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Conjectura: Filosofia e Educação

versão impressa ISSN 0103-1457versão On-line ISSN 2178-4612

Conjectura: filos. e Educ. vol.27  Caxias do Sul  2022  Epub 10-Abr-2024

https://doi.org/10.18226/21784612.v27.e0220063 

Entrevistas

Os 40 anos do Grupo de Trabalho (GT) de Educação Popular da ANPEd: entrevista com José Pereira Peixoto Filho

Valéria Oliveira de Vasconcelos1 

1Doutora em Educação, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Coordenadora do GT6 - Educação Popular da ANPEd.


Entrevistar José Pereira Peixoto Filho, ou simplesmente “Peixoto”, como é carinhosamente chamado, é um privilégio! Peixoto é um ícone do GT 06. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), possui uma fecunda experiência na área, desde suas atividades no Movimento de Educação de Base (MEB) até sua presença marcante em cursos de Graduação e Pós-Graduação. Sua trajetória é repleta de histórias atreladas à Educação Popular. Com sua fala fecunda, de chão carioca/mineiro/goiano, é um ferrenho defensor das lutas contra todas as formas de desigualdade social.

Fonte: arquivo pessoal.

Imagem 1 Valéria Vasconcelos e José Peixoto Filho em Recife, em 2022, na Celebração de 40 anos do GT 06. 

Sua conduta se confunde com as premissas dessa práxis que o conforma desde a juventude: é um professor-pesquisador amoroso, dialógico, rigoroso, solidário, atento e respeitador dos mais diversos saberes que compõem a dimensão humana de ensinar e aprender, como afirma Carlos Brandão – seu amigo e companheiro de longa data. Sua generosidade acompanha os 40 anos de existência do GT 06 e suas palavras seguem ensinando todas as pessoas que integram esse grupo por meio de escritos, falas e intervenções argutas e críticas – cujo cerne se assenta em sua orgânica relação com a vida a favor dos/as esfarrapados/as do mundo.

O diálogo que segue abaixo é resultado de uma de nossas tantas “prosas”, iniciadas há cerca de 20 anos no convívio promovido pelo GT 06, quando pessoalmente iniciei minha trajetória nesse grupo. Nele seguimos formando, aprendendo e ensinando na profícua partilha entre pesquisadoras e pesquisadores, mais ou menos experientes, quando tomamos a Educação Popular como solo fértil do trilhar e horizonte a indicar caminhos.

Desejamos que desfrutem a leitura!

Valéria: Eu gostaria de saber qual foi a história, o percurso da criação do GT 06. Eu queria saber como foi esse processo, quem foram os primeiros coordenadores e de onde partiu a ideia.

Peixoto: Seguinte, primeiro, bem antes de criar o GT e na própria organização da ANPEd, nós todos participamos, porque ela foi bastante articulada lá no Rio de Janeiro na época em que estávamos – eu e Osmar Fávero – no IESAE2. Eu como aluno de Mestrado e ele já como professor, fazendo o Doutorado dele na PUC-Rio. Nós já tínhamos um grupo que vinha da nossa história com a Educação Popular, o trabalho junto ao Centro Ecumênico, que trabalhou, inclusive, com a formação de pessoas da comunidadebase. Beatriz Bebiano Costa, eu, Jether Pereira Ramalho, entre outras pessoas, inclusive mais tarde Carlos Rodrigues Brandão veio a participar muito fortemente (com a escrita do livro dele3). Então havia já todo um trabalho quando a ANPEd foi criada – e não éramos somente do Rio de Janeiro: havia uma grande participação de Niterói e o Alceu Ferrari, lá do Rio Grande do Sul, que participou bastante dessa articulação. Depois, mais tarde, ele foi para o grupo de alfabetização e outros, mas no início o grupo de Educação Popular articulou um pouco mais essa questão de alfabetização. E enfim, não só ele (Alceu Ferrari), como outras pessoas que eram lá do Rio Grande do Sul e também vinham trabalhando com a questão da alfabetização, da Educação de Adultos e da Educação Popular. No Rio Grande do Sul teve sempre teve um grupo forte que vinha da época da preparação do Programa Nacional de Alfabetização (o PNA), da época do João Goulart. Então esse grupo permaneceu lá, fazendo trabalhos comunitários com Educação Popular.

Valéria: Em que época isso, Peixoto?

Peixoto: Antes e depois de 1964. Porque todos nós continuamos, na medida do possível, muitas vezes participando clandestinamente, mas trabalhando com grupos populares em vários lugares do país. Eu fui para vários lugares fazer treinamento de Educação Popular com a “metodologia Paulo Freire”. Enfim, nós não paramos. Mesmo onde o Movimento de Educação de Base (MEB) não continuou, a gente seguiu trabalhando. Então, quando fomos para a reunião da ANPEd, a segunda reunião, que foi em Vitória/ES, nós conversamos muito. Estávamos Carlos Rodrigues Brandão, eu, Osmar Fávero, o secretário-geral era o Jésus de Alvarenga Bastos – da Universidade Federal Fluminense UFF) – e veio conversar com a gente várias vezes. Fomos articulando e reunimos um grupo. Discutimos durante a reunião. Mais tarde, um pouco antes da realização da Assembleia Geral, a gente sentou no pátio da universidade, embaixo de uma bela mangueira, e ficamos lá conversando, falando, articulando. Eu me lembro de uma cena muito interessante: a Maria Amélia Goldemberg, que era da diretoria, veio até nós e perguntou: “Já saiu o coordenador? Já terminou a reunião?” (risos). Na pauta estava a criação do grupo, assim, e ela vinha... me lembro até da cor da roupa dela, ela era uma pessoa muito simpática, a Amélia. E o Jésus também vi várias vezes, até porque era importante criar o GT. Então, aí, nós discutimos e resolvemos entre vários nomes que Osmar e eu ficaríamos na coordenação. Eu ficaria na vice-coordenação e nós dois coordenaríamos a articulação do grupo ao longo do ano para poder, na próxima reunião, já ter um grupo estabelecido. Entende como é que foi? Então foi bastante conversado, preparado antes, várias reuniões no Rio de Janeiro...

Valéria: Em que instituição você estava?

Peixoto: No IESAE. Eu tinha saído da UFRJ e deixado de ser físico.

Valéria: Na UFRJ você estava fazendo Física e lá foi orientado pelo Cesar Lattes...

Peixoto: É, exatamente, aí foi um período de “eu” como professor de Física, que vai até 1979, mais ou menos. Então, logo que fiz a seleção para o IESAE, eu já tinha decidido que deixaria a Física e iria para a Educação. Quando fiz a seleção eu estava ligado ao Luiz Pingueli Rosa. Comecei a fazer o Mestrado, e já nele, no segundo período, foi criada uma cadeira da qual participei da criação, chamada Educação Popular – “Seminários de Educação Popular”. Era isso. Que foi onde começamos a articular algumas pesquisas que deram origem, inclusive, à tese do Victor Vincent Valla. O Valla foi o professor-coordenador desses seminários e o titular da cadeira, da disciplina. A turma era, fundamentalmente, o grupo, o núcleo que trabalhava junto com ele: eu, Ruth Rios, o Beto...

Valéria: O frei Betto?

Peixoto: Não, havia dois “Betos”: o Luís Alberto de Aracaju, antropólogo e professor da Universidade Federal de Sergipe, e o Carlos Alberto do Rio de Janeiro, psicólogo. Um Beto era da minha turma e o outro era da turma seguinte. Quem mais? O Jorge Ricardo, sociólogo e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Jorge que trabalhava no NOVA, e o professor Victor Valla. É esse o grupo. Desses seminários várias pessoas que não eram do IESAE, inclusive, participaram. A Regina Leite Garcia fazia Doutorado na UFRJ e foi participar do seminário. Então foi muito bom. Era um seminário, assim, em que se articulavam vários professores que o Valla convidava. Vinham discutir conosco “a questão da Educação Popular”.

Valéria: Você acha que esse foi um embrião, mesmo, da criação do GT na ANPEd?

Peixoto: Olha, tudo isso que estou contando foi mais ou menos um embrião. Porque nesse meio aí Osmar articulava com o pessoal do Rio Grande do Sul, e a gente discutiu com o pessoal de Niterói e de outros estados também, e, como o IESAE era um local que aglutinava pessoas vindas do Brasil inteiro, as pessoas interessadas em Educação Popular também participavam.

Valéria: Nos conte um pouco sobre o IESAE, porque provavelmente para compreender essa história é importante saber o que é o IESAE, não é?

Peixoto: Olha, o IESAE era o Instituto de Estudos Avançados em Educação da Fundação Getúlio Vargas. E foi um programa organizado na Fundação Getúlio Vargas pelos professores Maria Julieta Calazans e Newton Sucupira, que eram os dois coordenadores – ela a coordenadora científica e ele o coordenador pedagógico. Foi um programa bastante plural, acho que essa foi uma das características do IESAE. Então ele articulou uma seleção no Brasil inteiro, foi buscar gente no Brasil inteiro. Os cursos eram presenciais tanto nas regiões das pessoas quanto no Rio de Janeiro, para onde as pessoas se deslocavam. Na minha turma tinha um grupo de nove pessoas do Maranhão, de Sergipe, do Mato Grosso e de Goiás. Então ele abriu um caminho de discussão com professores muito competentes.

Valéria: E você fez seu Mestrado em Física orientado pelo César Lattes.

Peixoto: É, Mestrado em Física, fiz seleção, passei, mas não concluí. Quando decidi que eu ia sair, falei: “Não vou defender tese mais, acabou, ciclo que acabou da minha vida” – e não foi verdade, porque nunca acabou (risos). Naquele momento eu estava decidido, era o momento de preparação da anistia, pré-anistia, a sociedade se movendo, os movimentos sociais articulando de novo. Aí eu, altamente e muito mais envolvido com a questão da Educação de Adultos, vinha do Centro Ecumênico, e nós tínhamos muita atividade pelo país inteiro, pela América Latina junto com a ISAL4, que era o grupo do Uruguai, que era protestante... existe até hoje. Onde trabalhavam o Paulo Write5, os protestantes – presbiterianos e metodistas fundamentalmente –, o Júlio Barreiro, o Paulo, Júlio Santana, e vários outros de quem agora não me lembro o nome... E nós fomos, inclusive, convidados a dar treinamento. Fui ao Paraguai dar treinamento sobre o sistema Paulo Freire para um grupo que até hoje não sei se eram guerrilheiros ou não, só sei que era na região do Chaco Paraguaio. Minha impressão é de que eram guerrilheiros, até porque a maioria deles foi morta depois, literalmente metralhados, a mando de Augusto Stroessner, inclusive os padres.

Valéria: Falar guerrilheiro parece que é um termo desqualificador. Mas não, né? Eram pessoas militantes, revolucionárias.

Peixoto: Militantes revolucionários, sim. E que estavam, inclusive, fazendo trabalhos com os índios Quéchuas. No treinamento havia índios Quéchuas. Eles se negavam a falar espanhol, tinha que ter intérprete pra mim, um brasileiro que falava quéchua, um padre que falava quéchua, porque eles se negavam a falar espanhol, a não ser quando queriam.

Valéria: Isso foi mais ou menos na década de 1980?

Peixoto: Não, isso foi no início dos anos 1970.

Valéria: Início dos 1970... porque quando você levou o livro “Educação Popular e Conscientização”, do Brandão, já foi em 1980.

Peixoto: Não, foi antes, antes.

Valéria: Ah, é que foi publicado aqui em 1980, não é?

Peixoto: Isso, a publicação original em espanhol foi em julho de 1970, em espanhol. Ele saiu logo no início dos anos 1970, foi em pleno governo Emílio Garrastazu Médici.

Valéria: Conte essa história, que é muito interessante e que a grande maioria das pessoas não sabe, não é? O Brandão escreve no prefácio das últimas edições, mas poucos sabem que foi você quem levou o manuscrito...

Peixoto: Foi. A história é assim: o livro foi escrito a partir de um artigo maravilhoso que Carlos escreveu na revista Proposta. Nós, no Rio de Janeiro, entre outras pessoas, propusemos para ele escrever aquele livro, “Educação Popular e Educação de Classe”.

Valéria: Conscientização, não é?

Peixoto: É, é porque o artigo se chama assim... e está publicado na revista Proposta. Então ele começou a escrever esse livro e foi tomando um corpo. E o Jether era o nosso coordenador do CEDI (Centro Ecumênico de Documentação e Informação), muito articulado dentro da América Latina. O Jether era do grupo dos presbiterianos. Então o grupo, tanto do Uruguai quanto de lá, decidiu que o livro seria publicado. “Como” a gente não sabia, né – e aí a opção foi fazer a publicação em espanhol pela Sigla e o Júlio Barreiro assinar o livro. O Júlio Barreiro era uruguaio, um dos pastores uruguaios...

Valéria: Também presbiteriano.

Peixoto: Presbiteriano. O Júlio era presbiteriano, um presbítero. Então o Carlos escrevia os capítulos e mandava para a gente, no Rio de Janeiro, ler. Acho que mandava pro Osmar também; quer dizer, ele mandava uma cópia, então a gente lia, Osmar lia lá na casa dele. Mas o grupo do Centro Ecumênico lia – Beatriz Bebiano, Jether e eu, nós três sempre líamos e fazíamos observações. Beatriz, muito rigorosa, sempre muito cuidadosa, fazia observações nos diversos campos históricos, metodológicos. Enfim, ela era uma pessoa muito cuidadosa com as informações e os dados. E aí o livro voltava para o Carlos, que aceitava, reescrevia ou não, e foi fazendo. O último capítulo... o livro tinha que ter saído naquela época, que havia um evento importante para poder lançar... precisava sair esse livro. Aí veio o capítulo, não é? Alguém trouxe lá de Goiânia o capítulo, e ficou com Jether, Beatriz e Osmar. O Osmar leu, nós três depois íamos ler, só que no dia anterior houve uma invasão da polícia no condomínio onde Osmar morava. E levou...

Valéria: Em Niterói?

Peixoto: Não, ele morava na Barra da Tijuca, no condomínio. Lá moravam várias pessoas militantes. A invasão passou pela casa do Osmar e levou. E aí, bom, então nós marcamos de madrugada cedinho, seis horas da manhã, para começar a fazer a leitura, porque eu ia dar aula à tarde no Instituto de Física. Então chegamos lá, quando cheguei, encontrei a Beatriz lívida, ela estava, assim, branca, e eu disse: “O que que houve?”. E ela disse: “Perdi o livro no táxi”. Aí eu falei: “Meu Deus do céu”. Imediatamente, enquanto passava o meu susto, o Jether chegou e disse: “Você vai agora para Goiânia buscar a outra cópia, a única que existe na casa de Carlos”. E eu disse: “Pelo amor de Deus, tenho que dar aula à tarde, o que eu faço?”. Aí... Tá bom, já sei o que vou fazer: fiz uma loucura de pequenas mentiras, inclusive vários colegas contribuíram para essas pequenas mentiras também, enfim, me substituíram e falei: “Eu não posso comparecer ao instituto hoje, vocês deem um jeito de dar a minha aula, eu tenho que estar presente aí”. Eu não podia arriscar, éramos recém-contratados do instituto. Aí o Aluísio Ribeiro da Costa, que era meu colega, disse: “Pode deixar, a gente resolve”. Resolveram lá (essa parte é muito interessante também, o modo como eles fizeram); mas enfim, eu embarquei para Goiânia. Fui para o aeroporto, cheguei, tive que passar por Brasília... Meu irmão estudava na Universidade de Brasília. Aí não tinha voo. Era uma loucura, e o último voo de volta para o Rio de Janeiro partindo de Goiânia era às quatro horas da tarde. Enfim, falei: “Ah, vamos entrar no ônibus, vamos ir pr’aí”. Passei a mão no meu irmão, de guarda-costas, que estudava lá, e falei: “Vamos comigo”! Aí fomos para Goiânia. Desci e fui para a casa do Carlos. Peguei o livro e botei por dentro das minhas calças, e meu irmão disse: “Mas não vai dar certo”. E falei: “Olha, não tem jeito, vou tentar passar na Polícia Federal. Se for pego, paciência, mas vamos ter que arriscar”. Meu irmão ficou na porta da entrada do aeroporto, da sala, tremendo, quase chorando de medo de ser preso... e eu passei, consegui passar. Eles faziam revistas muito grosseiras, na época, muito agressivas, inclusive com o corpo da gente. Várias vezes ficávamos constrangidos com a agressividade que eles tocavam no corpo da gente. Mas consegui passar, e no Rio também – na descida o policial me olhou e disse assim: “Pode passar”. Cheguei lá no colégio Sion tirando aqueles pedaços de dentro das calças (risos). Nós passamos a noite relendo o texto, nós três. No outro dia o Júlio levou o livro para fazer a tradução. Aí foi feita a tradução e o livro foi publicado. Foi uma alegria quando ele foi publicado, mas tem essa história cômica, tragicômica do livro do Brandão... O livro foi um sucesso estrondoso, né? Júlio Barreiro virou o maior intelectual de Educação Popular do mundo, foi um negócio, assim, mundial, um negócio de vários países, não foi só Uruguai, só Argentina, só Brasil, não. Foi a América Latina inteira, Costa Rica, Caribe, tudo. O livro circulou mesmo, nem sei quantos exemplares Carlos já publicou desse livro, mas não são poucos...

Valéria: Deixa eu só fazer mais um adendo aqui, porque acho que isso é um documento maravilhoso. O Oscar Jara diz que nesse livro foi a primeira vez que a Educação Popular foi citada com esse nome. Antes não havia escrito algum, porque nos escritos do Freire, até então, usavam Educação Problematizadora, Educação Transformadora.

Peixoto: É, o MEB sempre usou a “Educação Popular” – isso nos textos do MEB que, inclusive, são anteriores à minha presença na equipe nacional. Já tinha lá, Educação Popular, por causa da Animação Popular criada pelo MEB, baseado em várias experiências da África e do Peuple et Culture na França e suas colônias. Mas a criação como nós conhecemos foi feita no Brasil. O MEB fez, não é? Não tinha livros publicados, isso ele tem razão, agora os documentos dos movimentos da época já falam em Educação Popular.

Valéria: O que você mostra até aqui, na verdade, é todo um movimento que vai preparando a criação do GT de Educação Popular da ANPED, não é?

Peixoto: É! Para mim o GT foi a oportunidade de sistematizar até quando começa a abertura política, pra gente poder articular mais livremente, e isso passa a ser discutido. Não só nos treinamentos clandestinos, que era como se fazia. A palavra Educação Popular era usada muito por ex-militantes dos anos 1960. Ou então vinha o contexto de Educação Popular como é citado antes. Inclusive, a discussão com Vanilda Paiva vai muito em cima disso. E nem estou citando aqui todo o debate que houve com ela durante muito tempo, que é a questão da Educação Popular no sentido do período da criação do sistema de ensino. Educação Popular é formada como “Educação para os pobres” e toda aquela questão, então o popular e a noção de povo eram isso.

Valéria: Educação para o povo, Educação para todos...

Peixoto: É, inclusive dentro da perspectiva da Educação republicana. O manifesto de 1932 trata assim, não é? Porque você vê a Educação supletiva, que era sinônimo de Educação Popular, que é aquilo, né? E o corte vai ser feito pelo Paulo Freire, já no final dos anos 1950. Então ali começa a grande discussão do entendimento do que é Educação, o que vai acontecer após o congresso de 1958 e durante a construção dos movimentos populares em favor da alfabetização, no final dos anos 1950 e início dos anos 1960, que vão ser abolidos pelo golpe, pela ditadura.

Valéria: E aí os movimentos de cultura popular...

Peixoto: É, de cultura popular. E a Educação Popular vindo já no seio da cultura. Isso aí é o corte fundamental da Educação Popular, no entendimento de povo como nação, como necessidade republicana, como a questão de a República ser de todos. Então o sistema para todos, de fato. Mas entender a Educação como um processo que dependia do outro, e isso do ponto de vista filosófico e epistemológico, foi uma grande diferença: ou seja, não é a “Educação para o povo”, a Educação Popular é a “Educação com o povo”. Então, o que é o “com o povo”? É a reflexão em cima do conhecimento elaborado por todos, e não só a elaboração, mas a proteção, a construção do conhecimento por todos, que sempre foi feita pela sociedade, que é a grande crítica da reprodução. Bom, mas enfim, vamos falar sobre o GT, não é? Para mim, o fato de o GT ser muito marcado por essas concepções é porque, na sua origem, a influência de Osmar, minha e de Carlos, tenho consciência disso, foi muito grande, evidentemente. A gente trazia sempre as questões a partir dessa nova discussão sobre o que era a Educação Popular e esse conceito de Popular na Educação, não é? Fazíamos sempre questão de trazer isso. Então teve muita participação de gente no período que vinha das comunidades de base, dos movimentos, dos grupos de atendimento, da população, do atendimento mesmo à população, do pessoal dos primeiros grupos ligados à saúde. Porque a Educação Popular, já no final dos anos 1950, anos 1960, principalmente para cá, já previa essa articulação com as outras áreas e entendia a Educação, a Saúde, a Cultura, o divertimento, o teatro, tudo como direito de todos. E isso tudo contribuiu para o processo educativo, que era a formação da consciência. Então, vai-se entender a Educação como formação de consciência, mesmo, a partir desse embate dos diálogos com as necessidades básicas do povo, evidentemente. Aí, inclui-se a maioria da população, a Educação dos pobres e dos miseráveis, não apenas como doação, como tal, dominação ou processo de treinamento, que era a concepção anterior.

Valéria: E daí vocês se organizaram... Você falou sobre a sombra de uma mangueira também, né? Muito legal.

Peixoto: À sombra de uma mangueira, plantada lá na Federal de Vitória, onde houve a segunda Reunião Anual da ANPEd.

Valéria: E à sombra dessa mangueira estavam você, o Fávero, o Brandão...

Peixoto: Brandão estava, e outras pessoas, acho que Alceu Ferrari estava também, ele participou de toda essa articulação anterior, o Alceu Ferrari. Ele era dos militantes do Rio Grande do Sul, foi no tempo do professor Ernani Maria Fiori e tudo, entende, que é o que faz o prefácio da “Pedagogia do Oprimido”. Ele era professor lá e marcou muito a nossa formação. Se você ver, muitas coisas que falamos ou falávamos eram do Fiori. A gente tentava entender o que ele falava (risos). Bom, mas enfim: à sombra dessa mangueira nasceu o GT de Educação Popular. Eu não me lembro mais das pessoas, não tenho foto, não tínhamos o hábito de fotografar nesse período. Acho que muita pouca gente fotografava. Não me lembro nunca de Carlos ter falado que tinha foto disso, que gostava de fotografar muito, né?

Valéria: Acho que a foto mais antiga que ele tem é daquele encontro na Nicarágua...

Peixoto: Ah, é... Aí é após o livro, quando a articulação com a Nicarágua passou a ser bem mais forte.

Valéria: Em 1981 vocês fizeram essa articulação, e aí em 1982 foi fundado o GT?

Peixoto: Fundado o GT. É, desde 1979 a gente vinha já... desde a fundação da ANPEd a gente pensou no grupo. Eu acho que isso o Osmar pode confirmar, ele inclusive como o mais velho do grupo todo (risos).

Valéria: E ele foi seu orientador no IESAE?

Peixoto: Foi meu orientador no IESAE. E como a gente tinha trabalhado juntos já no MEB, facilitava a conversa. Ele tinha uma conversa muito aberta. Ele era realmente a pessoa mais experiente, tinha uma compreensão da situação nacional muito maior do que a minha. Nessa época eu ainda estava um pouco novo na articulação formal dentro da área da Educação. Eu tinha participado de vários eventos de Educação. O Jésus também participou dessa reunião, não ficou o tempo todo, mas participou dessa reunião, um grande incentivador da criação do grupo.

Valéria: E vocês três, quer dizer, você, o Brandão e o Fávero, vêm do MEB.

Peixoto: Sim. O Brandão foi do MEB nacional também, do período que Osmar estava. Brandão entrou no MEB acho que em 1961 ou 1962, por aí, 1961, acho. Eu estava no MEB em Goiás nessa época, mas não era funcionário. Era de outro grupo de voluntários que trabalhavam muito fortemente dentro disso, até porque era um projeto da Ação Popular (AP), um projeto da Juventude Universitária Católica ( JUC). O MEB era um projeto de Educação Popular e grande parte das pessoas do MEB veio da JUC.

Valéria: Vou te fazer uma pergunta, porque vocês três sendo do MEB, da JUC e da AP mostra que o início do GT estava fortemente ligado aos movimentos populares. Eu só queria saber: por que ele nasce nesse seio dos movimentos populares?

Peixoto: O GT nasce nesse seio, e é fortemente marcado já no início. O GT de Educação Popular trabalhava com Educação de Adultos na perspectiva da Educação Popular. Então é parte da questão da escolarização vista na perspectiva da Educação Popular. E isso vai refletir, inclusive, nos nossos trabalhos posteriores, nas nossas pesquisas, na academia e no sistema de ensino. E com grande parte do nosso trabalho fomos participar do sistema de ensino no Governo Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, na Secretaria da Educação do Estado do Rio de Janeiro, muito fortemente.

Valéria: Nessa perspectiva, como aconteceram as reuniões depois de 1982?

Peixoto: As reuniões anuais aconteceram de forma coletiva: teve Movimentos Sociais, Educação de Adultos, Educação para a Saúde, Educação Ambiental, tudo o que estava nascendo, brotando e começando acontecia no GT de Educação Popular. Ele era bastante amplo e acolhia toda essa área, no sentido de uma Educação como movimento e uma Educação integral, integradora, libertadora. Era necessária essa diversidade. Ou seja, toda essa questão da diversidade, tanto disciplinar como social e política, estava dentro do GT 06. Então por muitos anos foi assim, depois as pessoas foram saindo e formando GTs específicos. Tem a Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, por exemplo. Por que a Petronilha de vez em quando ainda é chamada no GT? Porque ela participou. Depois vão criar outros, o caso do Miguel Arroyo, que vai estar lá no Movimentos Sociais. Mas eles foram muito importantes, um coletivo muito forte para todos os grupos. E o grupo de Educação de Adultos vai ser liderado por Maria Clara e Sérgio Haddad, um pouco mais tarde. Eu não me lembro exatamente do argumento, mas acho que Osmar pode esclarecer melhor isso, porque isso ocorreu no período de dois anos que não fui à ANPEd. Nesse ínterim o Valla entra como coordenador. Ele conversou comigo várias vezes, e eu não podia dizer nada, porque estava numa fase meio complicada da minha vida. Não assumi nada e só voltei dois anos depois, aí retomei minha participação. Sei que foi um momento que o grupo ficou bastante enfraquecido, que o GT ficou bastante enfraquecido. O Valla várias vezes me procurou. O Jadir Moraes, a gente conversou, que estava desvirtuando o grupo, por uma série de questões.

Valéria: Isso já na década de 1990, não é?

Peixoto: Exatamente, é na década de 1990 que eu volto, inclusive. Valla tentando segurar, Jadir fazendo um trabalho um pouco mais consistente. Lembro que quando voltei eu via os trabalhos e me perguntava: “Será que estou fora do ninho?”. Os temas me pareciam meio distantes... não que eu não soubesse da discussão, mas a Ciência tem padrões, tem epistemologias, então eu ficava meio preocupado, entende? Mais com o caráter científico do grupo. Mas Osmar pode esclarecer melhor como é que se deu esse período, principalmente quando se divide para formar o GT de Educação de Adultos e fica o GT de Educação Popular. Depois surgiu o GT de Trabalho e Educação, só que eles passaram por lá. Eu mesmo apresentei vários trabalhos sobre “Trabalho e Educação” que tratavam da Educação de Adultos ou da violência, ou outros temas. Várias vezes foram apresentados trabalhos sobre Didática, Metodologia, enfim, o GT de Educação Popular abrangeu tudo isso.

Valéria: Mas vamos pensar que você é . nosso decano, porque nunca saiu do GT 06, não é?

Peixoto: Ah, isso é verdade. Eu nunca mudei! Sempre me mantive firme no GT de Educação Popular.

Valéria: O que você visualiza nesse histórico do GT? Ele começou com movimentos sociais, com essa pluralidade toda, e essas pessoas maravilhosas – Petronilha Silva, Sérgio Haddad, Miguel Arroyo... –, pessoas muito representativas dos grupos para os quais migraram. Nós continuamos discutindo essas questões e hoje estamos todos e todas em subáreas, ainda juntos sob um grande guarda-chuva. E daí? O que você visualiza do percurso do GT nesses 40 anos?

Peixoto: Olha, a primeira coisa que eu diria é que esse grande guarda-chuva (que é uma expressão muito boa), possibilitou uma reflexão um pouco mais profunda da questão do que é povo. O que nós, academicamente, o que nós, filosoficamente, o que nós, sociologicamente, o que nós, politicamente, entendemos como povo? Que conceito é esse? O fato de discutirmos a Educação Popular nos permitiu ampliar esse conceito e entender que no campo científico – acho que isso é o caráter de cientificidade da associação e dos GTs que é necessário manter – devíamos elaborar epistemologias que sustentassem mais amplamente a importância da Educação para todos. E acho que isso é fundamental! A Educação não limitada, a elaboração do conhecimento e a produção social desse conhecimento em favor de todos ao mesmo tempo. Mas esse “todos” entendendo como incorporar todo o processo histórico e violento que a sociedade brasileira viveu ao longo dos anos, que foi de exclusão, de discriminação... isso abre o caminho para entender o que é cidadania, o que significa liberdade… Liberdade de quê? Como, por exemplo, os estudos sobre o negro e sobre a escravidão que passam lá pela ANPEd, os currículos da preparação de currículos... Tudo isso acho que foi fruto desse embate teórico, que não foi só do GT de Educação Popular, dentro da ANPEd. Acho que isso trouxe a busca por investimentos/instrumentos científicos, metodológicos e epistemológicos, e no campo da Filosofia Política a gente podia pensar mais claramente sobre o que é educar. Quando falo hoje em “Educação republicana”, não estou falando sobre a Educação republicana vista do ponto de vista das elites, ou seja, é pensar a República como coisa de todos mesmo. Então essa “coisa de todos” incorpora os miseráveis da vida, os esfarrapados da vida. Nos convoca a entender, por exemplo, o motivo de a maioria dos analfabetos ser de negros, apesar de também haver brancos pobres. A sociedade escravocrata permitiu ampliar a desigualdade. Para mim, até os anos 1960, sempre que se falava da Educação republicana ela era a própria simbologia dos nossos grupos escolares. Quando falo do meu grupo escolar, eu era o único pobre que tinha lá, que conseguiu terminar o quarto ano. Os outros meninos eram da elite que jamais tinha pensado a história dos grupos oprimidos, história maravilhosa que tem que ser respeitada; a história da luta em favor da Educação. Não se pensava, a meu ver, como com esse conceito amplo não só da diversidade cultural e acadêmica, mas fundamentalmente da filosofia política que estava dentro dela. Então acho que permitiu esse amplo debate, que não aconteceu só na ANPEd, evidentemente, mas fortaleceu muito a possibilidade de discutir essas questões hoje. Então a Educação Popular e essa discussão toda sobre a Educação republicana tem que passar pelo GT de Educação Popular.

Valéria: Peixoto, é muito, muito interessante o que você traz. O GT 06 é um espaço para fortalecer distintas reflexões, não como a possibilidade da “maternidade” das discussões, mas de representar mais um parceiro nessa ampla luta contra-hegemônica nas mais diversas áreas – a “unidade da diversidade mesmo”. Sejam homens, mulheres, com diferentes orientações, com diferentes etnias, mas sempre na busca por uma Educação transformadora, emancipadora e contra toda forma de opressão.

Peixoto: Mas até a opressão no sentido de que a reprodução não seja apenas aquilo que foi idealizado como um modelo a partir de uma visão única: esse é o problema. Então, não incorporou os povos originários, não é? Não incorporou o pensamento, digamos, dos pobres. O que é que os pobres querem? Por exemplo, você vai lá em “Educação de menino rua” do ponto de vista das elites, não é? Eles já pegam o caso de “se aqueles meninos querem realmente ser meninos de rua” ou velhos de rua. Está entendendo? Nós temos que perguntar isso, entendeu? Eles querem continuar sendo velhos de rua, viver lá na sarjeta? Eu acho que o problema da exclusão, da reprodução, são eles que têm que continuar nos indagando. Por isso o papel da questão da Educação transformadora, ou libertadora, é importante. Além da ampla compreensão do pensamento de Paulo Freire. O que é que ele traz? Ele sempre pensa isso como um movimento. Então nós, como educadores de idosos, libertadores e políticos, temos que nos perguntar isso: a sociedade continua na construção da liberdade, da libertação? Eu acho que a Educação como prática de liberdade é um movimento que não vai acabar nunca. Sou a favor disso. Precisamos descobrir novas formas de o ser humano Ser Mais. Isso, claro, nos apropriando dos saberes produzidos por toda a humanidade, inclusive os saberes da burguesia – tendo claro que ela não os produziu sozinha – e aquele produzido pelo braço dos pobres. Essa apropriação necessária, que foi um debate sempre presente no GT 06, é a questão da elevação espiritual. O que é essa elevação espiritual? Não é a elevação de classe. Essa elevação espiritual é a capacidade do ser humano cada vez mais consciente para a construção da sua independência, da sua autonomia, do seu poder de decisão, do seu poder de condução.

Valéria: E eu gostaria, se você não estiver muito cansado, que você falasse sobre os desafios que nós temos como GT no quadro atual... Quais são os desafios do GT de Educação Popular? Pensando na ANPEd mesmo.

Peixoto: Bom, uns tempos atrás eu já estava falando que temos que voltar a fazer trabalho de base! Vamos ter que voltar, ir lá, fazer um trabalho de base, porque temos que mexer nessas bases sociais aí e ensinar, ensinar mesmo, essa juventude que está se jogando nos trabalhos populares. Tem que fazer isso, porque a coisa parece que regrediu no sentido de cristalizar coisas muito reacionárias. Houve um período em que fiquei meio desesperado, quando fiquei por dentro do que estava acontecendo no MEC, no tal Ministério da Damares. Mas me parece que, com tudo o que passamos e com todo esse retrocesso do processo de conscientização, ele não acabou. Por quê? O ser humano não é idiota pela própria natureza. Não é. Eu não acredito nisso. Acho que tem muita coisa guardada aí no imaginário e, principalmente, nas camadas populares, como possibilidade de vida e de transformação. Então, ao meu ver, é o seguinte: o avanço científico e tecnológico que houve nos últimos cinquenta anos a gente tem que ser capaz de utilizar. Estou começando por aí, esse instrumento e essa conquista devem ser em favor das camadas populares. Outra questão é a retomada do sistema de ensino. Até hoje tínhamos avançado na questão do conceito de como o pensamento do Paulo Freire se coloca (ou não) dentro do sistema. Acho que isso tem que ser retomado, porque é como perspectiva de Educação para a nação. Acho que o novo Ministério – e eu espero que ele seja o novo que eu quero – pode pensar isso e não ter medo de retomar, inclusive, projetos que estavam em andamento e foram – alguns foram – conquistas, conquistas mesmo, no campo da Educação. Conquistas no campo da teoria, no campo das práticas. Porque essas conquistas permitiram práticas diferenciadas, inclusive no sistema de ensino. É evidente que isso não vai ser tranquilo, porque nós não vamos ser só Esquerda, não é? A burguesia não é boba, por isso ela continua dominando o mundo, não é? E vai atuar fortemente. Mas não acredito que os professores – com a opressão que sofreram nesses últimos anos, reforçada pelo uso da tecnologia (que não é acessível a todos) e pela pandemia –, ou grande parte deles, tenham esquecido das lições que aprenderam nos outros governos. Eu não acredito nisso. Não quero acreditar que a consciência regride, porque o conhecimento é acumulado e refletido, porque ele, mesmo nos lugares em que não se fazia uma reflexão mais profunda, às vezes até autoritariamente – não vamos negar isso –, mas houve uma inversão/imersão, houve um conflito... O conflito foi estabelecido nos últimos governos do PT e é fundamental no debate para a formulação de práticas que possam avançar nas práticas sociais a partir da escola. Acho que necessitamos de currículos diferenciados, incorporação de conteúdos novos, novas produções de Mestrado, Doutorado, teses, toda uma produção científica e literária. Temos que recomeçar, acho que tem que ir assim mesmo: levar instrumentos para que os professores reflitam, porque eles ficaram carentes de tudo. Outra coisa é que o GT tem uma participação, acho que aí a gente tem que retomar uma coisa, não paralela ao sistema. Acho que a gente tem que buscar ampliar nossas participações nas atividades do sistema de ensino da escola e todos os movimentos. Não pode ser uma coisa paralela. Isso sempre foi a grande trajetória marginal da Educação de Adultos. Então isso tem que ser enfrentado. E não é o projeto, o processo de alguém que vai lá – não, não é. É enfrentar. Nós temos milhões de analfabetos e de não escolarizados que não tiveram acesso a um processo mais amplo de formação de consciência. Porque a consciência não se forma num piscar de olhos, mas a partir dos saberes ancestrais e naturais. Não tem isso. Ela vai se formar no conflito entre o progresso e a disputa do conceito de Educação. O progresso científico tem que ser em favor de todos. E, no caso da Educação Popular, nós temos uma opção, sim, a opção pelos pobres, pelos oprimidos, ou não temos?

2Instituto de Estudos Avançados em Educação da Fundação Getúlio Vargas

3Educación popular y proceso de concientización, publicado inicialmente por Julio Barreiro – Siglo Vientiuno Editores SA, 1ª edición en español: junio de 1974.

4Igreja e Sociedade na América Latina (ISAL).

5Paulo é uma das pessoas que estão na lista dos desaparecidos na ditadura do Brasil.

Recebido: 18 de Dezembro de 2022; Aceito: 18 de Dezembro de 2022

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