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Cadernos de Pesquisa

versión impresa ISSN 0100-1574versión On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.50 no.176 São Paulo abr./jun 2020  Epub 18-Ago-2020

https://doi.org/10.1590/198053147040 

ARTIGOS

UMA ANÁLISE DA PRODUÇÃO DISCURSIVA GENERIFICADA NO “ESCOLA SEM PARTIDO”

Melina Costa Lima FragaI 
http://orcid.org/0000-0002-0226-9842

Ana Paula Abrahamian de SouzaII 
http://orcid.org/0000-0002-4321-3458

IUniversidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Fundação Joaquim Nabuco, Recife (PE), Brasil; melina.clfraga@hotmail.com

IIUniversidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Fundação Joaquim Nabuco, Recife (PE), Brasil; apabrahamian@hotmail.com


Resumo

Este estudo faz parte do campo discursivo dos estudos de gênero e baseia-se nas premissas de Foucault (2009) sobre “produção de verdades” e análise de discurso em uma perspectiva arqueogenealógica. Trata-se de um esforço analítico focado na rede de discursos da Escola Sem Partido, com o objetivo de compartilhar reflexões sobre as motivações do grupo, os conhecimentos envolvidos e os “efeitos de verdade” produzidos por ele. Com base no conceito de “lição”, consideramos que as afirmações marcadas pelo gênero (re) produzido pelo “movimento”, em interação com os sujeitos, causam processos de subjetivação da identidade. Observamos aqui que o sintagma “ideologia de gênero” constitui um poderoso dispositivo pedagógico usado pelos ideólogos da Escola Sem Partido como forma de produzir identidades heteronormatizadas.

Palavras-Chave: GÊNERO; EDUCAÇÃO; PROGRAMA ESCOLA SEM PARTIDO; IDEOLOGIA

Abstract

This study part of the discursive field of gender studies and is based on Foucault’s assumptions (2009) about “production of truths” and discourse analysis in an archeogenealogical perspective. It is an analytical effort focused on the discourse network of Escola Sem Partido, aiming at share reflections on the group’s motivations, the knowledge involved and the “truth-effects” produced by it. Based on the concept of “lesson” we consider that the statements marked by the genre (re)produced by the “movement”, in interaction with the subjects, cause processes of identity subjectivation. Here we note that the syntagma “gender ideology” constitutes a powerful pedagogical device used by the ideologists of Escola Sem Partido as a way of producing heteronormatized identities.

Key words: GENDER; EDUCATION; PROGRAMA ESCOLA SEM PARTIDO; IDEOLOGY

Résumé

Cette étude s’inscrit dans le champ discursif des études de genre et s’appuie sur les hypothèses de Foucault (2009) sur la “production de vérités” ainsi que sur l’analyse du discours dans une perspective archéo-généalogique. Cet effort d’analyse axé sur le réseau de discours de l’Escola Sem Partido [École Sans Parti] vise à réfléchir sur les motivations du groupe, les connaissances impliquées et les “effets de vérité” qu’il produit. À partir du concept larrosien de “leçon”, nous considérons que les affirmations marquées par le genre (re) émises par le “mouvement”, en interaction avec les sujets, provoquent des processus de subjectivation de l’identité. Nous observons ici que le syntagme “idéologie du genre” constitue un puissant dispositif pédagogique utilisé par les idéologues de l’Escola Sem Partido comme moyen de produire des identités hétéronormatives.

Key words: RELATIONS DE GENRE; ÉDUCATION; PROGRAMA ESCOLA SEM PARTIDO; IDÉOLOGIE

Resumen

Este estudio es parte del campo discursivo de los estudios de género y se basa en las premisas de Foucault (2009) sobre “producción de verdades” y en el análisis del discurso desde una perspectiva arqueogenealógica. Se trata de un esfuerzo analítico enfocado en la red de discursos de la Escuela Sin Partido, teniendo el objetivo de compartir reflexiones sobre las motivaciones del grupo, los conocimientos involucrados y los “efectos de verdad” elaborados por aquel. Con base en el concepto de “lección”, consideramos que las afirmaciones marcadas por el género (re) producido por el “movimiento”, en interacción con los sujetos, causan procesos de subjetivación de la identidad. Observamos, aquí, que el sintagma “ideología de género” constituye un poderoso dispositivo pedagógico usado por los ideólogos de la Escuela Sin Partido como forma de producir identidades heteronormatizadas.

Palabras-clave: GÉNERO; EDUCACIÓN; PROGRAMA ESCOLA SEM PARTIDO; IDEOLOGÍA

O presente artigo procura reunir as discursividades produzidas e postas em circulação pelo “Escola Sem Partido” (ESP) no que concerne ao campo epistemológico dos estudos de gênero. Dedicamo-nos aqui, mais especificamente, aos debates e embates oriundos dos discursos produzidos e/ou reproduzidos pelo “movimento”1 sobre gênero, sexo, sexualidade e a suposta “ideologia de gênero”. Por se tratar de um estudo calcado nos pressupostos foucaultianos sobre “produção de verdades”, não pretendemos aqui sermos taxativas em relação às mobilizações promovidas pelo ESP, mas apresentarmos considerações sobre as motivações do grupo, os saberes envolvidos e os “efeitos de verdade” por ele produzidos.

Numa perspectiva contextual, apresentamos aqui pistas analíticas entendidas por nós enquanto facilitadoras para uma investida de mapeamento da árvore enunciativa cultivada pelo ESP. Para tanto, nos baseamos no conceito larrosiano (LARROSA, 2001) de “lição”,2 considerando que os enunciados marcados pelo gênero (re)produzidos pelo “movimento”, em interação com os sujeitos, ocasionam processos de subjetivação identitária generificada. Trata-se, pois, de lições que, de acordo com Foucault (1998), podem ser extraídas do “ritual”,3 configurado entre o dito e o interdito.

A noção foucaultiana de discurso é entendida para este estudo como sendo

[...] um conjunto de enunciados, na medida em que se apoiem na mesma formação discursiva; ele não forma uma unidade retórica ou formal, indefinidamente repetível e cujo aparecimento ou utilização poderíamos assinalar (e explicar, se for o caso) na história; é constituído de um número limitado de enunciados para os quais podemos definir um conjunto de condições de existência. O discurso, assim entendido, não é uma forma ideal e intemporal que teria, além do mais, uma história; o problema não consiste em saber como e por que ele pôde emergir e tomar corpo num determinado ponto do tempo; é, de parte a parte, histórico - fragmento de história, unidade e descontinuidade na própria história, que coloca o problema de seus próprios limites, de seus cortes, de suas transformações, dos modos específicos de sua temporalidade, e não de seu surgimento abrupto em meio às cumplicidades do tempo. (FOUCAULT, 2009, p. 132-133)

Partindo da noção de regularidade enunciativa, nos empenhamos, então, em entender como instituições e práticas sociais se articulam em um regime de convergência para criar verdades e exercer poder sobre sujeitos, instaurando, com isso, processos de subjetivação identitária.

Os debates aqui apresentados são orientados pela perspectiva pós-crítica, o campo da metodologia da pesquisa feminista e as inspirações foucaultianas sobre a análise do discurso. Assim, apresentamos os arquivos sobre os quais nos debruçamos nas análises e o seu potencial para a montagem de um “mapa arqueogenealógico” que sinalize a profusão dos campos de saberes que aderem a esse discurso. Ou seja, ao assumirmos nesta pesquisa tais configurações de natureza teórico-metodológicas, quisemos mostrar, nos enunciados dos arquivos escolhidos, a capilaridade e discurso generificado produzidos por campos disciplinares dispersos. Tais enunciados não são exatamente inovadores, mas atualizam, exacerbam e complexificam o cenário conservador, sexista, misógino e homofóbico que temos experienciado na contemporaneidade.

Nos limites deste texto, iremos refletir sobre quatro lições que emergem como ideias-força dos enunciados analisados. São elas: a) existe uma “ideologia de gênero”, que representa uma ameaça à “família tradicional”; b) as pessoas que se orientam pelo arcabouço teórico feminista em torno do gênero são imorais ou amorais, “audiência cativa” das “ideologicistas” do gênero e assumem posturas de assediadoras e/ou doutrinadoras por pretenderem promover uma “revolução sexual”; c) reconhecer e respeitar pautas e práticas homossexuais ou mesmo identidades de gênero e sexuais desconformes com a heteronormatividade é promover um doutrinamento social gay; d) a educação sexual está no rol da “ideologia de gênero”, e, portanto, viola a moral das “famílias tradicionais”.

Lembramos, contudo, que se trata de um processo que requer bastante flexibilidade, por parte de quem se propõe ao estudo, para acompanhar, reconhecer e compreender os avanços, as reproduções, as retomadas e os recuos costurados no campo discursivo sobre o qual nos debruçamos. Além de serem movimentos espontâneos configurados no espraiamento de qualquer campo discursivo, devemos, pois, considerar também o fato de que o “movimento” sobre o qual tratamos ainda está se desenhando por ser articulado por uma mobilização vigente.

Diante do exposto, estruturamos nossas reflexões da seguinte forma: uma breve apresentação do Escola Sem Partido e considerações sobre o seu contexto de emergência a partir do viés generificado, alguns apontamentos sobre o conceito de “ideologia de gênero” enquanto dispositivo pedagógico que retroalimenta a teia discursiva do ESP e seu cunho conservador, as orientações teórico-metodológicas que elegemos para este estudo e, finalmente, algumas pistas analíticas a partir dos pressupostos foucaultianos da análise arqueogenealógica do discurso.

DO “MOVIMENTO” ESCOLA SEM PARTIDO, SEU CONTEXTO DE EMERGÊNCIA E O VIÉS GENERIFICADO

O Escola Sem Partido é um “movimento” que existe desde 2004 sob o argumento de tratar o “problema da instrumentalização do ensino para fins políticos e ideológicos” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018). Fundado pelo advogado Miguel Nagib, com o lema de “educação sem doutrinação”, o ESP tem inspirado diversos projetos de lei em todas as instâncias governamentais.

Oficialmente, a princípio, foi mencionado em dois projetos de lei (PL). O PL 867/2015 (DISTRITO FEDERAL, 2016a) - apresentado pelo deputado Izalci Lucas, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) do Distrito Federal, em 26 março de 2015, à Câmara dos Deputados - e o PL 193 (DISTRITO FEDERAL, 2016b) - apresentado pelo senador e pastor Magno Malta, do Partido da República (PR), do Espírito Santo, em 3 de maio de 2016, ao Senado. Ambos pretendiam incluir, entre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, o “Programa Escola Sem Partido” - plataforma ideológica de valores e medidas elaborada pelo “movimento” cujo principal objetivo é “regular desde o que o professor ensina em sala de aula até a composição de livros didáticos e as avaliações para o ingresso no ensino superior” (FREITAS; BALDAN, 2017, p. 1).

O “Programa Escola Sem Partido”, configurando uma proposta legislativa de inclusão em um dado sistema de ensino (no caso, o estadual do Rio de Janeiro), surgiu por um pedido do, à época, deputado estadual Flávio Bolsonaro ao coordenador do “movimento”, Miguel Nagib. Com isso, este último, valendo de suas habilidades jurídicas enquanto advogado, conseguiu articular as propostas do deputado em um PL, de número 2974/2014, que veio a ser apresentado pela primeira vez em 15 de maio de 2014 à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

O “movimento” espraia-se, contudo, a partir de esforços de Nagib que trazem a força do âmbito jurídico/legislativo para respaldar seu pressuposto de que, atualmente, todas as escolas apresentam características “doutrinadoras”, promovendo, de acordo com o coordenador do ESP, “de um lado, a doutrinação política e ideológica em sala de aula, e de outro, a usurpação do direito dos pais dos alunos sobre a educação moral e religiosa dos seus filhos” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018).

Além das reivindicações elencadas como constituintes de uma rede de discursividades empenhadas na produção, circulação e aderência ao conservadorismo, os ideólogos do ESP pretendem obstruir as conquistas acerca da equidade de gênero e ocasionar entraves no reconhecimento dos direitos sexuais como direitos humanos, através da principal bandeira do ESP, o combate à chamada “ideologia de gênero”, sintagma apresentado com regularidade enunciativa potencialmente articulada por membros do “movimento”.

Trata-se de um conceito forjado que vem a ser utilizado pelo grupo como estratégia de desvirtuamento do arcabouço teórico feminista calcado em torno da identidade e da performatividade do sujeito contemporâneo. Foi, inclusive, a partir da inclusão da proposta de veto ao debate de gênero que o ESP veio a ganhar maior popularidade. De acordo com a natureza conservadora do “movimento”, o patriarcado e os ditames sociais heteronormativos deveriam ser preservados, princípio radicalmente contraposto ao debate feminista em torno da noção de gênero.

Segundo Penna (2016), o termo “ideologia de gênero” vem sendo usado como uma forma política de manipulação do medo com base em informações falsas e distorções grotescas das práticas que acontecem nas escolas.

Ao debater essa perspectiva de incitar o “pânico moral” como forma de controle social, Miskolci (2007) aponta como referência as contribuições de Cohen (1972), que explica o processo de sensibilização social em relação a um tipo de desvio no que se refere a um determinado padrão. De acordo com Cohen, a forma como a mídia, a opinião pública, entre outros agentes de controle social, acusam determinados “desviantes” acarreta julgamentos severos e fortes reações coletivas. Assim, conforme seus pressupostos (1972), o “pânico moral” consiste na estratégia de apontar, de forma estereotipada e histérica, um sujeito ou um grupo como uma ameaça ao convívio social e fomentar uma teia discursiva de rechaço àquele determinado perfil.

Valendo-se de tal estratégia, o “movimento” procura desconstruir a conscientização de que, ao adotar uma postura neutra, o Estado corrobora a perpetuação de desigualdades entre lugares sociais. O principal alvo desse ataque são as conquistas da luta feminista sobre questões de gênero e das sexualidades, como se verifica na seguinte proposição do PL 193/2016:

Art. 3º. O Poder Público não se imiscuirá na orientação sexual dos alunos nem permitirá qualquer prática capaz de comprometer o desenvolvimento de sua personalidade em harmonia com a respectiva identidade biológica de sexo, sendo vedada, especialmente, a aplicação dos postulados da teoria ou ideologia de gênero. (DISTRITO FEDERAL, 2016b)

Por meio de tal proposição, o grupo, então, reivindica um verdadeiro retrocesso em relação à Constituição de 1988, já que tal legislação tenta estabelecer uma frente básica, embora ainda limitada pelos marcos de uma sociedade burguesa, de combate a discriminações e violências a “o Outro”, graças às lutas dos movimentos sociais como um todo, em especial às reivindicações feministas da década de 1980.

Por último, é importante observar, ainda, o contexto de emergência de tal “movimento”, decorrente de um momento em que vários golpes - de ordem política, social e cultural - atinge o país causando-lhe um verdadeiro retrocesso. Em consonância com Paiva (2017, p. 2), consideramos que esse quadro tem gerado: “graves consequências na área educacional, demonstrando cabal desconhecimento da mesma, além de má-fé (diríamos, de um lado, filosófica e, de outro, litigante, do ponto de vista jurídico), além de que se baseiam em confusões jurídicas e conceituais”.

Ainda em relação ao contexto situacional que perpassa o surgimento do ESP, acreditamos que não devemos deixar de problematizar o fato de ter sido alavancadotna sequência processual ligada ao impeachment da primeira mulher presidente do país, Dilma Rousseff, que, na época, sofreu diversos ataques de cunho misógino. Vale salientar, inclusive, que foi durante o seu governo que o Brasil veio a enquadrar o crime contra a mulher em função de seu gênero na Lei n. 13.104, conhecida como Lei do Feminicídio, promulgada pela presidente Rousseff em 9 de março de 2015.

A “IDEOLOGIA DE GÊNERO” ENQUANTO DISPOSITIVO PEDAGÓGICO NA TEIA DISCURSIVA DO ESP

Em consonância com os pressupostos foucaultianos sobre como os discursos configuram teias se articulando por meio de saberes comuns a um ou mais campos, observamos que o sintagma “Ideologia de Gênero” funciona como um potente enunciado que costura diferentes textos, instituições, práticas e campos de saberes, ou seja, trata-se de um dispositivo pedagógico usado, com frequência, pelo grupo em caráter persuasivo, na tentativa de normatizar e fixar os sujeitos no aparelho de produção e controle de suas existências.

Segundo os pressupostos foucaultianos, os dispositivos vêm, pois, a forjar processos de subjetivação identitária por onde circulam por serem ponto de ligação ou nexo - embora os efeitos de sua incidência possam vir a extrapolar suas linhas de coesão, podendo acarretar dispersões, quando não contradições, e exigir reformulações - entre elementos heterogêneos: lições, discursos, rituais, instituições, legislações, regulamentos, decisões governamentais, construções estruturais e arquitetônicas, posições filosóficas, morais, políticas, tecnológicas e filantrópicas, enunciados científicos, o dito e o não dito.

Sendo assim, além da noção larrosiana (LARROSA, 2001) de “lição”, fez-se imprescindível a este texto trabalhar com a noção foucaultiana (FOUCAULT, 1977) de “dispositivo”, a fim de identificar e compreender as articulações discursivas produzidas pelo ESP como ferramentas de deslegitimação do dispositivo de gênero produzido pelo campo de saberes feministas.

Argumentamos aqui que é por meio desse dispositivo que o “movimento” incute a ideia de que a tal “ideologia” é uma ameaça à “família tradicional”, e, também sob esse rótulo, colocam questões de sexo, sexualidade e educação sexual, reiterando o sexismo e inibindo qualquer proposta de promoção de políticas de superação das desigualdades sociais, sobretudo as diretamente ligadas a questões de gênero, sexo e sexualidade. E o fazem por meio de lições sobre as quais nos debruçamos neste estudo, buscando, a seguir, pinçá-las e visibilizá-las.

ANÁLISE DAS LIÇÕES GENERIFICADAS EMERGENTES DA TEIA DISCURSIVA (RE)PRODUZIDA PELO ESCOLA SEM PARTIDO

Ao passo que um determinado enunciado se configura transformando a memória, não deixa de estar embasado nela. É, portanto, através do método arqueogenealógico que objetivamos pinçar nos arquivos escolhidos os enunciados segundo regularidades e dispersões cunhadas dentro de e entre campos de saberes em atenção aos inumeráveis conjuntos de dispositivos pedagógicos voltados para a normatização de identidades de gênero, como se fossem fixas e pré-existentes ao contexto de vida do sujeito.

Procurando evidenciar enunciados produzidos pelo ESP, esta sessão reflete sobre arquivos produzidos pelo “movimento” calcados na “ideologia de gênero” e voltados para a heteronormatização identitária de sujeitos escolarizados.

Em matéria publicada no website do “movimento”, já do enunciado constituído no título “De novo, a tentativa de criar o ‘homem novo’. Será que agora vai? E os pais? Será que estão sabendo? Será que estão de acordo?”,4 emergem dois dados nessa perspectiva:

  1. intolerância em relação à possibilidade de desconstrução do homem inventado pelo patriarcado, através do uso da expressão “de novo”;

  2. desconfiança disseminada no sentido de fomentar o “pânico moral” de acordo com as considerações de Cohen (1972).

Trata-se de uma matéria reproduzida pelo ESP como “mau” exemplo do que se pode acontecer na educação formal de estudantes, colocado como um desacordo com os princípios morais de pais que se enquadrem no modelo matricial da “família tradicional”, fato que não chega a configurar nenhuma arbitrariedade. Originalmente, o texto foi produzido como uma matéria de autoria de Ocimara Balmant, publicada pelo Estadão em 4 de maio de 2013, sob o título “Bonecas são para meninos? Em algumas escolas, sim”, e, de acordo com o que pudemos analisar, o conteúdo do relato é “denunciado” pelo grupo simplesmente por abordar uma experienciação consonante com o debate feminista em torno do gênero e das sexualidades. De acordo com a matéria:

No salão de cabeleireiro de mentirinha, João Pontes, de 4 anos, penteia a professora, usa o secador no cabelo de uma coleguinha e maquia a outra, concentradíssimo na função. Menos de cinco minutos depois, João está do outro lado da sala, em um round de luta com o colega Artur Bomfim, de 5 anos, que há pouco brincava de casinha. Nos cantos da brincadeira do Colégio Equipe, na zona oeste de São Paulo, não há brinquedo de menino ou de menina. Todos os alunos da educação infantil - com idade entre 3 e 5 anos - transitam da boneca ao carrinho sem nenhuma cerimônia. “O objetivo é deixar todas as opções à disposição e não estimular nenhum tipo de escolha sexista. Acreditamos que, ao não fazer essa distinção de gênero, ajudamos a derrubar essa dicotomia entre o que é tarefa de mulher e o que é atividade de homem”, explica a coordenadora pedagógica de Educação Infantil do Equipe, Luciana Gamero. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Embora tanto o relato da experiência já contenha justificativas para tal feito, como a própria repórter os comente em caráter de concordância, o ESP não esmorece sua “vontade de verdade” nem abdica da produção do ilegítimo, como propõe Foucault (1987, 2009), e do inimigo, conforme os apontamentos de Souza (2013) sobre o uso político do sexo.

Em outro enunciado, o ESP recrimina a iniciativa com o seguinte comentário:

“Os pais têm direito a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções”. É o que diz o art. 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos, que tem força de lei no Brasil. Portanto, se os pais dessas crianças-cobaia autorizaram a experiência comportamental que a escola está fazendo com seus filhos, o problema é deles; ninguém tem nada com isso. Do contrário, podem (e devem) processar a escola por danos morais. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Através de tais enunciados, além de colocar-se contrário à realização de experiências pedagógicas capazes de instigar o repensar das lições e rituais de viés generificados que povoam o ambiente escolar, fomentam e disseminam a prática de ameaça de processo contra o pluralismo de ideias sob a acusação de danificarem a moral da referida “família tradicional”.

Outro arquivo encontrado com nosso estudo apresenta conteúdo bastante semelhante, mas com o diferencial de que o relato da experiência “denunciada” pelo ESP é pensado e articulado a partir de esforços envolvendo toda a comunidade escolar, gestão, equipe docente, grupo de discentes e suas respectivas famílias, como é revelado logo no início da reportagem:

Qual tipo de educação os jovens daqui a 10 anos vão carecer para viver numa sociedade com tamanha diversidade? Segundo alunos e professores, é preciso encontrar um caminho para a pluralidade das pessoas, engajando os jovens no mundo das diferenças, preparando-os para serem cidadãos completos. No sábado, o Centro de Ensino Médio 1 do Paranoá recebe pais, estudantes, docentes e quem mais quiser enaltecer a multiplicidade de gênero, sexualidade, raça e religião. Lá, uma festa junina diferente terá lugar: o noivo foge com outro homem e todo tipo de amor é aceito. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018, itálicos nossos)

Trata-se de uma matéria produzida e veiculada pelo Correio Braziliense, datada de 6 de julho de 2016, com o título: “Turma de escola do DF fez festa junina em que noivo foge com outro homem”. À revelia, porém, do que é revelado logo no início da reportagem, tanto no que se refere ao fato de o experienciado ter sido fruto de iniciativa coletiva como no que diz respeito às motivações terem sido por questões ideológicas comuns ao grupo, o ESP dispara, como título da publicação, acusações que não se comprovam no conteúdo do texto reproduzido: “No DF, professores usam festa junina para atacar moralidade cristã, e transmitir aos filhos dos outros seus próprios valores”.5

O texto inteiro é reproduzido sem que o ESP apresente contra-argumentos diretos e explícitos aos pontos debatidos. O único ataque não passa da forma pejorativa com que rotulam a experiência no título que dão à matéria, o que não é novo no rol de estratégias depreciativas do “movimento”. A novidade, dessa vez, porém, é que o próprio discurso criticado pelos ideólogos traz consigo referências a um campo de saber comum à base discursiva do ESP, o psicanalítico.

Através do enunciado “figuras de autoridade, como pais, líderes religiosos e educadores, exercem papel primordial na consolidação dos avanços, dizem os livros de pedagogia” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018), percebemos uma atualização do discurso psicanalítico que propõe a necessidade de uma figura de autoridade auxiliando os avanços na formação identitária dos sujeitos; mas, de acordo com essa concepção, esse papel pode ser estendido a outras figuras orientadoras para além dos pais, o que configura uma atualização. No caso, também se flexionou os substantivos apenas na forma masculina, o que acaba atribuindo maior importância aos homens. A dispersão encontrada no referido enunciado é que a figura de autoridade não é mais convocada a fazer interdições, mas a estimular a emancipação dos sujeitos.

Mudando mais uma vez o foco de ataque, o alvo de outro arquivo encontrado em nossa pesquisa é a própria educação sexual. Através de discurso articulado por Nagib, coordenador do “movimento”, o website publicou outro texto intitulado por “Ludibriando a audiência com a ajuda do UOL Educação”.6 Desse enunciado, emergem a “denúncia” ao consultor em educação sexual e veículo midiático que o referencia, no caso a Rádio UOL, e sua função de “ludibriar” o público consumidor de suas ideias, tomando, nessa formação discursiva, assim como em outros discursos da mesma teia, os sujeitos estudantes, segundo a visão do ESP, como meros “audientes cativos”.

Logo no início de seu discurso, Nagib destaca uma consideração feita por Marcos Ribeiro (educador sexual a quem ele se refere) sobre o debate de questões de ordem sexual entre crianças e reitera denúncia feita anteriormente sobre o livro Mamãe, como eu nasci?, de sua autoria.

Ouvido pela reportagem do UOL Educação, o consultor em educação sexual Marcos Ribeiro foi categórico: a escola é, sim, lugar para falar sobre sexo [...]. Para quem não se lembra, Marcos Ribeiro é autor do livro Mamãe, como eu nasci?, dirigido a crianças de 7 a 10 anos, e de cuja 2ª edição reproduzimos as seguintes passagens: “Olha, ele fica duro!”; “Certo! Isso acontece de vez em quando”; “O pênis do papai fica duro também?”; “Algumas vezes, e o papai acha muito gostoso. Os homens gostam quando o seu pênis fica duro.”; “Aí os espermatozoides se misturam com um líquido que se chama sêmen. Esse líquido, que é grosso e pegajoso, sai da ponta do pênis do homem. É uma sensação muito boa.”; “Se você abrir um pouquinho as pernas e olhar por um espelhinho, vai ver bem melhor.”; “Aqui em cima está o seu clitóris, que faz as mulheres sentirem muito prazer ao ser tocado, porque é gostoso.”; “Agora que você já sabe o que é o pênis e a vulva, vale dizer mais uma coisa.”; “Alguns meninos gostam de brincar com o seu pênis, e algumas meninas com a sua vulva, porque é gostoso.”; “As pessoas grandes dizem que isso vicia ou ‘tira a mão daí que isso é feio’.”; “Só sabem abrir a boca para proibir. Mas a verdade é que essa brincadeira não causa nenhum problema. Você só tem que tomar cuidado para não sujar ou machucar, porque é um lugar muito sensível. Mas não esqueça: essa brincadeira, que dá uma cosquinha muito boa, não é para ser feita em qualquer lugar. É bom que você esteja num canto, sem ninguém por perto.”; “Já nesse momento o pênis está duro (ereto), bem maior do que é normalmente. E a vulva também fica um pouco molhadinha. Eles ficam bem juntinhos, bem abraçados, e, então, o homem coloca o pênis dentro da vagina da mulher. A mulher gosta muito e o homem também. O homem movimenta o pênis para dentro e para fora da vagina várias vezes com a ajuda da mulher”. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Ciente de que o tal livro gerou muitas polêmicas por conter, segundo a perspectiva de muitas pessoas, “excessos de realismo”, Nagib reproduz essas passagens a fim de ilustrar o que concebem como abordagens absurdas e, com isso, fomentar o pânico moral, segundo as contribuições teóricas de Cohen (1972). A expectativa gerada pelo seu discurso é de que tais absurdos se espraiem, saindo do livro paradidático para “a veiculação da temática sexual nas disciplinas obrigatórias do currículo escolar”, já que Marcos Ribeiro é posto “em sintonia com o MEC”.

Ainda nessa perspectiva de disseminação do “pânico moral” (COHEN, 1972), analisamos, no trecho que se segue, o descrédito atribuído ao consultor pelo discurso de Nagib, que supõe dissimulação na fala de Ribeiro concedida em entrevista e infere que sua coerência seria uma estratégia para “enganar os desavisados”.

Não tivemos acesso à 3ª e mais recente edição da obra. Consta que foi revista e reformulada [...]. Esperamos que as passagens acima tenham sido suprimidas. Mas o fato é que Marcos Ribeiro pode ter evoluído em sua compreensão sobre o papel dos pais na educação moral dos filhos, como se vê do seguinte trecho da reportagem: “O trabalho na escola deve respeitar as diferentes opiniões e realidades de cada família, conforme sua cultura ou religião. Os valores, os limites e o que ‘pode’ ou ‘não pode’, cabe a ‘pai e mãe’, opina Ribeiro”. Convenhamos: para quem desqualificava a orientação dos pais dizendo que “[as pessoas grandes] só sabem abrir a boca para proibir”, e se arrogava o direito de dizer aos filhos dos outros o que é “a verdade” em matéria de moral, não se pode negar que é um avanço. Ou melhor, seria um avanço, se não passasse, como não passa, de uma simples tentativa de enganar os desavisados. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018, itálicos do autor)

Embora citem o posicionamento do consultor em educação sexual, o fazem desmerecendo, numa nova investida que chamam, com recorrência, de “desmentir”, outra regularidade produzida pelo discurso do ESP. Para tanto, apontam o seguinte trecho do livro recriminado: “As pessoas grandes dizem que isso vicia ou ‘tira a mão daí que isso é feio’. Só sabem abrir a boca para proibir. Mas a verdade é que essa brincadeira não causa nenhum problema”. Desconsideram, no entanto, o fato de que o autor, no depoimento supracitado, se posiciona enquanto adulto; já, no trecho da obra em questão, procura colocar-se segundo uma perspectiva infantil condizente com o jogo paradoxal “adulto-criança”.

Por último, Nagib conclui suas considerações afirmando que não se pode acreditar na sinceridade do autor de Mamãe, como eu nasci? quando ele afirma que “os valores, os limites e o que ‘pode’ ou ‘não pode’, cabe a pai e mãe”. Esse e outros enunciados, como os citados anteriormente, reafirmam as pistas analíticas que viemos encontrando de que o discurso do ESP é formado por saberes de orientação monológica, não concebendo, assim, a legitimidade no processo de formação crítica que considera o compartilhamento de informações concernentes ao interesse público e mediação dos valores morais por parte dos responsáveis.

A exemplo desse radicalismo, encontramos outro arquivo no website do movimento, intitulado “Prova de concurso público em Goiânia é mais um caso de estupro coletivo”.7 Nele, Sandra Ramos, em texto referenciado pelo ESP, se autoconfere a autoridade de falar com propriedade sobre o processo educacional brasileiro, ato enunciativo através do qual pretende fortalecer a argumentação dos ideólogos sobre uma suposta existência alarmante de doutrinação em nosso sistema de ensino.

Minha experiência docente de 35 anos deu-me o privilégio de lecionar em todos os níveis de ensino, da pré-escola à pós-graduação, com especial dedicação à formação de professores. Esta trajetória dá-me condições para fazer análises mais apuradas do processo educacional brasileiro. Uma constatação que faço e me deixa envergonhada é o problema da doutrinação no sistema de ensino. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Ainda nas palavras de Ramos, trata-se de “uma deslavada doutrinação ideológica que vem sendo implantada nas universidades e nas escolas do país. Uma tentativa escancarada e incansável de aliciar os brasileiros para redefinir conceitos e concepções tradicionais. Um verdadeiro estupro ideológico” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018).

Articulando enunciados do tipo, a autora produz um discurso de franca contribuição para a disseminação do “pânico moral” explicitado por Cohen (1972). Com os adjetivos “deslavada”, “escancarada” e “incansável”, estabelece o fortalecimento da motivação para contraposição, objetivada pelo ESP, e com a expressão “estupro coletivo” reforça a ideia de “violação” e “maculação” atribuída ao debate e seu veio questionador do status quo.

Vale destacar que o uso do termo “estupro” dialoga com a potência do poder atribuído ao falo ou à cultura machista (também nomeada neste contexto como “cultura do estupro”) de fetichizar práticas opressoras de objetificação e penetração não consensual de corpos frágeis ou abjetos, não viris ou menosprezados pela sociedade patriarcal. No caso, a autora rotula como “estupro” o “fato” de, segundo suas impressões, uma prova de concurso público em Goiânia - promovida pela Secretaria Municipal de Educação e Esporte para contratação de Profissional da Educação II pela Prefeitura de Goiânia, e aplicada em 19 de junho de 2016 - apresentar “questões [...] de explícita doutrinação ideológica. Afinal, se o candidato não responder o previsto pelo gabarito ideológico, é reprovado”.

Ainda de acordo com suas considerações no que se refere à análise do conteúdo que fez da prova,

Logo no primeiro texto “Objetivo de princesas da Disney não é mais o casamento, revela estudo” encontramos a Ideologia de Gênero em ação e sua tentativa de convencer a sociedade para o fato da Disney reconduzir sua abordagem sobre conceitos de família, casamento, papel da mulher, feminilidade e masculinidade. Um texto indutivo para levar o leitor a aceitar essas mudanças como evolução social, que na verdade é doutrinação [...] (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Ou seja, as pautas de debates endereçadas ao âmbito educacional, quando são ideologicamente contrárias aos pressupostos do ESP, passam a ser tomadas pelos ideólogos como doutrinadoras, o que é analisado aqui como reafirmação da produção do inimigo debatida por Souza (2013). Além disso, a articulação direta entre subestimação da instituição do casamento e abertura a novas concepções sobre família e papéis de gênero e “ideologia de gênero” são regularidades do campo de discurso religioso que inferioriza e reprime o menosprezo em relação ao conservadorismo de posturas e ritos comuns a padrões hegemônicos.

Nesse sentido, inclusive, em alegações seguintes, a autora chega a mencionar que a perspectiva do debate queer apenas “se diz científica” e a atribuir tal demanda de reflexão social aos “grupos LGBT”, mas sua suposição é de que, por basear-se em saberes construídos em um campo de saberes dissonantes do biologicista, outro bastante revivificado no discurso do ESP, não merece credibilidade ou legitimação social.

No texto abaixo podemos identificar a defesa da “Teoria Queer”, defendida pelos grupos LGBT, com a afirmação de que as pessoas nascem sem gênero definido. Segundo essa teoria, o sexo biológico não é determinante para a definição de homem ou mulher, visto que são constituídos pela sociedade e a cultura. Essa teoria que se diz científica, convenientemente, renega os contributos das ciências naturais como a biologia e a genética, por exemplo. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Por último, mas não menos importante, e em sintonia com a práxis de referenciar os saberes conservadores emergentes do campo discursivo religioso, acusa o debate acerca do “fundamentalismo” religioso de “difusão da cultura de ódio aos cristãos” e, sem apresentar muitos elementos de coerência textual entre um argumento e outro, compara a “gravidade” dos trânsitos ideológicos apresentados na prova referida à representação de práticas misóginas, afirmando que se trata de “uma atitude muito mais vergonhosa do que reprovar mulheres em entrevista de emprego simplesmente por serem mulheres”.

E, como desfecho de seu manifesto, Ramos (2016) ainda produz uma convocatória aos candidatos que se submeteram à seleção, incitando-os a tomar o conteúdo da avaliação como criminoso e, assim como o grupo, manifestarem juridicamente sua reprovação aos debates que tragam à tona tais questões, postas no rol do “inimigo doutrinador”.

A prova de Goiânia não é exceção. Esse tipo de prova impregnada de doutrinação ideológica alastra-se nos concursos Brasil afora. Candidatos à docência para as escolas da Prefeitura de Goiânia, prejudicados com esse abuso doutrinário, não permitam esse estupro coletivo de suas liberdades de pensamento. Exija a anulação deste concurso. A guerra contra vocês que defendem a família tradicional e cristã foi declarada. Ergam-se contra essa massiva doutrinação ideológica. Devemos defender a educação brasileira desse crime contra a liberdade. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Também na perspectiva de atacar as pessoas adeptas do debate feminista de gênero, Nagib menospreza carta escrita por duas professoras como “Direito de resposta ao artigo ‘Conteúdo Imoral na Escola’”,8 publicado na Gazeta do Povo. Segundo reprodução de trechos da carta contidos no arquivo, as docentes protestam pelo seguinte motivo:

Li a reportagem publicada no jornal Gazeta do Povo, dia 18 de novembro, pelo advogado Miguel Nagib. Fiquei chocada, revoltada, indignada com o que o senhor advogado escreveu sobre a profissão que escolhi. Uma coisa é ficar revoltado com fatos, que digo isolados, outra coisa é generalizar. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

O autor do discurso articulado no arquivo em questão, então, responde defendendo a si e às próprias ideias. Começa contra-argumentando que não se refere efetivamente a docentes, uma vez que suas críticas são voltadas aos “doutrinadores disfarçados de professores”.

1 - Não escrevi nada sobre a profissão que a senhora escolheu. Afinal, ensinar aos filhos dos outros o que é boquete, sexo anal, e coisas do gênero não faz parte das atribuições de um professor. Ao contrário: se fizer isso sem estar autorizado pelos pais dos alunos, o professor estará infringindo o art. 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos. 2 - A senhora não pode afirmar que os fatos mencionados no meu artigo sejam isolados. O livro Mamãe, como eu nasci?, de onde foram tiradas as frases em destaque no parágrafo seguinte da sua mensagem, foi adotado, por exemplo, pela rede municipal de ensino de Recife. Não me parece que seja pouca coisa. 3 - Além disso, como é impossível saber o que acontece a cada instante em todas as salas de aula, temos obrigação supor que esses fatos podem estar ocorrendo em muitas escolas, principalmente porque não faltam “especialistas” com a mentalidade do Sr. Marcos Ribeiro, autor do livro Mamãe, como eu nasci?. Repito o que disse no artigo: “pelos ‘vazamentos’ podemos estimar o volume e a qualidade do esgoto moral que circula pelas tubulações do sistema de ensino”. 4 - Em todo caso, a senhora mesmo reconhece que “grande parte da educação de valores que as crianças têm recebido, quem lhes garante é a escola”. Ou seja, reconhece que a violação ao art. 12 do CADH é uma realidade nas escolas brasileiras; e é isso o que importa. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Em trecho posterior, afirma reconhecer a liberdade de cátedra, como verificamos em: “os professores não podem ser obrigados por quem quer que seja a transmitir aos alunos conteúdos que se choquem com a sua própria consciência moral: para isso é que existe a garantia constitucional da liberdade de cátedra” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018). No entanto, tal reconhecimento se faz paradoxal às censuras que tantas outras formações discursivas apresentadas pelo ESP conferem à práxis docente.

Em contraposicionamento seguinte, o enunciado articulado por Nagib critica generalizadamente o devir questionador da docência e ironiza as professoras que apresentam divergências ideológicas em relação ao discurso taxativo do advogado sobre o que seria supostamente imoral no âmbito escolar, como podemos observar na passagem seguinte:

Por outro lado, as famílias têm todo o direito de não querer que esses assuntos sejam abordados em sala de aula. A tentativa de desqualificar essa escolha com o rótulo de “tabu”, além de claramente preconceituosa, é reveladora do quanto vocês, educadores iluminados, se consideram superiores aos pais dos seus alunos. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018, itálicos nossos)

Sobre a reivindicação apresentada na carta de que “atualmente, grande parte da educação de valores que as crianças têm recebido, quem lhes garante é a escola” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018), o advogado produz enunciado articulado de modo a “desmentir” a defesa de outras formações discursivas contrárias à ideologia do ESP de que a escola não se intromete na educação de valores dos estudantes, retrucando a tentativa das professoras de desconstruir o mito da “família tradicional perfeita” com o enunciado: “Garante? A senhora acha que a escola está fazendo um grande bem às crianças ao usurpar a autoridade moral dos seus pais?” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018).

Em trecho posterior da carta, as professoras defendem a importância da educação sexual como ferramenta de esclarecimento e fortalecimento da cidadania dos sujeitos escolarizados, sobretudo aqueles em situação de vulnerabilidade:

No cotidiano das escolas públicas o que mais encontramos são famílias desestruturadas, e não estou me referido a falta do modelo nuclear de família (pai, mãe, filhos). Refiro-me a falta de condições de saúde, higiene, social, falta de estrutura familiar, onde para seu conhecimento, caro advogado e para quem não é da área, não é incomum encontrarmos crianças que são plateia durante o ato sexual de seus pais [...] Desta maneira o senhor vem propor que se retire a disciplina (ou conteúdo) de educação sexual? [...] É neste momento que as crianças podem tirar suas dúvidas, já que em casa, mesmo assistindo o ato sexual, elas são proibidas de tocar no assunto. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Sobre tal defesa, no entanto, Nagib vem a negar o que fora apresentado como realidade, sem apresentar, porém, dados que comprovem sua opinião. Além disso, ressalta a importância atribuída à educação tecnicista e conteudística, desmerecendo a educação sexual contraposta à ideia de aprender na prática questões dessa ordem. Esse dado revela, então, que o “movimento” ignora ou menospreza a função, sobretudo preventiva, da educação sexual em relação a práticas e relações abusivas. Contrariando a argumentação das professoras, o coordenador do ESP apresenta a seguinte formação discursiva:

A senhora acredita mesmo que as crianças precisam de um professor para tirar esse tipo de dúvida? Eu diria que elas precisam de um professor para lhes ensinar Português e Matemática, e que informações sobre sexo elas vão obter de um jeito ou de outro, como nós obtivemos. A senhora argumenta como se 9 em cada 10 crianças presenciassem regularmente cenas de sexo em casa, e tivessem necessidade de ser esclarecidas a respeito, o que evidentemente não corresponde à realidade. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Outra pista analítica que conseguimos pinçar advém de enunciado que dá continuidade a essa resposta dada por Nagib. Observamos, a partir da formação discursiva que se segue, que questões de autoconhecimento identitário e biológico não têm, para o grupo, o mesmo peso, a depender da área de conhecimento sobre o ser humano.

Além disso, nem todas as crianças têm o mesmo tipo de dúvida ou curiosidade na mesma época da vida. Assim, ao tratar desses assuntos em sala de aula, o professor está nivelando o conhecimento de todos pela demanda de alguns, e isso, além de caracterizar uma violação ao art. 12 da CADH, configura um desrespeito à individualidade e ao processo de amadurecimento de cada aluno, o que ofende o Estatuto da Criança e do Adolescente. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Contra o argumento de abuso da judicialização de questões ligadas ao devir docente e reivindicação de observância também aos deveres da família, o advogado não apresenta contraponto direto, mas repete a perspectiva discursiva de que “é uma questão de limites” e reafirma apenas os direitos dos pais, como observamos em:

Mas, muito fácil, prático, e lucrativo para alguns, é propor processos, multas. Se vamos processar que comecemos então pelos pais negligentes com a saúde de seus filhos, com a educação deles... Para quando houver 100% de pais presentes, que levem seus filhos ao dentista por causa daquela dor de dente que vem sendo informada há duas semanas pela escola, ao pediatra quando lhes é informado sobre caroços com mau cheiro na cabeça de seus filhos, aí sim pensem em processar os professores/escolas por algo que foi dito, ou feito em sala. Até porque, se cada professor que fosse ofendido em nosso país abrisse um processo certamente faltariam respeitados advogados para representar e acompanhar esses processos.

[Resposta:] Não é uma questão de bons ou maus profissionais; é uma questão de limites. Os pais têm direito de dar aos seus filhos a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções. Os professores não podem usurpar esse direito. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Em relação à insistência por parte das professoras em relatar as faltas e questões de negligência por parte das famílias, Nagib advoga sobre o direito dos familiares a cometer tais faltas, como podemos constatar do seguinte trecho do arquivo:

Ou, vamos nós professores, começar a ajuizar ações contra os pais de nossos alunos, por negligências em diversos aspectos, propondo multas por não levarem seus filhos à escola, por não levarem ao médico, por não levarem ao dentista, por não levarem ao psicólogo, neurologista, fonoaudiólogo, oftalmologista... E assim por diante. Seria justo, já que, seremos processados e/ou multados por ensinar o que os pais se recusam a fazer em casa.

[Resposta:] Nunca lhe ocorreu que se os pais se recusam a ensinar certas coisas aos seus filhos é porque acham que não devem fazê-lo? (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

O discurso, então, das professoras acrescenta, como conclusão do que enunciam no texto em questão, que é graças ao empenho e comprometimento docente que aborda respeitosamente questões de atravessamento identitário que a cidadania dos sujeitos pode se desenvolver plenamente, como verificamos nos enunciados:

O que nossa sociedade está esquecendo é que para formar todos os profissionais existentes, e para que as pessoas possam refletir e escrever aquilo que quiserem em uma folha de papel, ela precisou do auxílio de um professor que sem nenhuma valorização, sendo ofendido diariamente por pais, alunos e sociedades, que leva nas costas a responsabilidade por uma sociedade que está em pleno caos e vivendo em uma época de barbárie, mas que apesar de tudo isso, com muita dedicação, amor e respeito, possibilita aquisição desse conhecimento [...] Fica aqui registrado não só a minha, mas a indignação de muitos profissionais que fazem o possível e o impossível pela educação desse país. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

À revelia do manifesto, Nagib vem a reforçar o desmerecimento da categoria docente por parte do grupo, como podemos analisar na forma como encerra seu discurso de repúdio ao manifesto das professoras:

Confesso que suas palavras não me comovem. Não sou especialmente grato pelo trabalho dos professores. Que eu saiba, ele é remunerado. Tive bons e maus professores. Mais maus do que bons, infelizmente. Meus filhos também. Socialmente falando, o resultado do trabalho de vocês é vergonhoso, para dizer o mínimo. Cito apenas um dado: quase 40% dos estudantes universitários brasileiros “não dominam habilidades básicas de leitura ou escrita. Ou seja: são analfabetos funcionais”. Repito, professora: se a senhora realmente deseja ajudar seus alunos, principalmente os mais pobres, ensine-os a ler, escrever e fazer conta. E deixe que o resto eles aprendem sozinhos ou com seus pais. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018, itálicos nossos)

Além de disseminarem descrédito à docência brasileira, também vêm a desmerecer os órgãos e entidades destinados a pensar a educação, como podemos observar por meio da formação discursiva de “Quem deve aprovar a BNCC”, arquivo que configura outro ato enunciativo que vislumbra fazer-se autoridade para legitimar a própria “verdade”.

Nesse sentido, o discurso é iniciado por um franco viés de produzir o “inimigo” conforme as considerações de Soares (2002), como podemos observar da seguinte formação discursiva:

O sistema educacional brasileiro é como um edifício gigantesco, cujas estruturas foram corroídas de alto a baixo por cupins ideológicos. De vez em quando, desaba uma parede ou uma laje, e o estrondo acaba chamando a atenção do grande público. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Em formação posterior, dando continuidade à investida analisada, primeiro procuram deslegitimar a capacidade dos profissionais cujos cargos são voltados às diretrizes educacionais nacionais, depois associam pautas de orientação decolonial ao que chamam de “ideologia de gênero”, dado que nos leva a refletir se a maior resistência por parte dos conservadores não é em relação à superação ou desconstrução do patriarcado, uma das mais contundentes frentes de opressão nas relações contemporâneas. Desses enunciados, emerge também nova reiteração de repúdio a investidas contrárias à exclusão do debate de gênero do âmbito educacional, como podemos observar no seguinte trecho:

O último desabamento foi provocado pela proposta da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Dias atrás, o historiador Marco Antonio Villa demonstrou, em artigo publicado no jornal O Globo, que, se a proposta do MEC for aprovada, os estudantes brasileiros que quiserem aprender alguma coisa sobre o antigo Egito, a Mesopotâmia e a Grécia; o Império Romano e o nascimento do cristianismo; a Idade Média, o Renascimento, a Revolução Industrial e até mesmo a Revolução Francesa serão obrigados a se virar por conta própria. Na sala de aula, terão de estudar os mundos ameríndios, africanos e afrobrasileiros; interpretar os movimentos sociais negros e quilombolas; valorizar e promover o respeito às culturas africanas e afroamericanas. É um assombro. Menos comentada, mas não menos importante, é a presença da famigerada ideologia de gênero. Como já se adivinhava, a perspectiva de gênero - cuja inclusão, nos planos de educação, foi rejeitada de maneira veemente pela quase totalidade das nossas casas legislativas - atravessa toda a proposta do MEC. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Além disso, desmerecendo as pessoas aptas para debater pautas educacionais que pensaram e elaboraram a BNCC, construindo o material, bem como contra-argumentação às investidas de veto ao debate de gênero embasados em campos de saberes legítimos, afirmam:

A quem prestam contas esses servidores, afinal? Ao povo que não é; ou não teriam emitido, no ano passado, uma nota pública de censura endereçada às assembleias legislativas e às câmaras de vereadores - e, implicitamente, também ao Congresso Nacional - por haverem excluído a ideologia de gênero dos planos estaduais e municipais de educação; nem declarado, na mesma nota, em tom de desafio, que as Diretrizes Nacionais de Educação, a serem por eles elaboradas, estarão “voltadas para o respeito à diversidade, à orientação sexual e à identidade de gênero” - donde se conclui, senhores deputados e senadores, que, se depender do CNE, “vai ter gênero” na BNCC. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Mais do que se acharem moralmente superiores aos sujeitos que não se conformam com o conservadorismo, são numerosos e acreditam que, articulados, são capazes de aprovar a(s) pauta(s) que “moralmente” lhes apetecem, como observamos da formação enunciativa apresentada como conclusão do arquivo:

Não é possível que seja assim. Numa democracia, se alguém deve ter o poder de decidir o que é que dezenas de milhões de indivíduos serão obrigados a estudar ao longo da sua vida escolar, que seja o parlamento, e não um punhado de agentes públicos indicados pelo chefe do Executivo. Cabe, pois, ao Congresso Nacional chamar a si, o quanto antes, essa imensa e histórica responsabilidade. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Desse movimento fascista, conseguimos pinçar do website do ESP outro arquivo cujo discurso, como enuncia o título, vem a propor “A ideologia de gênero no banco réus”.9 O conteúdo dessa formação volta-se agora para reflexões de Nagib sobre a representação de Butler (2003) no debate de gênero, por ocasião de vinda da filósofa ao Brasil10 para participação no 2º Seminário Internacional “Desfazendo Gênero”, e sobre o próprio evento.

Confessando a própria ignorância e afirmando que, “até ontem, nunca tinha ouvido falar de Judith Butler, uma filósofa americana, feminista radical, que veio ao Brasil para participar de um mega evento sobre sexualidade, feminismo e questões de gênero” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018), Nagib, mesmo não tendo propriedade sobre o debate, produz um discurso de contraposição desde o título.

É interessante observar também que, na referência usada pelo grupo, o fato de Butler ter produzido uma das principais contribuições para o debate de gênero não é visibilizado. Além disso, pontuamos que o coordenador do movimento afirmou, no final do ano de 2015, que não conhecia tal referência ao debate feminista, muito embora as mobilizações mais fervorosas do “movimento” contra a “ideologia de gênero” tenham sido iniciadas em 2014. Outro dado importante é que foi exatamente no mesmo ano da primeira visita da filósofa ao Brasil, momento de grande expansão do debate feminista, que o grupo articulou o referido Requerimento de Informação S/Nº, de 2015,11 como forma de legitimar a exclusão do debate de gênero dos Parâmetros Nacionais da Educação brasileira.

No que se refere às suas observações sobre o evento, Nagib descreve da seguinte forma: “o 2º Seminário Internacional ‘Desfazendo Gênero’ é uma realização do CUS. Isso mesmo: CUS é a sigla do grupo de pesquisa em Cultura e Sexualidade que funciona na Faculdade de Comunicação da UFBA” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018, itálicos nossos). Com esse enunciado, chamam atenção para a sigla de um grupo de pesquisa que articulou o seminário reportado no discurso de Nagib. A ressalva é feita sem explicações dentro do texto, no entanto, em uma perspectiva contextual, podemos inferir que se trata de uma alusão entre a pronúncia da sigla e sua aproximação com um vocábulo informal usado para referir-se vulgarmente ao ânus do corpo humano, orifício que, além de ser ligado a função de excreção, também é considerado uma zona erógena associada, muitas vezes, ao prazer de relações sexuais homoafetivas.

Com isso, como o discurso do ESP é de não aceitação das relações homossexuais, intertextualmente, configura-se a partir desse enunciado uma relação de transferência da não aceitação também ao debate e mobilização fomentados no seminário. Inclusive, o enunciado seguinte também apresenta esse tipo de intertextualidade. “Em quatro dias, promete o coordenador do evento, ‘iremos produzir muitas reflexões, babados, gritarias, confusões, afetos, laços e rupturas’. Tudo com o nosso dinheiro, claro” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018, itálicos nossos).

Com o destaque dado ao trecho da fala do coordenador do evento, onde também aparecem termos associados ao universo generificado como gay, percebemos o mesmo tom discursivo de reprovação. Isso, inclusive, se evidencia com construção que se segue aos tais termos: “tudo isso com o nosso dinheiro, claro”, expressando menosprezo pela motivação do gasto público.

O trecho seguinte do discurso de Nagib vem a reiterar a concepção do grupo sobre supostas investidas de ideologização por parte dos envolvidos na teia discursiva do gênero segundo o arcabouço teórico feminista. No final da passagem, inclusive, o ideólogo exime de “culpa” pais e professores, a fim de evidenciar desapreço em especial às pessoas que estudam o gênero como identidade, como podemos observar na seguinte formação discursiva:

A temática desse evento vem sendo repetida ad nauseam [sic] em milhares de congressos, seminários, encontros, simpósios, mesas redondas, etc., realizados todos os anos, pelas universidades e secretarias estaduais e municipais de educação. O público-alvo, quase sempre, é formado de professores da educação básica; e o objetivo - que está sendo plenamente alcançado -, não podia ser mais claro: martelar esses assuntos nas cabeças dos professores para que eles os martelem nas cabeças dos alunos. A obsessão dessa turma, como se sabe, é a chamada teoria (ou ideologia) de gênero. Indiferente às decisões soberanas do Congresso Nacional e da imensa maioria das Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores - que se negaram a incluir a ideologia de gênero nos seus respectivos planos de educação -, a burocracia do ensino continua utilizando a máquina do Estado para promover suas próprias convicções, induzindo professores desavisados a violar o direito dos pais dos alunos sobre a educação moral dos seus filhos. Ao cair nessa conversa, e tratar seus alunos como cobaias da teoria de gênero, esses professores estão correndo um altíssimo risco. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Analisamos, porém, nesse enunciado, certos vacilos no que se refere à coerência entre as ideias apresentadas pelo discurso de Nagib. As assertivas disparadas pelo ideólogo sobre a docência “doutrinadora” são paradoxais: ora a “inocenta”, a propondo intelectualmente fragilizada, típica de pessoas supostamente passíveis de “cair na conversa” (expressão usada para referir-se à possibilidade de concordância ideológica em relação ao debate proposto pelo evento); ora a propõe como assediadora (capaz de doutrinar os estudantes conforme as próprias convicções) e, portanto, como ré jurídica, reiterando a possibilidade de condenação.

Mais adiante encoraja os pais a agirem contra a suposta doutrinação, apontando “facilidades” jurídicas para tanto, como podemos verificar no trecho seguinte:

A lei facilita enormemente a propositura dessas ações de reparação de dano. As causas cujo valor não exceda 40 salários mínimos podem ser ajuizadas perante os juizados especiais cíveis; nessas ações, sequer é necessário estar assistido por advogado (se o valor da indenização pleiteada for igual ou inferior a 20 salários mínimos - R$ 15.760,00). Além disso, não há cobrança de custas judiciais nem, se a demanda for julgada improcedente, condenação ao pagamento de honorários ao advogado da parte contrária [...] (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

Por último, Nagib conclui seu discurso intimidando, mais uma vez, o professor, como observamos em: “O professor é pessoalmente responsável pelos danos que causar no exercício das suas funções. Por isso, é melhor ficar esperto e pensar duas vezes antes de seguir as recomendações do MEC. Na dúvida, vale consultar um advogado” (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018).

Vale notar que, embora fique claro que a contraposição radical, por parte do ESP, seja em relação a abordagens de gênero cujo estudo apresente orientação feminista, além de investir na deslegitimação do arcabouço teórico originário à “ideologia de gênero” na esfera legislativa, também procuram convencer pais e professores a fortalecerem o combate, apelando, muitas vezes, para o terreno das ameaças àqueles que podem visibilizar a perspectiva crítica e emancipadora contra a opressão por gênero frente às juventudes.

Ainda no que se refere a manifestos de ideólogos que produzem discursos nessa perspectiva de deslegitimação, além desses arquivos, encontramos depoimentos expostos no website e redes sociais do “movimento” e, lembrando que o grupo afirma protestar sobre o que tomam como práticas gerais de “doutrinação”, analisamos, no entanto, que praticamente nenhum deles deixa de mencionar a chamada “ideologia de gênero” - uma regularidade enunciativa dentro do discurso do ESP como um todo -, como se, de fato, o foco da acusação sobre ideologização fosse o debate de gênero consonante com o arcabouço teórico feminista. Contudo, notamos que todos eles fazem muito mais colocações sobre a suposição de assédio ideológico do que sobre a “ideologia” propriamente dita.

No que se refere aos debates articulados especificamente ao conteúdo elaborado pelo campo discursivo feminista sobre o gênero, encontramos poucos arquivos, são eles: o “Requerimento de Informação, S/Nº de 2015”, o “Modelo de Notificação Extrajudicial”; e a “Agenda de gênero: redefinindo a igualdade”,12 sobre a qual apresentamos pistas analíticas nas considerações que se seguem.

Assim como o documento intitulado por Requerimento de Informação, o modelo de notificação extrajudicial, disponibilizado no website do “movimento”, como supracitado, e o exposto no inquérito civil promovido pelo Ministério Público de Goiás contra suposta escola “ideologizadora”, também a “Agenda de gênero: redefinindo a igualdade” foi produzida como forma de sintetizar referências do arcabouço teórico feminista em torno do gênero, em investidas de desconstrução, invalidação e deslegitimação dos saberes articulados nesse campo discursivo, tanto que o último arquivo aqui mencionado apresenta considerações de um ideólogo recomendando a disseminação do material como forma de esclarecer melhor aqueles simpatizantes que ainda ignoram o arcabouço teórico de gênero articulado pelo campo discursivo feminista, mas que é apresentado conforme a “vontade de verdade” do “movimento”:

Recado do ativista cristão Júlio Severo: Pessoal, estou enviando, em arquivo PDF anexo, o documento Agenda de Gênero, resumo de um livro sobre ideologia de gênero. O livro foi escrito por Dale O’Leary, com quem tenho contato há quase 20 anos. Posso dizer que é o melhor livro sobre o assunto. Agora que estão começando as aulas, esse livro é importantíssimo para o esclarecimento de alunos e principalmente professores. A ideologia de gênero está infectando todo o ensino do Brasil. O que você pode fazer para derrotar este mal? Envie este livro, Agenda de Gênero, a todos os professores que você conhece. Incentive-os a ler. Incentive-os a repassar os esclarecimentos deste livro. Se você quer entender o perigo da ideologia de gênero, o livro da Dale O’Leary é a melhor fonte. (ESCOLA SEM PARTIDO, 2018)

O conteúdo desses arquivos, tomados como referência discursiva, são bastante repetitivos tanto na perspectiva textual (concernente, no caso, à reunião de ideias) quanto na contra-argumentação apresentada pelo movimento. No entanto, acreditamos, em nossa análise, que os esforços do “movimento” não chegam a superar a teoria por não terem conseguido construir outra. O que apresentamos aqui, no entanto, são arquivos que configuram uma teia discursiva que, assim como todas, têm sua potência, que não deve, por isso, ser desconsiderada.

Portanto, vigilantes ao alcance discursivo articulado pelo ESP no sentido de minar sobretudo o debate de gênero, buscamos mapear os saberes constituintes dos arquivos apresentados e pinçar as lições deles emergentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No intuito de visibilizar as raízes dos confrontos que colonizam sujeitos através de discursos totalitários, imbuídos de lições monológicas e antidemocráticas, recorremos, neste estudo, a alguns insights foucaultianos no campo metodológico ao nos aproximarmos da arqueologia e da genealogia para analisar o discurso do “movimento” Escola Sem Partido, que pretende criminalizar o viés político da educação, censurar a liberdade de expressão e silenciar debates de questões de gênero nas escolas brasileiras.

Entendemos que o percurso metodológico foucaultiano de mapeamento discursivo é um campo potente para “dar conta” dos objetivos do estudo, uma vez que, segundo a definição do autor: “a arqueologia é o método próprio à análise da discursividade local, a genealogia é a tática que, a partir da discursividade local assim descrita, ativa os saberes libertos da sujeição que emergem dessa discursividade” (FOUCAULT, 2016, p. 270). Encontramos, pois, no arcabouço teórico foucaultiano, pistas para lidar com a emergência dos enunciados generificados ligados ao ESP.

Para compreender os vieses arqueológico e genealógico do discurso que embasam o “movimento” Escola Sem Partido, entendemos que analisar arquivos ligados à sua articulação, bem como arquivos produzidos pelo próprio grupo adepto, seria imprescindível na medida em que o percurso investigativo permitiria observar a emergência de enunciados e analisar a “vontade de verdade” que trazem consigo, já que, para Foucault (1977), a verdade é um conceito situado no tempo e no espaço, elaborado historicamente de acordo com um determinado código ético.

Voltamos, então, nossa análise para a identificação de lições de gênero, a fim de perceber e visibilizar as interferências do e sobre o discurso do ESP em relação a sujeitos escolarizados.

Em nossas análises compreendemos que, ao negar o debate de gênero, e mesmo a concepção do gênero sob a perspectiva feminista, o Escola Sem Partido referencia saberes e campos discursivos que não são novos como as manifestações específicas da organização em si, assim autodenominada a partir do ano de 2004.

Além disso, observamos que, em nome da moral e da família, estratificam sujeitos por meio de determinadas condutas convencionadas pelo patriarcado, condenam sexualidades não condizentes com parâmetros heteronormativos, dis(re)criminam sujeitos cujas identidades não se conformam aos valores cristãos ou conservadores, institucionalizam papéis, usurpam direitos (principalmente o das mulheres), entre outras formas de ataques a cidadanias plenas, livres de estereotipagens. Nesse sentido, observamos, inclusive, emergências discursivas que denotam inferência, por parte do ESP, pouco articulada entre a inclusão do debate de gênero na perspectiva feminista e a suposta vontade de destruição da família.

Como pistas analíticas desse achado, tivemos o processo eleitoral envolvido nas últimas disputas presidenciais. Desde o golpe político que levou ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff e seu cunho misógino, até o apoio mútuo, expresso por meio de campanhas, entre o Partido Social Liberal (PSL), partido político de origem do atual presidente Jair Bolsonaro e do à época primeiro deputado estadual Flávio Bolsonaro a propor o guarda-chuva de proposições do “movimento” como PL.

Devemos, pois, reconhecer que estamos diante de discursos e mecanismos que reverberam nos processos de escolarização dos sujeitos de modo nada sutil e modesto, conforme aponta Foucault (1987), chegando à dimensão triunfante dos rituais de grandes aparelhos de Estado. Ora, além dos enunciados emergentes da teia discursiva em questão, estamos diante de um governo que elege como ministra dita de Direitos Humanos uma senhora que pretende ditar o que meninas e meninos devem vestir, determinando em pronunciamento a cor da roupa “apropriada” para cada criança; gestores da rede pública defendendo ritos de militarização nas escolas; uma mídia marcada pela concentração de concessões de rádio e TV sob o poder de grupos religiosos e conservadores que reproduzem suas ideologias de forma contundente e desconsiderando os princípios da laicidade estatal; e a própria disseminação de medidas antigênero se espraiando do âmbito legislativo ao educacional, como o guarda-chuva de proposições e empreitadas do Escola Sem Partido.

Diante do exposto, consideramos que os ideólogos do ESP são, na prática, aquilo que recriminam: “doutrinadores”. Compartilhamos, assim, os resultados de nosso estudo a fim de contribuir para o enfrentamento de políticas baseadas em discursos derivados dessas raízes conservadoras, preconceituosas, excludentes, diminuidoras de identidades e de formas de expressão do ser por processos de normatização, sobretudo os ligados ao gênero, que invadem o que há de mais íntimo nas identidades, pretendendo predeterminar o comportamento, as vivências e a situacionalidade dos sujeitos.

REFERÊNCIAS

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1Decidimos aspear a palavra “movimento”, já que, tendo como referência as contribuições de Gohn (2011), não tomaremos a mobilização do ESP como um movimento social.

2Tomamos por base a definição do conceito de “lição” expresso em Larrosa (2001) como sendo um jogo de ensino-aprendizagem que reconhece a proatividade do sujeito interlocutor ao interagir com os textos que lhe são colocados.

3Para Foucault (1998, p. 37), “o ritual define a qualificação que devem possuir os indivíduos que falam (e que, no jogo do diálogo, na interrogação, na recitação, devem ocupar determinada posição e formular determinado tipo de enunciados); define os gestos, os comportamentos, as circunstâncias [...]”.

4Disponível em: http://www.escolasempartido.org/educacao-moral/390-sera-que-os-pais-estao-sabendo-sera-que-eles-concordam. Acesso em: 17 nov. 2018.

5Disponível em: http://www.escolasempartido.org/educacao-moral/648-no-df-professores-usam-festa-junina-para-atacar-moralidade-crista-e-transmitir-aos-filhos-dos-outros-seus-proprios-valores. Acesso em: 17 nov. 2018.

6Disponível em: http://www.escolasempartido.org/educacao-moral/377-ludibriando-a-audiencia-com-a-ajuda-do-uol-educacao. Acesso em: 17 nov. 2018.

7Disponível em: http://www.escolasempartido.org/vestibular-categoria/620-prova-de-concurso-publico-em-goiania-e-mais-um-caso-de-estupro-coletivo. Acesso em 17 nov. 2018.

8Apud ESCOLA SEM PARTIDO (2018). Disponível em: http://www.escolasempartido.org/educacao-moral/370-direito-de-resposta-ao-artigo-conteudo-imoral-na-escola. Acesso em 15 nov. 2018.

9Disponível em: http://www.escolasempartido.org/artigos-top/559-a-ideologia-de-genero-no-banco-dos-reus. Acesso em 17 nov. 2018.

10Contextualizando o cenário político-social brasileiro, pontuamos, em caráter de memória, que, por sua orientação política e ideológica, ao visitar o Brasil, em novembro de 2017, a filósofa Judith Butler virou alvo de protestos. A autora de Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade (2003) foi perseguida e verbalmente agredida desde o momento de seu desembarque no aeroporto de Congonhas. Em um dos momentos mais extremos das manifestações, fundamentalistas, portando crucifixos, chegaram a atear fogo em boneca com rosto de Butler aos gritos de “queimem as bruxas!”. Vale salientar, ainda, que essa foi a segunda visita de Butler ao Brasil, a primeira já tinha sido feita em 2015, no entanto a repercussão desta ficou mais restrita ao mundo acadêmico. A partir de então, as críticas do ESP se intensificaram, já que o momento de maior efervescência do momento foi iniciado no ano de 2014, e a depreciação de seu constructo foi sendo disseminada entre os ideólogos através de mobilizações do grupo.

11Documento usado pelo “movimento” como suposta justificativa para a supressão do debate de gênero das políticas curriculares da educação no Brasil. Disponível em: http://www.camara.gov.br/sileg/integras/1337320.pdf. Acesso em: 13 mar. 2016.

12Disponível em: http://www.escolasempartido.org/educacao-moral/451-agenda-de-genero-redefinindo-a-igualdade. Acesso 17 nov. 2018.

Recebido: 19 de Dezembro de 2019; Aceito: 19 de Fevereiro de 2020

NOTA SOBRE AUTORIA

Melina Fraga atuou na pesquisa, levantamento de dados e análise. Este trabalho consistiu em parte de sua dissertação de Mestrado. A atuação de Ana Paula Abrahamian consistiu em auxílio parcial na escrita e orientações acadêmicas, sendo a professora orientadora.

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