1 INTRODUÇÃO
Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino... Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade.
Paulo Freire, 1996
É muito importante, no âmbito educacional, discutir e propor metodologias de ensino que possam ser utilizadas pelos professores nos diferentes segmentos de ensino, em especial, na educação básica, pois, a partir da escolha metodológica, é possível uma aproximação ou distanciamento dos conteúdos - discutidos em sala de aula - da realidade do aluno. Nesse sentido, fica clara a importância do professor para conduzir e organizar com destreza e competência os conteúdos programáticos.
Para alcançar esse grau de clareza, faz-se necessária uma formação de educadores que seja compatível com o que se busca para uma educação de qualidade, conforme explicitado por Paulo Freire:
A melhora da qualidade da educação implica a formação permanente dos educadores. E a formação permanente se funda na prática de analisar a prática. É pensando sua prática, naturalmente com a presença de pessoal altamente qualificado, que é possível perceber embutida na prática uma teoria não percebida ainda, pouco percebida ou já percebida, mas pouco assumida. (FREIRE, 1993, p. 73-74).
O autor ainda acrescenta que:
[...] na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. (FREIRE, 1996, p. 39).
A partír das citações acima, conclui-se que a formação permanente extrapola, portanto, a noção de formação contínua. E somente por meio da ação (fazer) e da reflexão crítíca sobre esse fazer (prátíca) é possível mudar, construir e reconstruir a prátíca, por meio do pensamento crítíco da prátíca de hoje ou de ontem para aprimorar a ação vindoura.
Com a consciência da necessidade de uma formação permanente para todos, em especial, para os educadores, em coerência com a educação problematízadora proposta por Paulo Freire (1987), ele desenvolveu, desde a década de 1970, a metodologia da investigação temática, a qual favorece aos envolvidos no processo educativo a possibilidade de se assumirem como sujeitos de sua práxis histórica e de sua libertação, em solidariedade com outros sujeitos.
A metodologia da investigação temática é, portanto, denominada “temática significativa” ou “temas geradores”, porque os sujeitos devem fazer parte do processo de escolha - coletivo e problematizador. Dessa forma, “investigar o tema gerador é investigar [...] o pensar dos homens referido à realidade, é investigar seu atuar sobre a realidade, que é sua práxis” (FREIRE, 1987, p. 98).
Com o objetivo de apresentar a metodologia da investigação temática ou de tema gerador como possibilidade pedagógica da educação transformadora e libertadora, a partir da leitura da epistemologia freiriana, neste texto, buscamos tecer como se configura essa abordagem temática, apoiada na dialogicidade e na problematização.
No contexto da dialogicidade e da problematização, Paulo Freire ressalta que o tema gerador não se encontra nos homens isolados da realidade, muito menos na realidade separada dos homens; somente pode ser compreendido nas relações entre mundo e homens, e destes entre eles.
2 TECENDO AS BASES PARA UMA ABORDAGEM TEMÁTICA À EDUCAÇÃO TRANSFORMADORA
Trabalhar com a metodologia de tema gerador pode ser uma possibilidade de impulsionar a troca de saberes por meio do diálogo/dialogicidade e da problematização da realidade, respeitando as diferenças de cada sujeito cognoscente em sua própria visão de mundo.
É importante conhecer alguns dos termos da epistemologia freiriana para tecer os fios da abordagem temática significativa na perspectiva transformadora da educação libertadora, como, por exemplo, dialogicidade, práxis e problematização em sua concepção.
Para Paulo Freire:
[...] diálogo é a força que impulsiona o pensar crítico-problematizador em relação à condição humana no mundo. Através do diálogo podemos dizer o mundo segundo nosso modo de ver. [...] o diálogo implica uma práxis social, que é o compromisso entre a palavra dita e a nossa ação humanizadora. Essa linguagem abre possibilidades de repensar a vida em sociedade, discutir sobre nosso ethos cultural, sobre nossa educação, a linguagem que praticamos e a possibilidade de agirmos de outro modo de ser, que transforme o mundo que nos cerca. (ZITKOSKI, 2017, p. 117).
Como vimos, o diálogo implica o compromisso entre a palavra dita e a ação, de forma que não haja distinção entre a fala pronunciada e a prática, concretizando-se ao se efetivar a práxis. Nesse sentido, o desafio posto por Freire é construir novos “saberes a partir da situação dialógica que provoca a interação e a partilha de mundos diferentes”, mas que partilhem do desejo de construir um mundo melhor (ZITKOSKI, 2017, p. 118).
A práxis, na concepção de Paulo Freire, é uma ação percebida pela conscientização, que, “gerada por esta leva à construção de um outro mundo conceitual em que o indivíduo se torna sujeito e passa a atuar sobre o mundo que o rodeia”. Ou seja, uma estreita relação instituída “entre um modo de interpretar a realidade e a vida e a consequente prática que decorre desta compreensão levando a uma ação transformadora” (ROSSATO, 2017, p. 325).
Já o termo problematização “compreende o momento do desenvolvimento de uma consciência crítica sobre os temas em debate pela identificação de situações desafiadoras ou de problemas concretos que envolvam a vida dos alfabetizandos”, e também possui o sinônimo de educação libertadora (MUHL, 2017, p. 328).
Dessa forma, os termos diálogo/dialogicidade, práxis e problematização podem ser compreendidos como uma “estreita relação que se estabelece entre o modo de interpretar a realidade e a vida e a consequente prática que decorre dessa compreensão levando a uma ação transformadora” (ROSSATO, 2017, p. 325). Totalmente oposta às ideias de alienação, possibilita aos sujeitos um processo de atuação consciente que conduz a um discurso sobre a realidade para modificar essa mesma realidade.
Para tanto, faz-se necessária uma prática problematizadora para se opor à bancária, sabendo-se que:
Enquanto na concepção ‘bancária’ [...] o educador vai ‘enchendo’ os educandos de falso saber, que são os conteúdos impostos; na prática problematizadora, vão os educandos desenvolvendo o seu poder de captação e de compreensão do mundo que lhes aparece, em suas relações com eles não mais como uma realidade estática, mas como uma realidade em transformação, em processo. (FREIRE, 1993, p. 71).
A diferença essencial na fundamentação da pedagogia bancária para a problematizadora situa-se na esfera do saber autoritário e alienante para o saber libertador e conscientizador; todo e qualquer ser humano é detentor de conhecimentos significativos, não importa sua idade, meio social, grau de escolaridade, posição político-econômica ou outras diferenças reais, contra-pondo-se à pedagogia bancária, na qual poucos são considerados detentores de conhecimentos e saberes científicos.
Para se vivenciar a prátíca da educação problematízadora em sala de aula, é necessária uma metodologia que proporcione o diálogo entre educador e educando, de forma coerente e respeitosa com a realidade existencial; esta deve ser mediatízada pela consciência da busca do conteúdo programático da proposta curricular, por meio do educador com o educando e a comunidade escolar (WONG, 2018).
Para tanto, Paulo Freire propõe a metodologia da investigação temática, a qual descreveremos na sequência deste trabalho, que foi bastante utilizada por ele ao longo da sua trajetória enquanto educador, em todas as modalidades educacionais, da educação básica - incluindo a educação de jovens e adultos - ao ensino superior.
3 ACERCAMENTO DO FAZER: TEMA GERADOR
A escolha ou a definição por temas geradores a serem desenvolvidos com os educandos a partir dos conteúdos programáticos de uma proposta curricular precisa estar fundamentada em uma metodologia coerente com o objetivo, tanto na relação pedagógica quanto para além da educação formal (político/povo, pai/filho, educador/educando). Para Paulo Freire, a investigação temática é:
[...] uma metodologia que não pode contradizer a dialogicidade da educação libertadora. Daí que seja igualmente diálogo. Daí que conscientizadora também proporcione, ao mesmo tempo, a apreensão dos “temas geradores” e a tomada de consciência dos indivíduos em torno dos mesmos. (FREIRE, 1993, p. 87).
Dessa maneira, Paulo Freire nos provoca a construir os projetos educativos/pedagógicos que almejam ser libertadores e estabelecer a própria metodologia, mas esta tem de ser coerente com o diálogo como parte fundamental do processo transformador do ser humano.
Para que ocorram projetos educativos que favoreçam a concepção da educação problematizadora, por meio dos conteúdos a partir de temas geradores, é necessário que os educadores fiquem em constante vigília de suas atitudes e compromissos, e estes realmente favoreçam o diálogo e a prática da dialogicidade de uma educação humanizadora.
Destarte, Paulo Freire nos alerta:
Como professor não devo poupar oportunidades para testemunhar aos alunos a segurança com que me comporto ao discutir um tema, ao analisar um fato, ao expor minha posição em face de uma decisão governamental. Minha segurança não repousa na falsa suposição de que sei tudo, de que sou o “maior’. Minha segurança se funda na convicção de que sei algo e de que ignoro algo a que se junta a certeza de que posso saber melhor o que já sei e conhecer o que ainda não sei. Minha segurança se alicerça no saber confirmado pela própria experiência de que, se minha inconclusão, de que sou consciente, atesta, de um lado, minha ignorância, me abre, de outro, o caminho para conhecer. (FREIRE, 1996, p. 135).
Nas palavras de Paulo Freire, não há motivo para nos envergonharmos por não sabermos algo, pois, quando reconhecemos, estamos dando a possibilidade para o outro também reconhecer o que sabe; esse movimento pode se configurar como uma inquietação que desperta a curiosidade, dá a certeza da inconclusão, em constante movimento na história da humanidade.
Para desenvolver uma proposta de ação pedagógica, na perspectiva da educação humanizadora, a metodologia consiste na investigação do tema gerador a partir dos conteúdos programáticos, apoiado na investigação do pensamento do sujeito referente à realidade, uma vez que é investigando a sua atuação sobre a realidade que se concretiza a práxis social, entendida como o compromisso entre a palavra e ação realizada pelo sujeito. Nesse sentido, a educação e a investigação temática estão totalmente imbricadas na concepção de educação problematizadora (FREIRE, 1987, p. 56).
Por outro lado, na concepção bancária de educação, o que impera é o “antidiálogo”, ou melhor, a falta de comunicação a respeito do conteúdo programático, em que o educador o recebe, mas não o organiza para ser executado. Já na prática problematizadora, o que prevalece é o diálogo; os conteúdos programáticos são organizados pelo educador, a começar pela visão de mundo dos educandos, culminando, assim, nas temáticas significativas para os estudantes, naquele contexto social, político e cultural daquela realidade.
Na perspectiva freiriana, ao entrelaçar relações entre o mundo e os sujeitos, ele nos desafia a pensar de uma nova maneira as nossas práticas pedagógicas; se uma educação libertadora é desejada, consequentemente, precisamos de uma nova concepção metodológica para abordar os conteúdos em sala de aula; e essa pode, a partir da problematização, chegar aos temas geradores.
Para Paulo Freire,
[...] a partir da situação presente, existencial, concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da educação ou da ação política. O que temos de fazer, na verdade, é propor ao povo, através de certas contradições básicas, sua situação existencial, concreta, presente, como problema que, por sua vez, o desafia e, assim, lhe exige resposta, não só no nível intelectual, mas no nível da ação. (FREIRE, 1987, p. 27).
De acordo com o autor, precisamos propor condições reais e concretas de existência, aproximando o máximo possível da totalidade da existência humana. Por essa razão, contemplamos a proposta da metodologia da investigação temática para uma ação pedagógica, porque ela possibilita o diálogo e a problematização sobre os conteúdos programáticos da educação, favorecendo uma análise crítica, que valorize a interação entre educador e educando por meio do diálogo verdadeiro, em que a palavra assume as dimensões da ação e da reflexão por todos os envolvidos (FREIRE, 1987).
4 DELINEANDO A ABORDAGEM DE TEMAS GERADORES
O educador que procura desenvolver suas aulas a partir da concepção problematizadora, fundamentada na investigação temática, certamente privilegia o diálogo, considerando o que os alunos possuem de conhecimento a respeito do conteúdo programático, para organizar o seu plano de aula, ou seja, como abordará o assunto por meio de uma temática gerada após a sistematização das conversas com seus estudantes. Muitas vezes, o material didático, ou qualquer outro material pedagógico, não é realista sem a mão do professor para garantir aprendizagem por intermédio do seu plano de aula ou sequência didática.
Por isso, o diálogo precede o conteúdo programático do currículo; portanto, as vivências naquele contexto cultural e social precisam ser levadas em consideração pelo professor, para organizar o seu plano de trabalho com aquela turma. O educador que valoriza o diálogo como premissa de uma educação de qualidade e libertadora para os educandos problematiza o conteúdo programático da educação escolar de forma organizada, sistematizada e direcionada, a começar com os elementos que os educandos lhe oferecem de conhecimento, por meio do diálogo que, mesmo em primeira vista, seja desorganizado/desestruturado.
Já no avesso da educação problematizadora, o educador que tem a concepção da educação bancária não dialoga com sua turma a “respeito do seu programa ao qual ele dissertará a seus alunos”; ele mesmo define como vai trabalhar os conteúdos programáticos, organizando o seu programa de acordo com a sua concepção ou, simplesmente, do jeito que é apresentado no programa curricular (FREIRE, 1987, p. 37).
Retomando a metodologia da investigação temática, o educador, apoiado no diálogo, faz o cercamento da situação real, existencial dos educandos, uma vez que a linguagem daquele está em sintonia com a situação concreta destes; a concepção de educação libertadora está presente na ação pedagógica, pelos atos de amor, humildade, esperança, fé e confiança. A relação dialógica promove a construção de uma base nas relações entre os conhecimentos e saberes que se encontram no contexto escolar, independentemente do contexto cultural, social e político. A metodologia da investigação temática é essencial na educação problematizadora, uma vez que atende à abordagem temática significativa.
5 ORGANIZAÇÃO PELA BUSCA DO TEMA GERADOR
Apropriando-se da concepção de Paulo Freire para chegar a uma temática significativa por meio dos conteúdos a serem trabalhados no contexto escolar, necessita-se de um ponto de partida para que se alcancem as situações vivenciadas pelos estudantes e pela comunidade escolar. Essas situações, chamadas por Freire (1987) de contradições sociais, são constituintes do tema gerador, que é selecionado mediante o processo de investigação temática significativa.
Em estudos mais recentes, esse processo perpassa pelas seguintes fases:
- Levantamento Preliminar: reconhecimento local da comunidade.
- Codificação: análise e escolha de contradições sociais vivenciadas pelos envolvidos.
- Decodificação: as escolhas dessas situações significativas podem ser confirmadas e sintetizadas em Temas Geradores.
- Redução Temática: escolhas dos conceitos para compreender o tema e planejamento de ensino.
- Desenvolvimento em sala de aula: implementação das atividades didático-pedagógicas em sala de aula. (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011, p. 154-55).
Nessas fases da organização da investigação temática, são apresentados cinco momentos essenciais para uma proposta temática significativa que pode ser desenvolvida para atender aos conteúdos programáticos do currículo, favorecendo uma educação problematizadora na concepção freiriana por meio de um tema gerador.
É de supra importância ressaltar que esse movimento de processos de codificação e decodificação do tema gerador possibilita aos educandos pensarem de forma crítica a sua existência no mundo, uma vez que:
A codificação de uma situação existencial é a representação desta, com alguns de seus elementos constitutivos, em interação. A decodificação é a análise crítica da situação codificada. O sujeito se reconhece na representação da situação existencial “codificada”, ao mesmo tempo em que reconhece nesta, objeto de sua reflexão, o seu contorno condicionante em e com que está, com outros sujeitos. (FREIRE, 1987, p. 55).
A busca por um tema gerador permite que todos os sujeitos se reconheçam na sua existência e, ao mesmo tempo, reconheçam os outros envolvidos, assim como os objetos de estudo. Para planejar e efetivar atividades em sala de aula, fundamentadas na metodologia da investigação temática ou tema gerador, os pesquisadores Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2011) apresentam uma sequência didática pedagógica, ou melhor, ações pedagógicas que podem favorecer a prática do educador, apoiado na codificação-problematização-decodificação, que estão assim dispostas:
- Problematização Inicial: o professor problematiza as situações significativas que os estudantes conhecem e que estão contidas no tema.
- Organização do Conhecimento: o professor sistematiza os conhecimentos dos estudantes por meio dos conceitos científicos.
- Aplicação do Conhecimento: retomada das questões trabalhadas durante a problematização inicial e apresentação de novas situações. (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011, p. 198).
Essas etapas servem para sistematizar e organizar a dinâmica da construção e organização dos conteúdos programáticos, considerando-se a realidade local, a redução de temas – sistematização – e, por fim, a reorganização do plano de aula por meio da problematização e do diálogo na prática pedagógica.
Corroborando o exposto e, em especial, a organização de uma proposta de trabalho ornada pela busca do tema gerador na concepção freiriana, os pesquisadores Saul e Silva (2012, p. 10) apresentam de maneira clara e sistematizada as fases que possibilitam a construção do plano de aula, para aproximar os conteúdos programáticos da realidade daqueles estudantes, com todas as considerações reais do ensino e da aprendizagem em qualquer contexto social.
Para Saul e Silva (2012), a organização dessas etapas na escola se dá nos seguintes momentos que antecedem o plano de aula, para aproximar os conteúdos programáticos apresentados na proposta curricular dos conhecimentos prévios daqueles sujeitos:
I-levantamento preliminar da realidade local;
II-caracterização de situações/falas significativas que expressam situações-limite;
III- retirada dos temas/contratemas geradores;
IV-elaboração de objetivos gerais e específicos programáticos;
V-redução temática a partir da seleção de conhecimentos sistematizados de diferentes áreas para a construção interdisciplinar da programação;
VI-preparação das atividades dialógicas para sala de aula. (SAUL; SILVA, 2012, p. 10).
Esses momentos apresentados pelos pesquisadores não constituem uma concepção que privilegia uma área ou outra de conhecimento, e sim a busca da construção de um currículo dinâmico que atenda a todos de forma participativa, respeitando a diversidade dos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem, a partir de uma temática significativa, extraída no e pelo grupo – educando e educador – com a possibilidade de desenvolver um plano de ensino para qualquer área de conhecimento, como também desenvolver planos interdisciplinares a partir do conhecimento dos educandos, sem deixar de lado os conteúdos programáticos.
Pinto (2015) reforça que, na investigação temática por tema gerador, a tarefa do professor não é transferir conhecimento, mas sim proporcionar um pensar crítico da realidade. Nesse sentido:
[...] se assume que toda a ação de pesquisa é uma ação educativa, na qual o conteúdo da aprendizagem tem intrínseca relação com o processo de aprender. Esse princípio exige, de quem coordenada a investigação, a clareza de que seu fazer investigativo é também prática docente e que, portanto, precisa estar em coerência com os pressupostos da educação problematizadora. (PINTO, 2015, p. 92).
Do ponto de vista metodológico, a investigação temática é uma tarefa possível, mas exige reflexão crítica em torno das relações mundo e sujeito, e destes entre si, de maneira esperançosa pela busca de uma abordagem significativa e contextualizada, que contemple tanto o direcionamento social quanto o conceitual, pois a contextualização se encontra relacionada à dimensão epistemológica da problematização, que se refere à visão de mundo de cada sujeito. E o sentido da problematização é possibilitar aos alunos a percepção e o engajamento de que é possível compreender e superar as contradições sociais vividas por eles, por meio do diálogo entre educando-educador e educando-educando.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme apresentamos ao longo deste texto, na investigação por um tema gerador, com base nos conteúdos programáticos, os sujeitos dialogam a partir de diferentes conhecimentos e da percepção que têm da visão do mundo, em busca de respostas às situações colocadas pelo método de problematização.
A busca por uma temática significativa está em coerência com a educação problematizadora, pois esta possibilita aos educandos problematizarem sua realidade como sujeitos de sua própria história, liberdade, ou seja, de sua práxis, cujo objetivo é desvelar temas geradores que se encontram imbricados com as situações vivenciadas pelos sujeitos.
Os pressupostos do tema gerador percorrem às seguintes fases: levantamento da realidade local; eleição das falas significativas dos educandos que expressam situações vividas em seu dia a dia; seleção dos temas geradores; decisão dos objetivos gerais e específicos dos conteúdos programáticos; redução de temáticas significativas com base na seleção sistematizada da área de conhecimento – disciplinar ou interdisciplinar – do conteúdo programático; e, por fim, elaboração do plano de aula e das atividades a serem discutidas com os alunos (SAUL; SILVA, 2012).
Mesmo encontrando uma organização sistematizada pela busca de uma temática significativa, é importante ressaltar que
[...] a investigação temática não pode ser reduzida a um ato puramente mecânico, uma vez que é processo pela busca de conhecimento, de criação. Daí que seja necessário que os sujeitos investigadores vão descobrindo a interpretação dos problemas no encadeamento dos temas significativos. (TORRES, 2014, p. 103).
Dessa forma, ensinar é possibilitar condições para a construção dos conhecimentos pelos alunos, por meio da curiosidade, de forma crítica, consciente, autônoma e reflexiva. Para tanto, o papel do educador, na contemporaneidade, é mediar o conhecimento social (contexto dos alunos) e os saberes científicos de qualquer área de conhecimento, por meio do diálogo, em uma relação de troca entre educando e educador, pois, como diz Paulo Freire: “não há docência sem discência”. E essa consciência é fundamental para o bom andamento da prática educativa. Também não podemos nos esquecer de que: “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 1996, p. 28).
Na concepção de Paulo Freire, só existe diálogo se as relações forem horizontais em qualquer situação em que prevaleça o respeito pelas diferenças desses sujeitos, assim, gerando um ato de amor, humildade, esperança e confiança. A relação dialógica é a base das relações entre os conhecimentos e saberes que se encontram no contexto escolar. Segundo Paulo Freire, o fundamental:
[...] é que a informação seja sempre precedida e associada à problematização do objeto em torno de cujo conhecimento ele dá esta ou aquela informação. Desta forma, se alcança uma síntese entre o conhecimento do educador, mais sistematizado, e o conhecimento do educando, menos sistematizado – síntese que se faz através do diálogo. (FREIRE, 2002, p. 65).
Nesse sentido, e tomando o diálogo como um dos pilares da educação transformadora e libertadora, a escola precisa ser um lugar de relações horizontais. Finalizamos este artigo com a convicção de que uma educação transformadora só será possível a partir de uma relação horizontal entre educador e educando, mediada pelo diálogo, e é nessa relação que surge a problematização para acercar uma temática significativa, fundada nos conteúdos programáticos da educação a partir dos conhecimentos reais dos educandos. Conforme Paulo Freire, aquele que ensina também aprende; além disso, quem pensa, discute sobre o contexto escolar (conteúdo programático e práticas pedagógicas) e extraescolar (condição de vida) em sala de aula, valorizando a visão de mundo que os educandos trazem do seu contexto social e cultural.
Em tempos em que a obra de Paulo Freire tem sido difamada e achincalhada em prol de um projeto educacional excludente, acrítico e antidemocrático, as teorias do Patrono da Educação Brasileira se fazem cada vez mais necessárias, mais urgentes, não só na escola, mas em todas as instâncias sociais. Na década de 1970, ele já dizia: “Eu sou um intelectual que não tem medo de ser amoroso. Amo as gentes e amo o mundo. E é porque amo as pessoas e amo o mundo que eu brigo para que a justiça social se implante antes da caridade” (FREIRE, 2006, p. 85). Portanto, o legado de Paulo Freire, atualmente, emerge como ponto de resistência, como um alento de esperança e de liberdade.