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Cadernos de Pesquisa

versión impresa ISSN 0100-1574versión On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.46 no.162 São Paulo oct./dic. 2016  Epub 01-Oct-2016

https://doi.org/10.1590/198053143645 

ARTIGOS

As funções educativas dos e-parlamentos: uma análise longitudinal do caso brasileiro

Educational functions of e-parliaments: a longitudinal analysis of the Brazilian case

Les fonctions éducatives des parlements électroniques: une analyse longitudinale du cas brésilien

Las funciones educativas de los e-parlamentos: un análisis longitudinal del caso brasileño

Sérgio Soares BragaI 

Isabele Batista MitozoII 

Julia TadraIII 

IProfessor da Universidade Federal do Paraná - UFPR -, Curitiba, Paraná, Brasil sssbraga@gmail.com

IIDoutoranda em Ciência Política na Universidade Federal do Paraná - UFPR -, Curitiba, Paraná, Brasil. ibmitozo@gmail.com

IIIMestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná - UFPR -, Curitiba, Paraná, Brasil. juliatadra@outlook.com


Resumo

O presente artigo objetiva apresentar a análise dos websites legislativos brasileiros em nível estadual (assembleias legislativas), observando de modo ilustrativo o Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), tendo em vista as funções exercidas pelos parlamentos, tais como as de legislação, legitimação, representação, supervisão, educação e participação. A investigação se concentra em comparar os websites nos anos de 2014 (início das legislaturas) e 2016, preocupando-se em verificar a influência de fatores socioeconômicos e políticos sobre os índices, bem como sua evolução ao longo desse período. Os resultados indicam que, ao contrário do esperado, não houve uma atenuação da fratura digital, especialmente em relação às funções educativas dos e-parlamentos.

Palavras-chave: Internet; Brasil; Parlamento; Educação

Abstract

This article aims to analyse the Brazilian Legislative websites at state level (Legislative Assemblies), observing, for illustrative purposes, the National Congress (Chamber of Deputies and Federal Senate), in relation to the legislative functions: legislation, legitimation, representation, scrutiny, education, and participation. The investigation focuses on comparing the performance of these websites between 2014 and 2016, regarding how socioeconomic and political factors influence the index of each function mentioned above. The results indicate that, contrary to expectations, there was no lessening of the digital divide, especially in relation to the educational functions of e-parliaments.

Keywords: Internet; Brazil; Parliament; Education

Résumé:

Cet article présente une analyse des sites législatifs brésiliens au niveau subnational (Assemblées législatives des états), n'observant ceux du Congrès (Chambre des députés et Sénat)qu'à titre illustratif. Il tient compte des fonctions exercées par les parlements, telles que celles concernant la législation, la légitimité, la représentation, la supervision, l'éducation et la participation. La recherche se concentre sur la comparaison des sites législatifs des années 2014 (le début des législatures) et 2016 pour vérifier l›influence de facteurs socio-économiques et politiques sur les indices ainsi que son évolution au cours de cette période. Les résultats indiquent que, contrairement aux attentes, il n›y a eu aucune atténuation de la fracture digitale, en particulier en ce qui concerne les fonctions éducatives des parlements électroniques.

Mots Clés: Internet; Brésil; Parlement; Éducation

Resumen

En este artículo se presenta el análisis de los portales web legislativos brasileños a nivel estatal (asambleas legislativas), observando de manera ilustrativa el Congreso Nacional (Cámara de Representantes y Senado Federal), en vista de las funciones ejercidas por los parlamentos, tales como las funciones de legislación, legitimación, representación, supervisión, educación y participación. La investigación se centra en la comparación de los sitios web en los años 2014 (comienzo de las legislaturas) y 2016, preocupándose de comprobar la influencia de los factores socioeconómicos y políticos en los índices, así como su evolución a lo largo de este período. Los resultados indican que, contrariamente a lo esperado, no hubo atenuación de la fractura digital, especialmente en relación con las funciones educativas de los e-parlamentos.

Palabras clave: Internet; Brasil; Parlamento; Educación

As funções do parlamento e a internet

O parlamento é uma instituição que, criada para representar os cidadãos no processo decisório sobre assuntos públicos, foi tratada durante muito tempo, conforme sua nomenclatura, como um corpo voltado exclusivamente para a elaboração de leis e fiscalização dos órgãos governamentais. Com a evolução dessa instituição, essas funções originais passam a ser desdobradas em pelo menos mais duas: representar e legitimar-se perante os cidadãos. Uma contribuição importante da literatura mais recente sobre e-parlamentos é a de demonstrar que, além de suas funções tradicionais e estipuladas nos códigos regimentais, os órgãos parlamentares desempenham uma série de outros papéis que podem ser dinamizados através do uso das tecnologias digitais e, em especial, da internet. Nesse contexto, particularmente relevantes são trabalhos recentes que buscam analisar o fenômeno da função educativa dos parlamentos e de seus portais, bem como os potenciais do uso das mídias sociais para uma maior aproximação entre parlamentos e cidadãos (LESTON-BANDEIRA, 2009, 2012; PERNA; BRAGA, 2012; FARIA, 2012).1 A internet, nesse cenário, exerce papel fundamental no fomento de demandas democráticas, constituindo-se como plataforma a partir da qual o trabalho dessas instituições pode se tornar mais transparente e acessível aos cidadãos, e como meio propício à promoção de seu engajamento e maior participação nas decisões públicas:

Em um mundo onde a internet se tornou parte da rotina das pessoas, os websites parlamentares podem ser muito mais que meros repositórios de informação; eles podem ser um mecanismo-chave para a promoção de cidadania ativa [...]. (LESTON -BANDEIRA, 2009, p. 14)

Não é por outro motivo que, apesar da existência de uma fratura digital (digital divide) na maioria dos países, uma ampla literatura tem surgido, desde a década de 1990, sobre o papel dos websites legislativos e de seus potenciais de aprimorar a qualidade das democracias em vários contextos políticos. Isso ocorre porque, apesar das desigualdades materiais, motivacionais e cognitivas existentes na maior parte dos países, as novas tecnologias digitais, ao baixar os custos da interação entre esfera civil e esfera política, abrem o caminho para aperfeiçoamentos incrementais na transparência dos órgãos públicos e na oferta de oportunidades de participação e deliberação aos cidadãos no sistema de instituições que interagem num determinado sistema político. Abrem-se, assim, possibilidades de melhoria da qualidade das democracias, ao serem criadas novas oportunidades de supervisão do público sobre os processos decisórios governamentais, o que, naturalmente, não equivale a dizer que tais oportunidades sejam sempre aproveitadas pelos atores políticos de maneira satisfatória, sem a necessidade de um processo de educação cívica para o exercício da cidadania democrática (COLEMAN; BLUMLER, 2009; FARIA, 2012).

No Brasil, o estudo de tais potenciais nos websites parlamentares (doravante referidos como WPs) tem recebido a atenção de diversos analistas que buscaram realizar estudos mais abrangentes e sistemáticos sobre o assunto (BRAGA, 2007; MARQUES, 2008; FARIA, 2012). Entretanto, nenhum desses trabalhos procurou empreender uma análise integrada das várias funções desempenhadas pelos WPs, nem examinar a evolução do desempenho de tais funções ao longo do tempo, procurando se concentrar nas funções educativas do parlamento, como buscaremos fazer neste artigo. Por outro lado, embora já exista um corpo considerável de estudos que abordam programas educativos do parlamento, tais como as Escolas do Legislativo ou Parlamento Jovem no mundo off-line (ASSIS, 1997; COSSON, 2008; CARVALHO, 2009), existem ainda poucos trabalhos que buscam analisar de maneira sistemática como os parlamentos brasileiros, especialmente em escala subnacional, usam as tecnologias digitais para veicular tais iniciativas, no contexto de uma reflexão mais ampla sobre as funções desempenhadas pelos WPs.

Nesse sentido, além de suprir essa lacuna, um estudo da evolução das funções desempenhadas pelos órgãos legislativos através de suas plataformas virtuais justifica-se porque, como indicam outros autores, as tecnologias digitais podem ser um importante fator para a reaproximação do parlamento com os cidadãos, especialmente através do exercício de suas funções educativas e da abertura de oportunidades para que os cidadãos participem de forma mais ativa no processo decisório parlamentar, e têm também um importante papel pedagógico na difusão dos valores democráticos (LESTON-BANDEIRA; THOMPSON, 2013; FARIA, 2012; FARIA; BRAGA, 2015). Além disso, é fundamental que tenhamos uma visão dinâmica de tal fenômeno, e não estática, na medida em que, devido à própria natureza volátil das tecnologias digitais, abre-se a possibilidade de inovações constantes desses novos recursos tecnológicos, bem como de novas experiências de e-democracia digital.

O objetivo deste artigo é abordar essas questões aplicando uma versão ligeiramente modificada do quadro analítico utilizado por Cristina Leston-Bandeira (2009) em suas análises dos WPs europeus e buscando destacar a função educativa e alguns programas educativos mais recentes divulgados nos WPs brasileiros.

Para cumprir tais objetivos, apresentaremos as estratégias metodológicas por nós utilizadas, bem como os objetivos e as questões de pesquisa. Na seção seguinte, procuraremos efetuar a análise do desempenho dos índices de funcionalidade dos e-parlamentos entre março de 2014 (início das legislaturas atuais) e julho de 2016 (período da atualização dos dados de nossa pesquisa), associando tais índices a fatores socioeconômicos e políticos. Na sequência, buscaremos nos concentrar na análise de algumas práticas educativas existentes dos websites das casas legislativas brasileiras, destacando seus potenciais de aprimorar a qualidade da democracia. Por fim, os resultados serão discutidos e novas possibilidades de pesquisa são apresentadas.

Estrutura metodológica, questões de pesquisa e hipóteses

O presente trabalho pretende, portanto, suprir lacunas quanto à análise dos websites legislativos brasileiros em relação a como expressam suas funções em ambiente on-line, especialmente suas funções educativas. Assim, este estudo se justifica pelo fato de as tecnologias digitais abrirem possibilidades para uma maior conexão entre cidadãos e instituições parlamentares, especialmente pelo exercício de uma educação cívica e pela abertura de oportunidades participativas aos cidadãos, constituindo-se essas ações como importantes para o desenvolvimento de uma cultura política democrática (LESTON-BANDEIRA; THOMPSON, 2013; FARIA, 2012; FARIA; BRAGA, 2015).

Para concretizar tais objetivos, utilizamos uma versão adaptada da metodologia empregada por Cristina Leston-Bandeira em sua análise dos websites europeus, a qual, conforme a própria autora, foi somente uma análise-piloto a ser desenvolvida posteriormente por outros estudos (LESTON-BANDEIRA, 2009). Essa metodologia consistiu basicamente em analisar os WPs a partir da presença ou ausência de variáveis relacionadas ao desempenho de quatro funções parlamentares básicas, ou seja, as funções de legislação, legitimação, representação e fiscalização (ou supervisão, como preferimos traduzir aqui a expressão original inglesa scrutiny). Para tanto, a autora efetua uma análise de conteúdo de 15 WPs europeus, distribuída em 50 variáveis.2 Em nosso estudo, procuramos desenvolver algumas ideias do modelo e adaptá-lo ao contexto brasileiro, efetuando as seguintes modificações:

(1) Em primeiro lugar, incluímos duas funções adicionais, além das quatro propostas pela autora, isto é, as funções de educação e participação. Esse procedimento justifica-se porque a própria Leston-Bandeira admite, em outros trabalhos, que o papel educativo dos parlamentos se constitui numa importante função desempenhada pelos modernos órgãos parlamentares, e não é apenas um aspecto contingente e secundário a ser exercido em virtude de decisões aleatórias ou das preferências de tal ou qual gestor de cada casa legislativa (LESTON-BANDEIRA; THOMPSON, 2013). Por outro lado, diversos estudos recentes têm demonstrado que a oferta de maiores oportunidades de participação dos cidadãos no processo decisório é uma importante função a ser desempenhada pelos órgãos parlamentares, especialmente no contexto do emprego crescente das tecnologias digitais na esfera pública (NORRIS, 2001; PERNA; BRAGA, 2012; FARIA; BRAGA, 2015; MENDONÇA; AMARAL, 2014).

(2) A segunda diferença de nosso modelo consiste na adaptação das variáveis referentes à função de fiscalização ou supervisão ao contexto brasileiro. Isso deve-se ao fato de que, no Brasil, ao contrário da maioria dos países parlamentaristas europeus, vigora um sistema de governo presidencialista, inclusive em escala subnacional, também denominado por vários autores de "presidencialismo de coalizão" (SANTOS, 2001). Sendo assim, enquanto nos sistemas parlamentaristas europeus as questões (questions) ou interpelações (interpelations), orais e escritas, são ferramentas regulares das comissões parlamentares para fiscalizar e supervisionar os membros do gabinete, que periodicamente comparecem a tais comissões para sustentar seus pontos de vista, em sistemas de governo presidencialistas como o brasileiro, o mesmo não ocorre com tanta frequência. Nesses sistemas de governo, as comissões legislativas, especialmente a Comissão de Constituição e Justiça - CCJ - e as Comissões de Finanças - CFs -, têm como papel fundamental o de organizar o próprio processo legislativo, formulando pareceres para diversas proposições dos parlamentares e efetuando a análise prévia da constitucionalidade e viabilidade técnica dos projetos. Por essa razão, substituímos as variáveis referentes às questões e interpelações orais e escritas, utilizadas por Leston-Bandeira para compor seu índice, por variáveis relacionadas à apresentação de informações sobre as diversas comissões legislativas, tanto as comissões permanentes como as comissões temporárias e Comissões Parlamentares de Inquérito - CPIs -, dando destaque para as informações sobre os trabalhos da Comissão de Constituição e Justiça e das Comissões de Finanças, apontadas pelos estudiosos do processo legislativo em escala subnacional como aquelas que possuem maior importância na organização dos trabalhos legislativos (SANTOS, 2001; TOMIO; RICCI, 2012).

(3) Por fim, uma terceira diferença de nossa análise em comparação com outras é que procuramos estudar a evolução da performance das funções dos WPs ao longo do tempo, comparando seu desempenho em dois anos consecutivos, e não apenas estaticamente. Isso porque, como indicamos anteriormente, uma das premissas fundamentais do presente estudo é a de que as tecnologias digitais provocam mudanças incrementais no desempenho das funcionalidades das instituições políticas, podendo incidir positivamente na própria qualidade das funções realizadas por tais instituições. Assim, um dos focos do presente trabalho foi realizar uma análise comparativa entre os índices obtidos pelas casas legislativas no início da atual legislatura, em 2014 e em 2016, conforme coleta realizada pelos autores.3

Quanto aos indicadores analisados, utilizamos os seis índices enumerados abaixo:

(1) O índice de legislação avalia a quantidade de informação nos WPs acerca das proposições básicas em tramitação em cada casa legislativa, tais como leis, projetos de lei, emendas, requerimentos e outras proposições. Para contabilizá-lo, observou-se essencialmente a possibilidade/facilidade de acesso a esses pontos e a seus debates.

(2) O índice de legitimação atenta para as características dos WPs destinadas a proporcionar uma compreensão geral sobre como uma instituição parlamentar funciona, tornando-a mais acessível ao cidadão (LESTON-BANDEIRA, 2009, p. 16). Essa função contribui para a melhoria da avaliação dos órgãos parlamentares pela opinião pública, já que propicia explicação minuciosa de seu papel, sua história, seu funcionamento, assim como recursos didáticos e informativos sobre o órgão. A existência de transmissão ao vivo dos debates na casa é uma característica importante observada na composição desse indicador.

(3) O índice de representação, diferentemente do índice de legitimação, tem por foco informações vinculadas aos representantes de modo individualizado. Logo, foi observada a existência de links para os perfis ou contatos digitais dos parlamentares fora do WP, por exemplo.

(4) O índice de fiscalização ou de supervisão, por sua vez, abrange variáveis relacionadas ao acompanhamento que os órgãos legislativos fazem do desempenho e das ações do poder executivo. Como afirmamos acima, adaptamos esse índice ao contexto do presidencialismo pluripartidário brasileiro em escala subnacional, dando maior destaque às Comissões Permanentes e Temporárias que compõem os parlamentos brasileiros. Observa-se, portanto, a presença de informações sobre mecanismos de controle e fiscalização dos governos pelo parlamento, que também constituem mecanismos de accountability horizontal do poder executivo.

(5) O índice de educação é composto basicamente por variáveis referentes à existência e divulgação de ações de programas tais como Escola do Legislativo, Parlamento Jovem e outras destinadas a divulgar as atividades educativas dos parlamentos, bem como programas endereçados à comunidade e atividades de pós-graduação patrocinadas pelos órgãos parlamentares.

(6) Por fim, o índice de participação compõe-se por aquelas variáveis que permitem a manifestação dos cidadãos nas plataformas parlamentares, assim como uma maior influência da população em geral no processo decisório parlamentar e nas atividades do parlamento.

Para servir como parâmetros para a avaliação do desempenho dos índices dos vários estados brasileiros, utilizamos uma série de indicadores sobre as características socioeconômicas e políticas dos estados brasileiros, que desempenharão o papel de "variáveis independentes" em nossa análise. Esses fatores que servem como variáveis de controle estão enumerados abaixo.

Fatores de natureza socioeconômica

  • Dentre os fatores de natureza socioeconômica, incluem-se:

  • População por estado: o número de habitantes por estado, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE - em 2012;

  • Produto Interno Bruto - PIB - por estado, também divulgado pelo IBGE em 2012;

  • Índice de Desenvolvimento Humano - IDH - por estado, mais preciso no tocante à distribuição de riqueza, pois fornece informações sobre a média do acesso das populações a fatores mais associados ao uso da internet, como saúde, educação e um nível adequado de renda média;

  • Inclusão Digital, mensurada pelo percentual médio de habitantes com acesso a computador por estado, segundo o Relatório de inclusão digital, da Fundação Getúlio Vargas - FGV -, em 2012 (NERI et al., 2012);

  • Índice de Analfabetismo, ainda de acordo com pesquisa do IBGE em 2012.

Fatores de natureza política

  • Em relação à organização dos legislativos em cada unidade da federação, destacam-se:

  • número de deputados em cada assembleia legislativa;

  • orçamento legislativo total (em reais) para cada casa, em 2014, conforme orçamento previsto para o ano fiscal;

  • gasto total por habitante com o Legislativo (orçamento legislativo dividido pelo número de habitantes);

  • custo médio por parlamentar, que consiste no orçamento total dividido pelo número de deputados, seguindo cálculo da organização Transparência Brasil para 2014;

  • existência ou não de Comissão de Legislação Participativa, que pode ser considerada um indicador indireto de maior grau de institucionalização de processos participativos off-line em cada casa legislativa.

Para o cruzamento dessas variáveis independentes com os seis sub- -índices expostos anteriormente (que constituirão nossa variável dependente, o Índice de Funcionalidade dos Websites Parlamentares - IFP), calculam-se correlações de Pearson e são apresentados diagramas de dispersão.

As questões de pesquisa mais gerais que orientam nossa investigação são as mesmas que servem de base para a análise de Leston- -Bandeira e outros autores, quais sejam: os portais dos legislativos brasileiros têm expressado adequadamente as funções dessas instituições? O fenômeno europeu identificado por Leston-Bandeira (2009), em que a função legislativa alcançou os maiores índices, enquanto a representação, os mais baixos, repete-se no caso brasileiro? Considerando o alto grau de personalização do sistema representativo em nosso país (NICOLAU, 2006), estariam os parlamentos dando mais destaque a seu trabalho como instituição (como identificado na Europa) ou ao de seus integrantes? Os parlamentos brasileiros têm avançado na função de educar os cidadãos acerca dos processos legislativos e de proporcionar mecanismos de participação? Há mudanças significativas ao longo da legislatura nesses WPs? Por fim, fatores externos podem influenciar os índices analisados?

A partir desses indicadores e questões de pesquisa, buscamos testar as seguintes hipóteses básicas:

  • fatores socioeconômicos estão positivamente associados ao desempenho do IFP. Assim, estados mais populosos, com maior eleitorado, maior IDH e maior grau de inclusão digital tenderão a possuir melhor desempenho em todas as dimensões das funções desempenhadas pelos WPs, excetuando a taxa de analfabetismo.

  • Variáveis de natureza política também estão positivamente associadas com o desempenho das funções pelos WPs, e da função educativa, em particular. Assim, assembleias com mais parlamentares, maior magnitude de gastos, maior eficiência de gastos e mais porosidade em relação à participação popular tenderão a apresentar melhor desempenho em todas as dimensões das funções desempenhadas pelos WPs.

  • No espaço de um ano, entre o início das legislaturas, em março de 2014, e julho de 2016, ocorreram melhorias incrementais nas casas legislativas dos estados menos desenvolvidos, que provocaram uma redução da fratura digital existente entre os estados (digital divide), causando uma tendência à equalização do desempenho do IFP.

  • O mesmo desempenho acima postulado nas três hipóteses pode ser observado no tocante à função educativa do parlamento, com um aumento das funcionalidades do programa tanto em termos absolutos como relativos. A análise desagregada do desempenho de tais índices servirá, por sua vez, para caracterizarmos as casas parlamentares que possuem desempenho acima e abaixo do esperado em virtude do contexto em que atuam.

Análise: a evolução das funções desempenhadas pelos websites parlamentares brasileiros nos últimos anos

Isso posto, podemos agora passar para a análise dos resultados de nossa pesquisa, ou seja, da análise comparada das funções desempenhadas pelos WPs brasileiros, bem como dos fatores a eles associados.

Fatores associados ao desempenho das funções pelos WPs brasileiros

No tocante à análise do desempenho das diferentes funções pelos diferentes WPs brasileiros, ele pode ser sintetizado na tabela e nos gráficos a seguir. A Tabela 1 nos fornece os desempenhos das seis funções, atualizados em julho de 2016, enquanto o Gráfico 1 nos dá informações sobre a variação no desempenho do índice médio entre 2014 e 2016.

Tabela 1: Índice de Funcionalidade dos Websites Parlamentares - IFP - em julho de 2016 

Unid. Legis. Legit. Rep. Superv. Educ. Part. Índice Geral
CD 0,96 1,00 0,89 0,90 0,90 0,93 0,93
MG 1,00 0,96 0,89 0,83 0,83 1,00 0,92
SF 0,93 0,96 0,89 0,83 0,87 0,98 0,91
SC 1,00 0,93 0,85 0,55 0,68 0,65 0,78
RJ 0,82 0,89 0,70 0,48 0,87 0,80 0,76
SP 0,96 0,96 0,72 0,86 0,55 0,46 0,75
RS 1,00 0,89 0,72 0,93 0,52 0,40 0,74
PR 0,82 0,89 0,89 0,59 0,42 0,65 0,71
GO 0,79 0,86 0,83 0,76 0,55 0,45 0,71
CE 0,96 0,86 0,81 0,55 0,32 0,60 0,69
PB 0,79 0,89 0,65 0,52 0,42 0,65 0,65
PE 0,93 0,86 0,65 0,41 0,13 0,60 0,60
AM 0,75 0,71 0,59 0,52 0,48 0,40 0,58
RN 0,54 0,86 0,57 0,45 0,61 0,40 0,57
MT 0,75 0,75 0,61 0,24 0,35 0,65 0,56
MS 0,64 0,75 0,70 0,38 0,55 0,25 0,55
BA 0,93 0,86 0,67 0,52 0,13 0,15 0,54
RO 0,57 0,64 0,80 0,43 0,16 0,60 0,53
AL 0,82 0,82 0,59 0,24 0,27 0,45 0,53
MA 0,63 0,79 0,74 0,25 0,27 0,50 0,53
DF 0,79 0,82 0,61 0,28 0,42 0,15 0,51
RR 0,64 0,75 0,70 0,21 0,16 0,50 0,49
PA 0,57 0,54 0,63 0,45 0,26 0,45 0,48
TO 0,80 0,79 0,67 0,28 0,00 0,35 0,48
SE 0,75 0,82 0,81 0,21 0,10 0,15 0,47
AP 0,96 0,75 0,67 0,28 0,00 0,15 0,47
ES 0,75 0,57 0,31 0,28 0,23 0,50 0,44
AC 0,64 0,64 0,54 0,38 0,16 0,10 0,41
PI 0,64 0,71 0,57 0,28 0,00 0,25 0,41
MÉDIA 0,80 0,81 0,70 0,48 0,39 0,49 0,61

Fonte: Elaboração dos autores. Leg.: Função Legislativa; Legit.: Função de Legitimação; Repre.: Função Representativa; Super.: Função de Supervisão; Educ.: Função Educativa; Part.: Função Participativa.

Com efeito, a tabela acima nos fornece várias informações sobre os padrões de uso das tecnologias digitais, pelos parlamentos brasileiros, para promover suas atividades em julho de 2016.

Inicialmente, analisando o desempenho de cada parlamento individualmente, podemos observar que, assim como ocorre no caso de estudo empreendido anteriormente (BRAGA, 2007), verifica-se uma acentuada desigualdade entre as assembleias brasileiras no tocante ao uso das tecnologias digitais. Em primeiro lugar, observamos um grupo de assembleias que apresenta uma postura fortemente proativa de uso da internet para promover suas atividades em várias dimensões, tais como a Câmara dos Deputados, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais - ALMG - e o Senado Federal, assim como já observado na pesquisa anteriormente citada. Em segundo lugar, há um grupo mais restrito de cinco assembleias, Santa Catarina - SC -, Rio de Janeiro - RJ -, São Paulo - SP -, Rio Grande do Sul - RS -, Paraná - PR -, Goiás - GO, que também têm uma postura ativa no uso da internet, mas apresentam deficiências em algumas de suas funções. Em terceiro lugar, observamos um grupo de dez assembleias que apresentam um desempenho um pouco acima da média. E, por fim, um grande grupo de oito parlamentos estaduais que apresentam desempenho insuficiente, ou seja, abaixo da média. Excetuando o Distrito Federal e o Espírito Santo, essas assembleias via de regra se localizam em regiões com baixo IDH e baixo grau de inclusão digital do eleitorado.

No tocante aos índices considerados verticalmente, podemos observar que as funções de legislação (média de 0,80), legitimação (0,81) e representação (0,70) estão sendo desempenhadas de forma satisfatória pela grande maioria dos WPs brasileiros. Com exceção da Assembleia Legislativa do Espírito Santo - Ales -, todos os parlamentos brasileiros tiveram desempenho acima da média nesses quesitos. Já no tocante às demais funções (supervisão, educação e participação), o desempenho é inverso, com a maior parte das casas legislativas apresentando desempenho abaixo da média.

Interessante observar que, em comparação com o início da legislatura, várias assembleias apresentaram melhorias em seus websites. Os casos mais destacados são as assembleias estaduais de GO, do PR, do RJ e de SP, todas localizadas em estados com elevado IDH, que promoveram diversas melhorias em seus websites. Como veremos adiante, esse fato contrariou nossa expectativa de que haveria uma tendência à equalização ou homogeneização dos desempenhos, com uma tendência das assembleias localizadas em estados com menor grau de desenvolvimento socioeconômico a se aproximarem dos estados mais desenvolvidos.

Essa evolução dos IFP de março de 2014 para julho de 2016 pode ser ilustrada pelo gráfico abaixo. Destacam-se algumas assembleias acima citadas que reformularam seus websites no período e apresentaram acentuada melhoria.

Gráfico 1: Comparativo do IFP entre 2014 e 2016  

Uma vez concluído o estudo descritivo preliminar sobre o índice de desempenho das funções do legislativo no Brasil, podemos examinar mais de perto alguns dos condicionantes e fatores associados a esse desempenho, bem como fazer uma análise mais fina e desagregada dos parlamentos individuais, destacando sua função educativa entre os dois períodos. Sublinhe-se que fazemos a seguir apenas a análise das assembleias legislativas e da Câmara Legislativa do Distrito Federal, excluindo a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, na medida em que o objetivo de nossa análise é apreender os fatores associados ao desempenho das casas legislativas, nas diferentes unidades da federação, ao longo do período estudado.

Uma primeira aproximação ao teste das hipóteses formuladas anteriormente pode ser dada pela matriz de correlações abaixo, a qual associa variáveis socioeconômicas ao desempenho das diferentes dimensões do IFP.

Tabela 2: Matriz de correlações entre variáveis socioeconômicas e IFP 

Ano Leg. Legit. Repr. Super. Educ. Part. Ind. Geral
2014 População ,449* ,478* ,184 ,268 ,231 ,337 ,543**
PIB ,375 ,349 -,021 -,122 ,203 ,149 ,256
IDH_2010 ,336 ,371 ,080 -,215 ,156 ,216 ,238
Inclusão Digital ,297 ,376 -,034 -,135 ,196 ,150 ,218
Taxa de Analfabetismo -,226 -,130 -,132 ,166 ,014 -,196 -,120
2016 População ,497** ,530** ,244 ,677** ,453* ,318 ,629**
PIB ,363 ,391* -,012 ,316 ,250 ,114 ,319
IDH_2010 ,299 ,352 ,085 ,322 ,511** ,210 ,431*
Inclusão Digital ,274 ,378 ,019 ,312 ,575** ,140 ,415*
Taxa de Analfabetismo -,177 -,093 -,110 -,385* -,444* -,259 -,383*

Fonte: Elaboração dos autores. Leg.: Função Legislativa; Legit.: Função de Legitimação; Repre.: Função Representativa; Super.: Função de Supervisão; Educ.: Função Educativa; Part.: Função Participativa.

Pela tabela acima, podemos observar inicialmente uma variação positiva das correlações entre os dois anos de todas as variáveis associadas a características socioeconômicas dos estados (por exemplo, população, PIB, IDH e inclusão digital), excetuando analfabetismo, em que há uma correlação negativa. Isso significa que é nos estados mais populosos, com maior IDH e inclusão digital que ocorreram os maiores aperfeiçoamentos nas funções dos websites. Verificamos ainda uma acentuada variação positiva das correlações entre funções educativa, por um lado, e IDH e inclusão digital, por outro, mostrando que os aperfeiçoamentos efetuados nos programas educativos nas casas com maior IDH impactaram fortemente na variação positiva dos índices. Esse foi o caso especialmente do RJ, do PR e de Santa Catarina - SC -, que passaram por acentuados processos de modernização dos websites e ampliação da oferta de programas voltados à educação. Conforme esperado em nossa análise, há uma associação positiva geral entre o grau de desenvolvimento socioeconômico e o uso das tecnologias digitais pelos parlamentos, embora a distribuição da riqueza (IDH) seja mais importante do que a riqueza bruta (PIB) para o desempenho das casas legislativas. Isso significa que, nas localidades com maior nível educacional e qualidade de vida, há uma maior pressão difusa para a modernização e transparência dos órgãos legislativos.

Para estudar melhor o desempenho de cada estado individualmente considerado, verificaremos, através de diagramas de dispersão, o comportamento da relação entre as variáveis mais significativas do quadro de correlações acima.

Gráfico 2 Relação entre IDH E IFP (2014 e 2016  

O diagrama de dispersão acima representa a relação existente entre o IDH das unidades federativas (variável independente) e o IFP (variável dependente) nos anos de 2014 e 2016, enquanto as retas nos fornecem informações sobre o comportamento médio esperado da relação entre as duas variáveis. Para os estados abaixo da reta, o IFP é menor do que seria esperado em função do IDH, enquanto que, no lado de cima da reta, ocorre o contrário, havendo um desempenho do IFP superior ao que seria esperado em função do IDH.

O gráfico ilustra claramente a melhoria de desempenho das funcionalidades dos WPs em estados com maior IDH, especialmente naqueles já mencionados acima (ou seja, RJ, PR, SC, SP). O diagrama de dispersão nos permite ainda identificar a existência de quatro grupos bem diferenciados de parlamentos estaduais, segundo sua localização acima ou abaixo da média de IDH e acima ou abaixo da média de desempenho do IFP. Em primeiro lugar, um grupo de parlamentos localizados em estados com alto IDH e alto grau de desempenho do IFP. Dentre estes, destacam-se, como já observamos, a ALMG (um outlier com IFP bastante superior ao esperado em virtude do IDH), a ALEPR, Alers, Alesc, Alesp e Alego, todas com desempenho acima do esperado em função do IDH. Um segundo grupo é formado por unidades federativas com alto IDH, mas desempenho do IFP aquém do esperado. Dentre esses órgãos, destacamos a Câmara Legislativa do Distrito Federal - CLDF - e a Ales, boa parte delas com existência de problemas administrativos e envolvidas em irregularidades nos últimos anos. Um terceiro grupo é formado por estados com IDH abaixo da média e desempenho do IFP acima do esperado, destacando-se no caso a AL do Ceará - CE -, com alto grau de desempenho relativo de seu website. Por fim, um quarto grupo de nove assembleias formado por estados com IDH abaixo da média e também com um baixo desempenho do IFP. O destaque negativo desse quadrante são as assembleias do Piauí - PI -, Acre - AC - e Rondônia - RO -, com desempenho aquém do esperado, mesmo levando-se em conta seu baixo IDH.

No que se refere ao desempenho da função educativa do parlamento, verificamos acima que o fator mais associado ao desempenho do índice é a inclusão digital. O diagrama de dispersão abaixo nos permite visualizar melhor o desempenho individualizado de cada assembleia em 2014 e 2016.

Gráfico 3: Relação entre inclusão digital e funções educativas (2014 e 2016). 

Pelo diagrama acima, também podemos verificar uma variação positiva no desempenho das funções educativas pelas assembleias, especialmente nos estados com maior índice de inclusão digital, tais como RJ, PR, SC, RS e SP. Destacam-se a esse respeito os casos de algumas assembleias, tais como a do Paraná (Alep) e a do Rio de Janeiro (Alerj), que investiram fortemente em programas educativos ao longo do período, com várias iniciativas para promover a educação dos cidadãos tanto no mundo on-line como off-line, sendo que o PR melhorou significativamente o desempenho após a implantação da Escola do Legislativo e a reformulação do website em agosto de 2015. Pelo gráfico, podemos observar também que uma associação positiva entre inclusão digital, IDH e o desempenho da função educativa dos parlamentos estaduais não nos deve ocultar a existência de uma ampla gama de possibilidades entre as assembleias estaduais, nem o fato de que muitas delas mal começaram a usar suas plataformas virtuais para estimular ações relacionadas às funções educativas dos órgãos parlamentares.

Resta agora verificar nossa segunda hipótese, referente à existência de uma associação entre variáveis políticas e IFP, bem como alguns dos condicionantes dessa associação. A matriz de correlações entre as variáveis micropolíticas relacionadas ao funcionamento dos legislativos estaduais e o grau de modernização dos parlamentos estaduais, tal como mensurado pelo IFP, é a seguinte:4

Tabela 3: Correlações entre variáveis políticas e funções dos websites parlamentares (n = 27 assembleias) 

Ano Leg. Legit. Rep. Fisc. Educ. Part. IFP
2014 N de deputados ,525** ,560** ,236 ,408* ,231 ,430* ,672**
Orçamento Total ,542** ,651** ,324 ,420* ,285 ,460* ,731**
Gasto por HB -,188 -,206 -,019 -,251 -,112 -,125 -,270
Custo por Parlamentar ,236 ,451* ,197 ,061 ,239 ,097 ,317
2016 N de deputados ,610** ,601** ,370 ,739** ,482* ,451* ,754**
Orçamento Total ,587** ,655** ,435* ,735** ,654** ,537** ,836**
Gasto por HB -,248 -,253 -,093 -,438* -,266 -,187 -,311
Custo por Parlamentar ,204 ,399* ,226 ,228 ,545** ,234 ,409*

Fonte: Elaboração dos autores.

Leg.: Função Legislativa; Legit.: Função de Legitimação; Repre.: Função Representativa; Super.: Função de Supervisão; Educ.: Função Educativa; Part.: Função Participativa

A Tabela 3 nos informa a variação das correlações encontradas entre as variáveis políticas analisadas e o IFP entre os anos de 2014 e 2016. Assim como no item anterior, verificamos uma variação que favorece os estados com mais recursos políticos (maior número de deputados, maior orçamento global e maior gasto por parlamentar) e maior "eficiência" no gasto vis-à-vis o número de habitantes. O fator mais associado ao desempenho dos índices é o montante bruto de gasto de cada assembleia, indicando que diferenças no mundo off-line se reproduzem na esfera virtual, inexistindo, portanto, tendência à equalização, devido à eficiência no uso das ferramentas digitais. No caso da função educativa do parlamento, também se observou uma acentuada variação entre 2014 a 2016, indicando que os estados com mais recursos políticos promoveram melhorias mais acentuadas em seus programas educativos virtuais do que os estados com menos recursos políticos. Outra forma de analisar os dados é examinando os diagramas de dispersão para as variáveis mais significativas. Esses diagramas também nos permitem mensurar indiretamente a eficiência relativa de cada casa legislativa no tocante ao desempenho das variáveis.

Gráfico 4: Relação entre custo por parlamentar e IFP (2014 e 2016) 

Temos aqui dois indicadores, que podem ser usados como proxy da eficiência de casa legislativa, que têm desempenho diverso: o montante de gasto de cada assembleia por parlamentar, que possui correlação positiva moderada, não indicando, portanto, relação positiva entre eficiência e IFP; e o gasto por habitante, que sugere uma relação positiva entre eficiência e IFP. Entretanto, consideramos que o gasto por parlamentar é uma medida mais precisa, pois refere-se a variáveis mais próximas ao funcionamento interno de cada casa legislativa. Embora, pelo gráfico, não haja uma relação direta entre eficiência do gasto e desempenho do IFP em nível agregado (na medida em que, quanto maior o gasto por parlamentar das assembleias, maior o índice, e não o inverso), de um ponto de vista desagregado, podemos utilizá-lo para comparar a eficiência relativa de cada assembleia legislativa ao longo dos anos. Com efeito, pelo diagrama, podemos verificar a existência, ao longo da legislatura, da eficiência do gasto parlamentar, na medida em que o índice de desempenho de boa parte dos parlamentos estaduais elevou- -se ao longo do tempo. Pelo gráfico, podemos também caracterizar as assembleias que apresentam desempenho mais eficiente, ou seja, acima do esperado em função do custo por parlamentar (tais como ALEMG, Alesc, Alep, Alers), e aquelas que possuem desempenho menos eficiente vis-à-vis seus gastos. O destaque negativo é a CLDF, com elevado gasto por parlamentar e baixo IFP, sendo que nenhuma melhora substantiva foi detectada em seu website ao longo do período estudado.

No tocante à função educativa, vimos que a variável independente mais associada ao desempenho dessa função é orçamento total dos parlamentos estaduais (R de Pearson = 0, 654). Entretanto, assim como o fizemos no item anterior, o custo por parlamentar nos fornece uma visão mais precisa da eficiência relativa do desempenho da função educativa pelos portais parlamentares vis-à-vis seus gastos. O diagrama de dispersão abaixo nos permitirá observar, de maneira mais detalhada, o desempenho individualizado de cada assembleia ao longo da legislatura, controlado por aquelas que possuem ou não Comissão de Legislação Participativa.

Gráfico 5: Relação entre custo por parlamentar e função educativa 

O gráfico nos mostra que, ao longo dos dois momentos examinados, as assembleias legislativas com Comissão Participativa tiveram melhor desempenho relativo do que aquelas onde inexistem tais comissões, revelando uma relação positiva entre participação e transparência, ao contrário da expectativa que poderia se originar de enfoques mais conservadores, segundo a qual existiria uma relação de soma-zero entre participação e eficácia decisória. Essa relação positiva se acentua mais ainda em 2016, não obstante o fato de uma das assembleias que teve maior incremento no período (a Alerj) não possuir Comissão de Legislação Participativa.

Entretanto, tão relevante quanto uma avaliação meramente quantitativa é a avaliação qualitativa dos programas empreendidos por cada casa legislativa. Com efeito, outros estudos (MADRUGA, 2008; MARQUES JR., 2008; BUTORI, 2014; RIBEIRO, 2014; TADRA, 2014; COSSON, 2011) têm chamado a atenção para várias iniciativas que, embora ainda minoritárias quando analisamos os portais legislativos como um todo, indicam tendências que podem servir para estabelecer alguns parâmetros normativos básicos para orientar os parlamentos brasileiros, especialmente em escala subnacional, a criar iniciativas que melhorem a qualidade dos portais legislativos, particularmente no que se refere ao seu papel educacional.

A esse respeito, efetuamos uma análise dos portais parlamentares a partir da metodologia de características de websites, inspirados em Ferber, Foltz e Pugliese (2005), para classificar o uso da internet pelos programas de educação legislativa nos websites das assembleias e nas redes sociais dos legislativos brasileiros. A partir disso, categorizamos as diferentes experiências de educação legislativa, segundo uma gradação de interatividade dos programas, a partir da seguinte classificação: 1) plataformas predominantemente informativas, que são aquelas que apresentam meras informações sobre como funciona o programa, a organização estrutural, o regimento interno, eventos a serem realizados, etc.; 2) plataformas moderadamente interativas, que são páginas que aderiram de forma moderada à Web 2.0, com uso de redes sociais e outros recursos, mas sem interagir de forma regular com o público; 3) plataformas fortemente interativas e/ou deliberativas, ou seja, aquelas que usam as ferramentas da Web 2.0 e as mídias sociais para interagirem, de forma efetiva e regular, com os internautas.

De todos os 32 programas examinados, cinco deles apresentam características "fortemente interativas" ou deliberativas (TADRA, 2014). Dentre estes, destacam-se iniciativas tais como a da página do Parlamento Jovem e Escola do Legislativo da ALMG,5 a página Jovem Senador, do Senado Federal,6 as páginas do Plenarinho e Parlamento Jovem, também da Câmara dos Deputados, programas esses que, além de promoverem espaços de interação com os internautas, criam espaços virtuais de participação e deliberação com o público externo por intermédio de plataformas virtuais (TADRA, 2014, p. 100 e segs.). As páginas do Parlamento Jovem de Minas Gerais e do Senador Jovem, por exemplo, são ilustrações de websites fortemente interativos.

Além de todas as informações básicas e disponibilidade de arquivos como as já citadas anteriormente, as páginas possuem recursos específicos direcionados às atividades do programa. As atividades estão sempre atualizadas e postadas no Facebook e se encontram vinculadas à página oficial, com vídeos das edições de cada programa realizado, acervo de todas as edições, áudio dos projetos apresentados pelos estudantes, possibilidade de conhecer cada escola participante e um espaço dedicado a cada escola, seja no blog, seja no Facebook, mostrando os alunos e projetos. Outro exemplo de plataforma virtual que reúne todas as características de plataformas mais interativas é o website do Plenarinho, da Câmara dos Deputados, que visa a aproximar a temática política e as crianças, desenvolvendo vários programas educativos nas escolas de ensino médio e fundamental.7

Em suma, apesar de ainda minoritária no contexto geral das assembleias legislativas brasileiras, desenvolve-se já há algum tempo uma série de iniciativas que utilizam amplamente as potencialidades interativas da internet para promover a função educativa do parlamento, as quais podem servir como parâmetro para a implementação e aperfeiçoamento de outras iniciativas do gênero em outras casas legislativas.

Conclusões

Para encerrar, podemos recapitular alguns dos principais resultados da análise empreendida e cotejá-los com as hipóteses enunciadas anteriormente. No tocante à hipótese 1, verificarmos que ela se confirmou, ou seja, que há uma relação positiva entre fatores associados ao desenvolvimento econômico e o IFP. Observamos também que essa associação se manteve positiva ao longo do período examinado, embora tenha se intensificado no último ano, na medida em que os aprimoramentos nos portais e nas funções educativas dos parlamentos ocorreram em estados com maior grau de desenvolvimento socioeconômico.

Nossa segunda hipótese também se confirmou em linhas gerais, embora com algumas qualificações. Verificamos que, via de regra, assembleias maiores, com maior orçamento e mais "participativas", são aquelas que têm melhor desempenho nas funcionalidades de seus websites. Observamos também uma melhoria incremental das funções dos websites ao longo do período, com as assembleias que possuem maior gasto por parlamentar aumentando mais aceleradamente seus índices, em comparação com aquelas que possuem menos gasto, o que indica um aumento moderado na eficiência dos gastos, se mensurado por esses parâmetros.

No que tange à terceira hipótese, ela não se confirmou, dado que as melhorias nas funcionalidades dos e-parlamentos no período estudado não foram observadas nos estados onde os indicadores socioeconômicos como IDH, PIB e inclusão digital são menores, mas sim naqueles estados com maior grau de desenvolvimento socioeconômico. Isso indica que não houve uma tendência à "equalização" das posições existentes off-line no mundo virtual, mas sim tendência à "normalização", ou seja, a uma acentuação das desigualdades previamente existentes fora da internet.

Por fim, no tocante à quarta hipótese, observamos que as funções educativas do parlamento apresentaram o mesmo desempenho geral que as demais funcionalidades, porém com algumas peculiaridades. Vimos que alguns poucos órgãos legislativos brasileiros tiveram desempenho acima da média e que isso está, geralmente, associado a fatores relacionados à qualidade do desenvolvimento socioeconômico (tais como IDH e índice de acesso a computadores) e políticos (eficiência do gasto por parlamentar e existência ou não de Comissão de Legislação Participativa). Verificamos, no entanto, que, em torno desse padrão mediano, existe um amplo campo de variação, com algumas assembleias apresentando desempenho acima e abaixo da média em relação às variáveis examinadas, que podem servir como parâmetros para a melhoria futura dos programas desses órgãos legislativos.

Por fim, através de uma análise mais detalhada das funções educativas dos WPs, observamos algumas casas legislativas que desenvolvem experiências de vanguarda de educação política por intermédio de suas plataformas digitais. Tendo em vista os resultados de trabalhos anteriores (BRAGA, 2007; FARIA, 2012; FARIA; BRAGA, 2015), talvez não seja exagerado inferir, da análise anteriormente apresentada, um movimento incremental em direção a uma melhoria da qualidade das funções legislativas e educativas pelos WPs, o qual, ao fortalecer e tornar mais capilarizadas e enraizadas socialmente as instituições parlamentares, pode repercutir no próprio aumento da qualidade da democracia brasileira, diminuindo os riscos de retrocesso autoritário em contexto de crise política e econômica e, consequentemente, aumentando a possibilidade de soluções democráticas para os problemas vivenciados pela sociedade brasileira nos próximos anos.

Referências

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1Em seu artigo seminal, em que sugere uma estrutura de análise para o exame dos impactos da internet nos trabalhos parlamentares, Cristina Leston-Bandeira (2007, p. 662) enumera as seguintes funções desempenhadas pelos órgãos parlamentares e que podem ser potencializadas por intermédio do uso das tecnologias digitais: mediação e resolução de conflitos, educação, legislação, legitimação, representação e fiscalização do Executivo. Para uma tentativa de aplicação desse modelo teórico na análise dos principais parlamentos europeus, cf. o artigo da mesma autora (LESTON - -BANDEIRA, 2009).

2O modelo de análise empregado por Leston- -Bandeira, assim como todas as variáveis empregadas em sua análise de conteúdo encontram-se expostas no anexo de seu artigo (2009, p. 24-27).

3As coletas foram realizadas, respectivamente, de março de 2014 a julho de 2016. Nesse período, várias casas legislativas aperfeiçoaram seus portais e introduziram melhorias em seus programas, especialmente os programas educativos

4Dizemos variáveis micropolíticas porque estão relacionadas mais de perto ao desempenho operacional e cotidiano das casas legislativas, ao contrário das variáveis macroinstitucionais, tais como sistema de governo, sistema eleitoral, sistema partidário, etc., que apresentam pouca variação ao nível dos legislativos estaduais brasileiros

5Ver: <http://www.almg.gov.br/educacao/parlamento_jovem/>.

6Ver: <http://www.almg.gov.br/educacao/parlamento_jovem/>.

7Ver: <http://www.plenarinho.gov.br/>.

Recebido: Novembro de 2015; Aceito: Julho de 2016

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