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Cadernos de Pesquisa

versão impressa ISSN 0100-1574versão On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.50 no.178 São Paulo out./dez 2020  Epub 23-Nov-2020

https://doi.org/10.1590/198053147037 

Artigos

A VULNERABILIDADE DO PROFESSOR DIANTE DOS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

TEACHERS’ VULNERABILITY IN DEALING WITH THE CHALLENGES OF ENVIRONMENTAL EDUCATION

LA VULNERABILIDAD DEL PROFESSOR FRENTE A LOS DESAFÍOS DE LA EDUCACIÓN AMBIENTAL

LA VULNERABILITÉ DE L’ENSEIGNANT FACE AUX DÉFIS DE LA SENSIBILISATION A L’ENVIRONNEMENT

Robiran José dos Santos-JuniorI 
http://orcid.org/0000-0003-3724-8467

Marta Luciane FischerII 
http://orcid.org/0000-0002-1885-0535

IPontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba (PR), Brasil; profrobiran@gmail.com

IIPontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba (PR), Brasil; marta.fischer@pucpr.br


Resumo

Objetivou-se caracterizar o papel do educador de ensino básico diante dos desafios da educação ambiental. A concepção e representação, acessadas por meio de questionário, constataram o envolvimento pessoal e profissional com a educação ambiental contrastante a uma inexpressiva participação em projetos. A análise apontou os obstáculos enfrentados que compreendem a urgência do tema, mas demonstra dificuldade para colocá-lo em prática principalmente em virtude da falta de capacitação, apoio das instituições e envolvimento da coletividade escolar. Levantou-se a pluralidade de fatores que colocam o educador ambiental em uma posição de vulnerabilidade e propôs-se a bioética ambiental como agregadora de diversos saberes na tentativa de mediar idoneamente esses desafios.

Palavras-Chave: BIOÉTICA; CIDADANIA; EDUCAÇÃO AMBIENTAL; INTERDISCIPLINARIDADE

Abstract

The goal of this article was to describe the role of primary education teachers in dealing with the challenges of environmental education. The conception and representation, accessed through a questionnaire, found that while teachers are personally and professionally involved in environmental education, they hardly ever participate in projects. Our analysis pointed out obstacles such as the theme’s urgency, but it also shows teachers’ difficulty putting it into practice, mainly due to a lack of training, support from institutions and involvement on the part of the school community. We show the multiple factors that put the environmental educator in a position of vulnerability and propose Environmental Bioethics as an aggregator of different types of knowledge so as to mediate these challenges.

Key words: BIOETHICS; CITIZENSHIP; ENVIRONMENTAL EDUCATION; INTERDISCIPLINARITY

Resumen

Nuestro objetivo ha sido caracterizar el papel del educador de educación básica frente a los desafíos de la educación ambiental. La concepción y representación, a las cuales tuvimos acceso por medio de un cuestionario, constataron la implicación personal y profesional con la educación ambiental en contraste con una inexpresiva participación en proyectos. El análisis puso de manifiesto los obstáculos enfrentados que abarcan la urgencia del tema, pero demuestra dificultad para ponerlo en práctica, sobre todo en función de la falta de capacitación, apoyo de las instituciones e involucración de la colectividad escolar. Se planteó la pluralidad de factores que lo sitúan al educador ambiental en una posición de vulnerabilidad y se propuso la bioética ambiental como agregadora de diversos saberes para intentar mediar idóneamente dichos desafíos.

Palabras-clave: BIOÉTICA; CIUDADANÍA; EDUCACIÓN AMBIENTAL; INTERDISCIPLINARIDAD

Résumé

On a eu comme but de caractériser le rôle de l’enseignant de l’école élémentaire face aux défis de la sensibilisation à l’environnement. La conception et réprésentation accedées par moyen de questionaire constatent un engagement personnel et profesisonnel avec l’éducation environnementale em contraste à une très faible participation dans des projets. L’analyse montre les obstacles confrontés tels que l’urgence du thème, mais démontre une dificulté pour sa mise en pratique, surtout en raison de leur faible capacitation et du manque de soutien des institutions et d’engagement de la comunauté scolaire. On a donc évoqué la pluralité de facteurs qui mettent l’enseignant dans une position de vulnerabilité et on propose la bioéthique environnementale comme agrégatrice des savoirs divers à fin d’essayer une médiation adéquate à ces défis.

Key words: BIOÉTHIQUE; CITOYENNETÉ; ÉDUCATION À L’ENVIRONNEMENT; INTERDISCIPLINARITÉ

A educação ambiental (EA) se constitui de um processo de reconhecimento de valores, clarificação de conceitos e perspectivas objetivando o desenvolvimento de habilidades para entender as inter-relações entre os seres humanos, suas culturas e seus meios biofísicos (DECLARAÇÃO DE TBILISI, 1977). O processo educativo intrínseco à EA conduz a um saber pautado nos valores éticos e nas regras políticas de convívio social. Assim, se consolida na promoção da cidadania ativa, considerando o sentido de pertencimento e corresponsabilidade, visando à compreensão e à superação das causas estruturais e conjunturais dos problemas ambientais (SORRENTINO; MENDONÇA; FERRARO JUNIOR, 2005).

A EA, segundo a Política Nacional de Educação Ambiental (BRASIL, 2005), deve estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não formal, garantindo, assim, o direito de todos à educação ambiental (BRASIL, 1999). De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), em seu artigo 8 (BRASIL, 2012), a EA deve ser “desenvolvida como uma prática educativa integrada e interdisciplinar, contínua e permanente em todas as fases, etapas, níveis e modalidades, não devendo, como regra, ser implantada como disciplina ou componente curricular específico”. A DCN (BRASIL, 2012) reforça, ainda, que a inserção dos conhecimentos concernentes à EA nos currículos da educação básica pode ocorrer pela transversalidade, mediante temas relacionados com o ambiente e a sustentabilidade socioambiental; bem como que professores devem receber formação complementar em suas áreas de atuação, com o propósito de atender de forma pertinente ao cumprimento dos princípios e objetivos da EA. A partir de dezembro de 2017, a gestão da educação básica brasileira conta com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), implementada pela resolução CNE/CP n. 2 do Conselho Nacional de Educação (BRASIL, 2017). Esse documento de caráter normativo atua em conformidade com o que preceitua o Plano Nacional de Educação (PNE), sujeitando-se hierarquicamente à Constituição Federal (BRASIL, 1988), à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) (BRASIL, 1996) e às DCN (BRASIL, 2012), e aproxima-se de uma interpretação prática dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (BRASIL, 1999), definindo um conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação básica. Não obstante, a BNCC é orientada pelos mesmos princípios éticos, políticos e estéticos de seus documentos precursores, que visam à formação humana integral e à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva. No que diz respeito à EA, a BNCC reforça os pressupostos preconizados pela LDB e DCN sem, contudo, proporcionar aporte específico para a prática da EA formal, exigindo do seu interlocutor a recorrência aos documentos supracitados.

A formação do educador ambiental não se reduz à capacitação conferida pela graduação, cursos técnicos ou especialização, mas transcende os objetivos programáticos das formações técnicas, demandando a consolidação de uma identidade pessoal e profissional (CARVALHO, 2005). Segundo Carvalho (2005), a formação do profissional educador ambiental parte da constituição de um campo de relações sociais materiais, institucionais e simbólicas em torno da preocupação ambiental, destacando a noção do “sujeito ecológico” como articulador da ética relacionada a essas questões. De acordo com a autora, esse sujeito deve considerar que a percepção ambiental é resultado da composição da tradição com as experiências vividas no presente. Jacobi (2003) destacou que a EA é caracterizada por uma pluralidade de atores próprios do universo educativo que deve maximizar a confluência dos diferentes sistemas de conhecimento, capacitação e academia no contexto formal e não formal, personificando o ato político que visa à cidadania para transformação social.

A formação do educador ambiental compreende, também, os princípios do desenvolvimento da moralidade ambiental (KAHN, 1997). O juízo moral se refere a uma faculdade que permite ao sujeito diferenciar o certo e o errado, garantindo sua inserção em um grupo social por meio de adequação de sua conduta a uma série de normas e regras adquiridas com a experiência. Consequentemente, as condutas morais derivam do reconhecimento dos direitos alheios e da dignidade inerente a todo ser humano, sendo a importância atribuída a uma norma denominada de “valor”. Os valores não são necessariamente positivos, e somente serão justos (valores morais) ao se referirem a questões de ordem moral (GOMIDE, 2010). Para o psicólogo Lawrence Kohlberg, o desenvolvimento moral ocorre concomitante ao desenvolvimento cognitivo em estágios hierarquicamente estruturados. Esses estágios são construídos em função das interações sociais e organizados pela sociedade, sendo a interação entre as condições internas (maturidade do sistema nervoso e níveis do desenvolvimento cognitivo) e externas (possibilidade de assumir papéis ou mudar de perspectiva) que o sujeito avança em cada estágio (KOHLBERG, 1992). A teoria do desenvolvimento moral de Kohlberg (1992) se apoia nos estudos de Jean Piaget (PIAGET; MERLONE, 1976), no entanto, admite que o desenvolvimento cognitivo, embora necessário, não é suficiente para o desenvolvimento moral. A perspectiva sociomoral se constitui componente essencial da estrutura de cada estágio do desenvolvimento. Logo, a relação entre as perspectivas sociais e morais indica o estágio sobre a prescrição das regras e dos princípios que obrigam os indivíduos a agirem de formas consideradas moralmente corretas (KOHLBERG, 1992).

Os julgamentos morais ecológicos, de acordo com Kahn (1999), estão relacionados com o desenvolvimento cognitivo evolutivo humano, uma vez que aspectos como a percepção da degradação ambiental ajudam a caracterizar o raciocínio ecológico moral em diferentes culturas. Esse fato justifica-se pela identificação de dois tipos de crenças empregadas para explicar as atitudes direcionadas para a natureza. O primeiro tipo é balizado pelas justificativas voltadas para as necessidades humanas e representa os valores de uma ética antropocêntrica e utilitarista, enquanto o segundo concebe a natureza pelo seu valor intrínseco, apoiando-se em valores das éticas biocêntrica e ecocêntrica (KAHN, 1999). Fischer e Furlan (2018) ressaltaram a importância em se diagnosticar a percepção e a representação social das temáticas ambientais e, assim, direcionar as intervenções educativas, principalmente envolvendo a bioética, que objetiva a promoção do diálogo entre os agentes morais. Os autores apresentaram diferentes escalas de percepção ambiental, entre as quais se destaca a tipologia de Sauvé (1996), que trabalha seis questões pragmáticas do ambiente, incluindo elementos fundamentais para desenvolvimento sustentável, considerando aspectos sociais e a ligação íntima entre economia, ambiente e desenvolvimento, perspectivas locais e globais, solidariedade internacional, as quais uma vez identificadas devem balizar as estratégias educativas. Gazzinelli (2002) atestou que os valores e as representações do educador influenciam a concepção ambiental do aluno - caso ela seja estigmatizada ou presa demais a conceitos engessados, a EA perde a força transformadora cujo maior desafio se constitui em romper com o autoritarismo dos saberes dominantes. Logo, o diagnóstico da percepção e representação do educador é o primeiro passo para ajuste de uma EA eficiente.

Partindo da premissa de que o educador se constitui em elemento fundamental no processo de EA e que a sua capacitação, percepção do ambiente, concepção filosófica e nível de maturidade moral influenciam diretamente o desenvolvimento dos educandos, questiona-se o papel do professor do ensino básico diante dos desafios decorrentes das atividades de EA. Para sanar esses questionamentos, testaram-se as seguintes hipóteses: a) considerando que o Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA) (BRASIL, 2005) está em vigor há quase 20 anos e que tem aumentado a determinação de que todos os níveis de educação formal e não formal apliquem a EA, espera-se que os educadores, independentemente do tempo de atuação, apresentem envolvimento pessoal e profissional com as questões de EA; b) espera-se que a participação em projetos ou atividades práticas de EA seja capaz de proporcionar ao educador melhor compreensão do seu envolvimento com a EA, formação, intervenções e concepções sobre o meio ambiente; c) considerando que a EA esteja incorporada também nos cursos de formação superior como tema transversal e que os cursos da área biológica tenham maior afinidade com as questões ambientais, espera-se que a formação nessa área ofereça melhores condições de desenvolvimento técnico e ético ao sujeito. Logo, o presente estudo teve como objetivo diagnosticar a concepção e representação da EA pelo educador do ensino básico e analisar os resultados sob a perspectiva da bioética ambiental de identificação dos agentes morais e vulnerabilidades a fim de subsidiar a mitigação do problema em confluência com valores comuns.

METODOLOGIA

O presente estudo foi realizado com base na análise transversal e quantitativa da participação em um questionário online do aplicativo Qualtrics. O público-alvo da pesquisa envolveu gestores, equipe pedagógica e professores de escolas públicas e privadas de Curitiba e região metropolitana por convite direto ou por meio de convites virtuais realizados em redes sociais na network dos pesquisadores.

O instrumento foi elaborado exclusivamente para esta pesquisa, sendo constituído de 25 questões, sendo 12 relativas à caracterização do participante da pesquisa considerando: a) idade; b) gênero; c) função; d) município da escola; e) instituição pública ou privada; f) disciplina ministrada; g) nível escolar; h) tempo de exercício da função; i) participação em atividades de EA; j) existência de projetos de EA na escola; k) tempo de existência do projeto.

Foram apresentadas cinco questões para pontuar de 0 a 9 de acordo com aderência a elas, considerando: a) aplicação da EA na vida profissional e pessoal; b) afinidade com questões ambientais; c) formação em EA; d) aplicação da EA em aulas. Foram apresentadas cinco questões abertas quanto: a) à importância do projeto de EA; b) a dificuldades enfrentadas no desenvolvimento do projeto; c) a benefícios proporcionados; d) ao papel dos valores na concepção das intervenções de EA e qual a sua importância. Esta última foi categorizada utilizando a técnica de análise semântica de Bardin (2004), resultando nas categorias: a) valores identificados; b) percepção da natureza identificada de acordo com a escala de Sauvé (1996); c) o nível de desenvolvimento moral da resposta de acordo com a teoria de Kohlberg (1992); d) concepção ética predominante.

Para verificar a identificação do participante da pesquisa com as escalas de percepção da natureza, corrente ética e desenvolvimento moral, registrados espontaneamente na questão aberta, foram apresentadas 16 assertivas, sendo seis com desfechos correspondentes aos princípios da educação ambiental na escala de Sauvé (1996); quatro correspondentes às correntes éticas e seis aos níveis de desenvolvimento moral de Kohlberg (1992) (Quadro 1).

Os dados coletados nos questionários foram analisados considerando as variáveis: a) participação em intervenções de EA; b) envolvimento nas disciplinas de Ciências/Biologia ou outras disciplinas; c) tempo de exercício na profissão maior ou menor que dez anos. Como parâmetros foram considerados: a) as dificuldades e benefícios enfrentados nas intervenções de EA; b) o interesse e a afinidade com a temática; c) a formação/capacitação; d) a aplicação e os resultados das intervenções de EA; e) a percepção do ambiente; f) os princípios éticos que norteiam a EA; g) o nível de desenvolvimento moral.

A comparação das frequências de dados de variáveis categóricas se deu por meio do teste do qui-quadrado e de variáveis de continuidade presumida, pela aplicação do teste t e, de forma geral, da análise de variância, sob confiança de 95% e erro de 5%.

Para atender aos princípios éticos, o estudo foi realizado em conformidade com a declaração Helsinque e resoluções CNS n. 466 e n. 510 (BRASIL, 2012, 2016), respeitando a integridade e o anonimato dos participantes da pesquisa, bem como o tratamento, análise e preservação dos dados.1

QUADRO 1 ASSERTIVAS COM DESFECHOS RELACIONADOS À ESCALA DE SAUVÉ (1996) PARA PERCEPÇÃO DO AMBIENTE, ÀS CORRENTES ÉTICAS E AOS NÍVEIS DE DESENVOLVIMENTO MORAL DE KOHLBERG (1992

Sauvé (1996) - Princípios da educação ambiental
Eu percebo o ambiente como natureza. Gosto de lugares onde posso contemplar e apreciar a natureza. Gosto de lugares onde posso me afastar da cidade e ter momentos de paz e integração com o ambiente natural. Acredito que o meio ambiente deva ser respeitado e preservado. Ambiente como natureza: deve ser apreciado, respeitado e preservado.
Eu percebo o ambiente como um recurso. Eu acredito que os recursos naturais são nossa herança. Que estão relacionados com a nossa qualidade de vida e devem ser manejados com responsabilidade para evitar desperdícios, uma vez que são limitados. Ambiente como um recurso: deve ser manejado.
Eu percebo o ambiente como algo a ser resolvido. Eu vejo a poluição do ar, do solo e dos rios como um grande problema. Eles trazem malefícios à população e diminuem a qualidade de vida, como, por exemplo, a questão do lixo à margem de rios e em terrenos baldios que atraem animais transmissores de doenças. Vejo-me capaz de ajudar a resolver esses problemas. Ambiente como problema que deve ser resolvido.
Eu percebo o ambiente como local para viver. Para mim o meio ambiente é tudo o que nos cerca, ou seja, os componentes culturais, sociais, tecnológicos e históricos. O ambiente é o lugar onde vivemos, o planeta, o continente, o país, a cidade, o bairro, a casa e até mesmo o próprio corpo. Devemos cuidar do lugar onde vivemos, uma vez que somos agentes transformadores do mundo que nos rodeia. Ambiente como local para viver: pensar e aprender sobre planejar o cuidado.
Eu percebo o ambiente como bioesfera, na minha visão o mais importante é que desenvolvamos uma consciência planetária, devemos preservar o nosso planeta para garantirmos o nosso futuro. Por isso acho fundamental a participação efetiva de todos nesse movimento. Ambiente como bioesfera: local no qual todos viveremos juntos no futuro.
Eu percebo o ambiente como uma ação comunitária na qual devo me envolver. Eu penso que deveria haver mais projetos de educação ambiental de que todos participassem, tal como hortas comunitárias, mutirões para a limpeza de rios, plantio de árvores. Eu me envolveria nesses projetos e convidaria outras pessoas. Ambiente como projeto comunitário no qual devo me envolver: democracia solidária.
Concepções éticas
Em minha opinião, a educação ambiental deve trabalhar valores que considerem que o homem tem direito de usufruir de um meio ambiente saudável. Por isso eu acredito que a educação ambiental é fundamental para garantir a qualidade de vida de cada pessoa. Nós devemos cuidar e gerir com responsabilidade o nosso patrimônio ambiental, para que nós mesmos sejamos beneficiados no futuro. Ética antropocêntrica.
Em minha opinião, a educação ambiental deve trabalhar valores que considerem a exploração dos recursos naturais de forma consciente e sustentável. Para mim os recursos naturais são bens a serem utilizados com responsabilidade. Eu acredito que a educação ambiental deveria se focar em ensinar as pessoas a como utilizar a natureza e os recursos naturais de forma a garantir que esses bens também sejam usufruídos pelas gerações futuras. Ética utilitarista.
Em minha opinião, a educação ambiental deve trabalhar valores que considerem a vida como valorosa em si mesma. Eu penso que todos os seres vivos têm o mesmo valor moral intrínseco, pois a vida é sagrada enquanto tal. Humano ou não humano, todos os seres vivos deveriam ter direito à dignidade, e esse deveria ser o fundamento da educação ambiental. Ética biocêntrica.
Em minha opinião, a educação ambiental deve trabalhar valores que considerem a preocupação com a conservação dos ecossistemas como grandes organismos vivos. Desse modo, deve-se buscar o equilíbrio do ambiente por meio da conscientização da sociedade sobre o valor intrínseco da natureza como um todo. Ética ecocêntrica.
Desenvolvimento moral em níveis e estágios, segundo Kohlberg (1969)2
Sou um cidadão que prioriza principalmente obedecer às regras e normas da sociedade para evitar as consequências punitivas. Eu tenho que me importar com as questões ambientais ou vou acabar sofrendo as consequências da degradação da natureza mais cedo ou mais tarde. Nível 1 - estágio 1 - orientação para a obediência e castigo.
Sou um cidadão hedonista, pois priorizo principalmente o meu bem-estar e a minha qualidade de vida. Em relação à natureza, eu acho importante a existência de bosques, parques e zoológicos para que as pessoas possam ter um lugar para o seu lazer e entretenimento. Nível 1 - estágio 2 - orientação ingenuamente egoísta.
Sou um cidadão que prioriza principalmente as orientações sociais. Eu faço a minha parte em cuidar do meio ambiente assim como todo mundo. Eu procuro não jogar lixo no chão, principalmente quando estou em público. Eu cuido do meu jardim para não destoar da vizinhança e procuro estar a par das questões ambientais, para que as pessoas vejam que estou bem inteirado dos acontecimentos no mundo. Nível 2 - estágio 3 - autoridade e ordem social. Consideração pelas expectativas merecidas dos outros.
Sou um cidadão que prioriza principalmente a Lei e a Ordem. Para mim o mais importante é cumprir a legislação ambiental vigente e dessa forma garantir a manutenção da ordem social. Eu não possuo muita afinidade com a natureza, mas compreendo que é nossa obrigação preservá-la. Nível 2 - estágio 4 - manutenção da autoridade e ordem social por normas e leis.
Desenvolvimento moral em níveis e estágios, segundo Kohlberg (1969)
Sou um cidadão que prioriza principalmente o contrato social. Na minha opinião, nós vivemos em uma relação comunitária, em que todos estão interligados e são interdependentes. Porém cada pessoa tem diferentes opiniões, direitos e valores. Em minha opinião, as leis ambientais são contratos sociais em vez de um mandamento rígido. Aquelas leis que não promovem o bem-estar geral devem ser modificadas quando necessário para adequar-se ao "bem máximo para o maior número de pessoas". Isso é atingido por meio da decisão da maioria e do comprometimento inevitável. Nível 3 - estágio 5 - manter as normas relativas ao grupo - contrato social.
Sou um cidadão que prioriza os princípios éticos universais. Eu considero os “fins” acima dos “meios”, ou seja, eu procuro transcender o plano dos contratos sociais, elevando minha reflexão à busca de uma integridade genuinamente ética. Eu priorizo a empatia ao meu próximo, logo eu seria capaz de dedicar a minha vida em favor dos vulneráveis. Eu considero que a vida é o valor maior, seja ela humana ou não. Assim, na minha concepção, todos os seres vivos deveriam ser respeitados com igualdade por seu próprio valor. Nível 3 - estágio 6 - princípios universais da justiça.

Fonte: Elaboração dos autores.

RESULTADOS

CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

A caracterização dos 239 participantes da pesquisa evidenciou um recorte com predomínio de respondentes do sexo feminino (79%), pertencentes à região metropolitana de Curitiba (43%) e professores (82%) cuja idade média é 39 anos, com menos de 67 anos. Destacaram-se educadores que atuavam no ensino fundamental II (35%) e médio (36%), em outras disciplinas (85%) que não Ciências e Biologia, em instituições estaduais (64%) e com mais de dez anos de exercício da profissão (52%). A maioria dos educadores relatou já ter participado de projetos de EA (49%), mas atualmente não participam, sendo que apenas 1% assumiu a coordenação. A metade dos entrevistados afirmou não existir projetos de EA em suas instituições, sendo que, entre os existentes, 48% tinham de 1 a 3 anos de implementação (Quadro 2).

QUADRO 2 CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA 

Gênero (*) Função (*) Atuação - Ensino Projeto de EA (*)
Feminino 79% Professor 82% Médio 36% Já participou 49%
Masculino 20% Equipe pedagógica 8% Fundamental II 35% Nunca participou 33%
Local (*) Direção 4% Fundamental I 15% Participa 15%
Região metropolitana 43% Outro 3% Técnico 10% Coordena 1%
Curitiba 29% Disciplina (*) Outro 4% Possui EA na escola
Outros 26% Outras 85% Tempo de profissão (*) Sim 50%
Instituição (*) Ciências e Biologia 14% Mais de 10 anos 52% Não 50%
Estadual 64% De 5 a 10 anos 26% Tempo de EA na escola (*)
Municipal 16% Menos de 5 anos 19% Mais de 3 anos 32%
Federal 2% De 1 a 3 anos 48%
Particular 18% Menos de 1 ano 19%

Fonte: Elaboração dos autores.

O teste de Qui-quadrado foi aplicado para verificar se o modelo de probabilidades iguais era adequado para o conjunto de dados. Se P < 0,05, a presença do (*) ao lado do nome da variável indica diferença estatisticamente significante entre números de respostas de categorias da variável.

ENVOLVIMENTO COM A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Os entrevistados no geral sinalizaram a importância da EA principalmente para as gerações futuras (40,9%) e para a natureza (28,3%). A comparação da categorização entre as variáveis apontou que educadores que participaram de projetos de EA ressaltaram a importância da EA para o indivíduo (27%), enquanto aqueles que não participaram indicaram maior importância para a natureza (41%). Os educadores com mais de dez anos de exercício da profissão pontuaram significativamente mais para a importância para a sociedade (21%) (Tabela 1).

TABELA 1 FREQUÊNCIA RELATIVA DA CATEGORIZAÇÃO DA OPINIÃO DOS RESPONDENTES A RESPEITO DA IMPORTÂNCIA, DIFICULDADES, BENEFÍCIOS E CONCEPÇÃO DE VALORES POR MEIO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL 

Participação em projetos EA Tempo de profissão Formação Total Número de respostas distintas (N) e respostas mais frequentes (P < 0,05)
Sim Não -10 10 B O
Importância
Gerações futuras 30a 28a 31a* 23a 25a 26a 40,9* N = 4: gerações futuras, sustentabilidade e recursos naturais
Natureza 27a 41b* 32a* 36a* 30a 35a* 28,3* N = 5: preservação da natureza
Indivíduo 27a 19b 24a 18a 30a 18a 16,4 N = 7: mudanças de hábito e qualidade de vida
Sociedade 16a 11a 12a 21b 12a 18a 14* N = 6: local onde vivemos
Não há 0a 1a 1a 0a 0a 1a 0,4 N = 1
Dificuldades
Instituição 70a* 78a* 68a* 76a* 75*a 74*a 70,8* N = 9: falta de apoio e envolvimento da escola
Estudante 15 a 17a 22a 15a 0a 18a 13 N = 3: falta de interesse
Pessoal 11 a 5a 10a 9a 25a 8b 12,2 N = 2
Não há 4 a 0a 0a 0a 0a 0a 4 N = 1
Benefícios
Estudante 56a* 77a* 65a* 56a* 56a* 61a* 70,4* N = 9: consciência ambiental; mudança de atitude
Comunidade 40a 22a 35a 39a 37a 35a 26,4* N = 10: problemáticas ambientais; comprometimento
Instituição 4a 0a 0a 4a 6a 2a 3,2 N = 4
Valores são...
Consequência 40a 50a* 51a* 47a* 28a 59b* 46* N = 17: conscientização
Condicionantes 30a 25a 25a 28a 34a 17b 27 N = 15: ambiente escolar
Meios 30a 25a 24a 25a 38a 24b 26 N = 15: preservação da natureza

Fonte: Elaboração dos autores.

Foram aplicados testes de qui-quadrado em duas situações: 1) verificar se o modelo de probabilidades iguais é adequado para o conjunto de dados (se P < 0,05, a presença do (*) ao lado da maior frequência relativa da variável (em negrito) indica diferença estatisticamente significante entre números de respostas de categorias da variável); 2) comparação entre as variáveis: participação em projetos, área de formação (B = biológicas e O = outras) e tempo de atuação (-10 = menos de dez anos, e 10 = dez anos ou mais), os valores distintos foram acompanhados de letras diferentes (a, b).

CAPACITAÇÃO E EXPERIÊNCIAS PRÁTICAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL

O envolvimento da EA na vida pessoal foi mais sinalizado pelos participantes do que o foi para a profissional; no entanto, enquanto o primeiro foi mais efetivo em educadores que participaram de projetos ambientais (F(363) = 4,1; P < 0,0001), a importância profissional foi maior em docentes oriundos da área biológica (F(363) = 3,8; P < 0,001). A aplicação do conhecimento ambiental pelos respondentes sinalizou maior preocupação com as problemáticas ambientais e com a aplicação da sustentabilidade no cotidiano (Figura 1), sendo essas mais proeminentes para respondentes que não eram da área de ciências biológicas (F(760) = 63,3; P < 0,001).

Fonte: Elaboração dos autores.

Os valores foram comparados entre as categorias de cada variável por meio do teste t (t) e Anova (F), sendo os valores significativamente diferentes (P < 0,05) acompanhados de letras distintas.

FIGURA 1 PONTUAÇÃO MÉDIA ATRIBUÍDA À IMPORTÂNCIA, APLICAÇÃO DE CONHECIMENTO E RESULTADOS DE INTERVENÇÕES DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL 

Os respondentes no geral indicaram a capacitação proveniente principalmente de experiências práticas (F(690) = 28; P < 0,001) (Figura 2), sendo que educadores que já participaram de projetos de EA indicaram maior capacitação atrelada à formação continuada e cursos de pós-graduação (F(760)=63,3; P < 0,001).

A maioria dos respondentes apontou dificuldades nas intervenções práticas de EA relativas à instituição, destacando a falta de apoio e de envolvimento da escola (Tabela 1). Os respondentes da área de ciências biológicas apontaram significativamente mais dificuldades pessoais do que os de outras disciplinas (Tabela 1). Os benefícios alcançados com as intervenções práticas de EA foram atrelados principalmente para os estudantes, ressaltando o desenvolvimento de uma consciência ambiental e uma mudança significativa de atitudes (Tabela 1).

A aplicação da EA em aula foi considerada significativa e muito significativa com uma frequente abordagem do tema e o envolvimento em projetos (F(686). = 19; P < 0,001). Não houve diferenças significativas entre as variáveis testadas (Figura 2). Os resultados das intervenções de EA foram frequentemente considerados bons e muito bons (F(678) = 13,4; P < 0,001), igualmente não houve diferenças significativas entre as variáveis testadas.

Fonte: Elaboração dos autores.

Os valores foram comparados entre as variáveis por meio da Anova (F), sendo os valores significativamente diferentes (P < 0,05) acompanhados de letras distintas, e os não significativos, por (NS).

FIGURA 2 PONTUAÇÃO MÉDIA ATRIBUÍDA A ASSERTIVAS COM DESFECHOS COM RELAÇÃO À PERCEPÇÃO DA NATUREZA SEGUNDO ESCALA SAUVÉ (1996) E AOS VALORES ÉTICOS 

VALORES ÉTICOS, PERCEPÇÃO DE AMBIENTE E CONCEPÇÃO FILOSÓFICA

Os valores ambientais relacionados à preservação da natureza, à percepção do ambiente como recurso e à concepção filosófica antropocêntrica se pronunciaram no grupo como um todo (Tabela 2). No entanto, os respondentes pertencentes à área de ciências biológicas se identificaram mais com valores relacionados à sustentabilidade, enquanto os de outras áreas enalteceram os valores relacionados à preservação e à responsabilidade (Tabela 2). Já os profissionais com mais de dez anos de atuação sinalizaram significativamente mais o ambiente como local em que vivemos, e os com menos de dez anos de exercício de profissão distinguiram o ambiente como uma ação comunitária com a qual devemos nos envolver (Tabela 2).

A maioria dos respondentes apontou a formação de valores como uma consequência das atividades de EA, sendo que educadores da área de ciências biológicas apontaram mais como meio e condicional, enquanto outras disciplinas salientaram mais como consequência das ações de EA (Tabela 2).

O desenvolvimento moral predominante nos depoimentos foi o nível 2, sendo o nível 1 mais frequente nos docentes que não participaram de projetos, os níveis 2 e 3 mais pronunciados em profissionais de outras áreas que não biológicas, e o nível 5 maior em profissionais da área biológicas e participantes de projetos (Tabela 2).

A identificação das assertivas com os desfechos baseados no instrumento de Sauvé (1996) indicou maior associação com a percepção do ambiente como local para viver e como biosfera (F(886) = 4; P < 0,001) (Figura 3), não ocorrendo diferenças significativas em relação às variáveis. Não houve diferenças significativas entre as perspectivas filosóficas, no entanto o viés antropocêntrico foi maior nos profissionais com mais de dez anos de exercício (F(545) = 3,8; P < 0,01) e nos que não eram da área de ciências biológicas (F(247) = 5,3; P < 0,01).

TABELA 2 FREQUÊNCIA RELATIVA DA CATEGORIZAÇÃO DA OPINIÃO DOS RESPONDENTES A RESPEITO DA IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL 

Participação em projetos EA Tempo de profissão Formação Total
Sim Não -10 10 B O
Valores
Preservação 46a* 58a* 46a* 48a* 30a 47b* 50*
Sustentabilidade 21a 20a 26a 18a 37 a 8b 21
Utilidade 22a 12a 20a 24a 29 a 21 a 21
Responsabilidade 10a 10a 8a 10a 4 a 21b 7
Valor inerente 1a 0a 0a 0a 0a 0a 1
Percepção de ambiente
Como um recurso 29a 28a 27a 30a* 30a 28a 39*
Como problema 3a 17a 12a 7a 0a 10a 29
Lugar onde vivemos 37a* 44a 27a 48b* 40a 40a* 17
Biosfera 19a 11a 20a 15a 20a 17a 9
Ação comunitária 8a 0a 15a 0b 10a 5a 6
Desenvolvimento moral
Nível 1 0,8a 5,5b 2,8a 1,3a 3,7a 1,9a 2
Nível 2 44,5a* 53a* 50,4a* 43%* 30a 50b* 48*
Nível 3 21,5a 18a 21a 20a 15a 22b 20
Nível 5 33,5a 24b 26a 36a 52a* 27b 30
Concepção filosófica
Antropocêntrica 73a* 79a* 78a* 76a* 82a* 75a* 76*
Ecocêntrica 20a 21a 19a 19a 10 a 22a 21
Biocêntrica 7a 0a 3a 5a 10a 3a 3

Fonte: Elaboração dos autores.

Testes de qui-quadrado foram aplicados em duas situações: 1) para verificar se o modelo de probabilidades iguais é adequado para o conjunto de dados (se P < 0,05, a presença do (*) ao lado da maior frequência relativa da variável (em negrito) indica diferença estatisticamente significante entre números de respostas das categorias da variável); 2) na comparação entre as variáveis participação em projetos, área de formação (B = biológicas e O = outras) e tempo de atuação (-10 = menos de dez anos e 10 = dez anos ou mais), os valores distintos foram acompanhados de letras diferentes (a, b).

A avaliação quanto ao nível de desenvolvimento moral evidenciou que a maioria dos entrevistados se classificou no nível de maturidade pós-convencional, destacando-se o estágio 6 (46%) e 5 (28%) (χ 2 (5) = 135; P < 0,01) quando comparado com os demais níveis (1 = 11%; 2 = 4%; 3 = 6,5%; 4 = 4,5%). Na comparação das variáveis, a identificação com o estágio 6 foi significativamente maior para os respondentes que participaram de projetos de EA e com mais de dez anos de exercício da profissão (57%).

Considerando o recorte da pesquisa, o panorama da EA no ensino básico evidencia que a participação em projetos, o tempo de exercício da função e a área de formação podem influenciar a concepção e aplicação da EA (Figura 3).

Fonte: Elaboração dos autores.

Os valores absolutos foram comparados entre as variáveis (área de formação, participação em projetos de EA e tempo de exercício profissional) por meio do teste do qui-quadrado, sendo os valores prevalecentes (P < 0,05) representados no fluxograma.

FIGURA 3 SÍNTESE DA ANÁLISE GLOBAL DOS PARÂMETROS E VARIÁVEIS RELACIONADOS COM O PANORAMA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO BÁSICO 

DISCUSSÃO

Os dados do presente estudo, resultantes do recorte permitido pela pesquisa, ilustram o panorama da EA formal, evidenciando uma relativa influência da participação em projetos, área e tempo de formação, o que coloca o educador em situação de vulnerabilidade ao ser coagido a cumprir uma demanda das políticas educacionais sem estar plenamente capacitado para tanto.

A análise dos questionários confirmou a hipótese de que os educadores do ensino básico apresentariam elevado envolvimento pessoal e profissional com as questões de EA. Contudo, embora as questões de pontuação tenham indicado uma média alta para a importância pessoal, profissional, afinidade e aplicação da EA em suas aulas, a caracterização dos participantes evidenciou que a maioria dos entrevistados não realizava no momento qualquer tipo de intervenção de EA, inclusive afirmando não haver projetos em suas instituições. Esses resultados sugerem, em certa medida, uma dissimulação positiva (FURNHAM, 1986; ALMIRO, 2017), indicando que o educador conhece a resposta desejada. Essa interpretação é apoiada em análises como as de Veiga, Amorim e Blanco (2005) e Mello e Trajber (2007), que demonstram que há mais de uma década a EA na educação básica era reconhecida na quase totalidade das escolas brasileiras, sendo que o censo de 2004 retratou que cerca de 110 mil escolas trabalhavam a temática ambiental, 64,3 mil ofereciam projetos ambientais, e 5,5 mil desenvolviam disciplinas especiais de EA (VEIGA; AMORIM; BLANCO, 2005). No entanto, contrariamente ao significativo aumento da EA nas escolas brasileiras, Veiga, Amorim e Blanco (2005) alertaram que apenas 5% dispensava tratamento adequado para o lixo reciclável. Essa questão dissonante entre o conhecimento teórico e a consolidação prática pode tornar a EA utópica e desacreditada socialmente. Para Marques e Dias (2014), pensar em EA essencialmente teórica isenta da prática de mudança de hábitos, das inter-relações sociais e do protagonismo equivaleria situá-la como disciplina isolada, somente como acúmulo de saber. Bortolozzi e Perez-Filho (2000) igualmente encontraram contradições nas respostas dos professores de geografia do interior de São Paulo quanto à EA, destacando o desconhecimento da necessidade do trabalho interdisciplinar. Marques e Dias (2014) alertaram que para que isso não ocorra, é preciso refletir a EA com maior critério e tratá-la como processo educacional que deve ser aprendido, construído e sistematizado, considerando a totalidade do ser humano.

Os entrevistados no geral afirmaram que a sua capacitação foi resultado de experiências empíricas, o que sugere formação superior e continuada ineficientes. Poucas oportunidades de atualização em EA se constituíram de uma realidade também para professores de Geografia pesquisados por Bortolozzi e Perez-Filho (2000). Os participantes da presente pesquisa, embora tenham atribuído idoneidade e valor intrínseco à EA ao identificarem como benefícios o desenvolvimento de uma consciência ambiental e a mudança significativa de atitudes dos estudantes, complementarmente apontaram a falta de apoio e envolvimento da escola como as principais dificuldades. Queiroz e Carniatto (2011), ao pesquisarem projetos de EA na formação continuada de professores, concluíram que é fundamental superar a formação fragmentada e descontextualizada, sobretudo a falta de apoio e as incipientes condições de trabalho, caracterizadas por salas com número excessivo de alunos, com diferentes necessidades, falta de recursos didáticos e orientações que compõem a realidade de um ambiente escolar que dificulta o trabalho docente. As autoras afirmaram, ainda, que os professores entrevistados destacaram que trabalham solitariamente e individualmente, com conteúdo fragmentado, mas entendem que essa realidade deve ser mudada, o que proporcionaria ganhos para os alunos e facilitaria o trabalho. Corroborando essas afirmações, Chaves e Farias (2005), ao investigarem a formação de professores sobre o meio ambiente, constataram que as principais dificuldades encontradas para a realização de projetos de EA foram a falta de formação adequada, as condições de trabalho e a falta de recursos didáticos. A compreensão desses aspectos tira dos ombros dos educadores a total responsabilidade por uma EA ineficiente e denota um conjunto de entidades e instituições mantenedoras que compartilham dessas incumbências e dos deveres legais e constitucionais para com uma sociedade ambientalmente saudável.

Os valores atribuídos à EA associados a vieses utilitários resultaram praticamente na inexistência do reconhecimento do valor inerente da natureza, corroborando a percepção do ambiente como recurso e o posicionamento antropocêntrico. Esses resultados, segundo as percepções de Fischer e Furlan (2018), são fruto de uma formação deficitária e descaso com a promoção de meios para o educador amadurecer moralmente. Contudo, ressalva-se que a percepção do ambiente como recurso atestada no posicionamento espontâneo contradiz a identificação do respondente com as assertivas, no qual predominou a identificação com desfechos que concebiam o ambiente como local em que vivemos e como a biosfera, novamente indicando o conhecimento da resposta desejável socialmente (ALMIRO, 2017). No entanto, na essência, o educador reproduz o senso comum que percebe o ambiente como um recurso que deve ser conscientemente gerenciado, tratando-se de uma herança biofísica coletiva, que sustenta a qualidade de vida dos seres humanos. Embora o desenvolvimento sustentável e a divisão equitativa transpassem os interesses momentâneos ao refletirem nas futuras gerações, ainda se detém a função de alertar para limitação do recurso natural (SAUVÉ, 1996). A conscientização, para Fischer e Furlan (2018), demanda a mudança de paradigmas e o balizamento de comportamentos e concepções reivindica posicionamentos biocêntricos e ecocêntricos, os quais têm sido lentamente inseridos nas sociedades contemporâneas.

A prevalência do posicionamento antropocêntrico, tanto na questão aberta quanto na objetiva, reitera a perspectiva ética dos respondentes. Contudo, o fato de ter sido mais pronunciada para educadores com maior tempo de atuação e que não participaram de projetos (Figura 3) não deve ser utilizado como argumentação contrária à eficiência das práticas educativas desses profissionais. Junges (2001) ressaltou que, mesmo diante de valores antropocêntricos, é possível assumir a responsabilidade pelos recursos naturais diante das gerações futuras. Consequentemente, deve-se determinar limites e regras para a intervenção na natureza e o uso de seus recursos para o bem dos próprios seres humanos. Após a compreensão com base nesse viés, o sujeito estará receptivo para aceitar a ética ecológica que pretende ampliar a abrangência de interesses, incluindo a biosfera, a natureza, os seres vivos como merecedores de consideração moral por si mesmos e não apenas enquanto servirem a interesses humanos. Assim, o objeto moral da ética ecológica deve ser a vida em seu sentido mais amplo (JUNGES, 2001). Para Ferreira e Bomfim (2010), faz-se necessária uma mudança de paradigma, de modo a resgatar o ser humano como ser vivente que se identifica com tudo aquilo que está vivo e que a interação com a natureza pode ser um caminho de resgate do espaço ambiental e da sensibilidade para com a vida.

A análise do posicionamento dos respondentes confirmou parcialmente a hipótese de que a participação em projetos de EA seria hábil em proporcionar ao educador melhor envolvimento e concepções sobre o meio ambiente (Figura 3). O fato de os participantes de projetos indicarem maior capacitação em cursos de formação continuada e a percepção da importância pessoal da EA refletem que as experiências socioambientais, a reflexão sobre as problemáticas e o enfrentamento prático dos dilemas ambientais cotidianos compõem um conjunto de fatores capazes de determinar a construção de um sujeito ecológico e, consequentemente, influenciar suas concepções sobre as dialéticas ambientais e seu nível de envolvimento com a EA. É possível perceber em suas representações da transposição da visão do senso comum que a EA é importante para a natureza e para o estudante, e o educador atribui igualmente o benefício para si enquanto indivíduo que amadurece, em um processo simultâneo de ensino/aprendizagem. Para Carvalho (2005), o “sujeito ecológico” representa o tipo ideal de educador ambiental, forjado no jogo das interpretações no qual se produzem os sentidos do ambiental, levando em conta os universos da tradição e das experiências vividas no presente. De acordo com a autora, o educador ambiental parte da constituição de um campo de relações sociais materiais, institucionais e simbólicas em torno da preocupação ambiental, no qual se destaca a noção do “sujeito ecológico” como articulador da ética relacionada a essas questões. Segundo Tozoni-Reis (2002), em uma perspectiva histórica da EA, os conteúdos educativos articulam natureza, trabalho, história e conhecimento, além de valores e atitudes como respeito, responsabilidade, compromisso e solidariedade. Assim, o educador ambiental deve ser formado à medida que congrega a capacidade de integrar os conhecimentos e a cultura com a formação ambiental. Acresce-se a essas afirmações as conclusões de Matos (2012) de que muitos aspectos e características associados ao educador ambiental refletem as diferentes dimensões e multiplicidades da EA, estando contempladas no conjunto de concepções, princípios e orientações sobre formação de professores, em suas vertentes acadêmica, personalista, tecnológica, prática e social-reconstrucionista.

A participação em projetos de EA indicou também a maior maturidade moral nas argumentações. A discrepância entre o nivelamento moral inerente à questão aberta e à identificação com as assertivas era um resultado esperado, sendo que os níveis mais elevados (5 e 6) foram os mais identificados pelos participantes. Contudo, o fato de a maior frequência do nível 5 na questão aberta ter sido atrelada ao educador que participou de projetos é um resultado que suporta a hipótese. Fischer et al. (2018) validaram um método de ensino de bioética ambiental para licenciatura em Ciências Biológicas na modalidade a distância. Os autores atestaram que a inserção do estudante em questões reais que promovam a vivência da problemática e a oportunidade de presenciar a atuação de colegas em níveis morais mais elevados proporcionaram o amadurecimento moral, fundamental para questões complexas, plurais e globais, tais como as ambientais. Fischer et al. (2018) confirmaram a mudança do estágio 1 para o 5 após as atividades da disciplina, o que pode ter sido o processo responsável pela diferença atestada no presente estudo, o que se constitui de uma importante validação para essas intervenções (FISCHER; FURLAN, 2018).

A hipótese de que a formação na área biológica ofereça melhores condições de formação técnica e do sujeito foi parcialmente confirmada. O fato de os educadores da área biológica pontuarem significativamente mais para um envolvimento profissional com a EA e a aplicação da sustentabilidade no cotidiano pode estar relacionado a que a EA esteja incorporada nos cursos de formação superior como tema transversal, e que esses cursos intrinsicamente detenham mais afinidade de conteúdos em relação à dimensão ambiental (GUIMARÃES, 2004). As questões ambientais estarem atreladas ao exercício da profissão pode ter sido condicionante para que as principais dificuldades para a sua aplicação terem sido atribuídas à esfera pessoal. Esse resultado é interessante para ser incluído em debates sobre como ensinar a EA no ensino superior. Nos cursos, programas e projetos de graduação, pós-graduação e extensão e nas áreas e atividades voltadas para o aspecto metodológico da EA, é facultada a criação de componente curricular específico (CARVALHO, 2005). Não obstante, o aspecto transversal, apesar de bem-intencionado, é questionado quanto à capacidade de gerar prejuízos à formação de docentes nos cursos de licenciatura, uma vez que podem não consolidar na prática a aplicação desse importante componente curricular, visto que 40% dos educadores entrevistados, da área biológica, também não participavam de nenhuma intervenção de EA. Carvalho (2005) ressaltou que a transversalidade da EA pode tanto ganhar o significado de estar em todo lugar, quanto ao mesmo tempo não pertencer a nenhum dos lugares já estabelecidos na estrutura curricular.

Por outro lado, Queiroz e Carniatto (2011) salientaram que outros fatores podem determinar a capacidade prática dos educadores, pois, uma vez que são responsabilizados de forma universal pelo desempenho escolar dos alunos, têm sido alvo e objeto de pesquisas que procuram identificar não apenas as deficiências e insuficiências do sistema de ensino superior, mas também as origens desses problemas. Essa perspectiva tem como pressuposto o entendimento de que a formação dos professores pode viabilizar mudanças significativas no quadro de dificuldades que se apresentam no âmbito escolar. A formação na área biológica, mesmo com seus limitantes, oferece ao educando a possibilidade de transpassar concepções limitantes, como acreditar que os valores serão obtidos apenas no final de uma intervenção, enquanto compreender os valores como meios presume que devam ser construídos antes da intervenção. Consequentemente, a aplicação da EA deve superar o estado de sensibilidade, recuperação e manutenção de um interesse individual, para uma concepção como sujeito de um projeto coletivo (FISCHER et al., 2018).

A análise da percepção do ambiente e da perspectiva filosófica subsidiou a hipótese de que o tempo de exercício da profissão seja um potencial condicionante das representações do ambiente e da EA (Figura 3). Os educadores com mais de dez anos de exercício de profissão pontuaram significativamente mais para uma importância da EA para a sociedade e para a percepção do ambiente como local onde vivemos. Esse fato pode sugerir uma visão amadurecida da relação de interdependência entre os seres vivos e um maior benefício comunitário superando o hedonismo da individualidade. Segundo Sauvé (1996), essa percepção refere-se ao ambiente do cotidiano, na escola, nas casas, na vizinhança, no trabalho e no lazer. Esse ambiente é caracterizado pelos seres humanos, nos seus aspectos socioculturais, tecnológicos e componentes históricos. Trata-se de um ambiente em que a humanidade compreende o senso de pertencimento, que deve ser cuidado como “nosso espaço de vivência”. Essa compreensão promissora de pertencimento à natureza corrobora os pressupostos de Wilson (1984, 1993), que estabelece a teoria da biofilia. Segundo o biólogo vivemos em uma rede intrincada e interdependente de seres vivos, resultado de milhares de anos de evolução. Para Wilson (1984), afiliar-se à natureza é um processo no desenvolvimento mental profundo e complexo, em uma dimensão ainda subestimada na filosofia e na religião. No entanto, a existência humana depende dessa propensão, o espírito humano está tecido nela, e a esperança surge em suas correntes. Logo, reconhecer o valor da experiência de vida como componente que agrega a elementos de inovação contribui para enriquecimento da EA.

CONSIDERAÇÕES ENTRE A EDUCAÇÃO AMBIENTAL E A BIOÉTICA AMBIENTAL

As múltiplas demandas e concepções da EA, retratadas no presente estudo, diante dos desafios éticos, os aspectos jurídicos, a moralidade dos sujeitos e as questões filosóficas de um mundo em constante transformação conclamam a adoção de um instrumento amplo e apropriado para contemplar a pluralidade do tema. Nesse sentido, identifica-se a bioética ambiental como uma alternativa para mediar o diálogo entre as diferentes áreas do saber, identificando agentes, pacientes morais e vulneráveis, bem como buscando mitigar os conflitos (FISCHER; FURLAN, 2018). Segundo Fischer, Moser e Diniz (2016), independente da área de atuação, a bioética permeia o debate entre agentes morais, ou seja, os atores detentores de poder de decisão diante de questões éticas. Para as autoras, o processo de globalização aliado às crises ambientais, econômicas e sociopolíticas traz contradições e confrontos morais, com relação aos comportamentos individuais e públicos, indicando desafios para a consolidação de uma convivência adequada entre os diversos povos e culturas do planeta (FISCHER et al., 2017). Acresce-se a orientação da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos para o ensino da Bioética em todos os níveis de ensino (UNESCO, 2005) enaltecendo as abordagens inter e multidisciplinar que permitem a colaboração entre diferentes áreas do saber a fim de mediar os conflitos e dilemas de ordem moral resultantes do rápido e estrondoso desenvolvimento tecnológico da humanidade (GOLDIM, 1997).

Vislumbra-se a utilização da perspectiva bioética como ferramenta educacional na condução de uma concepção aprofundada da EA, não a restringindo apenas à degradação ambiental como fim em si mesmo, mas compreendendo que a questão ecológica abarca a subjetividade humana, as relações sociais e o ambiente. Guattari (2011), ao discorrer sobre As três ecologias, afirmou que, para buscar uma convivência harmônica com a fonte de recursos limitados (natureza), é necessário conduzir a mente em uma busca por objetivos mais elevados, que opere uma autêntica revolução política, social e cultural, reorientando os objetivos da produção de bens materiais e imateriais. Segundo o autor, a revolução das atitudes mentais individuais e sociais dos cidadãos pode evitar a “implosão profética” do homem e a recuperação do planeta. Para Guattari (2011), a natureza não pode ser separada da cultura, sugerindo a ecosofia como alternativa para superar os problemas ambientais, classificando-a em: a) ecosofia mental: subjetividade humana e relação do sujeito com o corpo e protagonismo crítico diante das informações midiáticas; b) ecosofia social: reinvenção de maneiras de ser na família, no trabalho e nas relações sociais; c) ecosofia ambiental: soluções para os desequilíbrios naturais e evoluções flexíveis.

A compreensão integral da ecologia seria capaz de superar a visão romantizada da EA, corroborando o que Francisco (2015) afirma na carta encíclica ao propor a visão de uma ecologia integral. Na Laudato Si sobre o cuidado da casa comum, o Papa Francisco propõe, nos níveis social, econômico e político, processos transparentes e inclusivos, elucidando a necessidade de uma consciência ambiental verdadeiramente responsável. Essa consciência basilar permitiria o desenvolvimento de novas convicções, atitudes e estilos de vida, cultural, espiritual e educativo, que implicaria longos processos de regeneração (FRANCISCO, 2015). A EA deve transpor a transmissão de informação científica, a conscientização e prevenção dos riscos ambientais, incluindo a crítica aos “mitos da modernidade” baseados na razão instrumental, recuperando os distintos níveis de equilíbrio ecológico: o interior, o solidário, o natural e o espiritual (FRANCISCO, 2015), nesse contexto se identifica espaço para atuação da bioética com seu caráter dialogante e multidisciplinar.

Diante do exposto, ao se considerar o papel do educador ambiental perante esse turbilhão de demandas, conflitos e dilemas, bem como a diversidade de fundamentações teóricas para a prática da EA, é fundamental se valer de um olhar integral, proporcionado pela bioética ambiental. O recorte dessa pesquisa apoia a sugestão de implementação de comitês de bioética ambiental nas escolas, como sugerido por Fischer e Furlan (2018), contemplando a participação de representantes públicos, acadêmicos, comerciais, entidade de classes e comunidade escolar na deliberação e orientação na identificação de questões éticas, definição de diretrizes de condutas e implementação de projetos e ações locais que visem à atuação imediata e eficaz na promoção do bem-estar biopsicossocial de todos. Vislumbra-se a bioética como potencialmente capaz de contribuir fundamentalmente na mitigação das vulnerabilidades de todos os envolvidos com a EA, educadores, estudantes, instituições e comunidade. Essa proposta igualmente vai de encontro a perspectivas como a de Bortolozzi e Perez-Filho (2000) de aproximar a academia dos professores de ensino básico, congregando oportunidades para ambos os segmentos na concretização de projetos ambientais, formação e capacitação profissional.

CONCLUSÃO

O presente estudo investigou a concepção da EA formal no contexto da educação básica, visando a compreender a representação do educador ambiental e a identificar suas vulnerabilidades. A análise dos resultados levou à constatação de envolvimento pessoal e profissional dos educadores com a EA. No entanto, diante da baixa participação em atividades de EA, somada à sequência padronizada e incoerente entre o posicionamento espontâneo e o objetivo com as assertivas, identificou-se a possibilidade de que o mecanismo de desejabilidade social seja fator limitante a ser considerado para esse instrumento. Identifica-se que, embora o professor detenha conhecimento da importância da EA, principalmente com foco no aluno, constitui-se em sujeito vulnerável quando há incipiência de agregação e meios para viabilizar o trabalho de qualidade, devendo ainda ser responsável por construir seu próprio conjunto de conhecimentos, cujas limitações ainda sustentam concepções antropocêntricas.

A discussão dos resultados pontuou os desafios do educador ambiental que compreende a urgência do tema, mas tem dificuldade para colocá-lo em prática em virtude principalmente da falta de apoio das instituições e de envolvimento da coletividade escolar. A pluralidade de fatores identificada como implicantes nos processos de EA evidencia o educador ambiental em uma posição de vulnerável; logo, tema plausível de ser apropriado pela bioética. Nesse cenário, sugere-se a inserção da bioética ambiental no ambiente escolar como agregadora de diversos saberes na tentativa de mitigar de maneira mais justa os desafios da EA, com base na inter e na multidisciplinaridade e em uma concepção holística das relações com o ambiente, por meio de uma concepção integral da ecologia, compreendendo a subjetividade humana, os aspectos sociais e o meio ambiente. A bioética ambiental é hábil em agregar a pluralidade, complexidade e abrangência temporal e espacial de fatores próprios das questões ambientais, capacitando o educador ambiental no ofício de contribuir para a construção do cidadão consciente, crítico, protagonista e solidário com todos os seres vivos que compõem a intricada rede de inter-relações característica da biosfera terrestre.

AGRADECIMENTOS

Aos participantes da pesquisa.

REFERÊNCIAS

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1O projeto detém aprovação do CEP/PUC-PR (n. 2.224.2 - CAAE: 69748817.4.0000.0020).

2KOHLBERG, Lauwrence. Stage and sequence: the cognitive-developmental approach to socialization. Chicago: Rand McNally, 1969.

Recebido: 18 de Dezembro de 2019; Aceito: 06 de Agosto de 2020

NOTA SOBRE AUTORIA

Robiran José dos Santos-Junior participou da concepção, execução, análise, interpretação e redação inicial. Marta Luciane Fischer participou da concepção, análise, interpretação e redação final.

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