INTRODUÇÃO
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) atua historicamente na promoção da pós-graduação, por meio da avaliação de cursos stricto sensu e do fomento em bolsas e auxílio financeiro (MENDONÇA, 2003). O fomento da Capes se atrela ao desempenho avaliativo, por isso, pune ou premia conforme a nota atribuída na avaliação (IVASHITA; VIEIRA, 2017). Contudo, desde 2020 a agência começou a incluir na regratura de concessão de bolsas um indicador eminentemente social, o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM). As medidas foram anunciadas como uma forma de priorizar os municípios com os menores índices (CAPES, 2021c, 2022f).
Num país de assimetrias regionais, destacadamente a Região Norte ou a Amazônia 1 é um desafio para o desenvolvimento da pós-graduação (SILVA; BRANDÃO, 2020). A pós-graduação nessa região é incipiente, levando-nos a questionar os possíveis reflexos das novas medidas. Os programas de pós- graduação em educação (PPGEs) da Amazônia são particularmente sensíveis dado o contexto regional e porque estão presentes apenas em instituições públicas. Voltados à formação de pesquisadores para a educação básica, os PPGEs são elo de capacitação de professores de várias redes de ensino, em que pesem os cortes que a área num todo vem sofrendo (AZEVEDO; OLIVEIRA; CATANI, 2016), com reflexos também na Amazônia. Esses programas são os principais espaços para a proposição de soluções científicas para os diversos problemas educacionais que afligem a sua região, investigando vários temas educacionais, contextos e sujeitos (GARCIA, MAGALHÃES, WEIGEL, 2021).
Diante da implementação de um novo formato de distribuição de bolsas Capes desde 2020, este trabalho toma os PPGEs localizados na Amazônia para investigar como se dá o novo modelo de concessão. Aplicamos a regratura aos PPGEs da Amazônia, considerando os indicadores de cada programa, para identificar os reflexos imediatos quanto ao fomento em bolsas da agência.
Estes estudos vêm se desenvolvendo no bojo de uma tese sobre a política nacional de avaliação da pós-graduação. Neste recorte delineamos uma pesquisa descritiva e de abordagem qualitativa, com a utilização de fontes documentais (SÁ- SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009; FLICK, 2015). Os dados normativos foram colhidos na Plataforma Catálogo de Normas e Atos Administrativos (CAD) da Capes (2022c) e os dados acerca dos cursos credenciados no Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG) foram obtidos junto à Plataforma Sucupira, também mantida pela Capes (2022g). Ainda foram utilizadas outras plataformas públicas, tanto da Capes (2022a, 2022b), quando do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2022). As plataformas permitiram um pré-tratamento das informações, sendo necessário também a sistematização em planilhas, fazer tabulações e verificar as relações entre as normas editadas sobre o tema.
Além desta introdução, prosseguimos com uma visão geral e alguns destaques do Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG), que historicamente orienta ou deveria orientar as políticas no âmbito da pós-graduação. Em seguida, tomamos o novo modelo de concessão de bolsas da Capes e prosseguimos aplicando a regratura aos PPGEs da Amazônia para identificar os seus reflexos. Encerramos com nossas considerações finais.
A POLÍTICA E O PLANO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO
Os PNPGs orientam as políticas no âmbito da pós-graduação a serem desenvolvidas pela Capes, pois visam direcionar as ações da agência a longo prazo (CAPES, 2020f; SILVA; BRANDÃO, 2020). Os PNPGs reúnem os atores e assim permitem uma atividade política para a construção de estratégicas que priorizem ações de Estado para a pós-graduação. Neste sentido, um PNPG “[...] constitui-se enquanto a referência para a promoção e implementação de políticas públicas a esse nível de ensino” (SILVA; BRANDÃO, 2020, p. 47).
Consideramos que políticas públicas “[...] são o resultado da atividade política, requerem várias ações estratégicas destinadas a implementar os objetivos desejados e, por isso, envolvem mais de uma decisão política” (DIAS; MATOS, 2012, p. 13). Se trata justamente de gerir problemas coletivos a partir da identificação daquilo que é prioritário, a partir da qual se pode racionalizar investimentos, que passam necessariamente pelo planejamento visando atingir objetivos e metas (DIAS; MATOS, 2012). O espaço institucional que permite a elaboração do PNPG atua nesse sentido, desde a metade dos anos 1970.
O sexto e último PNPG vigeu de 2011 a 2020 (CAPES, 2010b), já os anteriores vigeram de 1975 a 2010, intercalados por períodos de apagões, conforme resume o quadro 1 .
Plano | Orientação |
---|---|
1º PNPG: 1975- 1979 | A capacitação dos docentes das universidades, formando o primeiro contingente de pesquisadores e especialistas em âmbito federal |
2º PNPG: 1982- 1985 | A preocupação com o desempenho e a qualidade, a integração da pesquisa desenvolvida na universidade com o setor produtivo, visando ao desenvolvimento nacional |
3º PNPG: 1986- 1989 | A integração da pesquisa desenvolvida na universidade com o setor produtivo, visando ao desenvolvimento nacional |
4º PNPG: 1994- 2002(1) | A flexibilização do modelo de pós-graduação, o aperfeiçoamento do sistema de avaliação e a ênfase na internacionalização |
5º PNPG: 2005- 2010 | A introdução do princípio de indução estratégica, o combate às assimetrias e o impacto das atividades de pós-graduação no setor produtivo e na sociedade, resultando na incorporação da inovação no SNPG e na inclusão de parâmetros sociais no processo de avaliação. |
6º PNPG: 2011- 2020 | A expansão do SNPG, a primazia da qualidade, a quebra da endogenia e a atenção à redução das assimetrias; a criação de uma nova agenda nacional de pesquisa e sua associação com a pós- graduação; o aperfeiçoamento da avaliação e sua expansão para outros segmentos do sistema de C,T&I; a multi e a interdisciplinaridade entre as principais características da pós-graduação e importantes temas da pesquisa; o apoio à educação básica e a outros níveis e modalidades de ensino, especialmente o ensino médio. |
7º PNPG: 2024- 2028 | Em construção. |
Fonte: Adaptado de Capes (2010b, p. 15-16).
(1) Este PNPG não chegou a ser promulgado, contudo o consideramos acompanhando autores como Ivashita e Vieira (2017) e Cabral et al. (2020), além de documentos no âmbito da própria Capes (2010b, 2020f, 2021b).
A priori cabe ressaltar a importância da principal instituição executora das políticas no âmbito da pós-graduação. A Capes dá suporte institucional ao desenvolvimento da pós-graduação, de outro lado fora o Estado que historicamente apoiou o fortalecimento da agência. Houve por isso um “[. ] terreno fértil para o seu desenvolvimento e sua institucionalização, o que sugere o alinhamento da pós- graduação aos objetivos econômicos, políticos e sociais do Brasil, como se pode constatar a partir dos planos nacionais de pós-graduação” (CABRAL et al. , 2020, p. 18).
A pós-graduação a partir da segunda metade do Século XX passa por uma institucionalização, centralizando na Capes o SNPG e a partir de meados dos anos 1970 são também os PNPGs que passam a integrar o direcionamento e a centralização das políticas no âmbito da pós-graduação (CABRAL et al. , 2020; SILVA; BRANDÃO, 2020; SHIGUNOV NETO; TREVISO; ALMEIDA, 2021).
Silva e Brandão (2020) consideram que “[...] a partir de tais documentos [os PNPGs], pode ser observado que há uma linearidade histórica e social bem expressivas, ou seja, se inicia com a necessidade de implementação legal da pós- graduação no país, frente a um contexto de abertura de cursos de forma desalinhada” (SILVA; BRANDÃO, 2020, p. 59). Os PNPGs favoreceram o desenvolvimento da pós-graduação, dando às ações da Capes um caráter também de políticas de Estado.
Outro aspecto importante identificado pelos autores é a preocupação com a mensuração da qualidade da pós-graduação que passa a ser uma questão central (SILVA; BRANDÃO, 2020). Os PNPGs prosseguem pautando a questão da qualidade até que no PNPG 2011-2020 o próprio modelo avaliativo e os seus efeitos são questionados, “[...] visto que há o fato da disparidade regional no cenário nacional, no que diz respeito às notas dos programas em relação às diferentes regiões do país, bem como, à própria quantidade de programas concentrados, principalmente, nas regiões Sul e Sudeste” (SILVA; BRANDÃO, 2020, p. 59). Para Silva e Brandão (2020) esse é um dos principais desafios da política de pós- graduação, denominando-o de fator disparidade em detrimento do uso da expressão assimetria .
As orientações dadas pelo PNPG 2011-2020 são várias, importando quanto ao objetivo deste trabalho as indicações sobre a Amazônia, de pós-graduação mais incipiente e muito afetada pelas assimetrias, além de tratarmos do papel indutor do fomento e os desinvestimentos recentes.
Ainda que o último PNPG tenha priorizado a expansão da oferta, a qualidade não fora preterida. Não somente a qualidade dos cursos avaliados, como também a qualidade em termos de aperfeiçoamento do próprio modelo de avaliação e do modelo de fomento. Quanto à redução de assimetrias, o PNPG 2011-2020 incentivou uma visão do país por mesorregiões.
A visualização por Unidade da Federação identifica que os estados das regiões Sul e Sudeste apresentam as maiores concentrações de programas de pós- graduação, e também identifica uma menor concentração nos estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Entretanto, a mesma análise – considerando as mesorregiões brasileiras – identifica as maiores concentrações de programas de pós-graduação nas regiões metropolitanas de quase todos os estados, principalmente as litorâneas. (CAPES, 2010b, p. 146, grifo nosso)
Essa geografia por mesorregiões torna a perspectiva mais rigorosa, diagnosticando que a assimetria não é apenas entre um eixo com suboferta de cursos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste versus um abastado eixo Sul- Sudeste, pois há também assimetrias intrarregionais. O PNPG 2011-2020 identifica que a concentração da oferta se dá nas regiões metropolitanas e, destacadamente, nas cidades litorâneas (CAPES, 2010b).
A assimetria ou o fator disparidade, em todo caso, pouco avançou. Ao avaliar o PNPG 2011-2020 a Comissão de Acompanhamento concluiu que:
Finalmente, a recomendação 4 [referente às assimetrias] deveria ter gerado uma política específica que contemplasse a questão das assimetrias, permitindo um grau de flexibilidade na avaliação em função da possibilidade de apoiar de forma diferenciada mestrados localizados em regiões em estado de desenvolvimento ainda incipiente , o que não ocorreu ao longo do decênio. (CAPES, 2021b, p. 68, grifo nosso)
O modelo avaliativo não concedeu uma flexibilidade na avaliação dos cursos incipientes em regiões nas quais a pós-graduação deveria ser apoiada para reequilibrar a assimetria da oferta no país e mesmo as demais assimetrias de desenvolvimento regional. O modelo avaliativo continuou único. Há, porém, programas estratégicos que atuam nesse sentido, sendo listados no documento elaborado pela Comissão de Acompanhamento o PDPG Amazônia-Legal, o Procad-AM, o Pró-Amazônia, o Pró-Centro-Oeste e o Procad/NF (CAPES, 2021b). Contudo, estes são pontuais e bastante limitados, tanto em número de PPGs atendidos quanto em orçamento.
A Amazônia é priorizada no PNPG 2011-2020 que identifica na região uma dificuldade para o desenvolvimento da pós-graduação em razão do “[...] número escasso de cursos de pós-graduação de nível de doutorado aí implantados [...] agravada pela ausência de políticas eficientes para a fixação de doutores e as deficiências em todos os níveis de ensino” (CAPES, 2010b, p. 208). Neste sentido, as ações da Capes são salutares, mas se demandam sobretudo políticas educacionais tripartites.
O mais preocupante no decênio 2011-2020 foram os desinvestimentos na pós-graduação, na qual os recursos tiveram “[...] uma redução de cerca de 40% em relação ao início da década, apesar da expansão do SNPG” (CAPES, 2021b, p. 39- 40). Minimamente se esperaria que o investimento fosse proporcional à expansão de matrículas e cursos, mas houve um desinvestimento de 40% em uma década. Isso é inversamente proporcional ao crescimento do SNPG, que fora de 43% em número de alunos e 39% no número de cursos (CAPES, 2021b).
A preocupação com o desinvestimento é um dos pontos iniciais citados pela Comissão de Acompanhamento do PNPG 2011-2020 em seu relatório de avaliação, sendo indicados (re)investimentos entre a maioria dos pontos sugeridos, quais sejam:
[...] 1) recuperar os investimentos em custeio e capital; 2) atualizar os valores das bolsas; 3) ampliar os investimentos em bolsas no nível de doutorado; 4) fortalecer o Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) e a concessão de bolsas de pós- doutorado; 5) estruturar e apoiar programas de fixação e atração de doutores no país; 6) dar continuidade aos programas em parceria com as FAPs; 7) garantir o investimento no Portal de Periódicos, concomitante com a implementação de uma política de apoio ao acesso aberto; 8) retomar o Programa de apoio à Editoração e Publicação de Periódicos Nacionais; 9) retomar o investimento no Paep; e 10) revisitar o modelo de distribuição de bolsas, cujos critérios devem ser discutidos com a comunidade. (CAPES, 2021b, p. 40)
Notadamente, “[...] desde 2013 os valores das bolsas de mestrado, doutorado e pós-doutorado não foram reajustados, sendo a inflação acumulada no período de dezembro de 2013 a dezembro de 2020 de 47,6% (INPC-IBGE)” (CAPES, 2021b, p. 40). Zanlorenssi e Gomes (2022) mais recentemente calcularam um índice de 66% de perdas, pois se os valores das bolsas, de R$ 1.500,00 e R$ 2.200,00, respectivamente para mestrado e doutorado, fossem corrigidas pela inflação a contar de 2013, seus valores seriam de R$ 2.499,00 e R$ 3.666,00.
As dificuldades de condições materiais, notadamente os desinvestimentos recentes, tornam a expansão da pós-graduação um desafio permanente, especialmente nos interiores do país de forma a minimizar a assimetria com as grandes cidades litorâneas.
É preocupante o atual momento em que não se tem um PNPG vigente. Essa preocupação, que é de toda a comunidade acadêmica, se vê expressa no relatório de avaliação do PNPG 2011-2020, na qual sua Comissão de Acompanhamento conclama pela realização de um novo plano.
Ao concluirmos este relatório final do período de vigência 2011-2020 do PNPG, destacamos a importância da elaboração do sexto PNPG, para o próximo ciclo, mantendo uma tradição de planejamento de longo prazo na área de pós-graduação, que explica muito da dinâmica e qualidade do SNPG. Os planos nacionais de pós- graduação tradicionalmente orientam a Capes em suas ações ao longo de seus ciclos de execução e sinalizam às instituições sobre o futuro, induzindo e fomentando ações que permitam atingir a visão de futuro definida no plano. (CAPES, 2021b, p. 199)
A possibilidade de se ter uma política de Estado no âmbito da pós- graduação, com um sentido de permanência, se dá a partir das orientações dos PNPGs. Esses planos balizam a política, pautando o desenvolvimento da pós- graduação. Contudo, além do apagão com o fim do último plano e a ausência de um novo, também emerge um novo modelo de concessões de bolsas sem lastro direto no PNPG, o qual detalhamos no tópico seguinte.
EMERGE UM MODELO INÉDITO PARA A CONCESSÃO DE BOLSAS CAPES
Desde o ano 2020, que encerrou a vigência do último PNPG, passamos a observar a edição de novas regras pela Capes que mudam a perspectiva de concessão de suas bolsas. Essa mudança é inédita, pois altera o paradigma anterior da agência. Ela passou a integrar o atual modelo a um indicador social, juntamente com a meritocracia da nota. Para caracterizar como o modelo está posto reunimos as normas que o balizam e os fatores utilizados para determinar a concessão, considerando os PPGs da área educação.
Reunimos no quadro 2 a regratura do novo modelo, que passa a fazer uso do IDHM nas concessões anuais de bolsas.
Ato editado | Resumo da ementa |
---|---|
Portarias nos 18, 19 e 20, de 20 de fevereiro de 2020, e 21, de 26 de fevereiro de 2020 | Definem os critérios de bolsas do Programa de Demanda Social (DS), do Programa de Excelência Acadêmica (Proex), do Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares (Prosup) e do Programa de Suporte à Pós- Graduação de Instituições Comunitárias de Educação Superior (Prosuc), de março de 2020 a fevereiro de 2021 |
Portaria nº 28, de 12 de fevereiro de 2021 | Define os critérios de bolsas DS, Proex, Prosup e Prosuc, de março de 2021 a fevereiro de 2022 |
Portaria nº 40, de 24 de fevereiro de 2022 | Define os critérios de bolsas DS, Proex, Prosup e Prosuc, de março de 2022 a fevereiro de 2023 |
Portaria nº 73, de 6 de abril de 2022 | Define os critérios para alocação de bolsas sob responsabilidade de pró-reitoria ou unidade equivalente encarregada da pós-graduação (cota da pró-reitoria) |
Fonte: Adaptado de Capes (2020a, 2020b, 2020c, 2020d, 2021a, 2022d, 2022e).
Os atos são portarias, portanto de competência da presidência da agência e atendem à necessidade de definir critérios de concessão de bolsas. A exceção é a Portaria nº 73 (CAPES, 2020e), que determina a regratura para as instituições destinarem a parcela de cotas não vinculada diretamente aos PPGs (cotas de pró- reitoria), já as demais normas são regras para concessões diretas aos PPGs e em exercícios financeiros específicos.
Nas portarias que definem a regratura do repasse direto de bolsas da Capes ao PPG, a agência elegeu três fatores concomitantes para determinar a concessão, nesta ordem:
o desempenho na avaliação da Capes, referente à nota obtida;
o IDHM de onde está sediado o PPG;
a titulação do PPG a partir da média nacional aferida na área de avaliação.
A maior mudança implementada pela agência é a utilização do IDHM. Este indicador social passou a compor, portanto, a regratura juntamente com a usual meritocracia da nota obtida pelo PPG em sua avaliação.
Tomaremos para análise a atual norma vigente editada pela Capes (2022d) para caracterizar como esse modelo está posto. Nela, a Capes parte de um quantitativo inicial conforme a nota do PPG. Esses quantitativos iniciais estão na tabela 1 .
O mesmo documento (CAPES, 2022d) define que esse quantitativo inicial em seguida é multiplicado pelo fator IDHM, conforme a tabela 2 .
Classificação | IDHM | Peso |
---|---|---|
IDHM 1 | 0,500 ≤ IDHM ≤ 0,599 | 2,50 |
IDHM 2 | 0,600 ≤ IDHM ≤ 0,649 | 2,00 |
IDHM 3 | 0,650 ≤ IDHM ≤ 0,699 | 1,75 |
IDHM 4 | 0,700 ≤ IDHM ≤ 0,749 | 1,50 |
IDHM 5 | 0,750 ≤ IDHM ≤ 0,799 | 1,25 |
IDHM 6 | IDHM ≥ 0,800 | 1,00 |
Fonte: Capes (2022d, p. 87).
A aplicação do fator IDHM ao quantitativo inicial de bolsas como um fator multiplicador (peso), como se verifica, faz com que os PPGs com oferta em municípios de menor IDHM (por exemplo entre 0,500 e 0,599) estejam no maior estrato (IDHM 1) e por conseguinte alcancem a multiplicação de suas bolsas em 2,50 vezes. Esta é a definição da linha um da tabela, que progressivamente vai reduzindo o peso multiplicador até o peso 1,00 para os PPGs com oferta em municípios de IDHM alto (igual ou superior a 0,800). Trata-se de um indicador que não tem relação com a avaliação Capes ou o desempenho do PPG. O IDHM tão somente é um indicador social, referente ao cenário da qual o PPG participa: o índice de desenvolvimento humano do seu município sede.
Em seguida a Portaria nº 40 (CAPES, 2022d) determina a aplicação do terceiro e derradeiro fator, o Tempo Médio de Titulação (TMC), nos termos da tabela 3 .
Classificação | TMC | Peso |
---|---|---|
TMC 1 | TMC < m - 1dp | 0,75 |
TMC 2 | m - 1dp ≤ TMC < m + 1dp | 1,00 |
TMC 3 | m + 1dp ≤ TMC < m + 2dp | 1,25 |
TMC 4 | m + 2dp ≤ TMC < m + 3dp | 1,50 |
TMC 5 | m + 3dp ≤ TMC < m + 4dp | 1,75 |
TMC 6 | m + 4dp ≤ TMC < m + 5dp | 2,00 |
TMC 7 | m + 5dp ≤ TMC < m + 6dp | 2,25 |
TMC 8 | m + 6dp ≤ TMC < m + 7dp | 2,50 |
TMC 9 | m + 7dp ≤ TMC < m + 8dp | 2,75 |
TMC 10 | TMC ≥ m + 8dp | 3,00 |
Fonte: Capes (2022d, p. 87).
O TMC fora elaborado pela Capes a partir dos números apurados no período de 2017-2020 para cada uma das áreas. A mesma Portaria nº 40 (CAPES, 2022d) traz esses números, que para a área educação, no mestrado é de 22,774 e de 8,585, de média e desvio padrão, respectivamente; no doutorado é de 16,747 e 9,377, de média e desvio padrão, respectivamente.
Para encontrar os números específicos de médias de titulação da área educação que definem os respectivos pesos de TMC para 2022, calculamos nos termos da Portaria nº 40 (CAPES, 2022d) e ilustramos na tabela 4 .
Média de titulações anuais | Estrato | Peso | |
---|---|---|---|
Mestrado | Doutorado | ||
< 14,189 | < 7,37 | TMC 1 | 0,75 |
≥ 14,189 até < 31,359 | ≥ 7,37 até < 26,124 | TMC 2 | 1,00 |
≥ 31,359 até < 39,944 | ≥ 26,124 até < 35,501 | TMC 3 | 1,25 |
≥ 39,944 até < 48,529 | ≥ 35,501 até < 44,878 | TMC 4 | 1,50 |
≥ 48,529 até < 57,114 | ≥ 44,878 até < 54,255 | TMC 5 | 1,75 |
≥ 57,114 até < 65,699 | ≥ 54,255 até < 63,632 | TMC 6 | 2,00 |
≥ 65,699 até < 74,284 | ≥ 63,632 até < 73,009 | TMC 7 | 2,25 |
≥ 74,284 até < 82,869 | ≥ 73,009 até < 82,386 | TMC 8 | 2,50 |
≥ 82,869 até < 91,454 | ≥ 82,386 até < 91,763 | TMC 9 | 3,75 |
≥ 91,454 | ≥ 91,763 | TMC 10 | 3,00 |
Fonte: elaborado pelos autores (2022).
A partir desses parâmetros, temos que o modelo de concessão de bolsas definida na Portaria nº 40 (CAPES, 2022d) indica que o PPG terá seu número inicial de bolsas a partir de:
um número inicial fixado em razão de sua nota na avaliação, por exemplo: 4 bolsas como quantitativo inicial para um mestrado com nota 3;
em seguida, conforme o município de oferta do curso, é aplicado o fator IDHM, por exemplo: sendo este ofertado num município com IDHM 0,577, lhe é conferido peso 2,50 para multiplicação do quantitativo inicial de bolsas;
por fim aplica-se a este PPG o fator TMC concernente à sua área. Por exemplo, se este PPG da área educação titulou 92 mestres anualmente, ele será considerado grande nos parâmetros de sua área e figurará no maior estrato, de peso 3,00 para nova multiplicação final do quantitativo de bolsas iniciais que já fora multiplicado pelo fator IDHM.
Esse hipotético PPG da área educação com nota 3, em um município de baixíssimo IDHM, que titulou 92 mestres em média anualmente (programa grande), conforme o novo modelo de concessão, terá 4 bolsas iniciais que serão multiplicadas por 2,50 (peso IDHM), que novamente serão multiplicadas por 3,00 (peso TMC), totalizando uma cota de 30 bolsas. Um outro PPG, da mesma área, se fosse sediado em um município de IDHM altíssimo (acima de 0,800) teria as mesmas 4 bolsas, porém, multiplicadas por somente 1,00 (peso IDHM), novamente multiplicadas por 3,00 (peso TMC), totalizando uma cota de 12 bolsas.
O IDHM influencia fortemente na concessão, nesse exemplo determinou cotas de 30 e de 12, respectivamente no menor e no maior IDHM, para um PPG da mesma área e de nota e tamanho similares. É justamente o fator IDHM que pode promover um maior financiamento em bolsas a programas que estejam em áreas prioritárias – se concedermos que IDHMs baixos podem identificar essas localidades. A seguir aplicamos essas regras in casu para identificar o reflexo do modelo de concessão de bolsas justamente na Região Norte e para os PPGs da área educação.
A ÁREA EDUCAÇÃO NA AMAZÔNIA SOB O NOVO MODELO
Para a aplicação do novo modelo de concessão de bolsas Capes aos PPGs da área educação na Amazônia, partimos da definição dos indicadores de cada programa; em seguida, aplicamos a regratura de concessão para então discutir seus reflexos.
Inicialmente identificamos na tabela 5 o IDHM de cada sede de PPGE na Região Norte junto à plataforma Cidades@ (IBGE, 2022).
Sede | IDHM | Estrato |
---|---|---|
Cametá/PA | 0,577 | IDHM 1 (peso 2,50) |
Santarém/PA | 0,691 | IDHM 3 (peso 1,75) |
Rio Branco/AC | 0,727 | IDHM 4 (peso 1,50) |
Macapá/AP | 0,733 | |
Porto Velho/RO | 0,736 | |
Manaus/AM | 0,737 | |
Belém/PA | 0,746 | |
Boa Vista/RR | 0,752 | |
Palmas/TO | 0,788 | IDHM 5 (peso 1,25) |
Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa (2022).
Os IDHMs mais baixos estão em municípios do interior, em Cametá e Santarém, ambos do Pará. Entre as capitais, as maiores têm IDHMs médios ao passo que as menores têm IDHMs mais altos. Contudo, para qualquer PPGE da Amazônia o novo modelo adotado pela Capes ao utilizar o fator IDHM trouxe algum ganho, prevendo-se uma multiplicação de 1,25 a 2,50 como peso multiplicador ao quantitativo inicial de bolsas.
Para completar a aplicação da regratura, levantamos na tabela 6 a média de titulados a partir do Catálogo de Teses e Dissertações e os dados dos cursos na Plataforma Sucupira (CAPES, 2022a, 2022g) para obtenção do respetivo TMC.
Programa-Instituição | Nível | Média | TMC | ||
---|---|---|---|---|---|
ME | DO | ME | DO | ||
PPGE-Ufam | ME/DO | 15,75 | 12,00 | 1,00 | 1,00 |
PPGEd-UFPA | ME/DO | 30,50 | 22,75 | 1,00 | 1,00 |
PPGEd-Uepa | ME/DO | 29,00 | - | 1,00 | - |
PPGE-Unir | ME | 17,50 | - | 1,00 | - |
PPGE-UFT | ME | 21,25 | - | 1,00 | - |
PPGEduc-UFPA | ME | 25,25 | - | 1,00 | - |
PPGE-Ufopa | ME | 24,00 | - | 1,00 | - |
PPGE-Ufac | ME | 20,25 | - | 1,00 | - |
PPGEd-Unifap | ME | 20,5 | - | 1,00 | - |
PPGE-Uerr/IFRR | ME | 14,25 | - | 1,00 | - |
PPEB-UFPA | ME | 22,00 | - | 1,00 | - |
PPGEduc-UFRR | ME | 7,00 | - | 1,00 | - |
PPGEd-UEA | ME | - | - | 1,00 | - |
Rede Educanorte | DO | - | - | - | 1,00 |
Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa (2022).
Nota. Para cursos sem titulação ou que em três anos do período 2017-2020 não houve registro de titulação, aplicamos o Art. 4º, § 4º da Portaria nº 40 (CAPES, 2022d), de forma a enquadrá-los no TMC 2 = peso 1,00.
A partir destes indicadores de cada PPGE, aplicamos os pesos definidos na Portaria nº 40 (CAPES, 2022d) para então traçarmos a previsão de concessão de bolsas Capes para cada curso. A tabela 7 consolida os números.
Programa e instituição | Nível | Nota | Quantitativo inicial | Pesos multiplicadores | Concessão em 2022(1) | Ganho ref. aos pesos multiplicadores | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
ME | DO | IDHM | TMC | ME | DO | ME | DO | |||
PPGE-Ufam | ME/DO | 3 | 4 | - | 1,50 | 1,00 | 6 | - | +50% | - |
PPGEd-UFPA | ME/DO | 5 | 11 | 16 | 1,50 | 1,00 | 16,5 | 24 | +50% | +50% |
PPGEd-Uepa | ME/DO | 4 | 9 | 12 | 1,50 | 1,00 | 13,5 | 18 | +50% | +50% |
PPGE-Unir | ME | 4 | 9 | - | 1,50 | 1,00 | 13,5 | - | +50% | - |
PPGE-UFT | ME | 3 | 4 | - | 1,25 | 1,00 | 5 | - | +25% | - |
PPGEduc-UFPA | ME | 3 | 4 | - | 2,50 | 1,00 | 10 | - | +150% | - |
PPGE-Ufopa | ME | 4 | 9 | - | 1,75 | 1,00 | 15,75 | - | +75% | - |
PPGE-Ufac | ME | 3 | 4 | - | 1,50 | 1,00 | 6 | - | +50% | - |
PPGEd-Unifap | ME | 3 | 4 | - | 1,50 | 1,00 | 6 | - | +50% | - |
PPGE-Uerr/ IFRR | ME | 3 | 4 | - | 1,25 | 1,00 | 5 | - | +25% | - |
PPEB-UFPA | ME | 3 | 4 | - | 1,50 | 1,00 | 6 | - | +50% | - |
PPGEduc- UFRR | ME | A | 3 | - | 1,25 | 1,00 | 3,75 | - | +25% | - |
PPGEd-UEA | ME | A | 3 | - | 1,50 | 1,00 | 4,5 | - | +50% | - |
Rede Educanorte | DO | A | - | 6 | 1,50 | 1,00 | - | 9 | - | +50% |
Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa (2022).
Nota. Em que pese o fator TMC ser por curso, em razão de todos os cursos terem o peso 1,00, consolidamos na planilha esse dado em uma única coluna.
(1) Os quantitativos não refletem o imediato ganho de bolsas, pois se aplica a limitação para perdas e ganhos (CAPES, 2022d), contudo esses números predizem quantas bolsas o programa alcançará.
Observamos uma perspectiva de aumento na concessão de bolsas para todos os PPGEs da Região Norte em número significativo, de 25% até 150%, considerando a aplicação dos pesos multiplicados ao quantitativo inicial. Em todo caso, é preciso comparar essa previsão de concessão de 2022 com o histórico de bolsas em uso nesses PPGEs para identificar se o novo modelo é vantajoso. O comparativo se encontra na tabela 8 .
Programa e instituição | Nível | Previsão para 2022 | Bolsas em 2020 | Bolsas em 2016 | Bolsas em 2012 | Bolsas em 2009 | |||||
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ME | DO | ME | DO | ME | DO | ME | DO | ME | DO | ||
PPGE-Ufam | ME/DO | 6 | - | 10 | 7 | 4 | 8 | 10 | 5 | 9 | - |
PPGEd-UFPA | ME/DO | 16,5 | 24 | 13 | 18 | 17 | 6 | 17 | 4 | 4 | - |
PPGEd-Uepa | ME/DO | 13,5 | 18 | 5 | 10 | 11 | - | 11 | - | - | - |
PPGE-Unir | ME | 13,5 | - | 10 | - | 13 | - | 6 | |||
PPGE-UFT | ME | 5 | - | 2 | - | 3 | - | 2 | - | - | - |
PPGEduc- UFPA | ME | 10 | - | 7 | - | 4 | - | - | - | - | - |
PPGE-Ufopa | ME | 15,75 | - | 11 | - | 4 | - | - | - | - | - |
PPGE-Ufac | ME | 6 | - | 8 | - | 12 | - | - | - | - | |
PPGE-Uerr/ IFRR | ME | 5 | - | 2 | - | 2 | - | - | - | - | - |
PPEB-UFPA | ME | 6 | - | 7 | - | 2 | - | - | - | - | - |
PPGEd- Unifap | ME | 6 | - | 5 | - | - | - | - | - | - | - |
PPGEduc- UFRR | ME | 3,75 | - | - | - | - | - | - | - | - | - |
PPGEd-UEA | ME | 4,5 | - | - | - | - | - | - | - | - | - |
Rede Educanorte | DO | - | 9 | - | - | - | - | - | - | - | - |
Fonte: elaborado pelos autores com base nos dados da pesquisa (2022).
A previsão de concessões pela nova regratura para 2022 supera as concessões anteriores, comparado ao histórico de concessões na qual apuramos as bolsas no último ano de cada ciclo avaliativo (2020, 2016, 2012 e 2009). A exceção é o PPGE-Ufam, possivelmente em razão de sua nota 3. Tal situação pode mudar, caso ao final da avaliação na atual quadrienal esse PPGE volte a alcançar a nota 4, que lhe permitiria pelos atuais critérios, 13,5 e 18 bolsas, respectivamente para mestrado e doutorado.
Verificamos entre os três fatores ou critérios que definem a concessão de bolsas, que cada um destes gera um efeito. O fator nota do programa é relativamente negativo, já que é referente ao resultado avaliativo e os PPGEs da Amazônia em sua maioria estão entre as menores notas para manter o credenciamento no SNPG. Com o fator TMC a situação é neutra, já que todos os PPGEs figuram no peso 1,00 – este parece funcionar para dimensionar o número de bolsas conforme o tamanho do PPG, portanto correlacionado ao tamanho do programa em relação à sua área e com isso a programas similares. Já o fator IDHM beneficiou os PPGEs da Região Norte com a ampliação das concessões em valores significativos, mesmo em comparação ao histórico de bolsas desde 2009 – o que se deve aos IDHMs baixos ou médios encontrados nos municípios da Região Norte.
Em todo caso, há um incrementalismo nos atos editados pela presidência da Capes que instituem o novo modelo de concessão de bolsas, pois a regratura é definida inteiramente em uma portaria de vigência anual e não em uma norma permanente, além de não ser um modelo orientado a partir de um PNPG. Se o próximo PNPG e as futuras gestões da Capes mantiverem ou aperfeiçoarem essa regratura, o novo modelo tem o potencial de ampliar o apoio a cursos fora dos grandes centros e das regiões litorâneas, já que geralmente IDHMs mais baixos estão nos sertões do país e mesmo em capitais das regiões Norte e Nordeste. A utilização do IDHM é ao mesmo tempo um critério objetivo de amplitude nacional e que também coincide com uma majoração de recursos a regiões menos desenvolvidas nas quais se espera haver uma pós-graduação incipiente.
Ao anunciar as novas medidas em seu sítio eletrônico (CAPES, 2021c, 2022f), a agência destaca o aperfeiçoamento ou a melhoria no modelo de concessão. Na notícia referente ao exercício 2022 a Capes destaca que:
Com o modelo, criado em 2020, a concessão de benefícios passou a levar em conta, na redistribuição da totalidade de bolsas (cerca de 84 mil), a nota obtida na avaliação, o nível do curso (mestrado e doutorado) e a ponderação de dois fatores: o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), para priorizar municípios com menores indicadores, e o fator Titulação Média de Cursos (TMC), cujo intuito é diferenciar cursos pelo tamanho. (CAPES, 2022f, n. p.).
Verificamos que o PNPG 2011-2020 não cita o IDHM (CAPES, 2010b). Em todo caso, a Comissão de Acompanhamento deste PNPG em seu relatório de avaliação recém-publicado (CAPES, 2021b), ciente da nova regratura que vem sendo implementada, menciona que:
Em 2020, não houve concessão adicional de bolsas no âmbito dos programas institucionais e foi implementado um novo modelo de distribuição de bolsas visando corrigir o desequilíbrio existente, de forma a alinhar o fomento ao processo de avaliação da pós-graduação realizada pela Capes. [...] Entretanto, embora tenha sido debatido com o Foprop, no momento de sua implementação, o modelo sofreu alterações em 2020, a partir das discussões com o MEC, tendo sido posto em prática uma nova versão do modelo de concessão em 2021. (CAPES, 2021b, p. 189)
O Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop) também é citado pela Capes na notícia veiculada em 2020, quando da divulgação do novo modelo:
“O modelo que entra em vigor, com o apoio do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop), harmoniza a distribuição de bolsas com o resultado da avaliação periódica da pós-graduação”, explica Zena Martins, diretora de Programas e Bolsas no País da Capes. (CAPES, 2020e, n. p.)
Pode-se inferir que, além da presidência da Capes, os outros atores que participaram da construção desse modelo desde seu início foram o Foprop e o MEC. Contudo, o Foprop não é citado nas novas versões do modelo que culminaram na sua versão atual, apenas o MEC. O que não se verifica é a participação da comunidade acadêmica nessa formulação. Em todo caso, observamos uma continuidade do modelo em três gestões da Capes, de Benedito Guimarães Aguiar Neto (2020- 2021), Cláudia Queda de Toledo (2021-2023) e Mercedes Bustamante (2023-atual).
Ao fim e ao cabo resta a instabilidade e a forma pouco democrática dessa nova regratura de bolsas Capes, que não tem lastro em um PNPG, mas se construiu no gabinete da agência. Não obstante, há as incertezas para os PPGs de ter toda a regratura do modelo formalizada em portarias de vigência anual, referentes tão somente às regras de concessão para o respectivo exercício. Bastaria uma nova portaria de concessão de bolsas não prever o fator IDHM ou outro indicador social similar para toda a regratura de bolsas ser desmontada. Apesar dos méritos do novo modelo de concessão de bolsas, as suas incertezas acabam por gerar mais apreensão do que esperança sobre o futuro da pós-graduação em educação na Amazônia. O que se observa não é uma política pública – portanto resultado da atividade política em uma construção programática com objetivos e metas – que assegure ou promova a pós-graduação na Região Norte e em demais áreas prioritárias, mas um corpus de regras construído isoladamente e de forma centralizada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo identificou que está emergindo desde 2020 um novo modelo de concessão de bolsas da Capes com regras que estão sendo criadas por meio de portarias anuais de concessão editadas pela presidência da agência, mas que inova ao incluir um indicador social: o IDHM. Aplicamos a nova regratura de concessão de bolsas considerando os indicadores dos PPGEs da Amazônia e verificamos ganhos expressivos em comparação ao histórico de concessões, o que se deve justamente ao fator IDHM. Os dois outros fatores que determinam a concessão possuem duas influências distintas. Enquanto o fator TMC exerce influência neutra, o fator referente à nota do programa pesa negativamente no caso da Região Norte – em que a maioria dos PPGEs possui as menores notas para manter o credenciamento no SNPG. O fator IDHM também refletiu em um maior apoio para os cursos sediados nos interiores, em contraponto à concentração da oferta de cursos nas metrópoles amazônidas, o que parece promissor para corrigir assimetrias intrarregionais.
O novo modelo de concessão de bolsas, destacadamente a inovação promovida pelo fator IDHM, é vantajoso para os PPGEs da Amazônia. Contudo, o modelo traz incertezas, pois a regratura está inteiramente disposta numa portaria de concessão anual e, portanto, de vigência definida para o respectivo exercício. Não há uma regulamentação permanente do novo modelo que o consolide e que lhe dê perspectiva de continuidade. Identificamos também uma centralização na concepção dessas regras, sem a participação de outros atores, notadamente de representações da comunidade acadêmica. O novo modelo está sendo criado na presidência da Capes, no que parece ser uma política de gabinete.
O novo modelo de concessão de bolsas Capes é um corpus de regras, mas não é exatamente uma política pública – portanto, resultado de atividade política, com ações estratégicas a partir de objetivos e metas definidas – que possa promover a pós-graduação em áreas prioritárias. Mesmo a nova regratura não tendo surgido de um PNPG, este ainda é o espaço mais adequado para consolidar o que pode se tornar uma virtuosa política pública de fomento da pós-graduação, priorizando-se locais estratégicos por meio de um indicador social – como o IDHM –, especialmente se ele for combinado com uma geografia por mesorregiões.
A consequência de subfinanciar a pós-graduação em regiões menos desenvolvidas, como na Amazônia, é a de impedir o próprio desenvolvimento desse nível de educação em que ele é primordial para justamente apoiar a superação do subdesenvolvimento desses lugares. Subfinanciar a pós-graduação em regiões prioritárias pode gerar um círculo vicioso, na qual inicialmente os cursos recebem as menores notas na avaliação e por isso são colocados nos menores patamares para se manterem credenciados, por consequência recebem menos recursos, dificultando seu desenvolvimento e consolidação, renovando o círculo de notas baixas e subfinanciamento. Políticas públicas de fomento para áreas prioritárias são salutares para inverter essa lógica.
A pós-graduação em educação na Amazônia também sofre de assimetrias intrarregionais, pois os cursos estão concentrados nas capitais dos estados. Para sanear esse cenário, políticas educacionais tripartites são fundamentais e não somente políticas no âmbito da Capes. Contudo, a liderança da agência é essencial para reunir a comunidade acadêmica, no bojo de um novo PNPG, para formular soluções que possam promover o desenvolvimento e a consolidação da pós-graduação em que ela é mais necessária, justamente para apoiar o desenvolvimento desses lugares. Entre essas ações, destaca-se a necessidade de “[...] políticas eficientes para a fixação de doutores e [superar] as deficiências em todos os níveis de ensino” (CAPES, 2010b,p. 208). O ponto fulcral é recuperar os recursos da Capes, pois as ações da agência passam pelas suas condições materiais de fomentar os cursos por ela avaliados. Junto a isso é primordial a construção do novo PNPG para (renovadamente) pautar e mesmo refundar a pós-graduação no Brasil, que resiste aos desinvestimentos de mais de meia década.