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Cadernos de Pesquisa

versión impresa ISSN 0100-1574versión On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.53  São Paulo  2023  Epub 13-Oct-2023

https://doi.org/10.1590/198053149880 

POLÍTICAS PÚBLICAS, AVALIAÇÃO E GESTÃO

ABSENTEÍSMO DOCENTE: DESAFIOS PARA AS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS

ABSENTISMO DOCENTE: DESAFÍOS PARA LAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCATIVAS

ABSENTÉISME DES ENSEIGNANTS: DÉFIS AUX POLITIQUES PUBLIQUES DE L’ÉDUCATION

Fabiana Silva FernandesI  , planejamento, organização, elaboração da redação
http://orcid.org/0000-0002-3458-9963

Claudia DavisII  , planejamento, organização, elaboração da redação
http://orcid.org/0000-0002-0003-3510

Cláudia Oliveira PimentaIII  , elaboração, revisão do artigo
http://orcid.org/0000-0002-1836-7535

Adriano MoroIV  , revisão do texto
http://orcid.org/0000-0001-9625-3923

Vandré Gomes da SilvaV  , revisão do texto
http://orcid.org/0000-0001-5369-0736

IFundação Carlos Chagas (FCC), São Paulo (SP), Brasil; fsfernandes@fcc.org.br

IIFundação Carlos Chagas (FCC), São Paulo (SP), Brasil; cdavis@fcc.org.br

IIIFundação Carlos Chagas (FCC), São Paulo (SP), Brasil; cpimenta@fcc.org.br

IVFundação Carlos Chagas (FCC), São Paulo (SP), Brasil; amoro@fcc.org.br

VSão Paulo (SP), Brasil; vandresgs74@gmail.com


Resumo

O artigo descreve o fenômeno do absenteísmo entre os servidores municipais da cidade de São Paulo e busca compreender como os profissionais da educação entendem a falta docente e se organizam para enfrentar esse problema na escola. A partir de uma revisão bibliográfica, fez-se a análise estatística descritiva de variáveis relacionadas a ausências dos servidores e perfil dos profissionais pertencentes ao quadro do magistério, bem como a análise dos resultados coletados por meio de entrevistas em vinte unidades escolares. O estudo recomenda que sejam delineadas melhorias das condições de trabalho dos professores, buscando, em especial, diminuir o número excessivo de alunos por sala de aula, aumentar os níveis salariais a fim de prevenir o acúmulo de cargos e investir na carreira do magistério, tornando-a mais atraente.

Palavras-Chave: POLÍTICA EDUCACIONAL; GESTÃO EDUCACIONAL; ABSENTEÍSMO; CONDIÇÕES DO TRABALHO DOCENTE

Resumen

El artículo describe el fenómeno del absentismo entre los servidores municipales de la ciudad de São Paulo y busca comprender cómo los profesionales de la educación entienden la escasez de docentes y se organizan para enfrentar este problema en la escuela. A partir de una revisión bibliográfica, se realizó un análisis estadístico descriptivo de variables relacionadas con la ausencia de los servidores y el perfil de los profesionales pertenecientes al cuerpo docente, así como el análisis de los resultados recogidos a través de entrevistas en veinte unidades escolares. El estudio recomienda que sean delimitadas mejorías de las condiciones de trabajo de los profesores, buscando, en especial, reducir el número excesivo de alumnos por sala de clase, aumentar los niveles salariales con la finalidad de evitar la acumulación de puestos, e invertir en la carrera docente, haciéndola más atractiva.

Palabras-clave: POLÍTICA EDUCATIVA; GESTIÓN EDUCATIVA; ABSENTISMO; CONDICIONES DEL TRABAJO DOCENTE

Résumé

L’article décrit le phénomène de l’absentéisme chez les fonctionnaires municipaux de la ville de São Paulo (Brésil) et cherche à comprendre comment les professionnels de l’éducation envisagent le manque au travail des enseignants et comment s’organisent-t-ils pour faire face à ce problème à l’école. À partir d’une revue bibliographique, on a entrepris l’analyse statistique descriptive des variables liées aux absences des employés et au profil des professionnels du cadre enseignant, aussi bien que l’analyse des résultats obtenus après des interviews auprès de vingt unités scolaires. L’étude propose que l’on apporte des améliorations aux conditions de travail des enseignants, surtout en ce qui concerne la réduction de la quantité excessive d’élèves par salle de classe; l’augmentation des salaires afin de prevenir l’accumulation de postes de travail; et l’investissement dans la filière enseignante, pour qu’elle devienne plus attrayante.

Key words: POLITIQUES DE L’ÉDUCATION; GESTION DE L’ÉDUCATION; ABSENTÉISME; CONDITIONS DU TRAVAIL ENSEIGNANT

Abstract

The article describes the phenomenon of absenteeism among municipal teachers in the city of São Paulo and seeks to understand how education professionals view teacher nonattendance and organize to face this problem in schools. Based on a bibliographic review, a statistical descriptive analysis was conducted with variables related to public servant absences and the profile of professionals in the teacher workforce. In addition, the results collected through interviews in twenty school units were analyzed. The study recommends for improvements to be outlined in teachers’ working conditions, aiming particularly to reduce the excessive number of students per classroom, raise wage levels in order to prevent accumulation of positions, and invest in the teaching career so as to make it more attractive.

Key words: EDUCATION POLICY; EDUCATION MANAGEMENT; ABSENTEEISM; TEACHERS’ WORKING CONDITIONS

Desenvolvido ao longo do ano de 2019 e 2020, o estudo teve como objeto o absenteísmo docente na rede municipal de São Paulo, fenômeno caracterizado pela ausência do funcionário no posto de trabalho em razão de diferentes fatores, tais como problemas de saúde, direitos legais, acidentes e, ainda, questões relacionadas aos contextos sociais e culturais que, em conjunto, acabam por reverberar no clima organizacional1 das escolas. No âmbito da educação, embora esse seja sabidamente um problema de monta, a ausência dos professores nas escolas ainda é um campo a ser mais bem explorado. Existem poucas investigações sobre o absenteísmo docente na rede municipal de São Paulo, sendo parte delas de caráter exploratório, pois nem sempre dados públicos consolidados sobre as ausências de professores se encontram disponíveis. Essa carência de estudos é, assim, a justificativa teórica para estudar o absenteísmo e suas consequências no interior das escolas. Do ponto de vista da relevância social, trata-se de um fenômeno cujas consequências são extremamente nefastas para a implementação de um projeto pedagógico consistente que, focado no processo de ensino e aprendizagem, promova a permanência bem-sucedida dos alunos em uma escola que ofereça uma educação de boa qualidade. Considerando esse contexto, a proposta do artigo é apresentar uma análise qualitativa do fenômeno do absenteísmo, realizada no âmbito de uma pesquisa conduzida em vinte escolas municipais de diferentes regiões da cidade de São Paulo, com o objetivo de compreender como profissionais da educação analisam esse fenômeno e como eles se organizam diante da ausência do professor nas escolas e dos desafios que isso lhes acarreta.

Absenteísmo docente: Revisão de literatura e dispositivos legais

Mediante levantamento bibliográfico realizado na Scientific Electronic Library Online (SciELO), no portal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e no Google Acadêmico, constatou-se que a maior parte da produção acadêmica existente sobre o tema do absenteísmo pertence à área da saúde, particularmente à enfermagem, envolvendo principalmente enfermeiros e pessoal técnico. No portal da Capes, foram encontrados também estudos de administração pública. Sobre o absenteísmo na profissão docente, o levantamento bibliográfico realizado indicou raros estudos. De acordo com a revisão de literatura realizada por Souza e Quadros (2017), das teses e dissertações de mestrado produzidas no período de 2006 a 2016, foram defendidos, no intervalo de tempo de 2006 a 2008, 2 trabalhos sobre a temática na educação, e, a partir de 2009, 20 outros. Esse número de produções foi obtido por meio dos descritores “absenteísmo”, “precarização docente”, “mal-estar docente” e “ausência e falta de professores”, individualmente e de maneira associada.

Sendo um tema da gestão de recursos humanos, as discussões sobre o absenteísmo têm-se fundamentado em conceitos da administração pública. Nas produções encontradas, o conceito que vem subsidiando os trabalhos (Tavares et al., 2009; Porto, 2010) é o de Chiavenato (2004), cujo livro, do campo da administração de empresas, foi publicado pela primeira vez em 1979. A definição de absenteísmo, segundo o autor, é a ausência do indivíduo no ambiente de trabalho, seja por atraso ou por falta. Nesse sentido, refere-se também ao cumprimento parcial da jornada de trabalho, quando em casos de atraso na entrada e adiantamento na saída (Delchiaro, 2009).

Denominado também absentismo ou ausentismo, o absenteísmo pode ser ocasionado por diversos fatores: doenças, direitos legais, acidentes e fatores sociais e culturais (Flores et al., 2016). Os fatores associados à saúde do profissional têm sido investigados no campo organizacional e empresarial, por constituírem não só um problema importante, mas por ocasionarem, particularmente, várias ausências ao posto de trabalho (Spósito & Gimenes, 2014; Andrade et al., 2017; Altoé, 2010; Flores et al., 2016; Martinato et al., 2010).

O absenteísmo na educação, por sua vez, configura uma situação que implica, de um lado, doenças decorrentes do trabalho e, de outro, custos econômicos e sociais importantes, quando se pensa na saúde dos docentes e nos prejuízos à aprendizagem dos estudantes da educação básica. Encontrou-se, na literatura, um grupo de estudos que apontou o absenteísmo como um fenômeno intimamente ligado às condições precárias de trabalho, bem como à presença de fatores estressores que resultam em adoecimento. De maneira geral, o objetivo das pesquisas é o de compreender melhor as razões das faltas ao trabalho, para que seja possível subsidiar estratégias de proteção e promoção de saúde do docente e, concomitantemente, melhorar o aproveitamento escolar (Chen, 2016; Soares & Silva, 2002; Spósito & Gimenes, 2014; Altoé, 2010).

Flores et al. (2016) indicaram que, em 2005, a Secretaria de Gestão Pública do Estado de São Paulo realizou um levantamento com o propósito de identificar as causas do absenteísmo dos servidores estaduais. Foram identificadas, dentre as principais, os transtornos mentais e comportamentais. O levantamento apontou ainda que, no ano de 2005, houve 5,5 milhões de faltas, em um contingente de 444 mil servidores da administração direta, não contabilizadas as faltas abonadas previstas em lei. Essas ausências significam que, naquele ano, um trabalhador faltou cerca de dez dias, para cada cem dias contratados.

Como já mencionado, parte das pesquisas consultadas sobre o absenteísmo docente no município de São Paulo é de caráter exploratório, em razão da dificuldade de se obterem os dados necessários para um estudo mais amplo. As investigações que buscaram compreender os tipos de absenteísmo docente e os motivos para isso (Santos, 2006; Gesqui, 2008, 2014) elaboraram formulários próprios para a coleta de dados e, portanto, tiveram um alcance limitado, na medida em que não contemplaram nem mesmo uma amostra das escolas da rede.

Santos (2006), em estudo que investigou o absenteísmo docente no município de São Paulo no período de 2004 a 2005, salientou que o Grupo de Pesquisa em Ciência da Informação e Educação (Ciedu) da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SMESP) não disponibilizava dados referentes às licenças médicas e aos abonos. Seu trabalho de dissertação contemplou cinco escolas, utilizando a distribuição espacial das unidades como critério de escolha da amostra. Foi constatado que o número total de faltas de professores nas escolas pesquisadas e as médias anuais de faltas por professor não se alteravam muito de um ano para o outro, levando à conclusão de que faltar, ao menos nesse município, parecia fazer parte da cultura escolar.

Gesqui (2008, 2014) acompanhou 12 turmas de ensino fundamental, ciclo II, de uma escola pública localizada na Grande São Paulo. Nela, o autor coletou e registrou, durante os 200 dias letivos, informações sobre a frequência diária dos professores, os tipos de falta e as justificativas dadas. Desse modo, identificou que parte dos afastamentos ocorridos no decorrer da pesquisa se enquadrava em dispositivos legais e que apenas 64,4% do total de aulas previstas foram ministradas pelos docentes titulares das disciplinas. Dessas faltas, 15,4% eram legalmente previstas e foram supridas com professores eventuais. Nas demais situações, as aulas ficaram vagas ou os alunos foram dispensados pela própria escola, já que as faltas careciam de amparo legal e, portanto, não poderiam ser cobertas por professores eventuais. O autor apontou, também, que essas faltas não eram oficialmente registradas e se davam com a conivência do diretor escolar, correspondendo ao que o autor chamou de “acerto caseiro”. Havia, ainda, as faltas classificadas como “playcenter”, pois funcionavam como um saldo de horas que o professor acumulava ao exceder seu horário de trabalho com os alunos em atividades fora da escola.

O controle das faltas dos docentes na unidade escolar ocorria, de acordo com Gesqui (2014), mediante a assinatura do professor no livro de ponto. O inspetor de alunos registrava em planilha própria o comparecimento de cada docente, e o secretário da escola comparava os dois registros para efetuar o pagamento. Em caso de ausência, o professor entregava ao secretário um documento que justificasse a falta, seja um atestado médico ou uma solicitação de falta abonada. O secretário, por sua vez, registrava a justificativa no livro de ponto por meio de código próprio, e, ao final de cada mês, o diretor da escola era chamado a deferir (ou não) as justificativas apresentadas. Finalmente, elas eram registradas na ficha de frequência (oficial) do professor.

Tendo em vista a possibilidade de haver professores substitutos ou eventuais, tal como mencionado por Gesqui (2014), a referida função, renomeada como professor em complementação de jornada (CJ) na rede municipal de São Paulo, foi, a partir de 2007, investigada por Americano (2011), por meio de pesquisa qualitativa e, portanto, sem pretensões generalizantes. As atribuições do professor CJ resumiam-se a substituir os professores regentes e a realizar atividades que pudessem auxiliar estes últimos e, também, os alunos com dificuldades. Destaca-se, na pesquisa, que a exaustiva ação de substituição de professores se dava de maneira desarticulada em relação à atuação do professor titular, isto é, servia apenas como um recurso para os alunos “não ficarem sem professor”, situação que ocasionava fragmentação curricular.

Jacinto (2016), em sua dissertação de mestrado, conduziu uma pesquisa qualitativa, na qual investigou as faltas docentes em duas unidades escolares do distrito Jardim Ângela, em São Paulo. Os dados, referentes aos anos de 2013 e 2014, foram pesquisados em documentos das instituições e por meio de entrevistas com os professores de língua portuguesa e matemática, para que fosse possível entender os motivos das faltas. O autor fez, assim, um descritivo dos tipos de faltas docentes registradas pelas escolas mensalmente. Chama atenção a conclusão alcançada no estudo: a de que os professores, como um todo, utilizavam as faltas de tipo abonadas, considerando-as como direitos a serem usufruídos, implicando que faltavam porque existia oportunidade para isso e sem prejuízos em termos de carreira e salário.

Tavares et al. (2009) verificaram que, na rede estadual de educação de São Paulo, em um único dia letivo, cerca de 12 mil professores efetivos estiveram ausentes das salas de aula. Além disso, 90 horas-aula foram perdidas por não haver substituições, o que causava, além do prejuízo para os processos de ensino e de aprendizagem, desperdício financeiro de monta. Dessa maneira, em 2006, conforme indicado pelos autores, foram gastos R$ 235,4 milhões para cobrir os custos do absenteísmo observado na Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP). Considerando a média de faltas, os professores ausentaram-se por 18 dias no ano, o que corresponde a 8% dos dias letivos.

Finalmente, a pesquisa de Tavares e Honda (2021) analisou, a partir de informações da rede estadual paulista, do Censo Escolar e do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) de 2007, os fatores associados ao absenteísmo docente, empregando um modelo que relaciona as faltas dos professores aos seus atributos (idade, tempo de serviço, entre outros), às características das escolas e às dos alunos. Os resultados mostraram que as faltas se associam a “problemas de saúde, ao custo de oportunidade e às chances de ser punido” (Tavares & Honda, 2021, p. 601). Escolas com alunos com menor poder aquisitivo e más condições de trabalho eram as que contavam com mais faltas, indicando que a decisão de não comparecer ao local de trabalho se devia também ao ambiente institucional. Em termos de recomendações, os autores sugeriram que, para diminuir o absenteísmo, seria preciso políticas públicas que considerassem o perfil da escola e o do professor.

Tendo em vista que apenas as faltas foram consideradas na definição de absenteísmo, as licenças foram encaradas, na presente pesquisa, como ausências, uma vez que o afastamento do professor gera, na ampla maioria das vezes, um problema para a gestão da escola, além de afetar negativamente o clima escolar e a qualidade da educação. Levando isso em consideração, o absenteísmo foi, neste estudo, definido como um fenômeno que contempla faltas parciais, faltas totais e todas as licenças definidas legalmente (licença-maternidade, nojo, gala, saúde, etc.).

O Estatuto do Funcionário Público do Município de São Paulo estabelece que os funcionários públicos podem solicitar afastamento do exercício de suas funções em várias circunstâncias: por meio de licenças para realizar tratamentos de saúde; em casos de doenças em pessoas da família; para cumprir serviços obrigatórios por lei; e para cuidar de interesses particulares. Além das faltas por motivos de saúde e das faltas voluntárias, são previstas as ausências compulsórias em caso de doenças infectocontagiosas e de licenças por acidentes de trabalho ou por doença profissional, conforme descrito nos incisos I, II e IV a VII, de seu artigo 138. Outro mecanismo previsto na lei são os abonos, situações em que o funcionário falta, mas não é descontado financeiramente. Ao longo de um ano, o funcionário público da Prefeitura de São Paulo pode ter dez abonos, não excedendo dois por mês. No entanto, a falta abonada deve ser por motivo justificado, a critério de autoridade competente (art. 92, Lei n. 8.989, 1979).

O Decreto n. 24.146 (1987), que regulamenta aspectos do Estatuto do Funcionário Público do Município de São Paulo, classifica, em seu artigo 2º, as faltas dos funcionários públicos municipais em: “a) abonadas; b) justificadas; c) injustificadas, além de destacar as faltas por ‘doação de sangue’ e para ‘comparecer a exames e provas escolares’”. Dessa forma, o servidor que tiver sua falta abonada não terá nenhum desconto em seu salário nem prejuízo em sua evolução na carreira (art. 3o, Decreto n. 24.146, 1987). Já as faltas justificadas podem ser até seis ao ano e, diferentemente das abonadas, acarretam descontos nos vencimentos, mas, ainda, sem nenhum outro efeito na carreira do funcionário. As faltas injustificadas podem, por sua vez, chegar a até sessenta ao ano, desde que interpoladas - compreendendo até 30 dias de forma consecutiva -, e acarretam desconto nos vencimentos e prejuízos para efeitos de evolução na carreira. Nesse sentido, há a previsão legal de que, em casos extremos, os docentes possam se ausentar do trabalho, ao longo de um ano, por 76 dias, utilizando-se de faltas justificadas, injustificadas e abonadas (Santos, 2006).

Procedimentos metodológicos

O estudo desenvolveu-se em duas etapas, uma de natureza quantitativa e outra, qualitativa. A primeira etapa teve por propósito verificar como se configurava o absenteísmo por tipo de ausência dos servidores públicos da SMESP e aprofundar a análise estatística do quadro do magistério, considerando variáveis relacionadas à carreira e à jornada de trabalho. Para a realização dessa etapa, foi concedido acesso ao banco de dados dos servidores municipais da Secretaria Municipal de Educação.

A etapa qualitativa, por meio da seleção de uma amostra intencional de vinte escolas vinculadas às diferentes Diretorias Regionais de Educação (DRE) do município, buscou conhecer quais eram as estratégias empregadas pelas instituições para lidar com as ausências, e, também, compreender algumas concepções dos sujeitos sobre o tema. Foram definidos como critérios de seleção das escolas os seguintes: número médio de ausências de servidores públicos na unidade escolar, no ano de 2018; localização da escola, a fim de contemplar todas as DRE; e complexidade de sua gestão (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira [Inep], 2014).

Procedeu-se à análise descritiva dos dados, iniciando-se, primeiramente, por uma análise longitudinal do período de 2009 a 2018, sobre os tipos de ausência, relacionados aos grupos de servidores pertencentes à SMESP (quadro do magistério - MAG; quadro de especialistas - ESP; quadro de apoio - APO; e outros funcionários - OUT). Em seguida, elaborou-se uma análise mais aprofundada das ausências dos servidores do quadro do magistério, no ano de 2018, na qual foram associadas variáveis de perfil do professor, carreira, condições de trabalho e jornada à média de eventos de ausência no ano e à média de dias de ausência no ano.

A hipótese de pesquisa aqui explorada é a seguinte: professores com maior carga horária de trabalho ou que apresentam mais de um vínculo profissional faltam mais do que os demais?

A previsão inicial era a de entrevistar, em cada uma das escolas, o diretor, os coordenadores pedagógicos e um único professor, indicado pelo coordenador pedagógico como sendo um profissional assíduo.2 Ao todo, nas 20 unidades escolares selecionadas, foram entrevistados 20 diretores, 21 coordenadores pedagógicos (distribuídos em 19 escolas) e 18 professores assíduos. No que tange aos professores, não foi possível a realização da entrevista em duas escolas, dado que os docentes indicados optaram por não participar dessa etapa da pesquisa.

As entrevistas tiveram diferentes propósitos. A do diretor explorou os tipos de ausências que ocorriam na escola e as estratégias utilizadas para lidar com as faltas dos professores (seja para desestimulá-las, seja para manter o bom funcionamento da escola, quando em número excessivo). Buscou-se também entender o que a ausência docente acarreta à gestão escolar, em termos de prejuízos ou dificuldades. Já a entrevista com os coordenadores pedagógicos buscou compreender quais eram, na opinião deles, os motivos da ausência docente, bem como explorar o perfil dos docentes que mais faltam e, ainda, o dos professores assíduos. Foi-lhes perguntado também que tipo de obstáculos ou dificuldades a ausência docente acarretava para o trabalho pedagógico. Finalmente, em relação ao professor indicado pelo coordenador, a entrevista investigou os motivos que levavam seus colegas de trabalho a faltar e as dificuldades que a ausência docente gerava para a escola e, em específico, para o trabalho dele. Buscou-se explorar, também, o motivo pelo qual o entrevistado não faltava, para entender melhor as razões da assiduidade. Todas as entrevistas seguiram roteiros elaborados previamente por categoria profissional e pré-testados antes da entrada em campo dos pesquisadores, que receberam orientações específicas a respeito de como os aplicar.

Os dados qualitativos obtidos nas entrevistas foram submetidos à análise de conteúdo categorial (Bardin, 2011), com o propósito de identificar as temáticas explicitadas pelos sujeitos que participaram da pesquisa. O tratamento dos dados ocorreu mediante a tabulação das informações, sua codificação e classificação em categorias, definidas a posteriori e analisadas, inicialmente, para cada um dos segmentos profissionais (diretor, coordenador pedagógico e professor). Em seguida, elaborou-se uma síntese com os principais resultados obtidos em cada um dos referidos segmentos, procurando identificar, neles, os aspectos sobre os quais havia convergências, divergências e contradições. Ou seja, os dados sistematizados foram triangulados, o que resultou em um quadro síntese das categorias discutidas pelos profissionais da educação, que será apresentado neste artigo.

É importante ressaltar que as opiniões dos sujeitos não refletem o conjunto das unidades escolares do município de São Paulo, dado que a pesquisa foi realizada em uma amostra de apenas vinte unidades. Entretanto, as manifestações coincidentes apontam dificuldades que gestores e professores enfrentam em suas rotinas de trabalho e algumas concepções sobre compromisso profissional e organização escolar, que podem trazer contribuições para pensar o absenteísmo na rede de ensino como um todo e levantar possíveis estratégias para atenuar o problema.

Apresentação e interpretação dos resultados

A análise descritiva do banco de dados dos servidores da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo foi realizada por meio do desenvolvimento de um estudo longitudinal, entre os anos de 2009 e 2018, e do aprofundamento analítico de informações sobre a vida do servidor público nela alocado.

Sobre essa análise, serão apresentados o número médio de ausências,3 faltas e licenças, bem como o número médio de dias em que o servidor se ausentou ou faltou ou tirou licença. As informações estão organizadas por categorias de profissionais existentes, sendo MAG o profissional pertencente ao quadro do magistério; ESP, especialista (coordenador pedagógico, diretor); APO, quadro de apoio (secretárias, inspetor de alunos); e OUT, outros funcionários, como o pessoal de limpeza e os merendeiros.

A Figura 1 estabelece uma comparação entre as quatro categorias de servidores e indica que o número médio de ausências dos servidores do quadro do magistério é maior. As demais figuras comparam as ausências dos servidores ao longo do tempo e seguem o mesmo padrão de registro para que se possa identificar, mais facilmente, os dados dos funcionários pertencentes ao quadro do magistério.

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 1 Número médio de ausências, por servidor, no ano  

O número médio dos eventos de ausência por servidor do tipo MAG está em torno de 6,6 por ano, variando de 4,91 em 2009 a 7,38 em 2016, tal como indicado na Figura 1. É importante esclarecer que a informação sobre o número médio de ausência destaca a frequência do fenômeno ao longo dos anos, mas não informa o número de dias que o servidor ficou afastado. Assim, os dados também foram organizados para indicar o número médio de dias que o servidor esteve ausente no ano de 2018, conforme apresenta a Figura 2.

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 2 Número médio de dias de ausência, por servidor, no ano  

Considerando o número médio de dias de ausência por servidor, a Figura 2 mostra que ele é expressivamente alto em relação ao número de eventos ocorridos, tal como indicado na Figura 1. Para servidores do tipo MAG, ele fica em torno de 30,5 dias por servidor por ano, variando de 24,51 em 2013 a 37,77 em 2016. Isso significa que, em um ano letivo, os servidores do tipo MAG se afastam, aproximadamente, por um mês.

Os casos de afastamento por licenças indicam que os servidores do tipo MAG também apresentam, ao longo de dez anos, um número médio de licenças maior do que os demais servidores municipais (Figura 3).

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 3 Número médio de licenças, por servidor, no ano 

De acordo com as informações da Figura 3, o número médio de licenças do servidor do tipo MAG é de 1,8 licença por ano. Se considerado o número médio de dias de licença, ilustrado na Figura 4, os servidores do tipo MAG afastaram-se em torno de 24 dias, apresentando o maior número de dias de licenças em relação às demais categorias de servidores municipais.

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 4 Número médio de dias de licença, por servidor, no ano  

Ao observar o conjunto de faltas ao longo de todos os dez anos estudados, é possível notar, na Figura 5, que os servidores do tipo MAG apresentam um número médio de faltas por servidor maior que os demais servidores municipais.

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 5 Número médio de faltas, por servidor, no ano 

Se o número médio de faltas por servidor do tipo MAG esteve em torno de 5 eventos por ano, como indica a Figura 5, o número médio de dias de faltas foi em torno de 7 dias por ano, tendo variado de 5,24 em 2009 a 8,10 em 2012 (Figura 6).

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 6 Número médio de dias de falta, por servidor, no ano 

Ao contabilizar o número médio de faltas, excluindo as abonadas, verifica-se que os servidores do tipo MAG, ao longo de todos os dez anos, apresentam um número maior que os demais servidores municipais (Figura 7): o número médio de faltas (exceto abonadas) por servidor do tipo MAG fica em torno de 1 por ano, tendo variado de 0,76 em 2009 a 1,18 em 2011. Ou seja, os profissionais do magistério apresentam mais faltas justificadas e injustificadas do que os demais servidores.

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 7 Número médio de faltas (exceto abonadas), por servidor, no ano 

A análise descritiva para aprofundar as informações especificamente sobre o quadro do magistério foi realizada após o estudo longitudinal apresentado, por meio do estabelecimento de relações entre número de ausências e dias de ausências com variáveis de perfil, de carreira, de jornada e de condições de trabalho. Não sendo possível apresentar todas as análises realizadas, serão explicitadas as informações mais relevantes, relativas a dados de frequência que destacam diferenças importantes entre os profissionais do magistério.

Em primeiro lugar, fazendo o cruzamento do tempo de carreira com o número de eventos de ausência, obtém-se a seguinte informação, conforme Tabela 1.

Tabela 1 Tempo de carreira do servidor do quadro do magistério, por registro funcional, até 1º jan. 2018, segundo o número de ausências 

Tempo de carreira Ausências
Nenhuma % 1 a 10 % 11 a 20 % Mais de 20 % Total %
Menos de 5 anos 317 16,1 10.788 30,3 2.914 22,5 397 13,0 14.416 26,9
Entre 5 e 15 anos 799 40,7 13.712 38,5 5.489 42,3 1.406 46,1 21.406 39,9
Entre 15 e 25 anos 667 33,9 9.455 26,5 3.988 30,8 1.154 37,9 15.264 28,5
25 anos ou mais 182 9,3 1.679 4,7 578 4,5 90 3,0 2.529 4,7
Total 1.965 100 35.634 100 12.969 100 3.047 100 53.615 100

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Nota-se, pela Tabela 1, que, no conjunto dos professores que não se ausentam, cerca de 40% deles possuem entre 5 e menos de 15 anos de carreira e 33,9% entre 15 e menos de 25 anos. No grupo que apresenta de 1 a 10 ausências, 30,3% possuem menos de 5 anos de carreira; 38,5%, entre 5 e menos de 15 anos; e 26,5%, entre 15 e menos de 25 anos. Entre os que têm 11 a 20 ausências, destacam-se os indivíduos com tempo de carreira entre 5 anos até 25 anos, pois são os que concentram a maior quantidade de ausências. Nota-se que os servidores que menos se ausentam são os professores com menos experiência e aqueles em vias de se aposentar, diferentemente dos professores que estão no meio da carreira. Algumas possíveis explicações para isso, mas que precisariam ser exploradas com maior profundidade, consistem no fato de os professores entre 5 e 25 anos de carreira estarem em uma fase da vida mais conturbada, exigindo a conciliação da vida familiar com o trabalho.

A Tabela 2 indica o cruzamento da variável situação funcional do servidor com o número de eventos de ausência. A situação funcional está relacionada ao tipo de contratação do profissional, observando-se que, de modo geral, os servidores efetivos faltam mais do que os contratados. No entanto, esses últimos superam os efetivos na categoria de 1 a 10 eventos de ausência, o que pode estar relacionado à possibilidade legal de abono.

Tabela 2 Ausência dos servidores do quadro MAG, segundo situação funcional, em 2018 

Situação funcional Sem ausência % 1 a 10 ausências % 11 a 20 ausências % Mais de 20 ausências % Total %
Efetivo 1.857 3,5 34.882 66,4 12.778 24,3 3.034 5,8 52.551 100
Contratado 87 10,5 598 72,0 137 16,5 8 1,0 830 100
Outros 21 9,0 154 65,8 54 23,1 5 2,1 234 100
Total 1.965 3,7 35.634 66,5 12.969 24,2 3.047 5,7 53.615 100

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Associando as informações relativas à carga horária semanal dos servidores do quadro do magistério com o número de eventos de ausências cometidos em 2018, obtém-se a informação, como mostra a Tabela 3, de que os funcionários que têm menos de 30 horas e aqueles que têm 30 horas semanais concentram suas ausências em torno de 1 a 10 eventos, enquanto há, entre os servidores com mais de 40 horas, uma proporção maior de sujeitos com mais de 20 eventos de ausência no ano. Isso parece significar que a ampliação da carga horária é um fator que favorece o aumento de faltas dos servidores do quadro do magistério municipal. Com base nos dados obtidos nas entrevistas realizadas com profissionais da educação, foi possível explicar esse fenômeno por meio da exposição maior desses professores a situações de estresse e a condições de trabalho mais extenuantes.

Tabela 3 Carga horária dos servidores do quadro MAG por número de ausência, em 2018 

Carga horária Sem ausência % 1 a 10 ausências % 11 a 20 ausências % Mais de 20 ausências % Total %
Menos de 30 horas 182 3 3.881 70 1.424 26 96 2 5.583 100
30 horas 835 2 25.329 74 7.577 22 393 1 34.134 100
40 horas 2 8 15 60 5 20 3 12 25 100
Mais de 40 horas 944 7 6.407 46 3.963 29 2.555 18 13.869 100
Total 1.963 4 35.632 67 12.969 24 3.047 6 53.611 100

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Na Figura 8, estabeleceu-se a relação entre o número de ausências e o cargo-base do servidor. Verificou-se que os professores com mais de um cargo-base tendem a se concentrar, em termos de número de ausências, nas categorias “11 a 20 ausências” ou “mais de 20 ausências”, diferentemente dos professores que contam com apenas um cargo-base. Nesse sentido, os dados parecem indicar que, quanto maior a carga de trabalho do professor, maior a tendência de que ele se ausente com mais frequência.

Fonte: Elaboração dos autores, com base em dados de Ciedu/SMESP.

Figura 8 Proporção de número de ausências do servidor do quadro MAG por quantidade de cargo-base, em 2018  

Finalmente, considerando as entrevistas realizadas, as condições de trabalho afetam muito o clima escolar, aspecto apontado tanto por professores quanto por diretores e coordenadores pedagógicos como obstáculo que desestimula o trabalho docente. Conforme indicado pelos participantes, más condições de trabalho são as que envolvem a desvalorização dos professores, o excesso de alunos nas salas de aula, a falta de professores substitutos, de funcionários de apoio e de professores em determinadas disciplinas, em razão de licenças médicas e/ou de não preenchimento de vagas para docentes. Estas últimas, particularmente, criam muitos problemas para as escolas. Os participantes, embora tenham afirmado que o professor adoece em razão das condições de trabalho, do estresse e do cansaço, se sentem incomodados com essa modalidade de licença, na medida em que os procedimentos periciais são lentos e a substituição do profissional igualmente morosa, havendo até casos nos quais ela não ocorre.

Já as faltas abonadas tendem a ser consideradas um direito do professor, havendo aqueles que as utilizam mesmo sem necessidade. Esse recurso é também muito utilizado em razão da relativa facilidade para se obter um atestado médico que justifique a falta abonada. Ademais, os gestores, muito embora procurem dialogar e negociar com os docentes para que eles não faltem, sentem-se impotentes para levar os professores a diminuir o número de faltas, uma vez que o amparo legal e a rigidez dos procedimentos administrativos os imobilizam.

Um aspecto que chamou a atenção nos resultados foi o incômodo demonstrado em relação aos alunos, principalmente por parte dos professores e coordenadores pedagógicos, já que entendem serem eles uma das causas das faltas e licenças. Assim, parte da responsabilidade pela ausência docente foi imputada aos próprios estudantes em razão de indisciplina, violência, falta de educação e vulnerabilidade social, bem como pela falta de apoio de suas famílias.

Do conjunto de depoimentos coletados nas escolas, foram identificados quatro temas/categorias centrais:

  1. motivações das ausências docentes e suas possíveis consequências;

  2. prejuízos causados pelas faltas docentes, na gestão escolar;

  3. procedimentos e estratégias de organização escolar, em função das faltas docentes;

  4. aspectos que poderiam ser mudados em relação ao quadro atual das faltas docentes, na perspectiva dos participantes da pesquisa.

Motivações das ausências docentes e possíveis consequências

No conjunto das respostas dadas pelos diferentes sujeitos, destaca-se a compreensão de que as condições de trabalho docente constituem um dos principais fatores que ensejam a ausência dos professores. Essas condições envolvem, além de questões salariais, outras afeitas ao plano de carreira, ao acúmulo de cargos e à falta de pessoal para substituir professores faltantes, ao relacionamento com os estudantes, que parece ser bastante difícil em função da quantidade de alunos em sala de aula, de sua indisciplina e de seu desinteresse pelos estudos, além de sua alta vulnerabilidade social. Na maioria dos casos, os problemas de saúde foram associados às más condições de trabalho, perspectiva preponderante na narrativa desses profissionais. Não raro, o adoecimento de professores, tal como percebido pelos respondentes, está vinculado ao “cansaço” ou “estresse”. Nas palavras de uma diretora:

Os professores faltam porque adoecem. Temos um número grande de pessoas com depressão, com crise de ansiedade, não só na educação. Isso vem interferindo. Temos salas lotadas e acredito que isso ajude a agravar os casos, porque é extremamente difícil trabalhar assim.

Por vezes, essa situação decorre do acúmulo de cargos de parte dos professores, o que implica sobrecarga de trabalho e, não raro, adoecimento. No caso das faltas abonadas, há o reconhecimento de que o docente dispõe dessa prerrogativa legal, que é faltar sem nenhum prejuízo para sua carreira profissional. Algumas coordenadoras também endossaram esse aspecto, ao destacarem haver o “entendimento, na rede, de que a falta é um direito” e de que a legislação é frágil, no sentido de viabilizar o enfrentamento dessa prática.

Prejuízos das faltas docentes na gestão escolar

Evidentemente, as faltas docentes têm efeitos na gestão e no cotidiano escolar. Mas isso se agrava, de forma especialmente acentuada, quando a escola não dispõe de meios para substituir os professores faltosos, seja pela oferta insuficiente de docentes modulares (que, não raro, têm, alegadamente, substituído os que tiram licenças longas), seja pela dificuldade em conseguir docentes substitutos de última hora, ou seja, de maneira inesperada e não prevista antecipadamente.

Em linhas gerais, os participantes da pesquisa afirmaram que as ausências, notadamente aquelas que não são avisadas com antecedência, prejudicam a rotina de organização da escola no que tange ao planejamento dos professores, ao deslocamento de profissionais que se ocupam de outras funções para lecionar ou “cuidar” dos estudantes, ao atraso na realização do serviço dos profissionais que substituem os professores e, ainda, ao remanejamento dos horários de merenda escolar e às consequências para a limpeza da escola.

Já em relação aos problemas que as faltas docentes causam aos alunos e ao seu processo formativo, contrariamente ao previsto, poucos foram os diretores que destacaram essa questão. Os que a mencionaram disseram que o professor faltoso:

Prejudica o aluno em suas atividades planejadas. Exige do professor substituto o planejamento da aula, de modo que os alunos percebam que a aula continuará a ter importância. Também causa indisciplina, pois os alunos ficam testando o professor substituto. (Diretor).

Leva à diminuição do rendimento dos alunos, devido ao aumento da indisciplina escolar, pois eles não querem outro professor e começam a elaborar ações para atrapalhar. A indisciplina seria uma manifestação de resistência. (Diretor).

Para o aluno, o prejuízo é enorme, porque atrapalha a sequência, principalmente nos casos em que não se consegue substituição para os professores em licença. Acredito que esse é um dos maiores entraves da escola pública. (Diretor).

Procedimentos e estratégias de organização escolar em função das faltas docentes

De modo geral, a organização e a gestão das unidades escolares em relação às faltas parece ter como pressupostos - ou como linha geral de ação - o “diálogo” e a “negociação” constantes com os docentes, em especial com aqueles com faltas em excesso, excetuando-se as faltas por licenças médicas. Um diretor afirmou, por exemplo, que seria preciso “tratar os casos de forma individualizada”, não “penalizando professores que estejam enfrentando problemas particulares graves”. Em outra fala, uma diretora considerou ser necessário:

Um trabalho de convencimento. Reconhecer a importância do papel de professor e de o professor estar aqui. A legislação permite que ele marque consultas. Não existe um limite para isso. Há, também, as folgas do TRE, que o servidor tem direito de gozar, uma vez que prestou serviços para esse órgão, como, por exemplo, ter trabalhado nas eleições. Por exemplo, eu tenho uma colega em licença médica e eu não tenho um professor que fique no lugar dela. Como eu posso segurar essa minha folga TRE? Posso segurar esse meu abono? É nesse sentido. Mas, legalmente, existe essa possibilidade, sim.

Essa perspectiva é referendada pelos coordenadores pedagógicos, que agregam a esse diálogo a necessidade de “promover a reflexão, conscientizar os professores sobre as implicações das faltas para a escola e para a aprendizagem dos alunos”.

Em que pese a dificuldade para evitar licenças e a maior parte dos tipos de falta previstos, parece ser generalizado, no universo das escolas pesquisadas, o estabelecimento de estratégias que incidem diretamente na falta abonada, que é dependente da anuência do diretor escolar. Nesses termos, é comum que as escolas adotem o critério de conceder certo número de abonos por período (em geral, apenas dois), a depender do tamanho do grupo de professores e do número de salas de aula em funcionamento.

Uma vez confirmada ou prevista a ausência do professor, diferentes procedimentos são adotados. Tem-se evitado, de forma generalizada, dispensar os alunos quando o docente falta, já que a aula não pode ser substituída. Assim, em casos extremos, são adotadas medidas paliativas, como a divisão e distribuição de alunos de uma determinada turma sem professor entre as demais turmas de mesma série e até mesmo de séries distintas, em especial nas escolas de menor porte. Essa situação foi motivo de queixa tanto de professores quanto de coordenadores, que disseram ter de reorganizar o planejamento feito para o dia ou assumir tarefas que não lhe competiam.

O que poderia ser mudado em relação ao quadro atual das faltas docentes na perspectiva dos sujeitos respondentes da pesquisa

Para a maioria dos respondentes, as mudanças que devem ser efetuadas para mudar o quadro atual das faltas docentes se relacionam, principalmente, à:

  • Melhoria das condições de trabalho: diminuição de alunos por turma; ações para combater a indisciplina e o desinteresse pelos estudos; contratação de mais professores.

  • Valorização dos professores: melhoria da carreira docente, bem como dos salários, para evitar o acúmulo de cargos; investimento na formação continuada e nos professores assíduos; apoio a projetos solicitados pelos docentes.

  • Melhoria das ações voltadas à saúde dos professores: melhoria do Departamento de Saúde da prefeitura; fiscalização e revisão das licenças médicas longas; oferta de horários de consultas que não entrem em conflito com o horário de trabalho do servidor.

  • E, por fim, com menos indicações, revisão da legislação que trata da ausência dos pro- fessores, estabelecendo novos parâmetros para ela.

Considerações finais

Com base nas percepções dos participantes sobre o fenômeno do absenteísmo, é possível afirmar que mudanças na política de recursos humanos e ações que afetam o cotidiano da escola são fatores a serem considerados na explicação de um fenômeno que é, notadamente, multifatorial. As licenças médicas criam problemas para as escolas, e, embora os profissionais denunciem que o professor adoece por causa das condições de trabalho, do estresse e do cansaço, eles também se sentem incomodados com essas licenças, na medida em que os procedimentos periciais demoram e a substituição do profissional é lenta ou não ocorre. Sobre as faltas abonadas, elas são tratadas como direitos do professor, e, mesmo sem necessidade, os participantes disseram que há professores que as utilizam. Destaca-se, também, a relativa facilidade para conseguir um atestado médico que justifique a falta abonada. Os próprios gestores sentem-se impotentes e sem amparo legal para diminuir o número de faltas docentes, pois procedimentos administrativos são rígidos e imobilizantes, restando-lhes apenas dialogar e tentar negociar com o docente para que ele não falte.

Professores e coordenadores pedagógicos relataram se sentirem profundamente constrangidos e incomodados com o fato de os alunos serem apontados como uma das “causas”, segundo alguns professores, de suas faltas e licenças. Essa fala, de fato, acaba por imputar aos alunos e a suas famílias parte da responsabilidade pela ausência docente, que decorreria da indisciplina, da violência, da falta de educação do aluno, de sua vulnerabilidade social e da falta de apoio da família no que concerne à escola e aos docentes. Além disso, a percepção dos profissionais da educação sobre as condições de trabalho como um fator ligado ao absenteísmo confirma conclusões apontadas pela literatura consultada, bem como a presença de fatores estressores, que resultam em adoecimento.

A bibliografia estudada também indicou que as faltas docentes parecem fazer parte de uma cultura escolar (Santos, 2006). No estudo realizado, a identificação do abono como um direito do professor coaduna-se com a ideia de que a falta constitui um aspecto de uma cultura escolar, o que significa que o comportamento de faltar se converteu em uma postura institucional, reforçada pela compreensão (distorcida) dos professores a respeito da legitimidade de se ausentarem de seus postos de trabalho.

Mostra-se urgente e necessário, para a conquista do direito à educação pública de boa qualidade, que os cursos de formação inicial e continuada para o magistério salientem muitas vezes quão importante é a presença dos professores na escola, fundamental que é para que se possa assegurar aos alunos tanto a aprendizagem prevista no currículo quanto uma trajetória escolar bem-sucedida. Nesse sentido, as vítimas da desorganização causada pelas ausências dos professores nas salas de aula - os alunos da escola pública e suas famílias - não deveriam ser responsabilizadas por esse problema.

Além disso, mostra-se igualmente central trabalhar com as significações que os docentes dão a seu contrato de trabalho, já que há controvérsias quanto ao fato de as faltas abonadas se configurarem como “direito de faltar” dessa categoria profissional. Se essa representação existe, ela possivelmente decorre de políticas públicas que, no passado, na tentativa de amenizar o trabalho docente, acabaram por ocasionar muitas dificuldades para os que estão sistematicamente na escola e para o desenvolvimento de um projeto pedagógico consistente e focado nos processos de ensino e de aprendizagem.

Nesses termos, a superação do fenômeno do absenteísmo docente parece requerer que se invista em várias frentes de ação pública, na tentativa de: (a) melhorar as condições de trabalho dos professores, a fim de evitar o excessivo cansaço, estresse e adoecimento que atualmente os acometem, em especial diminuindo o número de alunos por sala de aula, não autorizando o acúmulo de cargos e fazendo melhorias salariais e investindo mais na carreira docente; (b) modificar as crenças que docentes parecem ter acerca de suas responsabilidades e direitos; (c) agilizar a fiscalização das dispensas médicas e aprimorar o atendimento à saúde do quadro do magistério; e, finalmente, uma vez cumpridas as anteriores, (d) aprimorar a legislação, que se mostra hoje permissiva em relação ao número de ausências que cada docente pode ter sem prejuízos para sua carreira e salário, e frágil quanto às providências passíveis de coibirem o absenteísmo docente. Não se trata, de maneira alguma, de penalizar o professor, e sim de desencadear uma série de medidas que, em articulação, podem contribuir para que seja atenuado o absenteísmo, favorecendo a ampliação do direito a uma educação de boa qualidade, em uma escola bem gerida, que conte com docentes satisfeitos com o magistério e por isso assíduos, cientes da importância de seu papel educativo e social.

Disponibilidade de dados

Os dados subjacentes ao texto da pesquisa estão informados no artigo.

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1O clima organizacional é o resultado das percepções e sentimentos dos sujeitos inseridos em uma corporação, afetando a produtividade das pessoas de forma positiva ou negativa. Na escola, o conceito tem sido substituído por “clima escolar”, referindo-se também ao conjunto das percepções dos sujeitos, mas sobre dimensões específicas do espaço escolar e que deve englobar: atividade de ensino, relações entre professores e com a comunidade escolar, processos pedagógicos e administrativos próprios da organização escolar, objetivos e princípios que norteiam o trabalho educacional, entre outros (Melo & Morais, 2019; Vinha et al., 2016).

2A escolha por entrevistar um professor assíduo relaciona-se ao fato de que ele poderia fornecer informações menos tendenciosas sobre as possíveis implicações da falta docente para o trabalho da escola e, especificamente, para o conjunto de seus professores.

3Por ausência compreende-se a soma das frequências de faltas e ausências dos servidores alocados na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.

Recebido: 28 de Outubro de 2022; Aceito: 19 de Julho de 2023

Translated by: Fernando Effori de MelloVI

VI

Freelancer; São Paulo (SP), Brazil; feffori@gmail.com

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