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Cadernos de Pesquisa

versão impressa ISSN 0100-1574versão On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.52  São Paulo  2022  Epub 08-Set-2022

https://doi.org/10.1590/198053149122 

TEORIAS, MÉTODOS, PESQUISA EDUCACIONAL

ETNOGRAFIA COM CRIANÇAS EM TEMPOS DE PANDEMIA: UMA REFLEXÃO ÉTICO-METODOLÓGICA

ETNOGRAFÍA CON NIÑOS EN TIEMPOS DE PANDEMIAS: UNA REFLEXIÓN ÉTICO-METODOLÓGICA

L’ETHNOGRAPHIE AVEC LES ENFANTS EN PÉRIODE DE PANDÉMIE: UNE RÉFLEXION ÉTHICO-MÉTHODOLOGIQUE

Emilene Leite de SousaI 
http://orcid.org/0000-0003-2608-6677

IUniversidade Federal do Maranhão (UFMA), Imperatriz (MA), Brasil;


Resumo

Este artigo trata dos aspectos ético-metodológicos de uma pesquisa realizada em 2020, que investigou as representações de crianças maranhenses da covid-19. Busca-se problematizar a produção de uma etnografia a distância, tomando os pais das crianças como mediadores e fazendo uso das tecnologias digitais para ter acesso às crianças e às suas narrativas, por meio de pequenas entrevistas e áudios, além da elaboração de desenhos. Cumprindo as regras de distanciamento social, sem poder fazer uso da observação direta, problematiza-se o processo da obtenção das informações até a sua transformação em dados, por meio de sistematização e análise.

Palavras-Chave: ETNOGRAFIA; CRIANÇAS; PANDEMIA; DESENHOS

Resumen

Este artículo trata de los aspectos éticos-metodológicos de una investigación realizada en 2020, cuyo objetivo era investigar las representaciones de niños marañonenses (en Brasil) sobre la covid-19. Se busca problematizar la producción de una etnografía a distancia, tomando a los padres de los niños como mediadores y utilizando las tecnologías digitales para tener acceso a los niños y a sus narrativas a través de pequeñas entrevistas por medio de audio, y la elaboración de dibujos. Cumpliendo con las reglas de distanciamiento social y sin posibilidad de utilizar la observación directa, problematizo el proceso de obtención de las informaciones hasta su transformación en datos, por medio de la sistematización y el análisis.

Palabras-clave: ETNOGRAFÍA; NIÑOS; PANDEMIA; DIBUJOS

Résumé

Cet article traite des aspects éthico-méthodologiques d’une recherche menée en 2020 concernant les représentations d’enfants du Maranhão, Brésil, sur le covid-19. Il cherche à problématiser la production d’une ethnographie réalisée à distance, avec recours aux parents comme médiateurs et aux technologies numériques pour accéder aux enfants et à leurs récits, au moyen de courts entretiens, d’audios et de dessins. Dans le respect des règles de distanciation sociale, sans recourir à aucune observation directe, le processus de recueil d’informations a été problématisé à travers la systématisation et l’analyse jusqu’à sa transformation en données. Cet article se veut une contribution aux études sur l’enfance et à la méthodologie de la recherche avec les enfants.

Key words: ETHNOGRAPHIE; ENFANTS; PANDÉMIE; DESSINS

Abstract

This article is concerned with the ethical and methodological aspects of research carried out during 2020, which investigated the children’s representation of Covid-19 in the Brazilian state of Maranhão. It queries the fabrication of an ethnography at a distance (with the children’s parents as mediators), taking digital technologies as a means to access children and their narratives through short interviews, audio recordings, and drawings. Adhering to social distancing rules, without access to direct observation, it raises issues regarding the process of obtaining information and transforming it into data through systematization and analysis.

Key words: ETHNOGRAPHY; CHILDREN; PANDEMIC; DRAWINGS

ESTE ARTIGO RESULTA DE UMA ANáLISE DO PERCURSO éTICO-METODOLóGICO UTILIZADO em uma pesquisa que investigou as representações de crianças do Maranhão1 acerca da covid-19. A pesquisa foi realizada em meio à pandemia que assolou o mundo, sendo desen- volvida entre março e abril de 2020, durante o distanciamento social imposto pelo governo do estado do Maranhão.

A produção dos dados foi, assim, realizada por via remota, e este artigo teve sua escrita marcada pela solidão e pelo distanciamento, não apenas entre a pesquisadora e suas interlocutoras - as crian- ças -, mas também entre a pesquisadora e seus pares: colegas, orientandas e membros de seu grupo de pesquisa.

Entretanto, se meu diálogo com as crianças - principais sujeitos desta pesquisa - não pôde ser direto, descobri que há outros modos de dialogar, senão com os sujeitos, com o campo. Em que consiste, afinal, a produção de dados senão no resultado do encontro criativo (Wagner, 2010) entre o pesquisador e seus interlocutores? E esse encontro e seus diálogos não podem ser mediados pelas tecnologias digitais? Afinal, segundo Guber (2005), o campo não fornece dados, mas informações que costumamos equivocadamente chamar de dados. As informações se transformam em dados no processo reflexivo, posterior à coleta. Ou, como diz Magnani:

. . . a natureza da explicação pela via etnográfica tem como base um insight que permite reorganizar dados percebidos como fragmentários, informações ainda dispersas, indícios soltos, num novo arranjo que não é mais o arranjo nativo (mas que parte dele, leva-o em conta, foi suscitado por ele) nem aquele com o qual o pesquisador iniciou a pesquisa. (2002, p. 17).

Assim, as informações oferecidas pelos atores sociais só se tornam dados no processo de sistematização e análise, sejam as informações obtidas diretamente com os interlocutores ou remotamente - via tecnologias e redes sociais (um novo modo de fazer antropologia de gabinete ou de “estarmos lá”). Com razão, Favret-Saada (2005, p. 160) afirma que não se faz análises durante a produção dos dados: “o tempo da análise virá depois”.

Se os dados não estão dados, mas são produzidos, o campo não é necessariamente espacial, tampouco sinônimo de etnografia, como costumeiramente se pensa.

El campo no es un espacio geográfico, un recinto que se autodefine desde sus límites naturales (mar, selva, calles, muros), sino una decisión del investigador que abarca ámbitos y actores; es continente de la materia prima, la información que el investigador transforma en material utilizable para la investigación. (Guber, 2005, p. 83).

Não é o campo que define a etnografia, mas a experiência pessoal com aquele campo ou com aqueles sujeitos. O trabalho de campo não é apanágio da antropologia, nem seu monopólio. Muitos pesquisadores de diversas áreas vão a campo, desde o final do século XIX. Mas o “campo” antropológico supõe não apenas ir e ver, mas algo mais complexo: uma corresidência extensa, uma observação sistemática, uma interlocução efetiva (em língua nativa), uma mistura de aliança, cumplicidade, amizade, respeito, coerção e tolerância irônica (Clifford, 1995). O trabalho de campo antropológico consiste em estabelecer relações com pessoas.

Trabalho etnografando2 com crianças há 18 anos, mas as pesquisas que estavam em desen-volvimento antes da pandemia foram interrompidas, especialmente por ter como sujeitos crianças que residem em casas de acolhimento e crianças indígenas - espaços cujo acesso foi estritamente proibido durante o distanciamento social. Com abrigos e aldeias inacessíveis, comecei a questionar como as crianças dos centros urbanos estariam lidando com o volume de informações que chegavam a todo instante sobre a pandemia e com as profundas transformações sofridas em seu cotidiano.

A partir desta pesquisa, compus uma etnografia das concepções das crianças sobre o coronavírus - termo adotado por elas -, incluindo seus modos de contágio, as pessoas atingidas pelo vírus, a noção de risco, as consequências previsíveis e as prevenções possíveis, visando a perceber como a covid-19 afetou a vida das crianças a partir de suas interpretações. As representações das crianças e as informações, interpretações e sentidos atribuídos à covid-19 foram acessados por métodos, técnicas e instrumentos que apresento neste artigo por meio de um itinerário ético-afetivo.

Aqui me dedico a problematizar as condições da composição de uma etnografia durante o distanciamento social, sem o uso da observação direta. Para isso, o artigo está organizado em dois momentos. O primeiro, ético, discute os instrumentos utilizados na pesquisa, como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e os termos de assentimento, além da exposição das crianças no texto. O segundo, metodológico, está dividido em dois subitens: no primeiro, problematizei as conversas realizadas pelos pais com as crianças em áudios, a partir de roteiros semiestruturados; no segundo, tratei da elaboração dos desenhos como importante recurso da pesquisa, cujos sentidos atribuídos pelas crianças foram gravados em áudios que chamamos de explicação dos desenhos.

Da experiência etnográfica a uma etnografia sem experiência

Depois de tantas experiências com crianças em campo - aldeias, quilombos, reservas extrativistas, palafitas, sítios -, deparei-me com um novo desafio. Em meio à pandemia de covid-19, impedida de acessar aqueles que eram meus campos de pesquisa no momento, senti-me exilada da aldeia e da casa de acolhimento, lugares e condições de vivência da infância às quais tinha dedicado meus esforços de observação participante nos últimos tempos.

Em minha própria casa, onde recebia as notícias sobre a crise sanitária, questionava-me como essas informações eram obtidas, se as crianças estavam sendo privadas, de que maneira os pais estavam traduzindo as informações para a compreensão dos pequenos, como elas se apropriavam dessas informações e as ressignificavam, como processavam a prevenção e o enfrentamento da doença e de que modo conseguiam passar esses conhecimentos adiante entre seus pares - em uma transmissão horizontal de saberes (Delalande, 2001).

Eu mesma, em companhia do meu filho de 4 anos, ouvia dele as mais diversas representações do coronavírus sobre as mudanças no cotidiano impostas pelo vírus: cumprimentar com o cotovelo; a importância de usar máscaras e lavar as mãos; passar muitas vezes o álcool em gel; e muitas outras percepções que não lhe chegavam por mim, mas pelas redes sociais. Rapidamente, as crianças tiveram informações voltadas para elas por meio de seus personagens favoritos - como a Turma da Mônica -, e os próprios vídeos infantis nos canais do YouTube começaram a exibir anúncios sobre o coronavírus para as crianças.

Construído o projeto, elaborei um texto curto e objetivo direcionado aos pais e responsáveis - meus mediadores -, solicitando que me ajudassem a chegar às crianças. No texto, explicava os objetivos da pesquisa, a metodologia utilizada, elucidava as questões éticas e solicitava aos pais que gravassem áudios a partir de um roteiro semiestruturado fornecido a eles. Ao mesmo tempo demandava que, por meio do mesmo roteiro, que serviria de instrumento para as conversas com as crianças por áudio - que chamei de pequenas entrevistas -, as crianças fossem orientadas a cons- truir um desenho e gravar áudios explicando-os.3

A partir dessa matéria-prima - pequenas entrevistas em áudio e desenhos -, produzi minha primeira etnografia sem estar lá - “being there” -, como diria Geertz (2005). Pela primeira vez, a observação participante não foi o principal guia, e eu não tinha um informante qualificado (Malinowski, 1984). Faltavam-me os pequenos guias nas aldeias ou nos sítios que me levavam por toda parte ensinando-me sobre o lugar e as pessoas. As crianças não me cercavam a todo momento ou brigavam para segurar minhas mãos nos longos trajetos a pé. Não invadiam minha privacidade nem desorganizavam meus materiais de pesquisa. De tudo isso senti falta, mas aprendi um modo novo de conduzir a experiência etnográfica. E descobri que é possível sentir a solidão que circunda o empreendimento etnográfico tão bem descrita por Malinowski (1984) e DaMatta (1978) sem que se veja partir das ilhas trobriandesas o barquinho que lhe conduziu ou sem habitar uma cabana improvisada entre um povo timbira de onde se preenchia à luz da lua os infindáveis diários de campo. E, em casa - entre celulares, laptops, redes sociais, aplicativo de mensagens instantâneas e os bips que anunciavam a chegada dos dados enviados de todos os lugares do Maranhão, inaugurando minha nova condição de pesquisadora -, eu me senti em campo. E sozinha.

Se, para que exista etnografia, deve haver negociação e aceitação por parte dos sujeitos da pesquisa, remeto-me a Geertz (1989, p. 212), para quem “A cultura de um povo é um conjunto de textos, . . . que o antropólogo tenta ler por sobre os ombros daqueles a quem eles pertencem”. Se à antropóloga se permite ler algo, mesmo que por sobre os ombros do nativo, só o faz pela permissão (simuladamente desinteressada ou incidental) do nativo, seja ele adulto ou criança. Essa aceitação é fundamental por aliviar a solidão que a antropóloga vivencia em campo. Ser aceito minimamente nos permite compartilhar talvez a melodia do anthropological blues (DaMatta, 1978), uma espécie de “estarmos juntos” no “estar só”. Quando me dei conta da quantidade de material que recebia, confesso que nunca me senti tão aceita por ter conseguido a proeza de, sem nem ao menos ser vista, ser atendida em minhas solicitações. Claro que uma pequena parte desse público era também de uma rede de afetos por mim construída - filhos de colegas do trabalho, amigas, conhecidas, vizinhas -, mas não era o caso da maioria, e a pesquisa extravasou essa rede de afetos.

Quando as negociações não se fazem em campo: Questões ético-metodológicas

Pega desprevenida pela pandemia de covid-19, antes mesmo que pudesse processar a quantidade de informações que chegavam, fui rapidamente destituída de meus afazeres. Vi-me da noite para o dia trabalhando em regime de home office, com meu filho em homeschooling, paralisando as pesquisas em andamento. Comecei a me questionar como as crianças estariam lidando com o medo, as preocupações e as apreensões dos adultos. Com o perigo e o risco eminente, tendo de se distanciar de seus avós (importantes figuras na vida infantil), sair da escola, mudar a rotina escolar, ficar longe das atividades extracurriculares.4

Decidida a investigar as representações das crianças maranhenses acerca da covid-19 e o modo como elas têm construído suas percepções, questionava-me se era possível realizar uma pesquisa etnográfica a distância. Como afirma Magnani (2002, p. 17): “O método etnográfico não se confunde nem se reduz a uma técnica; pode usar ou servir-se de várias, conforme as circunstân- cias de cada pesquisa; ele é antes um modo de acercamento e apreensão do que um conjunto de pro- cedimentos”. Assim, para produzir uma etnografia, é preciso adaptar-se às condições mais adversas e lançar mão dos meios disponíveis a fim de produzir uma descrição densa do objeto em estudo. Produzir esse tipo de descrição é a capacidade de seguir uma hierarquia estratificada de estruturas significantes em termos nos quais o objeto de estudo é passível de interpretação e sentido (Geertz, 1989).

A ideia inicial era pesquisar apenas as crianças de Imperatriz, no Maranhão. Como mencionado, redigi um texto que solicitava aos pais ou responsáveis que gravassem pequenas entrevistas com as crianças - de 3 a 7 anos - e lhes solicitassem que fizessem desenhos e gravassem áudios explicando os desenhos. Junto do texto, foram enviadas questões que deveriam nortear as pequenas entrevistas e a elaboração dos desenhos, além de um termo de assentimento e um TCLE para os pais e um termo de assentimento para as próprias crianças. No texto das crianças, apareciam dois desenhos a serem pintados, um que deveria ser pintado caso a criança desejasse participar da pesquisa, e o outro a ser pintado pelas crianças que não desejassem participar. Esse termo deveria ser usado especialmente pelas crianças ainda não alfabetizadas, para que se sentissem incluídas nas decisões de participação na pesquisa.

A opção por esse tipo de termo de assentimento construído especificamente para as crianças vem do reconhecimento de que até mesmo os modos de solicitar consentimento são pensados por adultos em um padrão adultocêntrico: feitos por escrito, exigindo assinaturas e, no mais das vezes, uma compreensão de direitos (Sousa & Pires, 2020). Por isso, defendo a obtenção do termo de assentimento em um processo contínuo e criativo, que deve considerar o diálogo e a confiança construídos na relação que se estabelece entre os sujeitos envolvidos na pesquisa. E, sobretudo, que considere a capacidade das crianças de decidirem por conta própria a sua participação ou não.

Fonte: Elaboração da autora.

Figura 1 Termo de assentimento para as crianças5 

Todos esses documentos foram remetidos pelo aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp, inclusive o texto explicativo e o contato para onde os desenhos e áudios deveriam ser destinados. Eles foram enviados para contatos diversos de Imperatriz, como contatos de escolas, de grupos de mães, de colegas de trabalho, de grupos de professores da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) de cursos diversos e de amigas com filhos com a faixa etária determinada. Ocorreu que, não tendo os aplicativos sociais fronteiras, comecei a receber áudios e desenhos de municípios circunvizinhos à cidade de Imperatriz, de modo que, com a chegada do material, decidi ampliar a pesquisa do município de Imperatriz para o estado do Maranhão. Além disso, recebi diversas mensagens de mães, pais, tios, madrinhas solicitando que seus filhos com mais de 7 anos participassem da pesquisa, pois demonstravam interesse e solicitavam sua participação. Diante disso, mais uma vez redefini a participação das crianças, agora de 3 a 11 anos.

O que se depreende disso? O tédio produzido pelo isolamento, o desejo dos pais de que os filhos participassem, de ocupá-los, de distraí-los, de vê-los como sujeitos participantes de uma pesquisa científica, orgulhosos dos seus desenhos e seus conhecimentos. Além disso, o desejo das próprias crianças de participarem e demonstrarem “sua experiência”, como disse Pedro, menino de 4 anos: “Está pronto?”, perguntou a mãe para Pedro, com o áudio já ligado, antes de dar início à entrevista. Ele respondeu: “Sim! Com a minha experiência” (Pedro, 4, Imperatriz).

Para a antropologia, cujo método por excelência é a etnografia, e a sua principal aliada, a observação participante, é difícil pensar a pesquisa sem o encontro etnográfico entre o pesqui- sador e os sujeitos de pesquisa em um espaço definido e circunscrito a que chamamos de campo. É muito delicado conduzir uma pesquisa sem nunca ter visto de perto seus interlocutores e cuja produção de dados é produto de uma relação estabelecida a distância, tendo como mediadoras as tecnologias sociais.

Mas, conforme defende Toren (citada por Regitano, 2019), o que caracteriza a experiência etnográfica é a natureza da análise. Nesta pesquisa, o contato e a interação com os sujeitos da pesquisa foram feitos a distância, as negociações feitas no campo - como aquelas que decidem as delicadas questões éticas - tiveram de ser transformadas do convencional “ser aceito pelos nativos” por uma gama de documentos, termos de assentimento e consentimento para resguardar pesquisadora e interlocutoras, uma vez que não se podia negociar nos meandros da pesquisa, com apertos de mão, olhos nos olhos, cafés compartilhados, sorrisos e abraços sinceros as gentilezas e as dádivas que a experiência in loco nos oferece. Entretanto, como será revelado adiante, relações virtuais também podem gerar dádivas.

A impossibilidade da observação participante transformou pais em pesquisadores, e meu olhar disciplinado (Oliveira, 1998) foi substituído por orientações aos pais e responsáveis, que manejavam os aparelhos celulares e conduziam as pequenas entrevistas com as crianças, digitalizavam seus desenhos e os encaminhavam ao contato concedido. Nesse sentido, os pais e responsáveis pelas crianças tornaram-se meus mediadores, meus guias, meus olhos em campo. No final do percurso, questionava-me quem eram os entrevistadores nesta pesquisa: eu, que produzi o roteiro, ou os pais, que, de posse do roteiro, ao seu jeito, conduziram a entrevista?

Mas, como sempre ocorreu à antropologia, os mediadores causam ruídos e interferências na comunicação. E lá estavam eles: fazendo mímicas para as crianças durante as entrevistas, passando informações como em forma de “cola”, com sorrisos não disfarçados depois de uma resposta ingênua ou criativa de seus filhos, corrigindo a pronúncia de seus nomes, dizendo “só isso, não é?”, se eles começavam a se desviar, por meio do imaginário, do roteiro principal. E até mesmo produzindo pequenos textos junto com as crianças a serem lidos - perceptivelmente - nas gravações dos áudios. Se os intermediários sempre foram sujeitos que acrescentaram complexidade à pesquisa (Evans- -Pritchard, 1972), imagine quando esses são os pais dos interlocutores!

Mãe: “. . . como alguém pega o coronavírus?”.

Vicente: “Quando você não usa máscara e envia”.

Mãe: “Tá. E o que você pode fazer para não pegar o coronavírus?”.

Vicente: “Usar máscara”.

Mãe: “E o que mais? Tem outra coisa que eu mando você fazer direto, o que é?”.

Vicente: “Tarefa?”.

Mãe: “Não!” [com tom de reprovação].

[Silêncio].

Vicente: “Ficar dentro de casa”.

Mãe: “Sim. E outra coisa. Olha...” [escutamos um ruído provavelmente dela fazendo o mo-vimento de lavar as mãos].

Vicente: “Lavar as mãos”.

(Vicente, 4, Imperatriz).

Pai: “O que a gente pode fazer para não pegar o coronavírus?”.

Guilherme: “Álcool em gel”.

Pai: “Álcool em gel e o que mais?”.

Guilherme: “Água”.

Pai: “Água e o que mais?”.

Guilherme: “Laranja”.

Pai: “Laranja?”.

Guilherme: “É, porque você falou pra gente comer laranja, né?”.

[Áudio interrompido].

(Guilherme, 4, Imperatriz).

Mãe: “E que pessoas que podem pegar o coronavírus, quais são as pessoas? Você sabe quem são as pessoas que podem pegar o coronavírus?”.

Vicente: “Os vovozinhos... e... pessoas normais... Um coelho...”.

Mãe: “Tá bom, né?”.

(Vicente, 4, Imperatriz).

Ora, não importa se a pesquisadora está em campo ou a quilômetros de distância, os dados são sempre fictícios, forjados (Clifford, 2002) e de terceira mão, tenhamos ou não mediadores. A realidade é como um texto: interpretação e compreensão. Para Sahlins (2003), seja como for, a realidade etnográfica não pode ser substituída pela compreensão dela. Dos primórdios da etnografia, herdamos do realismo etnográfico o “eu estive lá” como prova da fidelidade do pesquisador ao campo e à realidade, mas, sobretudo, pela busca incessante de uma autoridade etnográfica (Clifford, 2002). Talvez esse seja o mal dos que fazem pesquisa, não só antropólogos, pois bastou transformar pais e mães em entrevistadores, solicitando áudios, que comecei a receber fotografias das crianças elaborando ou segurando os seus desenhos e vídeos inteiros com as entrevistas como se quisessem provar que eles estavam todos, de fato, lá.

Desde que se deu o reconhecimento de que as crianças são atores sociais importantes em suas culturas, tornando-as sujeitos nas pesquisas cujo ponto de vista orienta nossas ações em campo, os estudos da infância começaram a se debater com diversos impasses ético-metodológicos. Isso porque os documentos que regem a ética nas pesquisas6 tomam como norte as pesquisas quanti- titativas, têm como referência as ciências da saúde - cujos sujeitos são pacientes, e não interlocutores - e desejam, a partir de seus comitês de ética, vislumbrar projetos cuja proposta metodológica esteja fechada. Assim, a participação das crianças deve ser rigidamente planejada, o que resulta na ausência de espaço para o processo de construção da pesquisa em campo, na relação pesquisador/sujeito, condição da etnografia.

Assim, as negociações feitas em campo entre pesquisadora e sujeitos da pesquisa e o reconhecimento do direito destes de participarem e construírem os dados juntos com a pesqui- sadora desaparecem. Esses documentos tomam as crianças como seres incapazes e desconhecem sua potencialidade.

Cunha (2017), dedicando-se aos dilemas éticos nas pesquisas com crianças a partir da tensão entre os direitos de participação e os direitos de proteção, problematiza o uso dos termos de consentimento e assentimento em campo, reforçando a importância do tempo de permanência no campo para a construção das relações de confiança, da utilização de linguagens que sejam do universo das crianças e defendendo a etnografia como o método mais adequado de pesquisa com crianças. A autora avalia como as pesquisas com crianças não podem ser planejadas de modo fechado, estabelecido a priori, devendo sempre contar com os imponderáveis.

No caso desta pesquisa, os termos de assentimento para os pais e as crianças e o TCLE se fizeram fundamentais na ausência de uma negociação que pudesse ser feita no campo. Nas pesquisas que realizei entre o povo Capuxu (Sousa, 2017a, 2017b), as crianças e seus pais se sentiram ofendidos quando mencionei que poderia substituir seus nomes por nomes fictícios. Assim, cada caso deve ser analisado com cautela, considerando as particularidades da pesquisa e os níveis de vulnerabilidade dos sujeitos - adultos e crianças. Há contextos de pesquisa que não só permitem o uso de fotos, desenhos e nomes reais, como favorecem isso.

No Brasil, onde as crianças são consideradas vulneráveis, as pesquisas dependem de aprovação prévia nos comitês de ética. Barbosa (2014) conclui que isso tensiona a relação entre os projetos de pesquisa antropológicos com crianças e a legislação, uma vez que esta se equivoca em três aspectos: a) considera as crianças como vulneráveis, esquecendo da participação e do protagonismo delas; b) contrapõe-se ao método etnográfico, já que exige uma metodologia definida antes da entrada em campo; c) restringe a captação e a divulgação de imagens e de produtos realizados por crianças - quando nós antropólogas queremos garantir a participação das crianças e dar-lhes o direito de publicar suas imagens, seus nomes e suas contribuições intelectuais.

Uma solução seria exigir dos comitês de ética uma imagem mais contemporânea dessas crianças, como sujeitos de direitos com protagonismo e ação social. Precisamos garantir pesquisas com crianças com caráter ético, mas que não impeçam a pesquisa etnográfica ou participativa, ou que excluam a cidadania do pesquisado ou o protagonismo das populações infantis.

Ao tratar da concepção restrita de ciência presente nos comitês de ética, Barbosa (2014) destaca que, ao exigirem metodologias definidas antes da entrada em campo, com instrumentos avaliados com antecedência, roteiros de entrevistas ou de observação, população predefinida, tais comitês não atentam para o fato de que os dados são fabricados, de forma que sua produção deve ser adaptada a cada situação em campo por negociações constantes entre a pesquisadora e as crianças.

A Resolução n. 196 (1996) tinha como ênfase, entre outras coisas, a não coerção à participação das crianças na pesquisa. Diante disso, qual o lugar das crianças em pesquisas em ciências humanas? Como consideramos que as crianças são capazes de entender os objetivos de uma pesquisa e participar dela, mas que não têm condições de decidir sobre a sua participação (Francisco & Bittencourt, 2014)? A contradição inerente aos documentos citados perpassa a noção de autonomia, tão cara à antropologia da criança, para quem a criança é capaz de entender e responder por si mesma.

As crianças não são sujeitos sobre os quais produzimos pesquisa, mas que produzem pesquisa conosco (Francisco & Bittencourt, 2014). A relação não é, portanto, de obtenção de dados, mas de construção de dados e de realidades. Essa compreensão por parte dos comitês de ética e dos documentos que os regulam os ajudaria a entender a diferença entre pesquisa em seres humanos, pesquisa com seres humanos e pesquisa para seres humanos (Oliveira, 2004).

Para Alderson (2005), existem dois argumentos que obliteravam a participação das crianças nas pesquisas: a) a crença de que dados obtidos com crianças não são confiáveis; b) a ideia de que crianças não deveriam participar das pesquisas, dada a sua vulnerabilidade e a possibilidade de serem exploradas pelos pesquisadores. Ignorava-se, portanto, a capacidade de as crianças produzirem conhecimento acerca de si e de sua ação social. A autora afirma que “reconhecer as crianças como sujeitos em vez de objetos de pesquisa acarreta aceitar que elas podem ‘falar’ em seu próprio direito e relatar visões e experiências válidas” (Alderson, 2005, p. 423).

No caso da pesquisa a distância, sem que seja possível negociar em campo, instrumentos como o termo de assentimento e o TCLE se tornam importantes, por serem um guia para as ações de pais, crianças e pesquisadora. Neste caso, além desses instrumentos, utilizei-me de outro assinado pelos pais autorizando a publicação dos primeiros nomes de seus filhos e suas idades, apenas.

Considerando que as informações são provenientes de crianças de todo o estado do Maranhão, optamos por identificar apenas o prenome (nome próprio) de cada criança e a idade. A única exceção, neste caso, foi da criança indígena, cujo nome próprio a identificaria, por isso optamos por utilizar seu sobrenome indígena Guajajara.

Embora eu teça várias críticas aos termos mencionados, confessando inclusive nunca os ter utilizado em outras pesquisas, o fato de estar entre eles e a relação que eu estabelecia me pareciam o suficiente para negociar as participações e decidir junto aos meus interlocutores suas exposições nos textos. Neste caso, em que a pesquisa se realizava junto a pessoas que não conhecia, ceder a utilização dos termos me pareceu a decisão mais acertada, apesar de compartilhar da opinião de Fonseca:

Se o objetivo do antropólogo é justamente chegar na lógica implícita dos fatos, falar dos “não ditos” do local, adentrar de certa forma no “inconsciente” das práticas culturais, como podemos imaginar que os informantes preveem todas as consequências de seu consentimento informado? (Fonseca, 2010, p. 214).

As pequenas entrevistas: “Vai passar no jornal?”

A avó de Rhillary (8, Imperatriz) havia me enviado o áudio com a pequena entrevista feita com a mãe e as explicações sobre os desenhos. Pelo celular da avó, Rhillary me enviou um áudio perguntando: “vai passar no jornal? Hoje eu não perco o jornal por nada”. Expliquei a Rhillary que a entrevista não era para o jornal, mas para uma pesquisa da universidade. No áudio em resposta, ela me pareceu meio desapontada, mas logo começou a falar sobre o coronavírus e esqueceu.

Em outras ocasiões, critiquei o uso de entrevistas com crianças (Sousa, 2015) e defendi as conversas informais como importantes aliadas de pesquisadores que estudam crianças. As razões pelas quais eu acusava as entrevistas eram a inquietude típica das crianças, que divagam muito - não que os adultos não o façam -, e o fato de esse formato excluir as crianças muito pequenas de participarem, aquelas cuja linguagem ainda não estivesse concatenada. Além disso, a entrevista, importante técnica etnográfica, não é útil no caso da pesquisa com crianças em geral por conta da dificuldade de narrar o mundo em palavras (Faria et al., 2005; Kramer & Leite, 1996; Sousa, 2015). Assim, fazendo sempre uso da observação participante, nunca acreditei na entrevista como a técnica mais eficaz para acessar o ponto de vista infantil.

Ao longo da minha trajetória com crianças, sempre acreditei mais no potencial criativo das conversas informais, sempre que possível ou quando se faz uso da observação direta ou participante, permitindo-se “estar lá”. Também porque a impessoalidade das entrevistas, a formalidade do próprio termo, do aparelho digital entre nós, a não possibilidade de movimento e distanciamento do aparelho por causa do microfone terminavam por fixar as crianças em um canto. Por outro lado, as conversas informais permitiam o movimento, estávamos livres de gravações e tecnologias e conversávamos no trajeto para qualquer lugar, ou sentadas pelas calçadas de casa. Nesta pesquisa, o fato de serem entrevistadas pelos seus próprios pais foi fundamental, uma vez que o nível de intimidade existente entre eles não deixou as crianças intimidadas ou constrangidas, de modo que as conversas fluíam.

Estar em casa, em sua zona de conforto, deixou as crianças mais à vontade, diferentemente das entrevistas realizadas em prisões (Ferreira, 2020), consultórios psicológicos (Mueller, 2019) e escolas (Müller & Dutra, 2018).

Pela primeira vez, fiz o caminho inverso àquele a que estava habituada em minhas pesquisas de campo: desta vez, as conversas informais foram substituídas pelas entrevistas e seus roteiros semiestruturados. E, ocasionalmente, certa informalidade escapava vez ou outra, por entre os áudios das crianças. Abraços e apertos de mão foram substituídos por termos de consentimento, assentimento, etc. E, no final de uma entrevista ouvida pelo celular, para a surpresa da pesquisadora, um inesperado “Beijo, te amo”. Uma dádiva, nestes tempos em que fazemos pesquisa sem os calorosos abraços das crianças.

A produção de dados que resulta do encontro entre pesquisadora e sujeitos em campo não é menos complexa. O antropólogo não raras vezes é chamado a mediar conflitos, testemunhar insultos, solucionar impasses éticos. A distância, os problemas não são da mesma ordem, mas existem. Enquanto ouvia os áudios, percebia a interferência dos pais e irmãos durante as entrevistas, com dicas silenciosas, mímicas, tons de voz que denunciavam alguma reprimenda por algo dito errado. Textos previamente preparados pelas crianças e lidos, como se para não cometer erros. As crianças de uma mesma família copiavam os discursos dos irmãos, pois foram entrevistados uns diante dos outros.

Outros ruídos ou impasses se criaram. Das crianças muitas pequenas, cujos discursos não fossem compreensíveis em áudios ou vídeos, precisei solicitar às mães que os transcrevessem para mim. Algumas mães, conscientes da dicção de seus filhos pequenos, enviavam os áudios e já questionavam: “precisa de legenda?”, “quer que eu traduza?”, “deu para entender?”. As entrevistas e vídeos eram interrompidos inesperadamente, porque os pais, distraídos, apertavam o botão errado, ou porque alguém desavisado se aproximava do local da entrevista conversando. Quando não, porque as crianças denunciavam uma brincadeira, uma artimanha ou um segredo dos próprios pais.

Logo, a complexidade do ouvir (Oliveira, 1998) não está restrita à presença em campo. As entrevistas são complexas mesmo quando são por nós realizadas. Há sempre as delicadezas sutis nos modos de fazer com que os interlocutores voltem ao tema, as interrupções, os silêncios, os trechos não audíveis por conta de uma voz embargada, de emoção ou de medo. Sem falar dos ruídos na comunicação, estejamos nós frente a frente com os sujeitos, ou a quilômetros de distância.

Meu ouvir disciplinado pela formação em ciências sociais, emoldurado pelo olhar que a tudo observa, precisou ser reaprendido e ressignificado. Afinal, como afirma Oliveira (1998), o olhar e o ouvir devem estar conjugados para garantir a observação. Ao cabo da formação do antropólogo, nosso olhar se torna um olhar disciplinado pela teoria, e nosso ouvir, preparado para eliminar ruídos.

Nesta pesquisa, ouvi as entrevistas cujos roteiros eu mesma produzi e detive o olhar sobre os desenhos das crianças. Foi assim que a minha natureza aguçada de antropóloga fez nascer uma etnografia em plena quarentena, sem deixar que se perdessem em campo os fatos sociais por falta de quem os registrasse e transformasse em fatos etnográficos.

Os desenhos sobre o coronavírus

Ele é bem pequenininho, mas eu vou desenhar.

(Robert, 3, Buriticupu)

Desde Bateson e Mead (1942), a técnica de elaboração de desenhos foi legitimada como importante ferramenta de pesquisa, sobretudo na antropologia. As pesquisas sobre crianças no Brasil a têm utilizado com a intenção de alcançar uma forma de expressão da produção simbólica da infância, tornando-se comumente descrita em artigos diversos sobre os mais heterogêneos temas em contextos diferentes. Essa variedade de contextos, situações e objetos de análise tem demonstrado o vigor do uso de desenhos como uma importante técnica de pesquisa, adaptável para os mais distintos contextos, e cujo interesse das crianças por ela se manifesta quase de maneira universal.

Nesta pesquisa, ao contrário do que tem ocorrido normalmente, os desenhos não foram utilizados visando à aproximação das crianças com o pesquisador, para tecer redes de relação, engendrando socialização. Os desenhos foram utilizados por permitir acessar o ponto de vista das crianças, além de ser algo possível de ser produzido e coletado sem a presença do pesquisador, com o auxílio da tecnologia.

Nomes importantes dos estudos da criança em todo o mundo têm feito uso da técnica de elaboração de desenhos. Podemos mencionar, em um contexto mais amplo Bateson e Mead (1942), Mead (1963, 1985), Toren (1993) e Sarmento (2011). No Brasil, Cohn (2006, 2008), Tassinari (2015, 2016), Pires (2007, 2009), Sousa (2017a, 2017b, 2019), Müller e Dutra (2018) e Gobbi (2012) têm se dedicado aos desenhos como importante técnica de pesquisa para acessar as narrativas infantis. Através deles, importantes dados sobre a organização social dos povos podem ser alcançados, além de experiências e representações desses sujeitos, elementos que digam respeito às profundezas da vida social, não restrita necessariamente ao universo infantil.

Estamos cada vez mais atentas ao desenho como técnica, seus usos e a produção dos dados através dela e de suas limitações. E buscamos desconstruir determinados aspectos que rondam os usos dos desenhos, como: a) a redução de sua importância a mero artifício de interação entre pesquisadora e interlocutores; b) a pouca habilidade das cientistas sociais em lidar com desenhos; c) o não reconhecimento da técnica como eficaz na produção de dados (Sousa & Pires, 2021).

Ressalto a eficácia da técnica de elaboração dos desenhos quando ela se torna primordial para desnudar dada realidade ou tratar um dado objeto, o que não teria sido obtido por outra via. A utilização dos desenhos na produção de dados também diz respeito ao reconhecimento da agência e autonomia das crianças nos modos de dizer de si mesmo (Sousa, 2015).

Mead (1985), em pesquisa junto às crianças Manu, utilizou-se da observação participante somada à análise dos desenhos produzidos pelas crianças, fornecendo os meios para o desenho sem predeterminar o modo de desenhar - cuidando para que os adultos não interferissem: “Compreendi que este era o sistema mais aproximado ao ensino normal que eu podia aplicar, evitando que os adultos desenhassem, pois isso teria modificado os termos da investigação” (Mead, 1985, p. 211).

Toren (1993) utilizou os desenhos como instrumentos de pesquisa para capturar a percepção de hierarquia das crianças em Fiji. Em suas pesquisas, ela separava as crianças para que o desenho de uma não influenciasse o de outra. Assim, enquanto Mead se preocupava com a influência dos adultos sobre os desenhos das crianças, Toren se preocupava com a influência entre as próprias crianças. Logo após desenhar, as crianças faziam um relato sobre o desenho.

Recentemente, Toren (citada por Regitano, 2019) descreveu a sua experiência com os desenhos:

Eu não estava tentando descobrir sobre o desenvolvimento de sua perspectiva, digamos. Eu não tinha noção de que tipo de fim de desenvolvimento elas iriam chegar, eu estava usando os desenhos absolutamente para mostrar quais ideias as crianças tinham sobre o jeito que as coisas são. (Regitano, 2019, p. 296).

A autora ainda aponta as vantagens de se utilizar a técnica dos desenhos como forma de deixar as crianças à vontade. Para Toren: “Se você quer que uma criança fale é muito mais fácil ser capaz de dizer ‘puxa, esse é um ótimo desenho, quem é esse? Me fale sobre isso’. E, naturalmente, elas vão contar tudo sobre todas as coisas para você” (citada por Regitano, 2019, p. 296).

Toren (1993) defende que não devemos fazer interpretações dos desenhos por eles mesmos, mas usá-los como meios para acessar as interlocutoras e suas narrativas. Acredito que mais do que um caminho até as crianças, os desenhos representam um caminho até o ponto de vista das crianças, suas representações e suas leituras de mundo.

As análises dos desenhos devem ser feitas a partir do que foi dito pelas crianças e os significados atribuídos por elas mesmas, razão pela qual solicitei que explicassem os desenhos por meio de áudios. Afinal, “os desenhos úteis para a pesquisa antropológica são, sem dúvida, aqueles nos quais as crianças se esmeraram nos comentários. Diferentemente dos psicólogos, os antropólogos não são treinados para inferir qualquer conclusão a partir de um desenho” (Pires, 2007, p. 52).

Em geral, existem três tipos de desenho: livres, temáticos e temáticos controlados. São chamados de desenhos livres aqueles sem tema definido a priori, em que as crianças decidem por elas mesmas, às vezes individualmente, às vezes coletivamente, o que desenham. Ainda que chamemos a técnica de espontânea ou livre, concordo com Mèredieu (2017) que, em primeiro lugar, somos nós, os adultos, que oferecemos os instrumentos para as crianças desenharem e que decidimos a importância dos desenhos para a nossa pesquisa. Mèredieu (2017) também afirma a inegável influência do universo adulto sobre o infantil, de modo que não existiriam desenhos infantis livres de qualquer influência, como desejam Mead (1963, 1985) e Toren (1993).

Conversas com as crianças sobre o que desenhou são essenciais, devendo os pesquisadores recorrerem à oralidade sempre que possível (Sousa & Pires, 2021; Pires, 2007; Toren, 1993; Gobbi, 2012; Regitano, 2019). James et al. (1998) concordam que a eficácia da técnica do desenho é potencializada na medida em que os desenhos são motivos de discussões posteriores.

Em diversas situações nesta pesquisa, a fala das crianças nos áudios ou mesmo nos vídeos só se tornou evidente por causa dos desenhos. Então, ao contrário do que geralmente acontece - os desenhos sendo utilizados para complementar outras técnicas, comumente a observação direta -, neste caso, os desenhos e os áudios se completavam mutuamente, não havendo sobreposição de uma técnica sobre a outra, sendo as duas igualmente importantes. Afinal, é preciso que haja o reconhecimento da produção de desenhos como uma técnica legítima na pesquisa antropológica, e sua proficuidade não pode ser negada.

O lugar e as circunstâncias em que os desenhos são produzidos devem também ser considerados (Sousa & Pires, 2021). Nesse sentido, a elaboração dos desenhos em casa, na zona de conforto, sendo orientados por pais ou irmãos pode ter sido um fator de interesse das crianças em falar à vontade sobre o coronavírus, sem grandes preocupações. Pelos vídeos e as fotografias recebidas, as crianças estavam geralmente em mesas infantis próprias para tarefas escolares, mesas de centro ou nas escrivaninhas dos pais. Uma criança fez o desenho do coronavírus em um balão, e a mãe filmou o processo enquanto conversava com ela. Nos vídeos, as crianças aparecem despojadas, desenhando e conversando, revelando os bastidores das relações e da produção dos desenhos.

Como já mencionado, não pude acompanhar de perto a elaboração dos desenhos, conforme defendem os estudos da infância, embora esteja consciente da importância de acompanhar a feitura dos desenhos e conversar com as crianças enquanto os produziam. Por outro lado, acredito que a ausência de um pesquisador, que foi substituído pelos pais, por perto ou não, pode ter deixado as crianças mais à vontade, sendo uma vantagem da pesquisa nas condições em que foi forjada. Para compensar minha ausência durante a confecção dos desenhos e a impossibilidade da conversa durante o processo, solicitei áudios explicativos dos desenhos que as crianças gravaram com muita habilidade, talvez exatamente por não estarem frente a frente com o entrevistador; afinal, elas sabiam que seus pais eram mediadores.

Outro aspecto a ser considerado é que as imagens enviadas pelo aplicativo de mensagens WhatsApp perdem muita qualidade, e os pais não são, em geral, habituados a digitalizar documentos ou convertê-los para o formato PDF.7 Por essa razão, mandavam fotografias dos desenhos, e eu solicitava gentilmente que as digitalizassem para que tivessem melhor qualidade, muitas vezes indicando o aplicativo a ser instalado por meio do qual poderiam fazê-lo. A todas as minhas solicitações, os pais atenderam prontamente.

Assim, reforço que o auxílio dos pais foi fundamental para que a pesquisa se tornasse viável, como espécie de mediadores ou pesquisadores auxiliares, conduzindo o processo por perto enquanto eu procedia remotamente, tentando minimizar os impactos causados pela impossibilidade da utilização do mais importante método da pesquisa antropológica: a observação direta e participante.

Estou ciente de que os desenhos podem ter sofrido também interferência dos pais, e dediquei- -me a conversar com cada um deles explicando a importância de que os filhos falassem por conta própria, apresentassem o coronavírus do seu jeito, a partir de suas próprias percepções e experiências, por meio das entrevistas e desenhos.

Como o campo e seus sujeitos sempre controlaram as nossas impressões, como afirma Berreman (1998), apesar do pedido que fiz, ao questionar uma mãe se ela poderia perguntar a Vicente, de 4 anos, que elemento azul era aquele que aparecia no desenho meio fora de contexto e que eu não podia identificar, ela me respondeu por áudio e entre sorrisos constrangidos de uma criança que fez uma travessura com o colega e foi flagrada: “foi o pai dele quem fez!”. Foi assim que eu descobri que, se nos controlam as impressões os interlocutores em campo (Sousa, 2015), imagine a distância!

Das limitações do método, enfatizadas pela distância, lamento os usos dos desenhos e seus áudios explicativos, sem que a elaboração do desenho fosse por mim acompanhada, como defendem Pires (2007, 2009), Sousa e Pires (2021), Toren (1993) e Mead (1963, 1985). Estou consciente de que essa não era, nem de longe, a condição ideal da pesquisa, mas foi a opção que decidi tomar e à qual me dediquei, sem querer que a passagem do tempo, dos acontecimentos e do isolamento distanciasse as crianças do fenômeno da covid-19, e as suas representações não tivessem sido registradas no momento presente, tampouco analisadas. Em uma espécie de retorno às origens, senti-me como os evolucionistas acusados de colecionadores de borboletas, que acreditavam que as sociedades primitivas seriam extintas e deveriam registrá-las o mais rápido possível, antes que se perdesse o objeto. Sem pessimismo sentimental (Sahlins, 1997), tive receio de que, terminado o distanciamento social e retomando pais e crianças suas rotinas, os dados de que eu necessitava não me chegassem mais. À minha inabilidade com pesquisa a distância sobrepus o reconhecimento de que registrar esse momento era urgente.

Ao longo desse processo, descobri como é possível, nos dias de hoje, fazer uma etnografia de gabinete sem que estejamos distantes, ao contrário do que ocorria nos primórdios da antropologia. Apesar de nunca ter saído de casa para realizar a pesquisa, envolvi-me com ela noite e dia, dialogando com o campo, ora tirando dúvidas dos pais, ora recebendo o material, sistematizando, salvando, classificando e analisando. E o aplicativo de mensagens instantâneas emitia ruídos a todo instante, de domingo a domingo, porque também remotamente, como no campo, os fenômenos e suas repercussões, os questionamentos e as participações de nossos sujeitos não têm hora para acontecer.

Defendo, como Toren e Mead, a importância de que a elaboração dos desenhos seja acompanhada pela pesquisadora e que pequenas conversas sobre eles seriam sempre esclarecedoras. Também reconheço que seria importante garantir que as crianças, se mais de uma na mesma família, desenhassem longe umas das outras, para evitar que o desenho de uma sofresse interferência do desenho da outra (Toren, 1993; Mead, 1963, 1985). O mesmo devia-se dizer das pequenas entrevistas em gravações de áudio; pois, em se tratando das mesmas perguntas, quando uma criança ouve outra responder diante dela, tende a copiar parte do discurso da outra, julgando-lhe correto ou mais apropriado, especialmente se essa for mais velha e tenha a oratória mais desenvolvida. Nada disso pôde ser controlado nas condições excepcionais desta pesquisa, que isolava pesquisadoras e interlocutoras em suas próprias casas.

Por outro lado, sinto-me aliviada em afirmar que nunca acreditei existir uma pesquisa com crianças cujos resultados não sofressem interferência de um “universo” adulto, pois crianças e adultos compartilham o mesmo universo. Foi assim que, nesta pesquisa, eu pude abandonar definitivamente qualquer preocupação exagerada sobre a influência de adultos ou outras crianças nas participações de crianças em pesquisas. A mim, pouco importavam as influências, se essas forças existem na realidade das crianças e trabalham para que determinadas informações cheguem até elas de determinada maneira. Interessava-me, de tudo isso, como elas se apropriavam disso, o que selecionavam narrar - por desenhos ou áudios - e que sentidos lhes atribuíam.

Foi assim que pude, de maneira divertida, descobrir através das crianças as estratégias que os pais utilizavam para, de posse de determinadas informações, moldá-las de modo a fazer as crianças obedecerem às suas ordens:

Mãe: “Certo. O que acontece quando alguém pega o coronavírus?”.

Lina: “Fica doente, e quem não come verdurinha vai morrer, e quem come não vai”.

Mãe: “O que a gente pode fazer para não pegar coronavírus?”.

Lina: “Comer muita verdurinha”.

Mãe: “O que mais?”.

Lina: “E toda a comida do prato”.

(Lina, 4, São Luís).

Jayle [explicando o desenho]: “Esse daqui é o coronavírus. E, assim, não pode comer as unhas, porque é coronavírus, e também não pode tirar isso daqui, olha, das unhas, essa sujeirinha por dentro, porque é também o coronavírus”.

(Jayle, 6, Esperantinópolis).

Recebido o material no tempo determinado - inclusive os termos de assentimento e TCLE -, passadas a coleta, sistematização e análise dos dados, passei a dialogar com os pais para que decidissem se o nome de seus filhos e idade poderiam ser divulgados. Como já mencionado, elaborei um termo de autorização em que os pais assinavam que o primeiro nome da criança e a idade poderiam ser publicados. Considerando o estado do Maranhão como universo, o nome próprio da criança e a idade não seriam elementos fáceis para identificação. Utilizando apenas os prenomes das crianças, resolvi dois impasses: por um lado, a garantia de que não fossem identificadas, conforme apregoam os comitês de ética; por outro lado, a garantia de que as crianças se reconhecessem no texto como protagonistas, como defende a antropologia da criança.

Considerações finais

Neste artigo, abordei as questões ético-metodológicas que envolveram a pesquisa sobre as representações das crianças maranhenses acerca da covid-19. Dediquei-me a problematizar as condições da composição de uma etnografia a distância, sem o uso da observação direta como guia, utilizando pais e mães das crianças como mediadores.

Para dar conta das questões que se colocaram no itinerário metodológico desta experiência, organizei o artigo a partir de dois eixos: o primeiro, ético, discutindo os instrumentos utilizados na pesquisa, como o TCLE e os termos de assentimento para os adultos e as crianças, além de problematizar as questões referentes aos nomes das crianças a serem expostos no texto.

O segundo eixo é o metodológico. Dividido em dois subitens, no primeiro problematizei o que chamei de pequenas entrevistas, ou seja, as conversas realizadas pelos pais com as crianças registradas em áudio, a partir de roteiros semiestruturados enviados aos pais. No segundo momento, tratei da elaboração dos desenhos como importante recurso da pesquisa, cujos sentidos atribuídos pelas crianças foram gravados em áudios que chamamos de explicação dos desenhos.

Este artigo, uma digressão nas reflexões que eu fazia sobre os resultados obtidos através da pesquisa, pretende ser uma contribuição à metodologia da pesquisa com crianças, aos estudos da infância e aos modos de compor etnografias em situações de distanciamento ou isolamento social.

1 Foram ouvidas 23 crianças, com idade entre 3 e 11 anos, entrevistadas por pais e/ou mães, de diversos municípios. Todas as crianças são citadinas, inclusive uma criança indígena da etnia Tentehar-Guajajara. Das 23 crianças ouvidas, todas frequentam a escola, mas 9 ainda não são alfabetizadas.

2 Para Geertz (1989, p. 20), “a etnografia é uma descrição densa. O que o etnógrafo enfrenta, de fato, . . . é uma multiplicidade de estruturas conceptuais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são simultaneamente estranhas, irregulares, inexplícitas, e que ele tem que, de alguma forma, primeiro apreender e depois apresentar. . . . Fazer etnografia é como tentar ler (no sentido de ‘construir uma leitura de’) um manuscrito estranho, desbotado, cheio de elipses, incoerências, emendas suspeitas e comentários tendenciosos”.

3 No texto enviado, explicava: “As orientações para as crianças - sejam para desenhos, explicações dos desenhos ou pequenas entrevistas a serem gravadas pelos pais com as crianças em áudio - podem ser feitas a partir das seguintes perguntas: o que é o Coronavírus? Como alguém pega o Coronavírus? Quais são as pessoas que podem pegá-lo? O que acontece se alguém pegar o Coronavírus? O que podemos fazer para não pegarmos o Coronavírus?”.

4 No Maranhão, ao longo das últimas duas semanas de março, as escolas e as universidades deixaram de funcionar de modo presencial, adotando o modo remoto. Em 1º de abril, decidiu-se por antecipar as férias escolares, com férias cole- tivas a estudantes e funcionários das escolas particulares. As escolas estaduais e municipais ficaram paradas por tempo indeterminado.

5 Uma versão semelhante a esta foi utilizada pela primeira vez pelo grupo Criança, Sociedade e Cultura da Universidade Federal da Paraíba (CRIAS/UFPB), coordenado pela professora Flávia Ferreira Pires em uma pesquisa realizada na cidade de Catingueira, Paraíba.

7 Portable Document Format.

Disponibilidade de dadosOs dados subjacentes ao texto da pesquisa estão informados no artigo.

Como citar este artigoSousa, E. L. de. (2022). Etnografia com crianças em tempos de pandemia: Uma reflexão ético-metodológica. Cadernos de Pesquisa, 52, Artigo e09122. https://doi.org/10.1590/198053149122

Agradecimentos

A pesquisa que gerou este artigo foi produzida com o apoio da Coordenação de Aperfei-çoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Código de Financiamento 001, e da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema). Agradeço também a Fernanda Müller pela leitura atenta deste manuscrito.

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Recebido: 01 de Novembro de 2021; Aceito: 13 de Maio de 2022

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TRANSLATED BY Luiz Costa, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro (RJ), Brazil. luizcosta10@gmail.com

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