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Cadernos de Pesquisa

versión impresa ISSN 0100-1574versión On-line ISSN 1980-5314

Cad. Pesqui. vol.53  São Paulo  2023  Epub 30-Mayo-2023

https://doi.org/10.1590/198053149601 

FORMAÇÃO E TRABALHO DOCENTE

EU, NÓS E OS OUTROS: DESAFIOS DOCENTES PARA ENSINAR

YO, NOSOTROS Y LOS OTROS: DESAFÍOS DOCENTES PARA ENSEÑAR

MOI, NOUS ET LES AUTRES: LES DÉFIS DE L’ENSEIGNEMENT

IUniversidade Federal de Fronteira Sul (UFFS), Cerro Largo (SC), Brasil; livio.arenhart@uffs.edu.br

IIUniversidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó), Chapecó (SC), Brasil; martk@outlook.com.br


Resumo

O enfrentamento reflexivo-discursivo das aporias pedagógicas é uma possibilidade de pensar o aprender e o não aprender de estudantes. A pergunta que guia este trabalho é a seguinte: considerando nossas experiências de dificuldades como alunos, que estilo de docência possibilitou que nossos professores obtivessem sucesso em nossas aprendizagens? Reflete-se acerca da pertinência do enfrentamento pensante das aporias pedagógicas nos processos de aprender/não aprender de estudantes escolares. Organiza-se a reflexão em seis passos, com a intenção de sustentar que o sucesso pedagógico dos professores com alunos com ritmos singulares de aprendizagem passa pelo reconhecimento e pelo enfrentamento das aporias inerentes ao processo educativo.

Palavras-Chave: PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM; DOCÊNCIA; DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Resumen

La confrontación reflexivo-discursiva de las aporías pedagógicas es una posibilidad para pensar el aprender y el no aprender de los estudiantes. Así pues, se formuló la pregunta orientadora: Teniendo en cuenta nuestras propias experiencias de dificultades con los estudiantes, ¿qué estilo de enseñanza ha permitido a nuestros profesores tuviesen éxito en nuestro aprendizaje? Se refleja sobre la pertinencia de la confrontación pensante de aporías pedagógicas en los procesos de aprendizaje/no aprendizaje de los escolares. La reflexión se organiza en seis pasos, con la intención de sostener que el éxito pedagógico de los profesores con alumnos con ritmos de aprendizaje únicos implica el reconocimiento y enfrentamiento de las aporías inherentes al proceso educativo.

Palabras-clave: PROCESO DE ENSEÑANZA-APRENDIZAJE; ENSEÑANZA; DIFICULTADES DE APRENDIZAJE

Résumé

L’affrontement réflexif-discursif des apories pédagogiques se présente comme une possibilité de penser l’apprentissage et le non-apprentissage des élèves. Notre question-guide a été formulée: en tenant compte de nos expériences des difficultés en tant qu’élèves, quel style d’enseignement a le mieux permis à nos enseignants de réussir notre apprentissage? On réflechit sur l’à-propos de l’affrontement rationnel des apories pédagogiques dans les processus d’apprentissage/de non-apprentissage des élèves à l’école. La réflexion est structurée en six étapes, dans le but de soutenir que la réussite pédagogique des enseignants concernant des élèves ayant des rythmes d’apprentissages singuliers demande la reconnaissance et l’affrontement des apories inhérentes au processus d’enseignement.

Key words: PROCESSUS D’ENSEIGNEMENT-APPRENTISSAGE; ENSEIGNEMENT; DIFFICULTÉ D’APPRENTISSAGE

Abstract

The reflexive-discursive confrontation of the pedagogical aporias is a possibility of thinking about students’ learning and not learning. The guiding question was formulated as follows: considering our own experiences of difficulties as students, what style of teaching enabled our teachers to succeed in our learning? It reflects on the pertinence of thinking about facing pedagogical aporias in the learning/not learning processes of school students. The reflection is organized in six steps, with the intention of sustaining that the pedagogical success of teachers with students with unique learning rhythms involves recognizing and facing the aporias inherent to the educational process.

Key words: TEACHING-LEARNING PROCESS; TEACHING; LEARNING DIFFICULTY

Em nossa trajetória escolar, salvo em algumas raras situações, ora mais, ora menos, sentíamo-nos “lerdos”. Compartilhamos a impressão de que nossos(as) colegas aprendiam fácil e rapidamente. Talvez fosse esse sentimento de lerdeza que nos motivava a seguir estudando. Curiosamente, alguns professores diziam sermos alunos inteligentes. A nosso ver (retrospectivo), não éramos nós os inteligentes, mas eles, por terem conseguido prender a atenção dos “lerdos” como nós (e de outros, provavelmente). A pergunta didático-pedagógica que guia a reflexão é a seguinte: como esses professores conseguiram isso? Levando a sério a experiência de alunos “lerdos”, como se posicionar em relação à problemática pedagógica? Que tipo de linguagem seria o mais adequado? Que estilo de docência? A partir da problemática anunciada, objetivamos refletir acerca da validade das aporias como conhecimento pedagógico relevante para os processos de aprender/não aprender de estudantes escolares.

Entendemos que essas perguntas remetem a uma questão de fundo: a questão das aporias que se manifestam na relação pedagógica, que podem ser dribladas pelas ciências dos fatos educativos, mas não pela pedagogia em sua tarefa essencial de pensar prospectivamente a ação de docentes, gestores(as) e outros(as) profissionais da educação. Admitamos provisoriamente que o termo “aporia” significa dificuldade de dar continuidade a um raciocínio (Castro, 2017, p. 290). O termo se refere a situações cognoscitivas em que dois polos se opõem e parecem irreconciliáveis, situações que precisam ser explicitamente tematizadas para que o pensamento seja levado adiante (Sobrino, 1982, pp. 42ss.). Reconhecemos, assim, que a ação de ensinar a estudantes “lerdos” extrapola os saberes construídos pelo pensamento simplificador, segundo a lógica dedutivo-identitária, e exige dos(das) docentes a elaboração criativa de saberes a partir dos desafios do mundo prático e, certamente, do multiverso acadêmico.

Assim, respostas às indagações anteriormente levantadas, e desenvolvidas a seguir, convergem para a legitimação argumentativa da tese de que o sucesso pedagógico com alunos com ritmos singulares de aprendizagem passa pelo reconhecimento e pelo enfrentamento das aporias inerentes ao processo educativo. Assim, com efeito, reconhecemos que o trabalho pedagógico, tanto de veteranos(as) quanto de novatos(as), é atravessado por múltiplas aporias (Castro, 2017), cujo enfrentamento requer, em cada caso, considerar a insuprimível alteridade de cada um dos educandos, pois, sem levá-la a sério, o diálogo pedagógico não acontece.

Em termos metodológico-procedimentais, colocamos em movimento a proposta de Flávio Brayner (2015) de pensarmos algumas questões pedagógicas “a partir da experiência da leitura”, especificamente mediante uma imersão hermenêutica no mundo simbólico construído por Daniel Pennac em Mágoas da escola (2009). Além disso, olhar para as aporias do fenômeno pedagógico do ensinar/aprender/não aprender alarga e incorpora algumas contribuições, também, do pensamento psicanalítico e da complexidade de Morin. Anunciar esses horizontes abre o diálogo para o divergente, o incerto, a negociação etc. Significa abrir espaço para o ainda não institucionalizado, para aquilo que demanda reorganização, para o que escapa ao pensamento simplificador, mas que pode contribuir para encaminhar os desafios cotidianos da docência escolar.

Sustentamos que o sucesso pedagógico dos professores com alunos com ritmos singulares de aprendizagem passa pelo reconhecimento e pelo enfrentamento das aporias inerentes ao processo educativo. A construção de argumentos para nossa afirmação é feita considerando seis movimentos: o primeiro coloca em questão a alteridade na relação pedagógica. O segundo aborda a educação como o ato de amor político. O terceiro movimento aborda os alunos-clientes que hoje estão na escola. O quarto discute o conhecimento versus a ignorância como uma aporia pedagógica, sendo seu reconhecimento primordial à docência com alunos que aprendem/não aprendem. No quinto movimento apuramos o olhar para os professores que nos ensinaram (bons professores) e o que eles tinham em comum. Por fim, no sexto movimento adentramos nas aporias da educação como saberes teóricos-metodológicos para pensar os desafios pedagógicos dos professores no cotidiano escolar.

Alteridade na relação pedagógica

A relação pedagógica no “aqui e agora” é constituída por múltiplas e heterogêneas dimensões, que devem ser compreendidas como inscritas “numa história, ela mesma aberta em relação a eventualidades de um devir” (Ardoino, 2012a, p. 550). Note-se que à medida que refinamos o olhar dirigido aos fenômenos percebemos dimensões desarrumadas de nosso mundo e damos de cara com a complexidade. Pensar propriamente a complexidade dos fenômenos exige “admitir sua heterogeneidade constitutiva e sua natureza plural. Ela se ordena simultaneamente em diversas perspectivas contraditórias. Por isso, é preciso falar de leituras plurais” (Ardoino, 2012a, pp. 551-552).

O pensamento complexo reabilita o plural e a heterogeneidade, atenta para a fecundidade do conflito e da alteração e reconhece a importância do tempo e da história para a compreensão dos fenômenos (Ardoino, 2012a, p. 552; Morin, 2005a, pp. 332-333). As linguagens empregadas para descrever os fenômenos correspondentes a lógicas divergentes e concorrentes “mobilizam óticas e sistemas de representação totalmente irredutíveis uns aos outros” (Ardoino, 2012a, p. 552). Isso equivale ao descredenciamento epistemológico do pensamento unitário-totalizador e legitima a incerteza como categoria relevante na pesquisa e na prática pedagógica (Ardoino, 2012a, p. 553; Demo, 2000). Mas, para que a incerteza não nos imobilize, vemo-nos na obrigação de operar com redutores de complexidade: no plano prático-social, a confiança no diálogo intradisciplinar, interdisciplinar e intercultural com pesquisadores(as) de outras abordagens teórico-metodológicas, aliada ao compromisso de tradução recíproca de conceitos e princípios de inteligibilidade; no plano teórico, a formulação e esforços de resolução das aporias que emergem do campo profissional; supomos que essas aporias devem ser explicitadas e elaboradas teoricamente em busca dos melhores nexos possíveis, mesmo que não se alcance a síntese almejada pela razão dialética, justamente para que se retirem da obscuridade as melhores possibilidades de ação.

Um pressuposto filosófico da pedagogia contemporânea diz respeito àquilo que é a experiência da heterogeneidade “mais extrema, às vezes a mais cruel, mas provavelmente a mais enriquecedora” possível. Essa experiência só é possível na relação com o outro, no encontro com o outro, mas, a rigor, não é movida por nosso desejo nem pela pretensão de liberdade. É, ao contrário, a experiência de “limite de nosso desejo, de nosso poder e de nossa ambição de domínio” (Ardoino, 2012a, p. 553). Jacques Ardoino destaca que a significação mais profunda - para muitos difícil de tolerar - da pluralidade consiste em reconhecer e aceitar o outro, o outro como absolutamente outro, isto é, que não admite ser dissolvido por ou enquadrado em meu sistema de crenças e desejos. Nenhum outro ser humano, por mais que sua subjetividade já tenha sido modelizada por instituições de adestramento, disciplinamento e controle, é passível de ser capturado pelas malhas dos esquemas de representação. Nas palavras do autor:

Quaisquer que sejam os determinismos que condicionam e podem explicar seus modos de funcionamento, o ser humano tem em si (auto) um poder de negação, de contraestra-tégia que lhe dá, ao menos em parte, a inteligência desses determinismos e uma certa capacidade de a eles reagir, de a eles se adaptar e mesmo de os enfrentar ou de os transformar (negatricidade). (Ardoino, 2012b, p. 90).

Ardoino focaliza não simplesmente as ideias da diferença e da alteridade, mas a experiência concreta do encontro com o outro, experiência na e pela qual eu resulto alterado, se não me encolher para debaixo da crosta protetora-enganadora de minhas crenças egoicas. Na duração da experiência do encontro com o outro, reconhecido e aceito como outro, pode acontecer a alteração de minha pessoa “como jogo dinâmico e dialético no outro” (Ardoino, 2012a, p. 553). Hans-Georg Gadamer (1999, p. 532), um dos clássicos da hermenêutica, escreveu que a abertura para o outro implica “o reconhecimento de que devo estar disposto a deixar valer em mim algo contra mim, mesmo que não haja nenhum outro que o vá fazer valer contra mim”.

Nesse sentido, no desdobramento da alteração, na duração do encontro com o outro, a heterogeneidade se constitui “principalmente de desejos, interesses e intencionalidades, e mesmo de estratégias antagônicas” (Ardoino, 2012a, p. 553). “Com a heterogeneidade, o outro é experimentado como fonte de alteração e de frustração (porque ele nos resiste), muito mais do que fonte de alteridade, que transforma nosso campo de referências” (Ardoino, 2012a, p. 554). A experiência de que o outro resiste, contraria, enfim, frustra a realização de meus desejos e limita a minha li- berdade, é nomeada por Jacques Ardoino de negatricidade. Negatricidade é a “capacidade que o ser humano ‘possui sempre de poder desmantelar com suas contraestratégias aquelas de que se sente objeto’, capacidade de ‘fugir’, de estabelecer ‘contraestratégias’, diferentes daquelas que lhes são esperadas; de trair as expectativas colocadas” (como citado em Macedo, 2012, p. 39).

Nessa perspectiva, Abrantes (2011, pp. 131-132) aponta que há uma relação estreita entre socialização e as identificações, visto que “cada indivíduo interioriza disposições, competências e valores, na medida em que as associa a uma identidade específica, resultante de uma negociação entre papéis atribuídos e intenções próprias”; acrescenta, por outro lado, que há uma dimensão intencional e reflexiva na construção das identificações. Ou seja, não se trata de um processo estritamente mecânico, em que o sujeito é unicamente posto como objeto, mas fundamentalmente como resistência. Roberto Sidnei Macedo (2012, p. 39) complementa:

Considerar o diferente não necessariamente é considerar o outro e sua ação . . . . “É muito fácil dormir com a ideia do outro, ela não ronca”, mas por outro lado, “é muito mais difícil viver com a alteração, quer dizer com a ação do outro, que tem negatricidade, que se opõe a nós, portanto, e cujo desejo não responde necessariamente ao nosso”.

Nessa trilha dialética e multirreferencial de raciocínio, a negatricidade é condição para a alteração e torna possível experiências de formação pelo encontro com outros. Jorge Larrosa (2006, p. 184) acentua a alteridade da infância: “sempre além de qualquer tentativa de captura, inquieta a segurança de nossos saberes, questiona o poder de nossas práticas e abre um vazio em que se abisma o edifício de nossas instituições de acolhimento”. Assim, a resistência à colonização das instituições e do outro é a possibilidade de os sujeitos e sujeitas se constituírem em singularidades autônomas e emancipadas.

Nesse veio de pensamento, a convivência social e o saber não abrem mão do “reconhecimento da irredutibilidade das óticas umas às outras” (Ardoino, 2012a, p. 554). A “pluralidade de olhares, tanto concorrentes quanto eventualmente mantidos unidos por um jogo de articulações” especifica a abordagem multirreferencial da complexidade (Ardoino, 2012a, p. 554). Nesse enfoque, “os diferentes sistemas de referência, reciprocamente, mutuamente outros, interrogam o objeto a partir de suas perspectivas e de suas lógicas respectivas”, mas também “se questionam, se necessário contraditoriamente entre eles, alteram-se e elaboram significações mestiças, em favor de uma história” (Ardoino, 2012a, p. 554). Com isso, o leitor é remetido aos princípios de inteligibilidade do pensamento complexo, formulados e ético-epistemologicamente justificados por Edgar Morin (2003, pp. 93-97; 2005a, pp. 332-334). Mas também pode pensar que se trata de uma modalidade de amor que não se restringe ao âmbito das relações interpessoais.

Educação como o ato de amor político

Sem aprofundar o assunto, gostaríamos de lembrar que Martin Heidegger insistiu em destruir fenomenologicamente a noção de empatia, surgida no paradigma filosófico-cultural da subjetividade para explicar a relação com os outros a partir da ideia absurda de um sujeito encapsulado. Recentemente, numa obra ao mesmo tempo literária e pedagógica, Daniel Pennac (2009, p. 246) recusou que se chame de “empatia” a disposição subjetiva do(a) professor(a) que se dedica a salvar alunos com ritmos singulares de aprendizagem. É verdade que, para “libertar cábulas, convém saber como se sentem”. Mas esse saber nada tem a ver com passar-se por outra pessoa, no caso, o aluno com ritmo singular de aprendizagem. Para realizar seu ofício de repescar os “lerdos”, diz Pennac (2009, p. 246), o(a) professor(a) deve acrescentar a seus conhecimentos “a intuição da ignorância”,1 assunto a ser retomado mais adiante. Essa é a condição sem a qual o mau aluno não pode vir ao cimo, algo que ele só consegue se os(as) educadores(as) apostarem nele, investirem nele. Pennac chama de “amor” essa disposição subjetiva para ajudar os alunos “lerdos”, além dos não “lerdos”.

Acreditamos que o amor a que Daniel Pennac se refere cabe sob a definição formulada por Humberto Maturana e Sima Nisis de Resepka (2008). Os autores destacam que, do ponto de vista da filogênese humana, a emoção que constitui a relação social é a aceitação do outro como um legítimo outro em coexistência com alguém (Maturana & Resepka, 2008). Julgam que é agressão ao ser humano do outro o ato de recusá-lo “como um legítimo outro” em convivência com alguém (Maturana & Resepka, 2008, p. 15). Ainda de acordo com esses pesquisadores, “em qualquer idade, ficamos enfermos quando nos é negado o amor; na criança, esse adoecer tem graves consequências para o seu crescimento. As dificuldades de aprendizagem e de comportamento relacional surgem da negação do amor” (Maturana & Resepka, 2008, p. 15). A maior parte do sofrimento vem da negação do amor. Quase a totalidade das enfermidades humanas têm relação com a negação do amor (Maturana & Resepka, 2008, p. 61; Maturana, 2009, p. 25). A implicação pedagógica disso é que “a biologia do amor consiste precisamente em que o(a) professor(a) aceite a legitimidade de seus alunos como seres válidos no presente, corrigindo apenas o seu fazer e não o seu ser” (Maturana & Resepka, 2008, p. 21). Frise-se que a amorosidade de que aqui se trata guarda um nexo interno com o conceito de dignidade humana universal e com ações que lhe correspondem em cada contexto social.

Não faltam métodos didáticos para “salvar” alunos com dificuldades no processo de ensino dirigido a todos os alunos. Pennac denuncia a existência de professores(as) que se refugiam nos métodos, fazendo notar que, no fundo, os professores(as) sabem que o método não basta e que lhes falta amor. Trata-se de olhar para o dizer/fazer do aluno, com o sentido de reconhecer seu ser, sua condição de alteridade. Amor político-pedagógico. Para dizer como entende esse amor, conta a parábola das andorinhas que, atravessando o quarto, desalinhadas, na saída, enganadas pela transparência, chocam-se contra o vidro das folhas fixas/fechadas da janela, de duplo batente, aberta:

Entre os dois vidros fixos, um vasto espaço, suscetível de dar passagem a todos os pássaros do céu. Ainda assim, nunca falha, há sempre três ou quatro idiotas (sic) que escolhem os vidros fechados! . . . Paf! Atirada para o tapete. Então, um de nós levanta-se, segura na palma da mão a andorinha suicida . . . , espera que ela desperte, e lança-a ao encontro das companheiras. A ressuscitada voa, ainda um tanto desorientada, ziguezagueando no espaço reencontrado, e depois ruma em direção ao sul e desaparece no futuro. (Pennac, 2009, pp. 249-250).

Daniel Pennac conclui o livro com a tese de que salvar um aluno “lerdo” é como reanimar uma dessas andorinhas aturdidas! “As questões de simpatia ou antipatia por alguns deles . . . não entram em linha de conta” (Pennac, 2009, p. 250). Distante da empatia, o amor de professor(a) é amor-doação, amor político, que pressupõe a disposição subjetiva, de suportes ético e teórico, para salvar alunos “lerdos”. Traduz-se em compromisso e responsabilidade com o ser do outro. Acolher com sentido de investir, de empoderar esse sujeito.

Educadores(as) que se empenham em salvar “lerdos” enquanto ensinam a todos os alunos não admitem que “pessoas de fora do métier pedagógico venham revelar-lhes as saídas para os impasses e contratempos da profissão, ou mesmo ‘auxiliá-los’ nessa tarefa. Algo semelhante aos médicos convidarem economistas para discutir as questões da saúde” (Aquino, 2002, p. 109). Assim como é honroso para o profissional da saúde salvar pessoas enfermas, é honroso para o(a) professor(a) repescar alunos “lerdos”, sem demandar que um especialista externo venha “salvar a lavoura pedagógica” (Aquino, 2002, p. 26) e sem prejulgar os alunos “lerdos” com base em preconceitos de classe social, cor da pele, etnia, orientação sexual e/ou outros. O autor instiga os(as) docentes, afirmando que a minoria de alunos considerada problemática “é o filé mignon da profissão, aquilo que nas outras profissões é disputado a tapa - quanto maior o desafio, maior o regozijo profissional” (Aquino, 2002, pp. 148-149).

No que tange ao amor, é pertinente problematizar o lugar-comum do “amor ao próximo” ou “amor ao semelhante”. Numa sociedade de classes e de culturas múltiplas, “afinidade”, “empatia” e “amor ao próximo” (ou, ao “semelhante”) são termos ideológicos que legitimam a expulsão inescrupulosa dos filhos das classes populares da escola (Freire, 1999, 2004). É, no mínimo, problemático falar de “empatia” quando o interlocutor não escolhido, como é o caso do(a) aluno(a), é alguém de outra classe social e/ou de outra comunidade étnica. Pense-se na parábola do bom samaritano (Lucas 10, 25-37): os professores(as) éticos(as) terão de se fazer próximos de quem está distante, de quem é desigual, diferente e desconectado! Isso não se faz por empatia! Só por amor político! Aqui, politicidade vincula-se com amorosidade! E isso especialmente porque, pelo clássico princípio ético da não reciprocidade, os educadores adultos devem cumprir seus deveres pedagógicos mesmo quando/onde os educandos não correspondem às suas expectativas (Jonas, 2006, pp. 196ss.). E, como é público e notório, as expectativas dos(das) professores(as) sofrem reveses provenientes de condutas de alunos dos mais diferentes tipos.

A escola como tal e os “alunos-clientes”

Retomando a questão da negatricidade, sem perder de vista que cada aluno é uma singularidade, convém pensar a respeito dos tipos diferentes de alunos. Ressalve-se que nem todos os alunos são “lerdos”. Mas, destes últimos, a maior parte vive sob condições de instrumentalização. Entre outros tipos de crianças instrumentalizadas, há crianças-trabalhadoras, crianças-soldados, crianças-prostitutas, crianças-moribundas (de fome e abandono) e crianças-clientes (Pennac, 2009, p. 236). No livro citado, o autor se detém nas crianças-clientes e respectivo torpor escolar.

Desde a crise da escola republicana, na década de 1970, a negatricidade dos discentes está significativamente correlacionada com os alunos-clientes. As crianças-clientes formam hoje a versão predominante dos alunos “lerdos”. São crianças “treinadas na mesma aspiração pelo consumo”, atingidas “pela única e envolvente solicitação: consumir. Isto é, mudar de produto, querer um novo, mais do que novo, o último grito. A marca!” (Pennac, 2009, pp. 196-197). Há lerdos-clientes que, aspirados pelas telas dos smartphones, nelas diluídos para “surfar no espaço-tempo, sem constrangimentos nem limites, sem horários nem horizontes”, limitam tanto sua inteligência que manifestam dificuldades para “distinguir marca de objeto” (Pennac, 2009, pp. 193-194, 241). Isso, de tanto que as marcas enchem suas cabeças, tomam seu dinheiro, seu vocabulário e até mesmo seus corpos, como uniformes, transformando-os em publicidade viva, como manequins de plástico nas lojas (Pennac, 2009, p. 194). A escola trabalha com a tradição, com aquilo que a sociedade julga necessário conservar. Como encantar esses alunos(as) que se orientam pela constante imediatez da novidade?

Num conjunto de campos de consumo idênticos aos dos(das) pais/mães e professores(as), essas crianças desempenham o mesmo papel econômico que os adultos encarregados de sua educação e instrução. Clientes “com todos os direitos. Como os adultos”; consumistas autônomos (Pennac, 2009, p. 237). As crianças são elevadas ao status de maturidade comercial porque as provas de amor dos pais por eles “passam pela compra de objetos” (Pennac, 2009, pp. 238-239). Mas também porque hoje é a “avó marketing” que “veste, alimenta, dá de beber, calça, penteia, equipa toda a gente, é ela que sobrecarrega o aluno de eletrônica, o monta em patins, bicicleta, scooter, moto, patinete, é ela que o distrai, o informa, o põe na moda...” (Pennac, 2009, p. 233). Em tempo integral, a avó-marketing monitora a criança, tanto que, quando esta se senta na sala de aula, essa avó “vibra no fundo do seu bolso para o tranquilizar: estou aqui, não tenhas medo, no teu telefone, não és refém do gueto escolar!” (Pennac, 2009, p. 233).

A consciência que as crianças de hoje têm de si mesmas foi subvertida pelo acesso ao mundo adulto, pelos meios eletrônicos da hiper-realidade. O modo segundo o qual as crianças se compreendem não combina com instituições “fundadas numa visão das crianças como incapazes de tomar decisões sozinhas” (Steinberg, 1997, p. 125). Hoje, “crianças precoces entram em conflito com seus pais/mães por privilégios adultos e bens materiais” (Steinberg, 1997, p. 130). Para entender a resistência que crianças e adolescentes levantam contra o trabalho docente, é necessário indagar acerca das referências segundo as quais a subjetividade infantil e adolescente é produzida. Henry A. Giroux (1995, p. 50) explica que as identidades das crianças e dos jovens “são amplamente moldadas, política e pedagogicamente, na cultura visual popular dos videogames, da televisão, do cinema e até mesmo em locais de lazer como shopping centers e parques de diversão”. Particularmente, os desenhos animados funcionam como novas “máquinas de ensinar”, inspirando “no mínimo tanta autoridade cultural e legitimidade para ensinar papéis específicos, valores e ideais quanto locais mais tradicionais de aprendizagem, tais como escolas públicas, instituições religiosas e a família” (Giroux, 1995, pp. 51-79). Quando chegam à escola, as crianças já trazem consigo um sistema operacional mental, instalado em seus corpos pelos funcionários das grandes corporações empresariais que produzem a cultura endereçada às crianças (kindercultura). É necessário notar que o acesso das crianças de hoje à kindercultura comercial “as motiva a se tornarem consumidoras hedonistas” (Steinberg, 1997, p. 124).

Para Dufour (2005, p. 76), “na narrativa da mercadoria cada desejo deve encontrar seu objeto . . . . A narrativa da mercadoria apresenta os objetos como garantia de nossa felicidade e, ademais, de uma felicidade realizada aqui e agora”. Nesse movimento, compreende que o mercado se apresenta como a nova racionalidade verdadeira e última, aparece como o novo grande sujeito que dirige os desejos humanos. Assim, se considerarmos as posições anunciadas, ao que parece, a escola é “o último reduto da sociedade mercantil em que a criança cliente tem de pagar com a sua pessoa, vergar-se ao toma lá, dá cá” (Pennac, 2009, p. 240). A escola exige dela conhecimentos mediante o próprio esforço, acesso à universalidade do saber mediante o exercício solitário e próprio da reflexão, presença escolar plena em troca de uma vaga promessa de futuro (Pennac, 2009, p. 241). A dificuldade primeira dos alunos-clientes está em que não entendem por que teriam de aceitar essa situação, por que trocar seu status de adulto comercial por uma posição de aluno obediente.2 Por que haveria de pagar à escola, com esforço e sem retorno imediato, se o teclado “lhe permite o acesso a todos os conhecimentos solicitados pelos seus desejos”? Por que haveria de suportar as humilhações dos(das) professores(as) e pais/mães debruçados sobre os seus registros de avaliação “quando, fechado no quarto, isolado dos seus e da escola, é ele que reina” (Pennac, 2009, p. 241)? Em uma sociedade do prazer imediato, a escola se apresenta como um ponto fora da curva. Qual seria a razão para suportar uma instituição que se dobra sobre a tradição, quando a sempre novidade conduz seus desejos?

Previsivelmente, o trabalho docente contém dificuldades aumentadas quando o frente a frente é com uma turma de alunos-clientes. A escola não é uma galeria comercial em que se satisfazem desejos superficiais por meio de presentes. Nela, realizam-se as necessidades fundamentais por obrigações. E, como todo(a) professor(a) experiente sabe, as necessidades de instrução, para serem atendidas, têm de ser primeiro provocadas. “Rude tarefa para o(a) professor(a), este conflito entre os desejos e as necessidades!” (Pennac, 2009, p. 240). Em contrapartida, “dolorosa perspectiva para o jovem cliente, ter de se preocupar com necessidades em detrimento dos desejos: esvaziar a cabeça para formar o espírito, desligar-se para se ligar ao saber” (Pennac, 2009, p. 240). Obrigado à quase impossível tarefa de esquecer o brilho das bugigangas para assimilar conhecimentos escolares, sem utilidade imediata, e ainda ter de pagá-los com seu próprio esforço! Uma aporia maravilhosa que a modernidade inventou! Mas essa não é a única aporia da educação.

Importa que os(as) docentes se deem conta de que, no mundo contemporâneo, o modo de se comportar dos alunos-clientes nos instiga a pensar a complexidade de nossas relações com as crianças e adolescentes. O modo de ser das crianças da época moderna deixou de existir desde que os meios de comunicação social as tornaram informadas sobre muitos campos da vida social que antes podiam ser ocultados. Da impossibilidade de ocultar deriva o não poder simplesmente proibir. Segredos e tabus, inter-relacionados, caracterizaram as crianças da modernidade. Mas as crianças da contemporaneidade recebem informações que já não são nem podem ser filtradas pelos pais. Por consequência, na sala de aula, antes de serem convidadas a falar, algumas delas já estão “dando pitacos” e recontando as histórias que o(a) professor(a) começou a contar.

No mundo contemporâneo, em geral, a criança tende a ter “papel ativo na constituição das relações sociais em que se engaja, não sendo, portanto, passiva na incorporação dos papéis e comportamentos sociais” (Cohn, 2005, pp. 27-28). Clarice Cohn afirma, ainda, que “as crianças não são apenas produzidas pelas culturas, mas também produtoras de cultura. Elas elaboram sentidos para o mundo e suas experiências compartilhando plenamente de uma cultura”. Naturalmente, a elaboração desses sentidos parte do “sistema simbólico compartilhado com os adultos” (Cohn, 2005, p. 35). Mesmo na condição de alunos-clientes, de consumidores na sociedade contemporânea, não podemos esquecer do papel da criança de ator, produtor e protagonista na vida social. Reduzi-las unicamente a clientes/objetos seria reafirmar a manutenção estruturalista e funcionalista dos processos de socialização. Na sequência elucida-se o problema pedagógico de fundo, pouco dependente do tipo de aluno difícil com que o(a) professor(a) tem de trabalhar.

Conhecimento versus ignorância como aporia pedagógica

Distante da condição dos atuais alunos-clientes, como ex-alunos lerdos e como professores veteranos, entendemos que há um problema pedagógico de fundo. E é problema para o qual os(as) professores(as) jovens, por mais que dominem sua área de conhecimento, não se sentem preparados; e, por isso, este os faz sofrer (Pennac, 2009). Que problema é esse?

Para elaborar a resposta a essa pergunta, recorremos mais uma vez a Daniel Pennac (2009). Ele considera as “histórias de perda de referências, de violência, de consumo”, entre outras, explicações conjunturalmente válidas. Contudo, antes de acolhermos o entendimento da perda de referências, parece-nos necessário fazer uma observação. As transformações da pós-modernidade, modernidade líquida, neomodernidade,3 entre outras denominações, apontam para uma nova configuração da realidade. Entre as transformações figuram, conforme descreve Hall (2006, pp. 15-16), as do “tempo e do espaço”, que ele chama de “desalojamento do sistema social - a extração das relações sociais dos contextos locais de interação e sua reestruturação ao longo de escalas indefinidas de espaço-tempo”. Assim, a pretendida estabilidade proposta pelas metanarrativas da modernidade entra em gradativo colapso. Essa nova configuração afeta, inevitavelmente, as referências identitárias.

Nesse sentido, na modernidade tardia o que propriamente ocorre não é a perda de referências, mas a emergência de uma pluralidade de possibilidades. Se no contexto pré-moderno os sistemas mundiais se caracterizam por um conjunto fragmentado de comunidades isoladas, na modernidade o tempo e o espaço passam a ser comprimidos em vista das novas relações que se estabelecem, mas nada se compara à pós-modernidade em que a “humanidade se torna um nós, enfrentando problemas e oportunidades onde não há ‘outros’” (Giddens, 2002, p. 32). O que, no entender de Hall (2006, p. 17), “aponta para uma concepção de identidade muito diferente e muito mais perturbadora e provisória do que as anteriores”.

Quando aborda as balizas para a construção de nossas identidades na pós-modernidade, efêmera e transitória, Dufour (2005, p. 83) sugere o mercado como a grande referência. Em suas palavras, “se o Mercado, como racionalidade verdadeira e última, aparece como novo grande Sujeito, talvez seja apenas em razão de os grandes Sujeitos precedentes terem jogado a toalha, inclinando-se diante do novo mestre”. Assim, quanto mais a tradição perde espaço, tanto mais os estilos de vida centrados nos indivíduos ganham amplitude. A “perda de referências”, expressa pela dessimbolização e pela desreferencialização, marca a modernidade tardia e incide diretamente na construção de outros eus. Independentemente das nomenclaturas que adotemos para nos referirmos ao nosso tempo, reconhecemos nelas que há um crescente processo de desreferencialização ou de perda do Outro e as balizas mais ou menos estáveis estão estilhaçadas. Desse modo, não se trata tanto de “perda”, mas da emergência de novos parâmetros, novas referências.

Mas nem a soma dessas explicações dá conta do problema, para o qual logo virão outras respostas. O problema pedagógico de fundo é o choque violento “do saber contra a ignorância” (Pennac, 2009, p. 243). Na matéria que lecionam, os(as) professores(as) foram bons alunos e, em razão disso, são “incapazes para compreenderem o estado de ignorância em que vegetam” os “lerdos” (Pennac, 2009, p. 244). Mesmo que tenham sentido dificuldades de adquirir os conhecimentos da disciplina que ministram, logo que se encontram na posse destes, passam a entendê-los como evidentes e, assim, perdem a capacidade “de se imaginarem sem saber o que sabem”, de imaginarem o quanto tais conhecimentos são estranhos para aqueles que os ignoram (Pennac, 2009, p. 244). Tem-se assim a aporia: o saber que torna alguém professor(a), por fazer perder o sentido da ignorância, desabilita esse alguém a ser professor(a) como salvador de lerdos. Daí a proposta de Pennac (2009, p. 244) para a formação inicial e continuada de professores(as): tornar-se capaz de conceber o estado daquele que ignora o que o(a) professor(a) sabe. Essa capacidade deveria tornar-se a “principal qualidade” dos(as) professores(as). Tem-se assim uma proposta de um saber que enriquece o exercício da docência. As aporias docentes não são elaboradas nas tipologias de Shulman (1987, 1989, 2005), de Tardif (2004) e de Pimenta (2009) como saberes docentes, ou um saber para a docência.

Recorrentemente, os candidatos a professor(a) e os(as) professores(as) em exercício deveriam se lembrar de suas experiências de insucesso escolar e, a partir dessas lembranças (respectivas), procurar compreender o que lhes aconteceu naquele período da trajetória escolar, procurar saber as razões internas e externas que os levaram a descambar e, acima de tudo, lembrar-se da maneira e dos meios pelos quais acabaram de se desvencilhar e das razões os levaram a consagrar-se a essa ou aquela matéria e não a outras (Pennac, 2009, p. 245). Pela proposta de Daniel Pennac, quando desafiado(a) por alunos com dificuldades de aprendizagem, cada professor(a) teria de se lembrar de suas respectivas fraquezas em determinados componentes curriculares, em determinados momentos de sua trajetória estudantil, e reviver um pouco “o estado de ignorância” (Pennac, 2009, p. 245).

Desse modo, entendemos que não se trata de um saber/conhecimento oriundo unicamente da experiência de docência do professor, embora seja no cotidiano que este se materialize. Se compreendemos como promissora essa aporia nos processos de aprender/não aprender de adolescentes com ritmos singulares de aprendizagem, esse poderia ser um conhecimento de professor a ser incluído entre os saberes dos fundamentos da educação, os saberes da pedagogia, os saberes curriculares e epistêmicos/instrumentais do fazer pedagógico. Se a escola, de fato, tão criticada, conseguiu nos ensinar muita coisa, tanto que alcançamos saber que, quanto mais sabemos, mais sabemos que pouco sabemos,4 cabe perguntar: como os(as) professores(as) conseguiram isso?

O que nossos(as) bons(as) professores(as) tinham em comum

Admitido como razoável o discutido nesse percurso, interrogamos o que tiveram em comum os estilos de docência daqueles(as) professores(as) que, em momentos diferentes, conseguiram orientar nossas “cabeças” (atordoadas) para as matérias que estavam ensinando. Como conseguiram nos livrar do pensamento mágico e, com isso, colocar-nos no caminho da compreensão de suas áreas de conhecimento?

Sobre isso, Daniel Pennac (2009, pp. 148ss.) traz esclarecimentos primorosos. Ele chama a atenção para uma condição necessária à existência do diálogo pedagógico: distinguir entre respostas absurdas e respostas erradas dos alunos. Se o(a) professor(a) classifica como errada a resposta absurda do aluno, atribui-lhe nota mínima e não o liberta do pensamento mágico. A resposta absurda limita-se a um ato reflexo. Resulta menos do raciocínio do aluno do que de sua tentativa de adivinhação. Simplesmente responde ao ato de ter sido feita uma pergunta. O aluno, ao responder automaticamente qualquer coisa, e o(a) professor(a), atribuindo-lhe nota mínima por isso, eliminam-se simbolicamente um ao outro, não alcançando considerar um ao outro nas suas funções recíprocas (Pennac, 2009, pp. 149-150). Desse modo, no final das contas, o(a) professor(a) se anula como professor(a), pois desiste de entrar em diálogo com o aluno, a ser feito, naturalmente, sobre as dificuldades específicas de aprendizagem deste, no exato momento em que elas se manifestam. Por consequência, no caso do aluno, o que deveria ser uma questão de instrução passa a ser “um caso de suscetibilidade”, do tipo “o professor não gosta de mim” (Pennac, 2009, p. 150).

O diálogo pedagógico se faz sobre respostas a serem melhoradas. Os(as) professores(as) que nos despertaram para romper o círculo vicioso do pensamento mágico nos mostraram a diferença entre o erro e o acerto e, sem humilhar, instalaram-nos na dinâmica do “errando se aprende” quando se é bem conduzido. É esse “conduzir” que está na origem etimológica da palavra “pedagogia”. A abertura ao diálogo é a possibilidade de construir e reconstruir aprendizagens. Desse modo, na trajetória escolar de alunos lerdos, como foi o nosso caso, isso vale especialmente para a aprendizagem da escrita e do cálculo matemático.

Há outro ponto comum entre os(as) professores(as) que nos puseram no caminho do “errando se aprende”. É possível recordar que esses(as) professores(as) puderam nos conduzir - pois assim os deixávamos - por terem sabido cruzar e combinar dois tipos inconfundíveis de pensamento: de um lado, o pensar narrativo-descritivo e, de outro, o pensamento conceitual, lógico-científico e argumentativo (Bruner, 1988, pp. 23-53). Mediante a primeira modalidade de pensamento damos sentido à experiência; mediante a segunda, buscamos o conhecimento da verdade. O primeiro tipo de pensamento é universal, comum a todas as culturas, e não depende de escolarização. O segundo tipo é o pensamento característico dos sujeitos epistêmicos escolarizados. Ser escolarizado implica aprender a pensar conceitualmente (Vóvio, 1999; Young, 2007, 2011), seja pelo raciocínio lógico- -conceitual, seja pelo raciocínio argumentativo. Mas a escolarização não pode ocorrer sem que se façam costuras entre o tipo de pensamento a ser aprendido e o pensamento que se aprendeu desde o berço, que é o narrativo-descritivo. Sem intersecções e cruzamentos com este, dificilmente se aprenderia o pensamento conceitual, o que significa que não aconteceria o diálogo pedagógico especificamente escolar, pelo qual situações do mundo da vida passam a ser (re)conhecidas mediante procedimentos e aparatos conceituais do mundo acadêmico.

Por meio da linguagem narrativo-descritiva, associada ao timbre e à musicalidade da voz, nossos melhores professores(as) nos prenderam pelos ouvidos, pelos olhos e pelos dedos aos conteúdos escolares marcadamente conceituais. Olhando bem, eram bons os(as) professores(as) que transmitiam os conteúdos de forma narrativa, inclusive autobiográfica. O pensamento narrativo-descritivo permite trocar crenças e experiências com pessoas de outros mundos socioculturais, razão pela qual os educadores devem prestar atenção à sintaxe do pensamento verbal dos educandos, correspondente a seus respectivos mundos socioculturais.

Com efeito, os idiomas e dialetos determinam o modo de pensar, em seus limites e possibilidades. Repetidas vezes, Paulo Freire (2003, pp. 56-58) chama atenção para a diferença entre a “sintaxe ou organização popular do pensamento” e o modo intelectual de pensar dos educadores: a formação destes leva-os a descrever/caracterizar mais o conceito do objeto, ao passo que, na sintaxe popular, “se descreve o objeto e não o seu conceito”. Na educação escolar, portanto, não se deve suprimir o contraste entre os modos de pensar narrativo-descritivo e conceitual (lógico-matemático e argumentativo). Nenhum dos termos consegue absorver o outro e ambos são necessários ao diálogo pedagógico. Trata-se, entre muitas outras, de uma das clássicas aporias da educação. Se, apesar de nossa lerdeza, conseguimos aprender, isso foi possível porque nossos(as) professores(as) puseram em movimento a aporia do saber contra a ignorância, articulando a modalidade conceitual de pensamento com a modalidade narrativa. Mas eles(elas) foram mais longe. Souberam trabalhar outras aporias pedagógicas, valendo-se de ferramentas teóricas, argumentativas, retóricas, estilísticas, etc., cada um segundo seu modo de exercer a docência. Convém mencionar algumas dessas aporias pedagógicas e tornar razoável a ideia de que elas são adequadamente enfrentadas mediante os operadores cognitivos propostos por Edgar Morin (2005a, pp. 331-334), em especial, o princípio dialógico.

Aporias da educação: Saberes para pensar o trabalho pedagógico

A reflexão sobre as aporias da educação costuma não ter relevância nas pesquisas científicas sobre os fatos educativos. No entanto, deve ser rigorosamente abraçada pelo pensamento pedagógico, sempre multirreferencial e propositivo. As aporias emergem da própria ação pedagógica à medida que ela requer ser projetada e dirigida. Nesse campo simbólico de jogo (de poder), a cada pouco, defrontamo-nos com situações em que as contrariedades, reais e aparentes, fazem sentido.

Note-se que, na explicitação das aporias anteriormente referidas, procuramos ser razoáveis quanto aos argumentos utilizados. Um dos pensadores citados, Jacques Ardoino (2012a, p. 556), afirma que “a educação é sempre mestiçagem”, visando a auxiliar o sujeito a inventar seu próprio itinerário, ao mesmo tempo que cumpre função socializadora. Ele lembra que Sigmund Freud teria se dado conta da “natureza contraditória da educação: desejo de transgressão e respeito à lei”.

José M. Quintana Cabanas (1988, pp. 219-253) tratou sistematicamente das clássicas aporias da educação, ainda que se referisse a elas com o termo “antinomias”.5 Também Jean-Pierre Pourtois e Huguette Desmet (1999, pp. 31-33) propõem que se busque ou restaure “o intermédio entre os termos” das aporias. Como esses autores se estribam em Edgar Morin, não cogitam em síntese dialética, mas falam de “reengendramento”, “reorganização”, “recursividade” e “exploração do aleatório em vez de combatê-lo”. Com efeito, de acordo com o próprio Morin (2005a, p. 332; 2005b, p. 110), o imperativo ético-epistemológico de distinguir-e-ligar se desdobra nos princípios recursivo (os efeitos são necessários à produção de si e as causas são, por sua vez, afetadas pelos efeitos), dialógico (ligação dos termos antagônicos) e hologrâmico (a parte está no todo e vice-versa) de pensar, entre outros.

No que diz respeito ao princípio dialógico, de acordo com Morin (1997, p. 59), “o jogo dos antagonismos, sem necessariamente suscitar síntese, é em si mesmo produtivo” e as contradições fundamentais não podem ser ultrapassadas pelo pensamento. Em sua centenária biografia, após uma demorada empolgação pela ideia hegeliana de “síntese” (que excede e integra as contradições), Morin passou a considerá-la uma “ideia mágica” (Morin, 1997, p. 56). E, abandonando a “síntese eufórica”, em O método, o autor substituiu irrevogavelmente a dialética (hegeliano-marxista) pela dialógica, esta, considerada “associação de instâncias simultaneamente complementares e antagônicas” (Morin, 1997, p. 59). Na concepção da dialética hegeliano-marxista, as contradições são superadas e suprimidas em unidades superiores. Já a dialógica “não supera as contradições radicais, considera-as como insuperáveis e vitais, enfrenta-as ou integra-as no pensamento” (Morin, 2005b, p. 240). O autor acrescenta que essa “dialógica da vida” obedece à “complexidade da realidade viva”, não sendo regida por um princípio superior (Morin, 2005b, p. 240).

Desse modo, em sintonia com Blaise Pascal (2000, art. XVI, § 13), Edgar Morin (1997, p. 60) nos orienta a tomar como “o contrário de uma verdade profunda” não o erro, mas “outra verdade profunda”. Em coerência com esse princípio epistemológico, a atualização de alguma coisa potencializa sua antagonista e, inversamente, toda virtualização contraequilibra uma atualização; assim, as noções físicas de onda e de partícula, como muitas outras nas diferentes áreas de conhecimento, guardam uma relação de “contradição complementar” (Morin, 1997, p. 60).6

No marco dessa abordagem teórico-metodológica, Jean-Pierre Pourtois e Huguette Desmet (1999) propõem um modelo multirreferencial de pensamento pedagógico.7 Esses autores sublinham que se devem conjugar os termos opostos da pedagogia. Tal dever-princípio está na base de todo pensamento, que é “racional” precisamente porque busca, na medida do possível, evitar e resolver as contradições. Mas o pensamento complexo não permite que nos fechemos no interior de um sistema lógico (dedutivo-identitário) autossuficiente, e nos orienta a pensar as situações concretas do trabalho pedagógico, em diálogo com os outros, confrontando e cruzando múltiplos quadros teórico-conceituais, mesmo que não sejam sintetizáveis.

Por essa vereda somos enviados ao problema epistemológico das relações entre a lógica analítica e os princípios do pensamento complexo (Morin, 2005c, p. 211; Arenhart et al., 2022). Em alguns escritos, defendendo que se enfrente o desafio da complexidade, Edgar Morin (2005b, p. 110) privilegiava os princípios dialógico, recursivo e hologrâmico de pensar. Guiando-se por esses e outros princípios, o pensamento complexo opera segundo uma “dialética rotativa” (em espiral) entre os termos que se opõem e se unem. Por essa dialética, que não é hegeliana nem marxista, é-se levado a reconhecer que “a complexidade não é só o problema do objeto de conhecimento; é também o problema do método de conhecimento necessário a este objeto” (Morin & Le Moigne, 2000, p. 65); outras reflexões corroboram essa visão (Morin, 2005b; Demo, 2002). A nosso ver, as diretivas de inteligibilidade da dialógica moriniana permitem-nos enfrentar lúcida e eficazmente as aporias pedagógicas.

Considerações finais

A estratégia de reconhecer e enfrentar as aporias inerentes ao processo educativo afigura-se como condição necessária para um bom trabalho pedagógico com alunos com ritmos diferenciados de aprendizagem, e, por extensão, com todos os alunos em suas dificuldades específicas de aprendizagem. Para essa afirmação convergem as respostas às perguntas apresentadas na introdução. A incursão no pensamento pedagógico complexo foi feita mediante o mergulho hermenêutico numa obra da literatura contemporânea, Mágoas da escola, de Daniel Pennac (2009). Ensaiou-se a proposta metodológico-procedimental de Flávio Brayner (2015, p. 123) de repensar os fundamentos da educação a “partir da experiência da leitura”. Efetivamente, para pensar o trabalho pedagógico, a literatura fornece um “instrumento de significação de nossas experiências” menos ambicioso e “mais polissêmico e descentrado” que o princípio da razão calculadora (Brayner, 2015, p. 119).

Em estudo subsequente, juntando a essas considerações de ordem epistemológica as críticas de Diane Ravitch (2011) à reforma de ensino norte-americana de 2002, poder-se-ia aduzir argumentos em prol da hipótese de que a tecnologia instrucional apresentada por Doug Lemov (2011), com a certeza dogmática de quem conta com a chancela dos empresários do ensino para quem trabalha, assenta sobre equívocos pertinentes a seu objeto de estudo e ao conhecimento desse objeto: primeiro, é suspeito que as 49 técnicas de ensino do “professor campeão de audiência” sejam eficazes com crianças e adolescentes que conhecemos em nossas escolas; segundo, o modo pelo qual ele enfoca as questões de ensino parece seguir uma lógica dedutivo-identitária que ignora a complexidade e, particularmente, a alteridade das pessoas dos estudantes da atualidade e de seus mundos socioculturais. Ou, então, como se chamaria a lógica segundo a qual se selecionam os que podem ingressar numa escola, turma ou curso? E, mesmo com os selecionados, usando técnicas da “aula nota 10”, pautando-se rigorosamente pela lógica dedutivo-identitária, ter-se-á egressos bem preparados para o exercício democrático da cidadania? Por que, como denuncia Diane Ravitch (2011), a reforma empresarial do ensino nos Estados Unidos teria “dado com os burros n’água”?

Todos os problemas pedagógicos contemporâneos são complexos. Portanto exigem ser enfrentados na teoria, na pesquisa e na prática, no/pelo marco epistemológico do pensamento complexo. Também a formação continuada de professores(as), a fim de avançar na compreensão dos problemas educacionais de nosso tempo, precisa se alinhar com a abordagem epistemológica que ousa enfrentar a complexidade. Nesse sentido, o diálogo entre as aporias do não aprender/aprender não encontram resolução no âmbito lógico/racional, mas no movimento prático, no exercício cotidiano da docência. Reconhecer que há alunos com dificuldades, com ritmos singulares de aprendizagens, parece não ser o maior dos problemas com o qual se debatem os educadores, mas a ausência completa de qualquer expectativa por parte dos estudantes diante da escola e da vida. Isso, sim, torna a docência inoperante. O que fazer diante desse cenário?

Disponibilidade de dados

Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no manuscrito.

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1Nas tipologias de saberes reconhecidos para o exercício da docência isso não é anunciado. As aporias que desafiam a docência, nominadas em alguma medida por saberes oriundos da prática, são pouco tematizadas pela pesquisa. Parecem escapar dela. Histórias de vida, narrativas de professores podem ser possibilidades de trazer à tona essas aporias do cotidiano de ensinar/aprender/não aprender.

2Ressalve-se que há alunos recalcitrantes por razões diversas. Nem todos resistem com respaldo em referências mercadoló- gicas. As subjetivações contemporâneas dos corpos infantis os tornam ativos e reativos às condições do emparedamento escolar por motivações variáveis, como se verá adiante.

3A nomenclatura aqui não será objeto de discussão, contudo é pertinente apontar que estão vinculadas a diferentes concepções acerca das transformações que atingem o momento atual, podendo variar de autor para autor.

4Essa parece ser uma das condições de possibilidade do diálogo com os alunos, da compreensão relativa às suas dificuldades de aprendizagem e do esforço para auxiliá-los pedagogicamente em sua busca de conhecimento.

5Para o tema em pauta, julgamos impróprio o termo “antinomias”, pois nas antinomias ocorre um movimento em que a verdade de uma proposição implica a falsidade dela, e vice-versa, o que não é o caso nas oposições de que aqui se trata (Arenhart et al., 2022, pp. 36-61).

6Edgar Morin quer manter e compreender, sem dissolver, paradoxos como o de que a nação mais culta do mundo, a Alemanha, com o aval da ciência, produziu uma das piores barbáries da história universal, o holocausto (Morin, 1997).

7Pourtois e Desmet (1999) explicitam aporias diversas, como apego versus desprendimento, ser acolhido versus diferenciar- -se, investimento paterno versus singularização do(a) filho(a), independência versus filiação, autonomia versus submissão às normas sociais, consideração versus autoestima, liberdade versus diretividade, regularidade versus perturbações, o que já se faz versus o “fazer melhor”.

Recebido: 04 de Junho de 2022; Aceito: 16 de Fevereiro de 2023

Nota sobre autoria

Livio Osvaldo Arenhart realizou a escrita da primeira versão e a revisão da versão final. Martin Kuhn atuou como leitor crítico e na reescrita do texto.

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