplo: (a)ansiedade e insegurançapor parte dos estudantes,diante de um modelo de ensino participativo e colaborativo, que lhes exige disciplina, esforço, maturidade, organização e autonomia, para lidar com as ambiências online, repletas de materiais, atividades, informações; (b)não comprometimento do aluno com o próprio aprendizado,expressa na ausência de questionamentos que tenham relevância para o contexto, devido à falta de leitura e participação nas aulas; (c)excesso de tarefas solicitadas, em função do tempo requerido para realizá-las; (d)ênfase no aprofundamento dos conteúdos em detrimentode sua maior abrangência; (e)percepção de insucesso, atribuído à carência de suporte apropriado para sua implementação, pelo corpo acadêmico e institucional,; (f)desconforto dos docentes em relação ao processo de avaliação da aprendizagem,na medida em que a falta de contato físico com os alunos durante o desenvolvimento dos trabalhos, bem como as atividades em grupo dificultam a avaliação individual; e (g)atuação’menor’ do professorvisto como facilitador do aprendizado, espécie de ‘tutor’, como se a aquisição do conhecimento necessitasse de um especialista para simplificá-lo.
Candau e Moreira (2009) destacam que processos educacionais devem ser concebidos como historicamente situados e articulados a outros processos sociais. Desse modo, para além do protagonismo dos estudantes no processo de‘aprendizagemensino’,é necessário que os docentes, em suas práticas, possam promover a integração entre ensino e pesquisa; ou seja, aprendam ao mesmo tempo em que ensinam e pesquisam, e pesquisem e ensinem enquanto aprendem (Santos, 2019), vivenciando experiências por meio de um processo de reflexão acerca de seus percursos pessoais - autoformação; nas relações com os outros - heteroformação; e, por intermédio das coisas - saberes, técnicas, culturas, artes, tecnologias, entre outros, e de sua compreensão crítica - ecoformação, como pontuam Pineau;1988;Macedo, 2010). A esses processos, Macedo (2020) acrescenta a metaformação - olhar para si mesmo, para sua própria formação, o que possibilita avaliar itinerâncias e errâncias, e refletir sobre o próprio processo de aprendizagem; e a erosformação - ou seja, o desejo de saber e se formar com e pela pesquisa . A alegria, o prazer e a paixão pelo que fazemos mobilizam forças criativas; a aula, a pesquisa e a escrita nos fazem viver, curando-nos, enfatiza o autor. Na dinâmica relacional entre esses processos é que se encontra a complexidade constitutiva da trans (formação) docente e discente.
Sob esse prisma, a EducaçãoOnlinepode contribuir para reconfigurar os usos realizados por professores nas ambiênciasonline.Isso demanda, entre outros aspectos, como asseveraAmaral (2014), a criação, ao longo do processo educacional, de currículos ‘pensadospraticados”, que levem em conta:
(a) adimensão integrativa do processo ‘aprendizagemensino’,mediante a aproximação de diferentes ‘espaçostempos’escolares; as experiências prévias dos praticantes e os modos como apreendem e tecem seus conhecimentos; a criação de projetos integradores, que privilegiem a prática interdisciplinar, norteada por experiências intencionais de interação entre disciplinas e especialistas - com intercâmbios enriquecedores mútuos e produção coletiva de conhecimentos (SANTOS, 2003, p. 221); além da necessidade de um olhar plural que alinhe teoria e empiria, no movimento ‘práticateoriaprática’.
(b) adimensão formativa, que possibilitou a vivência de experiências formativas ‘docentesdiscentes’,como a alteridade, a negociação de sentidos e a partilha de conhecimentos e afetos; e
(c) adimensão tecnológica, que considera as transformações dos tradicionais processos de comunicação, sociabilidade e, de uma forma geral, da educação e da aprendizagem, com a entrada do digital em rede, mediante a elaboração de umdesignpedagógico, aberto e flexível, que envolva múltiplas combinações de linguagens, por meio de percursos hipertextuais diversos, e oportunize mediações compartilhadas que contemplem processos dialógicos, interativos e colaborativos.
Nessa perspectiva, a produção do conhecimento ocorre em parceria com o estudante, promovendo engajamentos específicos, na qual o protagonismo do processo‘aprendizagemensino’ocorre nas relações que docentes e discentes estabelecem entre si, e, principalmente, com o objeto do conhecimento.
Praticando na e para além da pandemia
O cenário atual nos convoca a pensar novas maneiras de atuar e de ser docente, no qual o acolhimento e os processos de ‘aprenderensinar’ pautados em princípios integrais e democráticos são fundamentais no enfrentamento dos desafios decorrente da pandemia e para além dela.
Nesse contexto, como não nos reportarmos ao pensamento deFreire (1997, p. 75) quando se indaga: “Como ser educador, se não desenvolvo em mim a indispensável amorosidade aos educandos com quem me comprometo e ao próprio processo formador de que sou parte? Com efeito, o autor reconhece a necessidade de uma ação dialógica como fundamento ético da solidariedade e da possibilidade do ser mais; o que demanda abertura ao outro, respeito e escuta solidária; o que implica compreensão e reconhecimento do outro em toda sua existência.
Com esse olhar, enfatizamos que, o processo de ‘aprendizagemensino’ baseado nos princípios da interatividade, da dialogicidade e da colaboração, possibilita que os sujeitos se tornem atores e autores de suas histórias de vida e transformação cotidianas. Assim, é necessário buscar metodologias de ensino mais participativas, voltadas à produção de conhecimentos, de forma coletiva, como, por exemplo, as atividades curriculares promotoras de autoria, que propomos, a seguir.
(1) Vídeo curto ou produção de história em quadrinhos
Os alunos devem participar de umworkshop online,anteriormente à atividade colaborativa, para compreenderem os processos de produção de vídeo ou história em quadrinhos, quais sejam:
(a)Pré-produção: planejamento de vídeo ou história em quadrinhos, desde a ideia inicial até a filmagem ou desenho propriamente dito, tais como: (i) sinopse: resumo geral do vídeo ou história em quadrinhos; (ii) argumento: breve descrição de como a ação será desenvolvida; (iii) roteiro: divisão das cenas do vídeo; tema e diálogos de personagens sem ainda incluir as ilustrações.
(b)Storyboard(apenas vídeo): representação das cenas em desenhos sequenciais, como em uma história em quadrinhos, que facilita a visualização, antes da gravação do vídeo;
(c)Produção(apenas vídeo): etapa em que as cenas são gravadas;
(d) Diagramação (somente quadrinhos): os quadrinhos são esboçados sem o diálogo, contendo os personagens do roteiro. Esselayoutdos quadrinhos, junto com a arte, compõe a narrativa visual, que deve seguir, em nosso contexto, o padrão de leitura ocidental (da esquerda para a direita, de cima para baixo);
(e)Pós-produçãoou versão final: etapa final, definida pela edição e organização das tomadasgravadas (vídeo) ou pela consolidação do roteiro elayouta serem coloridos comsoftwarede edição de imagens.
(2) Plataforma de escrita colaborativa
Uma plataforma de escrita colaborativa deverá ser adotada durante a produção de vídeos ou histórias em quadrinhos. É o espaço, no qual os alunos escrevem, de forma colaborativa, a sinopse, o argumento e o roteiro do artefato. Os alunos podem discutir a ideia, usando ochate, juntos desenvolver a atividade. O professor deverá acompanhar a discussão, intervindo, quando necessário.
As práticas acima ressaltam a intencionalidade de ‘aprenderfazendo’; por meio da interação entre todos, considerando o conhecimento prévio dos alunos como base para o processo de criação. Nessa perspectiva, aprende-se em todas as fases da produção de vídeos, ou histórias em quadrinhos, com autoria consciente, dinâmica e criativa. No processo de ‘aprendizagemensino’, a produção desses artefatos tem possibilitado: (a) o desenvolvimento do pensamento crítico; (b) a promoção da expressão e comunicação; (c) a aprendizagem, de forma multirreferencial, flexível e prática; e (4) a mobilização de habilidades diversas e valorização da interação, da criatividade e do sentimento de corresponsabilidade.
Conclusão
Vivemos uma crise avassaladora, de dimensões intercontinentais: a pandemia do novo Coronavírus atinge uma magnitude sem precedentes, de duração incerta e de consequências catastróficas, seja no campo social, político, econômico ou educacional. Tudo é novo para nós, a partir do distanciamento físico, que nos obriga a reformular nossos ensinamentos, práticas e modos de agir. O fechamento de escolas está longe de ser o ideal, mas é a medida que se faz necessária neste momento. Tecnologias aplicáveis ao processo de ‘aprendizagemensino’, há muito disponíveis para criar conteúdo e experiências de aprendizado, são, agora, resgatadas por escolas, universidades e redes de ensino diversas, na busca de soluções imediatas, que minimizem os impactos da pandemia.
Bem sabemos que essas mudanças têm gerado conflitos de todas as ordens e magnitudes, sejam políticos, sociais, trabalhistas, familiares e/ou econômicos. As insatisfações se ampliam a cada dia, seja pela falta de infraestrutura tecnológica das instituições, problemas de conectividade, que acentuam a exclusão social, além de sofrimento, perdas de afetos e empregos, pais estressados, tendo de atender aos filhos em seus estudos, e professores sem formação pedagógica específica que os ajude a planejar atividadesonline.
No entanto, uma boa parcela dos educadores e pais não consideram razoável interromper as atividades escolares, por tempo indeterminado, ressaltando a importância de as redes públicas manterem algum tipo de atividade a distância para evitar aumentar, ainda mais, o ‘fosso’ existente entre os alunos da rede pública e da rede privada. Nesse contexto, a educação remota vem sendo adotado em diferentes níveis de ensino, pelas instituições educacionais, e a
transposição didática do ensino presencial para o ensino não presencial, marcada, pelo caráter
emergencial dessas soluções, tem sido um grande desafio para os educadores, em geral.
O que se verifica, neste momento, é a migração e transposição dos mesmos cursos, currículos, metodologias e práticas pedagógicas presenciais físicas para os ambientes digitais em rede. Com foco nos conteúdos, e o processo de comunicação de um para todos, a exemplo
da comunicação de massa, essa modalidade de ensino tem o professor como protagonista. As aulas expositivas são preparadas no formato de vídeoaula, mediante sistemas de webconferência. Todo o material concebido é armazenado em um repositório, podendo ser acessado, posteriormente.
Não há dúvidas quanto à relevância do ensino presencial para a formação dos sujeitos, mas o momento atual convida professores e estudantes a experimentarem as potencialidades do digital em rede, especialmente, nos cenários e realidades dos ambientes digitais de ‘aprendizagemensino’ síncrono e assíncrono. Nessa perspectiva, metodologias como, por exemplo, a aprendizagem baseada em projeto, na qual o protagonismo desse processo é do estudante, bastante utilizada, na educação universitária, tem ganhado mais espaço. Reiteramos, entretanto, que qualquer saber só tem sentido, quando ancorado em valores universais como empatia, solidariedade e direitos humanos; e o aprendizado será tanto mais eficaz quanto mais conectado estiver com realidade e cultura de nossos alunos.
Mais do que absorver conteúdos, é preciso, na relação dialógica, colaborativa e interativa ‘docentediscentes’, criar conhecimentos que permitam aos estudantes viverem momentos de ação, refletindo e estabelecendo relações significativas entre os conteúdos aprendidos. Nessa perspectiva, torna-se relevante que os atos de currículo engendrados levem em conta as dimensões integrativas do processo de ‘aprenderensinar’, a vivência de experiências e as potencialidades do digital em rede.
Com efeito, é preciso buscar soluções, para que a prevalência dos processos de aprendizagem, pautados no modelo transmissivo-conteudista adotados em grande parte das instituições brasileiras de ensino seja superada por metodologias mais participativas, em prol de uma educação-cidadã, democrática e plural, voltada para a criação do conhecimento, por meio da mediação compartilhada, que leve em conta a comunicação interativa, presencial e online.