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Cadernos de Pesquisa

versión impresa ISSN 0100-1574versión On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.52  São Paulo  2022  Epub 28-Mar-2022

https://doi.org/10.1590/198053148072 

TEORIAS, MÉTODOS, PESQUISA EDUCACIONAL

FÚLVIA ROSEMBERG, IANSÃ, TODA CALIBÃ

FÚLVIA ROSEMBERG, IANSÃ, TODA CALIBÃ

FÚLVIA ROSEMBERG, IANSÃ, CALIBAN

Paulo Vinícius Baptista da SilvaI 
http://orcid.org/0000-0001-9207-2439

IUniversidade Federal do Paraná (UFPR), Curitiba (PR), Brasil;


Resumo

Este artigo discute os escritos de Fúlvia Rosemberg e sua contribuição para a pesquisa social e em educação. Analisa, na obra da autora, os conceitos de não sincronia das hierarquias sociais nas intersecções das hierarquias de raça, gênero e idade nas políticas educacionais e de branquidade, compreendida como norma de humanidade, que revela a norma social naturalizada situada no centro da hierarquização branco-negro e a necessidade de sua crítica. Os conceitos mobilizados e a forma de análise mantêm vívido o interesse da obra e dos conceitos para a análise das desigualdades educacionais e sociais.

Palavras-Chave: DESIGUALDADES SOCIAIS; RAÇA; RELAÇÕES DE GÊNERO; NEGROS

Resumen

Este artículo discute los escritos de Fúlvia Rosemberg y su contribución para la investigación social y en educación. Analiza en el trabajo de la autora los conceptos de no sincronía de las jerarquías sociales en las intersecciones de jerarquías raciales, género y la edad en las políticas educativas y de blancura, entendida como una norma de humanidad, que revela la norma social naturalizada situada en el centro de la jerarquía blanco-negra y la necesidad de su crítica. Los conceptos movilizados y la forma de análisis mantienen vivo el interés del trabajo y los conceptos para el análisis de las desigualdades educativas y sociales.

Palabras-clave: DESIGUALDADES SOCIALES; RAZA; RELACIONES DE GÉNERO; NEGROS

Résumé

Cet article examine les écrits de Fúlvia Rosemberg et leur apport à la recherche en sciences sociales et éducation. Il analyse, dans son œuvre, les concepts de non-synchronie des hiérarchies sociales à l’intersection des hiérarchies de race, de genre et d’âge dans les politiques éducatives ainsi que celui de blancheur, comprise comme norme de l’humanité, révélant la norme sociale naturalisée au sein de la hiérarchie blanc/noir et l’urgence de critiquer cette dernière. Les concepts mobilisés et la forme d’analyse renouvellent l’intérêt pour son œuvre et pour ces concepts permettant d’analyser les inégalités scolaires et sociales.

Key words: INÉGALITÉS SOCIALES; RACE; RELATIONS DE GENRE; NOIRS

Abstract

This article discusses the writings of Fúlvia Rosemberg and her contribution to social and educational research. It analyzes in the author’s work the concepts of non- -synchrony of social hierarchies at the intersection of the hierarchies of race, gender, and age in educational policies and of whiteness, understood as the norm of humanity, which reveals the naturalized social norm at the center of the black-white hierarchy and the need to criticize it. The concepts mobilized and the form of analysis keep vivid the interest of the work and the concepts for the analysis of educational and social inequalities.

Key words: SOCIAL INEQUALITIES; RACE; GENDER RELATIONS; BLACKS

Iansã, a charmosa, e elegante.

Iansã de olhar sorrateiro,

nos vê sem percebermos.

Iansã, a poderosa que vive no vento.

(Silva, 2009, p. 75)

OARGUMENTO CENTRAL DESTE ARTIGO é QUE, EM MUITOS ASPECTOS, AS pesquisas e os escritos de Fúlvia Rosemberg foram inovadores para a pesquisa social e em educação. A proposta aqui é dar destaque para abordagens na produção de Rosemberg, analisando os conceitos de não sincronia das hierarquias sociais e de “branquidade como condição normal e neutra de humanidade” (Rosemberg, 1979b, p. 159).

A obra de Fúlvia Rosemberg, além de extensa, revela uma multiplicidade de interesses; um campo amplo de objetos, que nas pesquisas sobre políticas educacionais abrangem da educação infantil à pós-graduação; uma perspectiva que considera “o recorte temático mais relevante que o disciplinar”,1 organizando-se, portanto, de forma interdisciplinar. Aqui temos um ponto importante na concepção de pesquisa e na obra da autora, cujo trânsito por pesquisa em educação, psicologia, sociologia, ciência política e, em diversos casos, em demografia foi constante. A prática em pesquisa foi de não considerar muros entre as disciplinas - visto que os objetos e seu lugar na política, seu papel na distribuição desigual de poder são os definidores -, e as diversas disciplinas acadêmicas fazem sentido nas suas formas de interpretação e nas contribuições para compreensão dos fenômenos sociais estudados, tais como a criança pequena ou as mulheres negras adultas, para ficar em dois exemplos de objetos.

Para tratar do legado múltiplo e das contribuições abundantes para a pesquisa social brasileira, inicio pela escolha da epígrafe deste texto. Diversas vezes Fúlvia afirmou que disseram ser ela “filha de Iansã”. Revelava-se muito confortável com essa classificação. Sendo Iansã orixá guerreira que zela pela justiça, a identificação com a personagem mítica despertava apreço. A guerreira Fúlvia Rosemberg estruturou sua trajetória acadêmico-política com profundo senso de justiça, e isso marca sua obra e suas escolhas, bem como é o traço marcante das opções que realizou. Operava com um conceito de justiça social em diálogo com as reflexões feministas, com uma perspectiva de análise das tensões e conflitos sociais como contraditórios e complexos, analisados, por exemplo, por Joan Scott (2005), compreendendo a sociedade contemporânea como estruturada em diferentes eixos de desigualdade que se intercruzam, e da necessidade de estabelecer políticas de equidade para promover grupos com menor acesso ao poder material e simbólico.

O senso de justiça orientou a produção extremamente profícua e as escolhas da pesquisadora. Em seu memorial para o concurso de professora associada da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Fúlvia Rosemberg (1993) discorre sobre algumas contingências que foram definidoras de sua trajetória de pesquisadora e inclusive da escolha de objetos de investigação: o encontro com feministas na França e o Ano Internacional da Mulher (1975); a recusa em participar de um projeto que possibilitou, logo em seguida, assumir a coordenação de outro sobre a educação dos negros; a necessidade de guarda para seu primeiro filho e o contato diário com a instituição creche. Tais contingências são operadas de uma forma peculiar pela mãe/mulher/pesquisadora, por seu olhar extremamente atento para as desigualdades, com sua busca pela justiça, fazendo com que as contradições e faltas sociais fossem motores para a pesquisa e a reflexão.

As ações da pesquisadora, professora, conferencista, gestora de programas e políticas passavam pelo crivo inicial sobre qual luta lutar, qual causa defender, em que o senso de justiça se impõe de forma primordial. Aceitar ou não uma palestra passava por pesar seus possíveis dividendos políticos, não em relação à promoção pessoal, à maior inserção ou ao reconhecimento, mas sim em que contexto seria a palestra, qual o público, quais possíveis derivações para formuladores e executores das políticas educacionais. Sua voz poderia ajudar a criar espaços para regimes de igualdade? Para a educação infantil, tantas vezes foi a oradora disponível, via de regra pelo compromisso com mudanças necessárias nas políticas dirigidas à criança pequena no Brasil.

Na pesquisa, a preocupação com o combate às desigualdades se manifestava indelével, pelas definições de temas, formulações de problemas, opções teórico-metodológicas. A primeira questão a ser pensada era o campo de distribuição de poder, as iniquidades e as possibilidades de atuar politicamente em prol do regime de igualdade. O que pesquisar? Qual o objeto da pesquisa? Qual o problema? Para nossa autora, as opções passavam pela análise de em que medida as opções e possíveis resultados teriam potencial de atuar para mais justiça social. A análise do contexto social, da distribuição de poder e das formas possíveis de equidade era a linha de base das escolhas e perpassava todo o processo. As opções metodológicas e procedimentais também eram instrumentos de que o/a pesquisador/a2 poderia dispor a partir da reflexão tanto de sua adequação ao problema e contexto da pesquisa quanto de sua possibilidade crítica.

O conceito de crítica, nos ensinou Fúlvia, articula-se com uma compreensão de sociedade do conflito, em considerar que a sociedade ocidental contemporânea é estruturada na desigualdade e que os eixos de desigualdade de idade, gênero e étnico-racial são tão relevantes como o de classe social e operam com certa “independência”.

A não sincronia dos eixos de desigualdade social

Segundo Maria Malta Campos (2015), a feminista Fúlvia Rosemberg levou à Fundação Carlos Chagas (FCC), nos anos 1970, os primeiros ecos das políticas da diferença. De sua tese, defendida em 1969, La famille et les relations familiales dans les livres pour enfants (Rosemberg, 1969), a autora anotou em seu Currículo Lattes as palavras-chave: “Estereótipo; Relações raciais; Infância; Literatura infantil”. Portanto, em seu trabalho intelectual inicial, já aparece a análise da articulação dos eixos infância e relações raciais. Esses temas foram retomados na pesquisa realizada na FCC, Análise dos modelos culturais na literatura infanto-juvenil brasileira (Rosemberg, 1979a), na qual coordenou a equipe que analisou a literatura (publicada no Brasil entre 1955 e 1975) endereçada às crianças. As pesquisadoras3 se debruçaram sobre a literatura infanto-juvenil para discutir as discriminações contra grupos oprimidos (Rosemberg, 1985, p. 17), abordando as relações de dominação nos eixos étnico-racial, de gênero, etário e de classe social. A discussão de base foi como os produtos culturais produzidos por adultos visando ao público infanto-juvenil4 informam modelos culturais que divulgam hierarquias sociais (de idade, étnico-raciais, de gênero, de classe social) a seus leitores e produzem/reproduzem significado social do ser criança. Identificam-se nessa produção aspectos que continuaram marcantes na obra da autora ao longo de sua trajetória: os discursos dirigidos à infância estudados não como fim em si mesmos, mas como informantes de complexas relações de poder que atuam na formação das infâncias; uma sintonia com a literatura internacional atualizada (Rosemberg, 1985, p. 17, nota 2), articulando os fenômenos estudados em contextos locais com o subsídio de pesquisas divulgadas nos principais meios internacionais; e o tratamento das formas de dominação de idade, étnico-racial e de gênero com aprofundamento de análise nas suas especificidades ao mesmo tempo que analisadas na complexidade de suas inter-relações5 (nesse caso, a construção da infância crivada de marcas hierárquicas de idade, étnico-raciais, gênero e classe social).

Antes de seguir na análise das relações entre os eixos de desigualdade, coloca-se aqui um parêntese para apontar um aspecto da pesquisa sobre os modelos culturais que tem caráter precursor na sociologia da infância brasileira e que está fortemente presente em nosso discurso de pesquisadores sobre infância no Brasil. Fazendo análise da relação de poder adulto-criança e das suas formas de cristalização mediadas pela educação formal e informal, Fúlvia realizou a crítica da desigual distribuição de poder da sociedade “pensada e construída em torno do, e para o adulto” (Rosemberg, 1985, p. 24) e concluiu que “Na sociedade centrada no adulto a criança não é. Ela é um vir a ser. Sua individualidade deixa de existir. Ela é potencialidade e promessa” (p. 25). Observa-se aqui uma crítica ao adultocentrismo que era precursora no debate acadêmico e educacional quando de sua publicação (Rosemberg, 1979a, 1979b, 1979c, 1985) e que passou a integrar o vocabulário dos profissionais da educação e ativistas pró-infância ao longo das décadas. Apesar de as críticas ao adultocentrismo terem se expandido na academia e nos movimentos sociais, ele continua tendo manifestações diversas nas políticas educacionais, formatadas muitas vezes pela expectativa de adulto a ser “forjado” e perdendo de vista o respeito e a dignidade que supostamente os pequenos têm garantidos.

Voltando à discussão sobre as relações entre eixos de dominação social, no memorial de “Concurso para Professor Associado da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)”, em 1993, Fúlvia descreve o foco de sua produção intelectual até aquele momento:

A trama que venho tecendo em minha vida profissional . . . numa perspectiva de transformação social. Compreender as subordinações de gênero, raça e idade no Brasil, na dinâmica das interações entre sujeitos e instituições sociais, visando sua superação, é o que tem orientado o padrão da estamparia que tenho costurado. (Rosemberg, 1993, p. 1).

É este o desenho que busquei neste período: trazer para o campo da educação o debate sobre subordinações de gênero, raça e idade; levar para o campo do debate sobre gênero, raça e idade a importância do debate sobre educação. (Rosemberg, 1993, p. 8).

Ao analisar sua própria produção intelectual, Fúlvia discute sua filiação a perspectivas teóricas que se afastam “do reducionismo de classe” (Rosemberg, 1993, p. 7), que consideravam tão relevantes quanto a classe social as demais formas de subordinação e a não redutibilidade das dinâmicas de gênero, raça, idade e classe. A pesquisadora afirma também como a busca da compreensão de tais dinâmicas se articula com a busca de intervenção na esfera das políticas sociais.

No desenvolvimento dessa discussão, Fúlvia Rosemberg (1993) apresenta dados de dois estudos seus sobre subordinações de raça, gênero e idade na educação brasileira, nos quais analisa a expansão de atendimento em creche no Brasil, articulada com a implantação de modelo de baixo custo e baixa qualidade para crianças pobres e negras, tal modelo vinculado com baixas condições de trabalho das professoras.6 Além da crítica veemente aos nefastos impactos derivados da exportação de modelos de política social ao que se nomeava naquele momento histórico de Terceiro Mundo, sua conclusão ajuda a configurar um modelo de compreensão das relações entre os eixos de desigualdade: “De certa forma, a transformação social das relações de gênero pode ocorrer em detrimento das crianças, em sociedade que se constrói sobre e com estas múltiplas subordinações” (Rosemberg, 1993, p. 16). Observa-se um exemplo do que Fúlvia passou a denominar relações não sincrônicas - ou assincrônicas, ou heterocronia (Rosemberg, 1993, 1996, 1999, 2001, 2012) -, conceito que tomou da feminista Hicks (1981). Ainda em seu memorial, ela discute seu trabalho de análise de relações de gênero, raça e idade que desenvolvera em conjunto com Esmeralda Negrão e Edith Piza (então desenvolvendo tese de doutorado), voltando-se à literatura infantil como suporte discursivo que expressava como tentativas de romper com subordinações de gênero apoiavam-se em subordinações de idade e raça: “estamos diante de respostas ativas às contradições sociais, e que evidenciam, em nossa perspectiva, a não sincronia tanto dos sistemas sociais (no relativo ao sistema de idade, gênero e raça), quanto das necessidades individuais” (Rosemberg, 1993, pp. 20-21, grifo meu).

Segundo o conceito de Hicks (1981), uma vez que as sociedades não demarcaram e reconheceram direitos dos diversos segmentos sociais, ou desigualdades sociais que lhes afetam, não se pode supor uma sincronia em processos de luta pela igualdade e em todas as instituições. Os processos sociais de produção de desigualdades de classe e gênero não são sincrônicos.

A análise de dados empíricos múltiplos das hierarquias observadas nas instituições escolares e nas políticas educacionais - espaços nos quais as dinâmicas de raça, gênero, idade e classe apresentam complexidade, contradições, ambiguidades, descontinuidades e rupturas que não podiam ser explicadas por um modelo cumulativo simples - levou Rosemberg a propor o uso do conceito de movimentos não sincrônicos. O conceito possibilita apreender melhor os jogos de conflitos nos diversos eixos de hierarquia social e tensões inter e intrainstitucionais. A operação entre os diversos eixos de hierarquia social nem sempre atua de forma não linear ou cumulativa. “Isto significa que a intersecção dessas relações pode levar a interrupções, descontinuidades, alterações ou incremento do impacto original das dinâmicas de raça, classe ou gênero em dado contexto social ou institucional” (Rosemberg, 1996, p. 59, grifo meu).

O modelo associativo de desigualdades sociais seria, portanto, parcial e limitado para compreender as diversas dinâmicas de raça, gênero, idade e classe social, ao passo que o conceito de não sincronia possibilitaria entender melhor os conflitos, tensões e contradições. Além disso, “a intersecção dessas relações pode levar a rupturas, descontinuidades, alterações” (Rosemberg, 1999, p. 10, grifo meu), e nem os indivíduos, nem os movimentos sociais desenvolvem “em perfeita sincronia consciência de classe, gênero e raça”. Por exemplo, “a busca de superar subordinações de classe pode ignorar ou mesmo apoiar-se em subordinações de gênero e raça. Intervenções igualitárias podem ter impactos diversos nos diferentes segmentos sociais” (1999, p. 11). Nos anos 1990, diversas análises da autora observaram essas rupturas e descontinuidades entre os eixos de desigualdade social e, nesse artigo em específico, ela analisou como as políticas de expansão da educação infantil brasileira naquela década se apoiaram em argumento de igualdade para crianças de classes populares, mas, concreta e contraditoriamente, levaram a novos processos de exclusão de crianças pobres e negras, além de, ancoradas em ideologia de aptidões naturais femininas, terem acarretado a discriminação de mulheres de classes populares (Rosemberg, 1999).7

Rosemberg (2012, p. 21) acrescentou, portanto, a hipótese de que, no plano da história de vida, as desigualdades sociais atingem as pessoas com diferentes intensida- des e impactos. Observemos nas palavras da autora suas considerações sobre o conceito de não sincronia (a longa citação é por trazer sua concepção em suas próprias palavras):

No Brasil, a busca de compreensão simultânea das hierarquias de gênero, raça e classe tem se baseado, muitas vezes, em modelo cumulativo, esperando-se uma associação linear entre os eixos de desigualdade. Tal modelo associativo não dá conta, porém, da complexidade e das contradições observadas nas instituições educacionais onde as dinâmicas de gênero, raça e classe não são redutíveis umas às outras, evidenciando, muitas vezes, um movimento não sincrônico.

O conceito de não-sincronia possibilita apreender melhor o jogo de conflitos, ten- sões e contradições inter e intra-institucionais: “indivíduos (ou grupos) em suas relações com os sistemas político e econômico não compartilham da mesma cons-ciência ou das mesmas necessidades no mesmo momento” (Hicks, 1981, p. 221). Isto significa que a intersecção destas relações pode levar a interrupções, descontinuidades, alterações ou incremento do impacto original das dinâmicas de raça, classe ou gênero em dado contexto social ou institucional. Nem as pessoas individualmente, nem os movimentos sociais desenvolvem em perfeita sincronia consciência de classe, gênero e raça. Por exemplo, a busca de superação de desigualdades de gênero pode ignorar, ou mesmo apoiar-se, em desigualdades de raça. Além disso, venho levantando como hipótese de trabalho que na trajetória de vida, a pessoa não enfrenta ao mesmo tempo os diferentes impactos das desigualdades (Rosemberg, 2002). Assim, apesar de a criança já nascer em sociedade fortemente marcada por identidade de gênero bipolar, não é possível afirmar que nas sociedades ocidentais ocorram desigualdades de gênero no plano material desde a pequena infância, diferentemente do que ocorreria para desigualdades de classe e de raça. (Rosemberg, 2002, p. 4).

Na pesquisa social, o conceito se aplica para explicar diversas cisões e contraposições que são mais complexas que, como explícito na citação, o modelo cumulativo. Em contextos sociais específicos, interesses de grupos minoritários - por exemplo, trabalhadoras da creche - podem se antepor a interesses dos bebês. A ideia cumulativa de que uma menina negra e pobre teria somatória de desigualdade se esvai quando o contexto é a educação escolar, visto que as meninas obtêm melhores resultados nas escolas em todas as etapas e, portanto, nesse contexto, ser menina é uma vantagem.

Em trabalho de doutorado orientado8 por Fúlvia Rosemberg e produzido por Edith Piza (1995), a abordagem foi a partir da tese da não sincronia entre os eixos de desigualdade, sendo que o objeto selecionado foi a construção de personagens negras por escritoras brancas de literatura infanto-juvenil, ou seja, operou na confluência das subordinações de gênero, raça e idade. Os resultados evidenciaram que escritoras de literatura infanto-juvenil brancas têm em suas trajetórias e narrativas voltadas para o público infanto-juvenil características que rompem com subordinações de gênero, ao mesmo tempo que se apoiam em subordinações de raça.

Rosemberg utilizou o conceito para discutir, em especial, o papel dos movimentos sociais, apontando que tanto movimentos de mulheres quanto de negros diversas vezes atuam socialmente de forma adultocêntrica. As críticas que formulou dirigiram-se em especial aos movimentos de mulheres e às formas pelas quais as políticas para as crianças pequenas muitas vezes foram menosprezadas por tais movimentos (Rosemberg, 2012, pp. 20-22). Ou seja, suas críticas muitas vezes foram a autocrítica de uma feminista engajada.

Vinculado a essas manifestações de não sincronia, Fúlvia discute criticamente o papel dos movimentos sociais. As perspectivas e propostas dos movimentos sociais são relevantes e devem ser trazidas para análise, mas tomadas de uma forma crítica, dizia ela, não em uma perspectiva idílica sobre suas proposições como verdades ou dogmas. Por um lado, os movimentos sociais representam aqueles que atuam socialmente para combater as desigualdades, e seu ponto de vista deve ser relevante para a pesquisa, para as relações de poder estabelecidas, para o reconhecimento das tensões e críticas que formulam para as desigualdades e as políticas. Por outro lado, devem-se considerar as relações de poder dentro dos movimentos e entre os movimentos. As possibilidades assíncronas podem fazer movimentos específicos penderem para defesa do que pode ser, em um eixo, emancipatório, mas, em outro, conservador; as análises/interpretações de intelectuais ligados aos movimentos sociais podem ser parciais, descoladas, ou mesmo contraditórias com dados de pesquisa.

De um modo, Fúlvia reconhece o papel do conhecimento acumulado pelos atores sociais em relação às práticas de subordinação a que estiveram sujeitos e às formas de intervenção que propõem no seu ativismo político. Por exemplo, no início dos anos 1990, o grupo de estudos desenvolvido no Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade (Negri - PUC-SP) tinha proposição de formação em pesquisa de quadros da militância negra. Fúlvia descreve que as discussões e a participação ativa de mulheres negras influenciaram sua compreensão das relações raciais em intercruzamento com gênero.

De outro modo, suas críticas dirigiam-se aos movimentos feministas e negros quando atuavam (ou se omitiam) em relação a desigualdades em outros eixos. Diversas vezes tais críticas voltaram-se ao adultocentrismo de movimentos de mulheres ou movimentos negros (Rosemberg, 2012), principalmente por atuarem, mesmo em pautas relacionadas a políticas educacionais, desconsiderando a educação infantil.

Fúlvia Rosemberg (2002, 2015), ao apresentar o conceito de não sincronia, informa sobre sua fonte, Hicks (1981), e afirma que o conceito tem sido utilizado em sua abordagem das interações entre relações de gênero, raça e idade. Revisando os artigos na base SciELO,9 foi encontrado somente um estudo que utiliza o conceito de não sincronia, este mesmo de autoria de Fúlvia Rosemberg e Leandro Andrade (2008), que trata da tensão raça/etnia e gênero nas ações afirmativas. Empregando as palavras-chave “raça” e “gênero”, foram localizadas 257 referências. Examinando essa produção, observa-se que a maioria dos artigos pouco articula as subordinações de raça e gênero para além da simples ideia de somatória; as análises raramente vão além do modelo cumulativo; mormente são descritivas análises de desigualdades em diferentes eixos, com limitado estabelecimento de relações. Essa revisão da bibliografia disponível nas revistas científicas de maior prestígio no Brasil fornece subsídios para afirmar que a análise proposta por Rosemberg (1996, 2002, 2015) compreendendo as subordinações como não sincrônicas permite apreender contradições sociais. Ao mesmo tempo, observa-se que a análise realizada pela autora é significativa, em especial considerado o conjunto de publicações brasileiras. Ainda, verificando tal literatura, é perceptível que as relações de idade são tratadas de forma minoritária em relação a gênero e raça, o que seria nova manifestação do adultocentrismo no campo acadêmico.

A crítica ao branco como norma de humanidade

Uma outra contribuição da pesquisadora Fúlvia Rosemberg selecionada para discussão é o conceito de “normatividade branca”. Mais uma vez foi encontrada a utilização de conceito com caráter inovador e relevante para a pesquisa social no Brasil.

Novamente, na pesquisa de “modelos culturais na literatura infanto-juvenil brasileira” (Rosemberg, 1979a, 1979b, 1985), ao realizar a síntese dos resultados relativos aos indígenas e negros, afirmou a autora:

Dentre as formas latentes de discriminação contra o não-branco, talvez seja a negação de seu direito à existência humana - ao ser - a mais constante: é o branco o representante da espécie. Por esta sua condição, seus atributos são tidos como universais. A branquidade é a condição normal e neutra da humanidade: os não- -brancos constituem exceção . . . . A neutralidade do branco também aparece na ilustração, quando segmentos de uma parte do corpo são usados como símbolo de humanidade (o dedo indicador que aponta a direção, a mão representando pessoa, etc.): nestes casos a cor é sempre a mesma, o branco sempre presente. É importante que se note que esta branquidade paradigmática não se restringe ao universo ficcional presente no texto, pois ela é estendida à humanidade exterior à narrativa: por exemplo, nas falas emitidas pelo narrador e destinadas ao leitor infantil, o modelo de criança, quando explicitado, é branco. (Rosemberg, 1985, pp. 81-83).

Num período em que os estudos sobre a whiteness10 eram pouco desenvolvidos na literatura internacional e, no Brasil, pouco adentravam a pesquisa social,11 Fúlvia si- tuava o conceito no centro de sua análise sobre hierarquias raciais no país.

De forma similar ao Brasil, a literatura internacional do período pouco tratava do branco compondo uma “raça”, mas a crítica ao branco como modelo de humanidade já havia sido realizada por Du Bois (1999) e era incorporada em alguns estudos. Na base ERIC,12 foram encontradas 471 publicações sobre whiteness, sendo que as duas das mais antigas disponíveis - Citron (1969) e Steelman e Murphy (1972) - realizam crítica à normatividade branca. A hipótese é que Rosemberg (1985), ao discutir as subordinações de gênero e raça em seus estudos, utiliza a percepção das pesquisas americanas e francesas dos anos 1970 que analisam a normatividade. O tema normatividade branca na literatura internacional (a partir de consultas realizadas nas bases ERIC, Sociological Abstracts e Periódicos Capes) parece ter caído no esquecimento nos anos 1980, retornando com força nos anos 1990 e ampliando-se especialmente após 2000.

Aponta-se aqui o caráter novidadeiro, que possivelmente dava pouco espaço de interlocução com outros pesquisadores brasileiros para além das equipes da Fundação Carlos Chagas. Nos estudos da FCC, o conceito continuou operante tanto nas pesquisas voltadas para “a educação do negro” (Rosemberg, 1985, 2004) quanto naquelas relativas à educação da mulher, em que é afirmada “a dificuldade em se romper de fato (além da palavra e da intenção) com esse modelo que pressupõe ser a trajetória masculina neutra e universal” (Rosemberg et al., 1981, p. 141).

No Brasil, observando a literatura disponível, a discussão sobre normatividade branca surge também em publicações esparsas nos anos 1990 e ganha força e amplitude nos anos 2000. Em estudo bastante citado sobre a branquidade, Henry Giroux (1999) analisa as “políticas de branquidade”, tomando como objeto o debate público sobre políticas afirmativas para negros nos Estados Unidos e, com impulso dos estudos culturais, duas produções cinematográficas.13 Algumas observações sobre as quais Rosemberg havia advertido nos discursos que analisou em seus estudos (1979a, 1979b, 1985) aproximam-se muito das afirmações de Giroux de que “a branquidade emerge como base normativa de sucesso, responsabilidade e autoridade legítima” (1999, p. 119) e “é codificada como uma norma de autoridade, ordem, racionalidade e controle” (p. 117). A operação que o autor desenvolve é muito similar àquela que Rosemberg já tinha realizado no trecho citado acima, afirmando a branquidade como norma social naturalizada que se situa no centro da hierarquização branco-negro. Ou seja, a divulgação da análise crítica da normatividade branca realizada pelos “teóricos da resistência” ajuda a retomar críticas formuladas por Rosemberg (1979a).

É nos anos 2000 que as críticas à “normatividade branca” têm novo impacto na bibliografia internacional e passam a ser integradas em alguns estudos no Brasil, em que são utilizadas para análise de discursos midiáticos (Silva & Rosemberg, 2008; Santos, 2011), publicitários (Silva et al., 2012), de livros didáticos (Rosemberg et al., 2003; Silva, 2006; Nascimento, 2010; Silva et al., 2012) e da literatura infantil (Araujo, 2012; Silva, 2014). Tais estudos e a adoção da crítica à normatividade branca eram episódicos nos anos 1990, passaram a ser mais frequentes nos anos 2000 e têm se multiplicado, um tanto fomentados pela maior entrada de sujeitos negros na pós-graduação e na pesquisa social, os quais, trazendo as marcas de sua formação de vida e do peso do racismo em suas trajetórias, elegeram problemas de pesquisa que focam a normatividade branca como forma de estabelecer hierarquia racial.

Relevante ressaltar que as políticas afirmativas na pós-graduação foram área de militância de Fúlvia Rosemberg, que coordenou o Programa Internacional de Bolsas de Pós-Graduação (FCC e Fundação Ford, 2001-2013) e o Programa Equidade na Pós-Graduação (FCC e Fundação Ford, 2010-2014). Ou seja, a formação de uma intelectualidade negra que possibilitou a ampliação das pesquisas sobre a temática, a incorporação, o uso, as tensões e a crítica a conceitos de que Fúlvia Rosemberg foi precursora na difusão no Brasil tiveram sua energia também na abertura de oportunidades para formação de intelectuais ativistas de minorias étnico-raciais, de gênero e diversidade sexual, regionais.

O conceito que foi anunciado na pesquisa “Modelos culturais na literatura infanto-juvenil brasileira” (Rosemberg, 1979a, 1979b, 1985) foi incorporado ao debate entre 20 e 30 anos após sua primeira publicação, passando a ter maior expressão na pesquisa social brasileira e tem dado bons frutos, ou seja, tem seu potencial analítico afiançado e toma lugar importante na análise das normatividades e no debate acadêmico.

Palavras finais

Como síntese da análise proposta sobre algumas dimensões da obra de Fúlvia Rosemberg, podem ser acentuadas ainda algumas notas gerais: sua obra, inclusive diversos artigos dos anos 1970 e 1980, tem um interesse tanto conceitual quanto de método, muitas vezes por seu caráter inovador, várias vezes pelo potencial analítico dos conceitos com o qual opera. Ao trazer para análise os conceitos de “não sincronia” das subordinações sociais, de “branquidade normativa” e de “sociedade adultocêntrica”, o objetivo é apontar a atualidade e o potencial que a abordagem rosemberguiana nos oferece.

O estudo da sua obra revela que a autora foi precursora, na pesquisa social brasileira, na análise crítica das normatividades branca, masculina e adulta, bem como na discussão sobre as intersecções das hierarquias sociais de raça, gênero e idade nas políticas e nas práticas educacionais, sobre a complexidade, as ambiguidades e contradições entre os diferentes sistemas de hierarquia social. Os conceitos por ela mobilizados e a forma de análise cruzando dados de fontes diversas mantêm vívido o interesse de sua obra para a análise das desigualdades de idade, raça, gênero e classe social na educação brasileira.

Sua atuação no Programa Internacional de Bolsas na Pós-Graduação e no Programa Equidade na Pós-Graduação foi marcada pelo diálogo e luta conjunta pela igualdade racial, de gênero, LGBT, com a interação constante com ativistas/bolsistas, trazendo de forma mais acentuada para a luta política as demandas por participação na academia e a valorização da produção de conhecimento por ativistas, mulheres negras, indígenas e quilombolas (Rosemberg, 2013b; Silvério et al., 2011; Anjos et al., 2011).

Para concluir este artigo, aponta-se a importância da crítica e do conflito, tão caros à pesquisadora. Os conceitos que mobilizava para combater as desigualdades sociais tinham relação com a compreensão de como a pesquisa se insere na formulação das agendas políticas, assim como na sua execução. Em sua trajetória, a pesquisa foi utilizada como instrumento no embate a favor da igualdade, podendo-se indicar algumas expressões disso: sua insistência para que nossas descrições metodológicas fossem muito detalhadas, visando à possibilidade de replicação dos estudos por minorias sociais; sua luta cotidiana para a execução de políticas afirmativas na pós-graduação, incorporando as minorias étnico-raciais, as mulheres negras, ativistas LGBT nos processos de produção de conhecimento; sua crítica à gestão das multilaterais que passaram a ser dirigidas essencialmente por economistas; e o uso da pesquisa quantitativa como forma de se contrapor às relações hierarquizadas estabelecidas por tais agências. Muitas vezes Rosemberg nos advertiu: essas pessoas entendem somente essa linguagem, e somente com manuseio competente desses dados teremos argumentos para nos contrapor a eles. Conclui-se demarcando esse ponto. A metáfora Calibã nunca coube tão bem! O personagem de Shakespeare é aquele que, diante do colonizador, aprende sua língua, mas lhe adverte explicitamente: “aprendo sua língua para feri-lo”. Essa metáfora, acionada por alguns estudiosos da literatura para apontar a resistência pelo conflito, transparece na trajetória de nossa guerreira.

Iansã mobiliza armas diversas contra a injustiça. Nossa Iansã Fúlvia Rosemberg mobilizou a pesquisa como arma contra as injustiças sociais. Façamos jus ao seu legado!

Disponibilidade de dados

Os dados subjacentes ao texto da pesquisa estão informados no artigo.

1Fala proferida por Fúlvia Rosemberg em diversas ocasiões, em suas aulas no Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social na PUC-SP.

2A partir deste momento o texto passa a utilizar o genérico masculino como forma de aliviá-lo.

3Regina Pahim Pinto, Esmeralda V. Negrão, Solange Assumpção, Ana Maria Caleiro, Silvia Lustig, Maria Lúcia Pupo e Nidia Vailati.

4Observa-se exemplo de análise sobre as relações de poder nos próprios mecanismos de produção, foco de análise das hierarquias adulto-criança, no artigo “Eu consumo, tu me consomes” (Rosemberg, 1979c).

5Essa dupla entrada relaciona-se com a trajetória da pesquisadora, que se tornou autoridade acadêmica nas três áreas de pesquisa, relações de idade, de gênero e étnico-raciais.

6A análise de políticas de expansão da educação infantil acompanhou sua produção até seus últimos textos publicados (Rosemberg, 1999, 2013a), inclusive o importante estudo sobre o atendimento de crianças no campo (Rosemberg & Artes, 2012).

7Relacionado às diferenças de gênero, o trabalho de Fúlvia Rosemberg na FCC também foi pioneiro e seus projetos e publicações foram referências ao longo das décadas de 1970 a 2010-2014. Merece desta- que, também por seu pioneirismo, a análise sobre diferenças de desempenho de meninas e meninos (Rosemberg, 2001).

8Cabe aqui observação sobre a forma de orientação adotada por Fúlvia na maior parte das dissertações e teses, com participação muito ativa na revisão de literatura, na opção dos objetos e organização de projetos integrados, na definição de problemas, nas definições metodológicas, na análise dos resultados, quando, via de regra, mantinha período de imersão na tese ou dissertação e operava com os dados primários. Em minha opinião, estudar os trabalhos que ela orientou traz importantes dados sobre as preocupações e questões de pesquisa de Fúlvia ao longo se sua trajetória de pesquisadora, tamanho seu envolvimento com a atividade de orientação.

9Revisão feita até o período de 2015.

10Nos anos 1990, a tradução de artigos de alguns autores denominados “teóricos da resistência” - Michael Apple, Henry Giroux e Peter Mclaren - utilizou predominantemente o termo “branquidade”. O conceito de whiteness comportou as traduções como branquidade ou branquitude, em publicações no Brasil. Por exemplo, no artigo de Valter Silvério (2002, p. 240), é apresentada uma definição precedida de “branquitude” (whiteness). Publicada logo depois, a coletânea de artigos organizada por Vron Ware (2004) teve a tradução como branquidade. Em 2002, foi publicado o artigo “Branqueamento e branquitude no Brasil”, de Maria Aparecida da Silva Bento, em coletânea organizada pela autora, bastante fundamentado na psicologia social norte-americana (por exemplo, nos trabalhos de Janet Helms), utilizando o conceito de branquitude para analisar a identidade racial do branco brasileiro. Situamos o alto impacto desses artigos de Silvério (2002) e de Bento (2002) como marco que amplia o uso de “branquitude”, com a diminuição relativa de “branqui- dade”. A demarcar que o debate inicial e a divulgação do conceito na pesquisa social brasileira foram marcados por publicações de duas ex-orientandas de Fúlvia Rosemberg: Maria Aparecida Silva Bento (1992) e Edith Piza (1995).

11Podemos citar como exemplo de uma manifestação na sociologia brasileira um trabalho específico de Alberto Guerreiro Ramos (1957), no qual é analisado o lugar do “branco” na sociedade brasileira.

12Levantamento feito em 2015.

13Os filmes Dangerous Minds (lançamento em 1995) e Suture (lançamento em 1993) analisados por Giroux (1999, pp. 115 e seguintes).

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Recebido: 29 de Dezembro de 2020; Aceito: 20 de Dezembro de 2021

TRANSLATED BY Silvia IacovacciIIhttps://orcid.org/0000-0003-4499-0766

II Freelancer, siacovacci@gmail.com

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