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Educação em Revista

versão impressa ISSN 0102-4698versão On-line ISSN 1982-6621

Educ. rev. vol.37  Belo Horizonte  2021  Epub 14-Jul-2021

https://doi.org/10.1590/0102-469820613 

Artigos

PRESENÇAS E ÊNFASES DO TEMA DA SAÚDE NOS CURRÍCULOS DE FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO FÍSICA: NOTAS PARA UMA ESTRUTURAÇÃO CONCEITUAL

PRESENCIAS Y ÉNFASIS DEL TEMA DE SALUD EN LOS CURRÍCULOS DE FORMACIÓN EN EDUCACIÓN FÍSICA: NOTAS PARA UNA ESTRUCTURA CONCEPTUAL

VICTOR JOSÉ MACHADO DE OLIVEIRA1 
http://orcid.org/0000-0001-7389-9457

IVAN MARCELO GOMES2 
http://orcid.org/0000-0002-0311-9651

1 Universidade Federal do Amazonas(UFAM). Manaus, AM, Brasil. <oliveiravjm@gmail.com>

2 Universidade Federal do Espírito Santo(UFES). Vitória, ES, Brasil. <ivanmgomes@hotmail.com>


RESUMO:

O texto apresenta um recorte de investigação dos currículos de Educação Física (EF) do Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo, cujo objetivo é apresentar subsídios para o uso dos conceitos presenças e ênfases para a análise curricular sobre o tema da saúde em cursos de EF. Os dados foram produzidos a partir de documentos curriculares do bacharelado e da licenciatura, entrevistas com dez professores, currículos dos professores, documentos de concursos públicos na área da saúde e acompanhamento de quatro disciplinas durante um semestre. O artigo é apresentado em duas partes: na primeira, uma conceituação de presenças e ênfases com base na teoria da estruturação de Giddens e no conceito de orientação político-epistemológica de Cunha; na segunda, a análise da empiria configurando cinco presenças e duas ênfases do tema da saúde nos currículos de formação em EF. Considera-se que as presenças e ênfases do tema da saúde se constituem nos movimentos da dualidade da estrutura nos quais as ações dos sujeitos, segundo suas orientações político-epistemológicas, se relacionam com (ou tensionam) as coerções estruturais que constituem os currículos de formação em EF.

Palavras-chave: saúde; capacitação de recursos humanos em saúde; currículo; Educação Superior; Educação Física

RESÚMEN:

El texto presenta un recorte de investigación de los currículos de Educación Física (EF) del Centro de Educación Física y Deportes de la Universidad Federal de Espírito Santo, cuyo objetivo es enseñar contribuciones para la composición de los conceptos, presencias y énfasis en el análisis curricular sobre el tema de la salud en los cursos de EF. Los datos fueron producidos a partir de documentos curriculares de los pregrados, entrevistas con diez profesores, currículos profesionales, documentos de concursos públicos en el área de salud y acompañamiento de cuatro asignaturas universitarias durante un semestre. Se presentan dos movimientos: en el primero, una conceptualización de presencias y énfasis basado en la teoría de la estructuración de Giddens y en el concepto de orientación político-epistemológica de Cunha; en el segundo, el análisis empírico configuró cinco presencias y dos énfasis en el tema de la salud en los currículos de formación en EF. Se considera que las presencias y énfasis del tema de la salud se constituyen en los movimientos de la dualidad de la estructura en la que las acciones de los sujetos, de acuerdo con sus orientaciones político-epistemológicas, están relacionadas (o tensionan) con las restricciones estructurales que constituyen los currículos de formación en EF.

Palabras clave: salud; capacitación de recursos humanos en salud; curriculum; educación superior; educación física

ABSTRACT:

The text presents partial results of an investigation on Physical Education (PE) curricula at the Physical Education and Sports Center of Universidade Federal do Espírito Santo, aiming to present some elements to construct the concepts of presences and emphases in curriculum analysis regarding health in PE courses. Research data were obtained from curricular documents of both Bachelor’s and Teacher training degrees, analysis of professors’ curricula vitae, and documents from civil service exams for the health area. We have also conducted interviews with ten professors and monitored four courses during a semester. Two movements are presented: in the first, a conceptualization of presences and emphases based on Giddens’s structuration theory and on Cunha’s concept of political-epistemological orientation; in the second, the analysis of empiricism, which indicated five presences and two emphases on the health theme in the teacher training curricula in PE. We consider that the presences and emphases of the health theme are established in the movements of the structure duality in which the subjects’ actions, according to their political-epistemological orientations, related to (or tension) the structural constraints that compose the teacher training curricula in PE.

Keywords: health; health human resource training; curriculum; higher education; Physical Education

INTRODUÇÃO

Este texto é fruto de uma tese de doutorado que investigou os currículos de formação em Educação Física (EF) no Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo (CEFD/UFES) a partir da temática da saúde. Além dos tradicionais campos de atuação vinculados ao mundo do fitness, a EF tem sido solicitada nos cenários de trabalho que envolvem o tema da saúde em sua interface com as Práticas Corporais e Atividades Físicas (PCAF), mormente no Sistema Único de Saúde (SUS) e na educação básica. Fomentam essa justificativa documentos como a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), o Programa Academia da Saúde, o Programa Saúde na Escola (PSE), a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o Relatório Movimento é Vida (PNUD) e o Guia de Atividade Física para a População Brasileira3.

Recentemente, as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de EF (Resolução 06/2018) contemplaram o eixo saúde na formação do bacharelado, citando, sem maiores aprofundamentos, a atenção básica, a secundária, a terciária, a Saúde Coletiva e o SUS. Apesar de o SUS aparecer pela primeira vez em uma Diretriz para formação em EF, autores como Freitas, Oliveira e Coelho (2019) consideram que o design das diretrizes se voltam, majoritariamente, ao fitness e à formação de um profissional empreendedor de si mesmo, ou seja, voltado para as questões do setor privado. Essa perspectiva “privatizada” contradiz a própria menção ao SUS e seu caráter público e coletivo. Tal contradição é percebida quando as diretrizes “[...] reduzem o objeto de estudo da Educação Física ao movimento humano para adoção de um estilo de vida fisicamente ativo e saudável como ideologia que esconde questões relacionadas à saúde e à qualidade de vida” (FREITAS; OLIVEIRA; COELHO, 2019, p. 251).

Já a Resolução 569/2017, que expressa pressupostos, princípios e diretrizes comuns para as Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação da área da saúde, no artigo 1º, vem “reafirmar a prerrogativa constitucional do SUS em ordenar a formação dos(as) trabalhadores(as) da área da saúde”. Sendo a EF uma profissão da área da saúde, conforme a Resolução 218/1997 e o reconhecimento da Classificação Brasileira de Ocupações4 (CBO), entende-se que ela deva atender, também, à Resolução 569/2017.

Em termos epistêmicos, a aproximação do SUS com o campo da Educação Física tem sido mediada pela apropriação crescente do debate com a Saúde Coletiva. Segundo Nogueira e Bosi (2017), a Saúde Coletiva surge da resistência de uma vertente crítica à Saúde Pública, às teorias lineares da causalidade e ao modelo biomédico que, hegemonicamente, sustentam o processo saúde-doença-cuidado. Logo, a Saúde Coletiva busca conjunções interdisciplinares, conformando seu campo na Epidemiologia, nas Ciências Sociais e Humanas e nas Políticas, Planejamento e Gestão de Sistemas de Saúde (NOGUEIRA; BOSI, 2017).

Nogueira e Bosi (2017) chamam a atenção para a constituição de um campo da EF em Saúde Coletiva, ainda fortemente orientado na Epidemiologia da atividade física e nas Ciências Biológicas. No entanto, as autoras indicam que a aproximação com a vertente crítica da Saúde Coletiva, assentada nas Ciências Sociais e Humanas, tem provocado uma reorientação daquilo que a EF conhece como saúde (NOGUEIRA; BOSI, 2017).

Embora possamos perceber avanços desse debate na área, em estudo recente, Dessbesell e Caballero (2016) apontam que as configurações curriculares da EF se baseiam nos modelos tradicional-esportivo, técnico-científico e na abordagem médico-centrada, que pouco se aproximam dos princípios do SUS (integralidade, universalidade, equidade). Diante de um cenário global, mercadológico e produtivista, a formação é precarizada, sobretudo, nos desencontros entre ensino e serviço e na especialização de um profissional centrada no monitoramento das PCAF sob bases unicamente biológicas (DESSBESELL; CABALLERO, 2016).

Nessa esteira, Loch, Rech e Costa (2020) relatam a urgência da Saúde Coletiva na formação em EF. Os autores advogam que a EF necessita ir além dos efeitos clínicos da atividade física nas doenças, incluindo elementos da gestão e dos determinantes sociais da saúde. Além disso, a Pandemia da Covid-19 evidenciou a falta de clareza de gestores, dirigentes e profissionais de EF sobre a atuação da área no campo da saúde. Os autores apostam que: a) a aproximação com a Saúde Coletiva deve ir além de inclusão de disciplinas; b) a Saúde Coletiva não é restrita ao curso de bacharelado; c) é necessário abordar o tripé da Saúde Coletiva: Epidemiologia, Ciências Sociais e Humanas, Política e Planejamento; d) conceber que o trabalho em saúde é interprofissional e colaborativo (LOCH; RECH; COSTA, 2020).

Nesse sentido, este estudo justifica-se ao tematizar elementos reflexivos sobre as construções curriculares que incidirão na formação de Professores e Profissionais de EF (PEF) para atuarem com o tema da saúde nos mais variados setores - educação básica (licenciatura) e atenção primária, secundária, terciária etc. (bacharelado). Avançamos da análise de disciplinas e ementas (BRUGNEROTTO; SIMÕES, 2009; PASQUIM, 2010) para compreendermos as ações curriculares produzidas por sujeitos em sua relação com as estruturas institucionais.

Entendemos o currículo como uma rede que vai se conformando e se (re)produzindo nas ações dos sujeitos. Das linhas que a tecem, identificamos as disciplinas, as narrativas curriculares, as narrativas dos sujeitos que constroem os currículos, as ações cotidianas dos professores que conduzem as disciplinas, a formação dos professores, as políticas de formação, a pós-graduação e as coerções institucionais sobre o saber-fazer curricular.

O arcabouço teórico está fundamentado em Giddens (2009) e seu conceito de “dualidade da estrutura”, em que a estrutura é, ao mesmo tempo, o meio e o resultado da conduta dos agentes. Dito de outro modo, os sujeitos que coadunam ou subvertem a estrutura só o podem fazer mediante a própria estrutura, pois eles possuem limitações, as quais delimitam a reflexividade institucional.

Trabalhamos também com o conceito de “orientação político-epistemológica” (CUNHA, 2005), segundo o qual as ações docentes estão fortemente vinculadas a um estatuto político-epistemológico que orienta o processo de ensinar e aprender em uma determinada área. Cunha (2005) observa que a organização do conhecimento tem se pautado pelo paradigma hegemônico ancorado na ciência positivista. No entanto, existem rupturas que coadunam com energias emancipatórias em ações ancoradas em um paradigma emergente5.

Com essa base teórica, propusemo-nos investigar as presenças e ênfases dadas ao tema da saúde nos currículos de formação em EF do CEFD/UFES. Dividimos este texto em dois movimentos. No primeiro, conceitual, delimitamos o que entendemos por presenças e ênfases. O segundo, de caráter operacional, diz respeito a quando utilizamos esses conceitos para analisar a empiria produzida no campo de investigação.

Nesses movimentos, observamos as continuidades/descontinuidades, os conflitos e as disputas em torno das ações curriculares sobre o tema da saúde. Nesse sentido, nosso objetivo é apresentar subsídios para o uso dos conceitos presenças e ênfases para a análise curricular sobre o tema da saúde em cursos de EF.

MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, de inspiração cartográfica, durante a qual habitamos um campo no período de 2017 a 2018, no qual atuávamos como docente e discente de pós-graduação.

Buscávamos pistas na construção do campo problemático, e as produzimos num primeiro contato com os Colegiados dos cursos de licenciatura e bacharelado. Obtivemos acesso aos seguintes documentos: da licenciatura, os Projetos Pedagógicos de Curso (PPC) de 1991, 2002, 2006, 2011 e 2012; do bacharelado, o PPC de 2016. As análises mostravam-se insuficientes para a busca da encarnação dos currículos. Destarte, buscamos os professores que participaram de sua construção, fazendo contato com sete deles(as).

Realizamos entrevistas semiestruturadas, entre abril e junho de 2017, nas quais perguntávamos sobre: 1) a participação nas (re)formulações curriculares; 2) como o tema da saúde se configurava naquele(s) currículo(s) e as relações estabelecidas nas tensões/jogos de força; 3) quais as compreensões conceituais percebidas sobre o tema da saúde. Sustentada na inspiração cartográfica (TEDESCO; SADE; CALIMAN, 2013), essa “estrutura” nem sempre foi seguida linearmente ou literalmente, até pelo fato de a própria história/memória arregimentada pelo(a) professor(a) constar de singularidades que a ela fugiam.

Sem preocupação com uma “representatividade do objeto”, buscamos uma amostragem que se configurou como um efeito de “bola de neve”. A partir de dois professores (informantes-chave), conseguimos obter indicações de outros professores que também participaram das reformulações curriculares (efeito “bola de neve”) (VINUTO, 2014). Com essa postura, acompanhamos processos, ouvimos relatos e preocupações sobre os rumos que o Centro estava tomando, principalmente com relação ao tema da saúde. Emergiram pistas que se relacionavam fortemente à figura do professor e dos concursos realizados para a área da saúde nesse Centro.

Foi então que realizamos um zoom6 (KASTRUP, 2010) no campo, que se processou em três movimentos, os quais relacionamos com o conceito de orientação político-epistemológica (CUNHA, 2005). No primeiro, perseguimos a pista referente aos currículos vitae dos professores que compunham o quadro docente do CEFD/UFES. Acessamos os currículos que constavam na Plataforma Lattes no dia 23 de julho de 2017. Buscamos os elementos pertinentes à formação, aos projetos de pesquisas e à produção acadêmica (artigos e livros).

No segundo, adentramos na pista dos concursos públicos vinculados à área da saúde. Solicitamos aos Departamentos do Centro acesso aos documentos referentes aos concursos (editais, atas de concursos, memorandos etc.) que datavam de 1993 até 2017, observando, a partir deles: ano, área, titulação exigida e temáticas/pontos das provas. Acessamos ainda algumas atas que tratavam de discussões acerca dos concursos.

No terceiro e último movimento, buscamos pistas nas práticas docentes cotidianas em disciplinas ofertadas no primeiro semestre de 2017. Por questões logísticas, delimitamos quatro disciplinas que contemplassem os dois cursos e diferentes concepções político-epistemológicas. Duas disciplinas aproximavam-se das Ciências Sociais e Humanas e da Saúde Coletiva, e outras duas, das Ciências Naturais e Biológicas.

Acompanhando essas disciplinas, utilizamos o diário de campo como ferramenta para a produção dos dados. O diário foi estruturado em três campos de registro: 1) descrição dos acontecimentos; 2) sensações ante esses acontecimentos; 3) anotações de referências bibliográficas que pudessem corroborar aproximações analíticas com os fenômenos percebidos. Com os diários, não apenas registramos aquilo que pesquisávamos, mas também o próprio processo de nosso ato de pesquisar (BARROS; PASSOS, 2010).

Ainda tivemos acesso a documentos disponibilizados pelos professores das disciplinas, que consistiram em: planos de ensino, e-mails, provas, roteiros para produção de atividades de campo (documentário, produção de vídeos curtos), slides de aulas, textos de auxílio.

No fim do semestre, realizamos uma entrevista com cada professor, acrescentando, além das três questões apresentadas anteriormente, outras sobre a produção do plano de ensino, a ligação da disciplina com a discussão do tema da saúde e o lugar que ela ocupa no curso. Cabe frisar que todas as entrevistas foram transcritas na íntegra e enviadas para cada um dos professores para conferência, deixando aberta, também, a oportunidade de os professores acessarem os diários de campo produzidos em suas aulas.

A análise dos dados produzidos a partir das entrevistas com os professores, dos currículos vitae acessados e dos diários de campo foi realizada com o programa MAXQDA© Analytics Pro 12 (Release 12.3.2). Trata-se de um software QDA (Qualitative Data Analyze) utilizado para análise de dados qualitativos em Ciências Sociais e que proporciona a gestão de textos, documentos e diversos arquivos de mídia.

Inicialmente, procedemos à leitura dos documentos acessados e dos produzidos. Na sequência, enquanto construíamos as categorias de análise, fomos codificando os documentos a partir delas mesmas. Isso nos permitiu realizar uma análise de triangulação dos dados para compreendermos nosso objeto de estudo.

Apresentamos até aqui os elementos que agregaram a construção do nosso campo de investigação durante nossa habitação naquele espaço. Os caminhos e pistas que perseguimos indicaram-nos as condições de possibilidades de construirmos bases para investigar essas presenças e ênfases do tema da saúde nos currículos de formação.

Os PPCs, os sujeitos envolvidos nos processos de subjetivação, as aulas acompanhadas, os planos de ensino, os editais de concurso, os quadros de oferta de disciplinas, tudo isso foi fruto de um processo da nossa intervenção em campo.

A pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo, obtendo aprovação com o número de parecer 2.104.457. Todos os participantes desta pesquisa foram esclarecidos e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

PRESENÇAS E ÊNFASES: MOVIMENTOS CONCEITUAIS

Partimos da premissa de que as linhas que vão tecendo a rede curricular são arregimentadas na dualidade da estrutura que conforma as condições de possibilidades para as presenças e ênfases dadas ao tema da saúde nos currículos de formação em EF.

Apoiamo-nos nos conceitos de estrutura e de sistema em que é observada a perpetração das consciências prática e discursiva - ambas apoiadas em uma monitoração reflexiva (GIDDENS, 2009). Tais consciências se enredam dentro de uma estrutura composta de traços mnêmicos que orientam a conduta de agentes dotados de capacidade cognoscitiva. Essa estrutura só existe como presença espaço-temporal. As presenças são elementos estruturais que tangenciam a (re)produção dos sistemas sociais ao longo do espaço e do tempo.

As ênfases dizem respeito ao sistema, pois se caracterizam como a criação de condições de possibilidades para a rotinização das relações sociais ao longo do espaço-tempo, contribuindo, assim, para a reprodução das práticas sociais - ou seja, as ênfases também têm relação com a própria constituição da reflexividade institucional7, pois se vinculam à capacidade cognoscitiva dos agentes que estão implicados na construção dos sistemas sociais.

Dito de outro modo: a presença é um traço da estrutura (o conjunto de regras e recursos recursivamente implicados); a ênfase é a rotinização de relações sociais ao longo do tempo-espaço. Nesse sentido, em composição com Giddens (2009), entendemos que os sistemas sociais e a estrutura, mesmo sendo conceitos diferenciados, estão intimamente ligados, o que, da mesma forma, ocorre com as noções de presenças e ênfases.

No aspecto empírico, também é possível conceber as presenças e ênfases. Consideramos como presenças a objetivação do tema da saúde no currículo. As presenças só existem quando materializadas a partir de uma condição de possibilidade que demarca contextos empíricos de existência. As disciplinas/componentes curriculares, as narrativas curriculares (objetivos, justificativas etc.), os espaços de formação e os currículos dos professores são elementos empíricos que possibilitam a construção dessas categorias. Esses elementos podem ser considerados regras e recursos recursivamente implicados na reprodução de sistemas sociais (estrutura).

Dentre as regras, destacam-se os elementos normativos, ou seja, o conjunto de elementos que normatizam a formação (documentos, portarias, leis etc.). Dentre os recursos, temos os alocativos, conceituados como “recursos materiais envolvidos na geração de poder, incluindo o ambiente natural e os artefatos físicos” (GIDDENS, 2009, p. 443). Podemos considerar, por exemplo, as disciplinas e as estruturas físicas (salas, laboratórios etc.) como artefatos físicos/culturais, pois foram produzidos por agentes e fornecem informações sobre seus produtores e usuários. A presença encontra-se como parte constituinte da estrutura, uma vez que revela os traços de memória, as linhas de cognoscitividade e a base para a ação dos agentes (GIDDENS, 2009).

Logo, conceituamos presenças como as condições de possibilidade para a existência empírica de regras e recursos alocativos constituintes da estrutura dos currículos de formação.

Já nas ênfases, compreendemos os efeitos gerados por afetos. Ênfase, do grego émphasis (reflexo, imagem) ou do latim emphăsis,is (força enunciativa), é apresentada no dicionário pela relação com as acentuações, exageros ou destaque dados às expressões ou à voz em um discurso. As ênfases podem ser entendidas como o efeito gerado sobre a presença, a partir da qual passa a afetar a sua existência em uma determinada perspectiva. Na esteira da teoria da estruturação, as ênfases podem ser compreendidas como elementos que perpassam a reflexividade institucional, ou seja, relacionam-se com os sentidos, os significados, as ações que geram poder (GIDDENS, 2009).

Uma determinada ênfase afeta uma presença de acordo com a cognoscitividade e a reflexividade que com ela compõem ou a subvertem. Logo, temos por ênfases as formas nas quais se conformam as presenças. As ênfases processam-se nas rotinizações das relações sociais no decorrer do tempo-espaço. Desse modo, se a presença está para a estrutura, a ênfase está para o sistema que apresenta elementos da rotinização que desencadeiam a continuidade das práticas cotidianas (micropolíticas), as quais sustentam e são sustentadas pela reflexividade institucional em uma espécie de monitoração reflexiva (GIDDENS, 2009).

Podemos também caracterizar as ênfases como determinadas orientações político-epistemológicas (CUNHA, 2005) que afetam as presenças - sendo que estas não se consolidam sem uma ênfase, ou ênfases em disputa, e vice-versa. Isso significa dizer que as ênfases não precedem as presenças, pois são estas que dão as condições de possibilidade para que as outras componham com elas, dando distintas orientações no decorrer do tempo-espaço. Por exemplo, primeiro é necessário o estabelecimento de estruturas recursivamente organizadas em regras e recursos alocativos (presenças) para que estes possam ser afetados por uma determinada reflexividade (ênfases). É necessário ressaltar, ainda, que tais dimensões não são separadas e estanques, mas se vinculam em uma complexa relação.

Dito isso, conceituamos ênfases como os afetos gerados na/com a presença, designando, assim, distintas orientações político-epistemológicas nos currículos de formação.

Condições recursivas para a existência (presenças) e formas de afeto e regularidades rotinizadas (ênfases) integram a forma curricular e suas práticas cotidianas. Alicerçados nessa perspectiva é que lançamos o olhar para as linhas das redes curriculares a fim de conceber as presenças e ênfases do tema da saúde produzidas nos currículos de formação do CEFD/UFES.

AS PRESENÇAS E ÊNFASES DO TEMA DA SAÚDE NA FORMAÇÃO INICIAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA

Passamos a apresentar cinco presenças das quais o tema da saúde recebe condições de possibilidade para existência nos currículos de formação do CEFD/UFES. São elas: a presença disciplinar, a presença da prática como eixo formador, a presença mínima (ou embrionária), a presença curricular (ou das narrativas dos Projetos Pedagógicos de Curso) e a presença acadêmica (ou da formação dos professores).

Presença disciplinar

Apesar de compreendermos que os currículos são mais do que o conglomerado de disciplinas, observamos que o aspecto disciplinar ainda é majoritário em sua constituição. A sociologia baumaniana permite-nos compreender que tal fenômeno compõe o anseio/projeto moderno pela ordem e pela classificação dos fenômenos, cada um em sua “caixa” (BAUMAN, 1999). A lógica disciplinar é moderna por se ancorar no arquétipo cartesiano de separar as partes para explicar o todo. Observamos nos currículos essa lógica concretizada pelas disciplinas.

Pistas produzidas nos PPCs, na constituição das disciplinas e nas narrativas de professores envolvidos em suas construções indicaram como a presença disciplinar é um dos elementos centrais que permitem a materialização do tema da saúde. Elencamos como exemplo dessa presença a narrativa de uma das professoras:

Quando eu crio a disciplina, eu posso reivindicar uma vaga de concurso dizendo assim: olha aqui; nós temos a disciplina história do ‘cuspe à distância’, metabolismo do ‘cuspe à distância’, pliometria do ‘cuspe à distância’, não sei o que do ‘cuspe à distância’. E, portanto, nós precisamos criar uma vaga para professor de ‘cuspe à distância’ (silêncio... riso) (PROFESSORA 1, entrevista).

Essa narrativa indica algo sobre as disputas políticas que ocorrem em torno da hegemonia do currículo. Na concepção da professora, a presença disciplinar apresenta-se tão fortemente que chegaria a influenciar na contratação de professores. Na esteira de Giddens (2009), concebemos que essa contratação não se daria apenas pela presença de disciplinas, mas, também, pelo estabelecimento de uma consciência prática na qual os sujeitos se encontram imbuídos em prosseguir no sentido de assegurar a rotinização dos saberes-fazeres curriculares que estão pautados na reflexividade institucional.

Não obstante, vemos que o fenômeno da presença disciplinar também é observado em estudos que se debruçam sobre a incidência das disciplinas obrigatórias e optativas sobre o tema da saúde (BRUGNEROTTO; SIMÕES, 2009; PASQUIM, 2010). Esses estudos corroboram a ideia de que a presença disciplinar que recebe o tema da saúde não é uma questão apenas dos cursos do CEFD/UFES, mas acompanha a reflexividade das instituições modernas, o que inclui a área da EF.

Outra pista observada trata da lógica disciplinar da Universidade, que sempre se mostrou como um elemento constrangedor dos currículos de formação. No entanto, por outro lado, agenciamentos eram construídos no sentido de subverter essa lógica.

Para você ter ideia, nós brigamos com a Universidade inteira para fazer aquele currículo funcionar. Porque a gente esbarrava em coisas do tipo: não pode ter essa unidade curricular, porque não tem como lançar no sistema. E aí como, também, mudar o sistema da Universidade não era um negócio muito fácil (risos), o controle teve que ser artesanal. Não tinha outro termo (PROFESSORA 1, entrevista).

A narrativa expressa o “encastelamento” das disciplinas operado pela Universidade, ao não permitir outras formas de se construirem os currículos. Esse “encastelamento”, segundo Macedo et al. (2011), necessita ser superado, uma vez que ele expressa a racionalidade das disciplinas tradicionais como único meio de construir o conhecimento (metodologicamente, pela sua divisão e hierarquização). No caso do tema da saúde, discutir e buscar superar esse modelo pode ocorrer com a produção de “projetos multiprofissionais, atuação docente multiprofissional e ações multiprofissionais na pesquisa, na extensão e nos cenários de práticas precisam ser prestigiadas” (CARVALHO; PRADO; ALONSO, 2013, p. 5).

Essa necessidade é destacada em Loch, Rech e Costa (2020) ao considerarem os limites de uma formação disciplinar, linear e conteudista. Se o processo saúde-doença é demasiadamente complexo, a formação em EF necessita ser pautada na interprofissionalidade e interdisciplinariedade, que supere a visão que fragmenta o conhecimento em disciplinas (LOCH; RECH; COSTA, 2020; REIS; GOMES; OLIVEIRA, 2020).

Na eminência do imperativo que subverte a presença tradicional, vemos surgir outra presença do tema da saúde nos currículos de formação no CEFD/UFES. Para observá-la, tivemos que redirecionar o olhar das disciplinas do currículo para os tempos e espaços cotidianos nos quais esse é praticado. É no cotidiano que se encontram os cenários de prática nos/com os quais se engendra a prática como eixo formador.

Presença da prática como eixo formador

Conforme nos alertam Carvalho, Prado e Alonso (2013, p. 5):

A experiência da Educação Física no serviço público de saúde ensina que é preciso, antes de tudo, considerar as características do território para planejar suas intervenções visando atender as necessidades de saúde da população local. Formar a fim de garantir a integralidade na atenção e a ação interprofissional compartilhada e intersetorial, por exemplo, é muito diferente da formação centrada nos conteúdos e na pedagogia da transmissão que desconsidera a realidade das condições de vida e da saúde e desconecta o estudante dos cenários de práticas.

Agrega-se, aí, a necessidade de, nos currículos de formação, ser considerado o entorno sociocultural no qual as relações humanas são estabelecidas (BAGRICHEVSKY, 2007). Para além da aproximação dos cenários de práticas, Ferreira et al. (2013) indicam que a Universidade também deve se responsabilizar por criar cenários e propostas pedagógicas que incorporem os contextos de atuação profissional nos currículos de formação inicial.

Uma das pistas que nos remeteram a essa presença deu-se no estágio do curso de bacharelado - eixo de formação na saúde. Nesse caso, um dos cenários de prática observado, com o qual o estágio se articula, é o Serviço de Orientação ao Exercício8 (SOE). Não obstante, foi observado que essa ainda é uma ação tímida, já que há uma concorrência de outros dois espaços nesse estágio, em que os alunos devem decidir por qual optar9.

Outra pista tem relação com as construções do currículo e das experiências curriculares no cotidiano. Nas disciplinas acompanhadas, observamos a constituição de metodologias e dispositivos não tradicionais, como a produção de vídeos/documentários, aulas de campo e visitas aos serviços públicos de saúde. Consideramos que estes são elementos/estratégias que descaracterizam o aspecto disciplinar tradicional e começam a criar condições de possibilidade para inserir os alunos nos contextos de práticas, inclusive aqueles relacionados aos serviços públicos de saúde.

Esses espaços-tempos engendram elementos da formação do PEF, uma vez que a presença da prática como eixo formador cria condições de possibilidade de estabelecer movimentos no cotidiano das práticas que são produzidas nas relações (FREITAS; CARVALHO; MENDES, 2013). Além disso, tais encontros dependem do exercício da escuta qualificada e das ações compartilhadas que os alunos têm a oportunidade de vivenciar (ROCHA; CENTURIÃO, 2007).

Ressaltamos que a prática, como eixo formador, pode perspectivar distintas ênfases. Notamos tal pista a partir da fala de uma professora entrevistada. Ao discorrer sobre o estágio no curso de bacharelado (já citado), a professora relata:

Então, a gente tem três campos que são divididos: o campo da academia, o NUPEM - que tem uma vertente mais puxada também para a academia - e o do SOE. Eu herdei esse estágio do professor Bruno, que ele trabalhava nas Unidades Básicas de Saúde com os grupos da saúde da família. Então, ele saindo desse estágio eu passei por assumi-lo. E aí eu optei por ficar mais no Serviço de Orientação ao Exercício que é onde o professor de Educação Física se localiza mais dentro desse projeto que existe lá na Prefeitura de Vitória (PROFESSORA 5, entrevista).

Na narrativa, observamos que não basta apenas realizar uma atividade de campo ou estágio para alcançar a integração ensino-serviço com vistas à prática como eixo formador. Compreendemos que essa premissa se verifica, uma vez que essas aproximações podem ocorrer orientadas pelas tecnologias duras, leve-duras e leves (CECCIM; BILIBIO, 2007). No exemplo apresentado, a mudança de professor(a) tanto quanto do próprio local do estágio, acabou por indicar distintas formas de se orientar o mesmo.

Um ou outro aluno questiona a questão de não conseguir aplicar todos os princípios do treinamento. Aquela ciência mais dura. De dizer assim: ‘não dá para ter muita progressão. É muita gente. Não dá para corrigir todo mundo’. Então, eles começam a ver esses detalhes que também são importantes e que precisam ser minimizados em relação às práticas. Mas que precisam também ser relativizados. É preciso falar com eles: ‘olha, ali não é uma academia de ginástica’ (PROFESSORA 5, entrevista).

O trecho apresentado indica o conflito, no estágio, entre os saberes das tecnologias duras e leve-duras (embasados na epidemiologia do risco, nos protocolos de treinamento, nas variáveis quantitativas das taxas metabólicas corporais etc.) e os saberes das tecnologias leves orientadas no ato do trabalho vivo, no encontro com o usuário do serviço.

Com base em uma proposta vinculada às Ciências Sociais e Humanas, observamos que as tecnologias leves necessitam ser integradas na prática como componente formador, pois é a partir delas que ocorrem o trabalho vivo e o encontro com os usuários dos serviços (CECCIM; BILIBIO, 2007). Sob essa perspectiva, a exclusão das tecnologias leves implica a negação das pessoas que sabem sobre sua saúde e que podem assumir um espaço de empoderamento no processo de enfretamento e administração das infidelidades do meio (DEJOURS, 1986; CANGUILHEM, 2009).

A abertura de espaços-tempos e corpo docente que trabalhem com as perspectivas das tecnologias leves pode estabelecer contrapontos com a tradição biologicista que fundamenta as tecnologias duras e leve-duras, no sentido de acompanhar a prática como eixo formador a partir de orientações político-epistemológicas não tradicionais e inovadoras. Inovadoras não apenas no sentido de alargar conteúdos, mas de serem capazes de alterar o próprio sentido das práticas (SILVA; BRACHT, 2012).

Consideramos que, quando a rede se expande para a operação de mudanças nos currículos de formação, se produzem meios potenciais para o estabelecimento dessas mudanças, já que, em seu seio, são geradas as condições de possibilidade para a subversão da hegemonia posta e, também, a continuidade das práticas curriculares.

Presença mínima (ou embrionária)

Estudos vêm apontando um descompasso do tema da saúde entre os cursos de licenciatura e de bacharelado (BRUGNEROTTO; SIMÕES, 2009; FONSECA et al., 2011; FLORINDO et al., 2012; FONSECA; NASCIMENTO; BARROS, 2012). Isso nos permite considerar que esse fenômeno não é restrito ao CEFD/UFES, mas se coloca como uma questão do próprio cenário dicotômico das formações que a área vem assumindo no decorrer de sua história.

Podemos observar, no quadro 1, tal descompasso no tocante a uma presença mínima do tema da saúde no curso de licenciatura em relação ao bacharelado.

Fonte: PPCs. Legenda: * = disciplinas optativas.

ATIF = Atividades Interativas de Formação.

Quadro 1 Disciplinas relacionadas ao tema da saúde no decorrer do tempo no CEFD/UFES 

O quadro permite destacar que o advento do curso de bacharelado conferiu uma maior presença do tema da saúde no CEFD/UFES. No entanto, esse tema vem assumindo uma posição mínima no curso de licenciatura. Podemos, ainda, citar o “desaparecimento” dos componentes curriculares optativos (ATIFs e Oficinas de Docência) na transição do PPC de 2011 para o de 2012 no curso de licenciatura.

Percebemos que, atualmente, enquanto o curso de licenciatura abriga uma disciplina de 30 horas que discute a saúde, o curso de bacharelado apresenta 12 (doze) disciplinas, das quais duas são obrigatórias e dez são optativas (todas com 60 horas, e o estágio com 105 horas).

Parece-nos que esse fenômeno não é específico do contexto pesquisado, mas é fruto de constrangimentos institucionais, cujo exemplo se encontra na própria legislação. Citamos, por exemplo, a especialização da EF para a carreira docente escolar, fundamentada pelas Resoluções 1 e 2 de 2002 (BRASIL, 2002a; 2002b), que parece ter redimensionado os currículos de formação para as discussões socioculturais e pedagógicas. Esse cenário pode ter contribuído para a redução do tema da saúde, sobretudo, por uma questão: seriam a consideração da saúde biológica e a crítica radical a ela endereçada por movimentos renovadores no seio das instituições as responsáveis pela “minimização” desse tema, sem, contudo, a sua recuperação pela discussão do movimento sanitarista brasileiro?

O PPC de 2006 da licenciatura, orientada nessas políticas, teceu dura crítica ao paradigma da aptidão física e à concepção biológica da saúde. Porém, a crítica parece não recuperar tal tema com a materialização de espaços-tempos curriculares com carga horária mínima para a discussão da saúde a partir das Ciências Sociais e Humanas e/ou da Saúde Coletiva. Inclusive, parece que esse currículo se tornou um “divisor de águas” no CEFD e que contribuiu significativamente para a construção do curso do bacharelado.

[...] o curso de licenciatura, na época, apresentou uma matriz, apresentou uma grade curricular, assim, que está mais para ser um pedagogo do que um professor de EF. Aí, um determinado grupo de professores falou: ‘ah não! Agora por vez a gente tem que criar o bacharelado’ (PROFESSOR 7, entrevista).

Não obstante a crítica ao paradigma da aptidão física e a concepção de saúde biológica, que nos parece ter desembocado na minimização do tema da saúde na licenciatura e a construção do curso de bacharelado com uma grande presença desse tema, devemos considerar que o currículo de 2006 da licenciatura é fruto da cognoscitividade dos agentes nesse período de reformulação curricular, ou seja, da reflexividade do seu tempo.

Como consequência dessas construções históricas, observamos que o curso de bacharelado passa a ser nutrido nos concursos públicos realizados para a área da saúde, em que professores com orientação político-epistemológica na área das Ciências Naturais e Biológicas são contratados10. Tal fato é reforçado na análise dos currículos vitae desses professores, cujas temáticas principais estão vinculadas às Ciências Naturais e Biológicas (cf. quadro 2).

Essa configuração cria algumas dificuldades para a tematização da saúde em uma perspectiva vinculada às Ciências Sociais e Humanas no CEFD/UFES. E esta seria uma segunda espécie de “minimização” que o tema da saúde recebe nos currículos de formação quando comparado às Ciências Naturais e Biológicas. Trabalhamos com a premissa de que a orientação político-epistemológica da formação dos professores (expressa em parte por seus currículos vitae) e os concursos públicos têm sido dois dos elementos que contribuem na conformação da “minimização” do tema da saúde no tocante à sua abordagem social e humanística.

Ainda, observamos o fortalecimento da área biológica em decorrência das políticas de fomento da pós-graduação, sendo essa mais uma ação que corrobora a perspectiva de construção do tema da saúde a partir da hegemonia biomédica historicamente instalada na área.

Apesar de tal cenário, vemos que a presença mínima, também, é embrionária, uma vez que há professores que vêm se apropriando dos espaços de debates sobre o tema da saúde pelo viés das Ciências Sociais e Humanas e da Saúde Coletiva no CEFD/UFES, inclusive assumindo disciplinas nessa temática. Entretanto, a sua presença acontece frequentemente de forma não programada, ou seja, como uma consequência impremeditada (GIDDENS, 2009).

As ações dos professores e os processos desenvolvidos em voga de uma saúde ampliada são formulações que mostram como esse fenômeno, “embrionário”, pode ganhar condições de possibilidades de subverter a hegemonia biomédica na formação no que tange à orientação restrita que se dá ao tema da saúde.

Esse fator “embrionário” é corroborado com Costa et al. (2012) ao afirmarem que os conhecimentos da Saúde Coletiva seriam profícuos para a licenciatura e o bacharelado - ou seja, conhecimentos com base nessa orientação político-epistemológica produzem motes no desenvolvimento da EF como profissão da área da saúde (NASCIMENTO; OLIVEIRA, 2016).

Demandas sociais têm sido criadas com a produção de políticas vinculadas à saúde. No contexto escolar, podemos citar o PSE, programa que tem solicitado aos agentes escolares (dentre eles a EF) contribuições no tocante ao desenvolvimento da saúde dos alunos (BRASIL, 2007). Por outro lado, vemos a PNPS (BRASIL, 2010), a qual tem possibilitado a presença do PEF em equipes multiprofissionais de saúde. Sob essa perspectiva, as PCAF vêm sendo visualizadas como elementos que podem contribuir para o desenvolvimento da saúde da população.

No sentido da discussão realizada nessa presença, com a íntima relação da EF com a saúde em diferentes contextos, é necessário problematizar a dicotomia criada em seus cursos de formação, como se a saúde fosse um tema do bacharelado em detrimento da licenciatura.

Presença “curricular” (ou das narrativas dos PPCs)

O currículo é muito mais do que os documentos que o representam. Compreendemos o currículo como uma rede que se forma em torno das subjetividades formadoras e em formação (ALVES, 2010). Todavia, nesse subtópico, utilizamos o termo presença “curricular” (entre aspas), no sentido estrito documental (das narrativas expressas nos PPCs).

Compreendemos que essa presença é fruto das consciências práticas monitoradas reflexivamente (GIDDENS, 2009) e que as identifica, apresentando, também, as disputas por espaço nos currículos de formação. Observamos os PPCs como dispositivo político, pelo movimento constituinte que dá materialidade a ele (e os usos possíveis que dele se faz), instituindo os seus limites e potencialidades nos processos institucionais. Os PPCs identificam os movimentos das ações dos (grupos de) professores que expressam determinadas orientações político-epistemológicas e que produzem disputas acadêmicas em torno, por exemplo, das contratações de novos professores.

Identificamos dois grandes movimentos de narrativas nos PPCs. Nesse sentido, observamos no PPC-L de 2006 um movimento de crítica à concepção de saúde biológica (paradigma da aptidão física) e a instituição de uma visão ampliada (apesar de essa visão não ser convertida na forma de disciplinas nomeadamente da saúde naquele documento). Essa presença encontra nas ações de um grupo de professores as condições de possibilidade para sua materialização documental. Visualizamos essa ação não somente na assinatura dos professores no documento curricular, mas, inclusive, na publicação de um artigo no qual apresentam esse currículo à comunidade acadêmica (PAIVA; ANDRADE FILHO; FIGUEIREDO, 2006).

A presença “curricular” do tema da saúde é encontrada nas narrativas expressas nos documentos e na consciência discursiva dos professores (GIDDENS, 2009). O movimento de crítica à concepção biológica da saúde instituído a partir do PPC-L de 2006 inicia um processo para uma perspectiva ampliada de saúde. Com o distanciar do tempo e do espaço, vemos tais narrativas se desdobrarem na criação de componentes curriculares e, também, em sua retirada (cf. quadro 1).

Nesse cenário, são expressos os movimentos de rupturas amparados nas narrativas dos professores - principalmente daqueles que estiveram envolvidos com as reformulações no curso de licenciatura. Apesar dos paradoxos que envolvem a presença disciplinar do tema da saúde no curso de licenciatura, vemos que as narrativas construídas em 2006 corroboram a criação de uma disciplina “Educação Física e Saúde” em 2012 - que avança com as discussões da Saúde Coletiva.

A segunda grande narrativa encontra-se no PPC-B de 2016. Esse currículo apresenta o tema da saúde como um eixo norteador da formação para os espaços não escolares. Nesse sentido, a presença dá-se na justificativa para a existência do tema da saúde na formação do bacharel em EF. Esse entendimento parece seguir o fenômeno relatado na hipótese da diferenciação interna da área (BRACHT, 2003), uma vez que a diferenciação dos currículos parece permear a distinção de ênfases na formação (PIZANI; BARBOSA-RINALDI, 2014).

Outra narrativa que o currículo apresenta é a da saúde ampliada, que parece acompanhar, inclusive, o conceito proposto na VIII Conferência Nacional de Saúde (BRASIL, 1987). Assim, as PCAF são correlacionadas com a saúde nas mais variadas perspectivas, que vão desde os conhecimentos biofisiológicos até os socioculturais, pedagógicos, filosóficos e políticos. Entretanto, o currículo apresenta o paradoxo entre a narrativa ampliada e a presença majoritária de disciplinas vinculadas à orientação político-epistemológica das Ciências Naturais e Biológicas.

Tais ambiguidades, também, foram comentadas por professores. “Já na discussão do bacharelado, ela também tem nas disciplinas, nas ementas essa visão mais ampla. Só que a gente percebe que no vivido há uma tentativa de biologização” (PROFESSORA 5, entrevista). O relato apresentado aponta que a narrativa “curricular” nem sempre é praticada nos cotidianos, já que muitos professores se vinculam às orientações político-epistemológicas centradas nas Ciências Naturais e Biológicas. Nesse sentido, questionamos: como é possível haver uma narrativa “curricular” ampliada, ao mesmo tempo que se produzem práticas biologizadas?

Compreendemos que as narrativas “curriculares” não se constituem como força micropolítica se não estiverem vinculadas a uma consciência prática condizente com ela. Na esteira de Giddens (2009), vemos que, na consciência prática, o agente “não se atém” ao que está fazendo, pois ele o faz porque sabe/crê que aquela é a coisa mais correta a se fazer. Nessa lógica, apesar das narrativas “curriculares”, um currículo pode apresentar paradoxos, já que é praticado por diferentes sujeitos com distintas orientações político-epistemológicas (CUNHA, 2005).

Presença “acadêmica” (ou da formação dos professores)

Para caracterizar uma presença “acadêmica”, consideramos a formação dos professores como ações mediadas a partir de uma reflexividade institucional (GIDDENS, 2002) e que fazem parte da rede que compõe os currículos. Essas formações permitem que observemos como as ações sobre determinadas formas reflexivas de se pensar/fazer currículo vão sendo nele constituídas com determinadas presenças e que vão orientar distintas ênfases. Denominamos de presença “acadêmica” (entre aspas), no sentido estrito da formação dos professores, aquela que se encontra expressa em seus currículos vitae.

Consideramos que o tema da saúde se faz presente na formação dos professores e que esse fato parece se associar a distintas orientações político-epistemológicas (CUNHA, 2005). Os dados produzidos a partir dos currículos vitae indicam, com relação à formação, que o tema da saúde se apresenta, principalmente, a partir das temáticas das titulações e de seus relatórios de conclusão do curso (TCC, dissertações e teses).

Fonte: Currículos Lattes dos professores do CEFD/UFES.

Quadro 2 Principais temáticas da formação dos professores do CEFD/UFES 

Observamos no quadro a diferença das temáticas entre os departamentos, uma vez que o Departamento de Desportos (DD) parece se vincular mais às Ciências Naturais e Biológicas, e o Departamento de Ginástica (DG), às Ciências Sociais e Humanas. Ademais, percebemos que o tema da saúde aparece, nomeadamente, com maior recorrência no DG.

Contudo, ambiguamente, observamos uma narrativa que indica que professores formados (e pesquisadores) na área biológica se autointitulam da área da saúde.

Então, a gente percebe, assim, nas nossas reuniões de Departamento todo mundo que pesquisa na área biológica, eles se intitulam professores da área da saúde. Como se bastava estar envolvido com a área biológica já ser uma pessoa envolvida com a área da saúde. Então, há um certo reducionismo na fala em relação ao tema saúde quando se fala em vivido (PROFESSORA 5, entrevista).

São esses professores, inclusive, que acabam por assumir a maioria das disciplinas consideradas da área da saúde (exclusivamente, no curso de bacharelado). Nesse sentido, observamos o paradoxo que tem se destacado no decorrer do tempo-espaço. Problematizando o fenômeno, parece-nos que há pouca aproximação dos professores do DG nas ações curriculares relativas ao tema da saúde, mesmo que esses apresentem maior presença em suas formações sobre tal tema.

Esse fenômeno parece estar ligado à própria história da área, na qual as discussões de saúde se circunscreveram nas Ciências Naturais e Biológicas. Logo, a presença majoritária de professores com formação nessa orientação político-epistemológica (CUNHA, 2005) provoca um “alongamento” dessa reflexividade no tempo-espaço institucional (GIDDENS, 2009).

Contudo, há, nesse cenário, o surgimento de consequências não premeditadas (GIDDENS, 2009) quando observamos a presença de professores que, abrigados nas Ciências Sociais e Humanas e na Saúde Coletiva, produzem algumas ações em outra direção que não a da tradição biomédica.

Outro elemento que exerce influência nesse complexo fenômeno é a pós-graduação, uma vez que a EF é considerada, no sistema brasileiro de pesquisa e pós-graduação, pertencente à Área 21 (Grande Área das Ciências da Saúde). A orientação político-epistemológica dessa área é vinculada às Ciências Naturais e Biológicas, o que denota uma “atração (fatal) para a biodinâmica” (MANOEL; CARVALHO, 2011).

Esse cenário é um fator preponderante para compreendermos as contradições no caso dos currículos de formação do CEFD/UFES. Historicamente, esse Centro construiu um forte traço pedagógico, mas acabou sofrendo constrangimentos constantes do aparato maior da reflexividade institucional da pós-graduação na qual está inserida a EF.

Por outro lado, o aumento da presença do tema da saúde em outras lógicas (aqui, no nosso caso, nas Ciências Sociais e Humanas e na Saúde Coletiva) parece instituir outras possibilidades para a presença do tema da saúde na formação em EF, pois indica diferentes trajetórias que podem transformar tal cenário. Nota-se que tais ações compõem a potencialidade de questionar a tradição até então propagada na EF e materializada nos currículos de formação superior dessa área.

AS ÊNFASES DO TEMA DA SAÚDE NA FORMAÇÃO INICIAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA

As presenças materializam os contextos empíricos de existência (e ação) do tema da saúde nos currículos de formação. As suas conformações são afetadas pela reflexividade que passa a caracterizar aquilo que denominamos de ênfases. A seguir, apresentamos duas ênfases: a) ênfase técnico-cientificista, biofisiológica e biomédica; e b) ênfase pedagógica, pública e coletiva. Compreendemos que essas ênfases expressam os contornos que o tema da saúde vai ganhando no cenário institucional do CEFD/UFES e os movimentos que ocorrem nos currículos que passam a afetar a formação em EF.

Ênfases técnico-cientificista, biofisiológica e biomédica

A tradição ocidental moderna expressa a especialização das disciplinas científicas, que foi absorvida pelas suas instituições, inclusive, as educacionais. A ciência é conclamada como arquétipo da educação das pessoas - uma educação universal, técnica e científica. A divisão e hierarquização dos conhecimentos em disciplinas corrobora a maneira como se produzem as formas de se educar no ensino superior, o que inclui nosso campo de pesquisa.

Muitas das disciplinas curriculares se caracterizam pela natureza científica, mormente, como frutos de aplicação das ciências-mãe: anatomia, fisiologia, bioquímica etc. No CEFD/UFES, assim como em outras instituições, observamos que, entre os anos 70 e início dos 80, foi aplicado o currículo mínimo. Esse tipo de currículo sobrepuja todos os contextos de cada Instituição de Ensino Superior, pois sua “aplicabilidade cientificista” sobre o “saber-fazer” concebe uma extensão universal do conhecimento que congrega, não permitindo saberes particulares de cada localidade (SOUZA NETO et al., 2004; BENITES; SOUZA NETO; HUNGER, 2008).

Apesar do rompimento com o currículo mínimo, que na instituição pesquisada se deu a partir do PPC-L de 1991, o conhecimento curricular ainda continua destrinchado pela hierarquia disciplinar que se sustenta pela ênfase cientificista. Sob essa perspectiva, vemos que a própria intenção pela transformação acaba por acompanhar a reprodução da estrutura, levando assim a se consolidar no distanciamento do tempo-espaço.

Na presença disciplinar que acaba por se sustentar a partir da lógica da ênfase cientificista, há um ponto de interseção, ou seja, tal ênfase corrobora a presença disciplinar do tema da saúde (e de outros) quando há relatos de que as disciplinas como anatomia, fisiologia, bioquímica etc. se ligariam a tal temática. Nesse sentido, é expressa uma concepção restrita de saúde (biológica), que está centrada no aparato científico tradicional.

O paradigma epistemológico tradicional postula princípios e leis que acabam por definir as atividades de ensino na Universidade (CUNHA, 2005). Essas definições hierarquizam os saberes, destacando como superiores aqueles advindos das Ciências Naturais e Biológicas. Esses princípios assentam-se no paradigma dominante expresso no modelo de racionalidade (quantificação, neutralidade entre sujeito/objeto, produção do conhecimento sobre a relação causa/efeito), no qual o método científico opera a redução da complexidade (SANTOS, 2010).

A ênfase cientificista que afeta os currículos de formação do CEFD/UFES decorre da própria configuração epistemológica da área que, ao ser vinculada à Grande Área da Saúde/Área 21 (CAPES/CNPq), passa a ser influenciada pelos parâmetros científicos da biodinâmica (ciência que, hegemonicamente, se concentra em torno dos estudos biofisiológicos e biomédicos).

Esse cenário curricular influenciado pela pós-graduação é percebido em estudos que realizam críticas a esse modelo em voga no campo da EF (MANOEL; CARVALHO, 2011; BRACHT, 2014). Vemos em Bracht (2014), também, a afirmação de que a relação da EF com a ciência se apresenta, metaforicamente, nas cenas de um casamento infeliz. Observamos que esforços por mudar a lógica disciplinar nos currículos de formação para uma contextualização interprofissional e interdisciplinar estabeleceriam aquilo que Bracht (2014) denomina de se interessar pela ciência sem ser por ela dominada. Ou, nos termos do mesmo autor, que a produção científica na Educação Física não se resuma a uma prática reificada que pouco estabelece diálogo com a intervenção profissional (BRACHT, 2015).

Essas são linhas que se põem na rede de formação, mas que são, constantemente, constrangidas pelo sistema de pós-graduação em, pelo menos, dois sentidos. O primeiro trata do fomento de políticas públicas (e, nesse caso, podemos citar o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI), em que a pós-graduação ganha espaço na (re)formulação dos currículos de formação, influenciando-os, assim, quanto às formas como se darão as presenças e ênfases do tema da saúde. O segundo relaciona-se com a própria formação dos professores que atuam/atuarão na formação superior, isto é, tais professores terão consolidadas em sua formação pós-graduada determinadas orientações político-epistemológicas (CUNHA, 2005) que influenciarão a constituição dos currículos de formação e da própria experiência curricular cotidiana.

Vemos que a ênfase cientificista também se faz manifesta a partir dos currículos vitae dos professores, uma vez que a Universidade também congrega a responsabilidade social de produção do conhecimento. Nesse sentido, é percebido que há uma ênfase do tema da saúde, que se liga à produção de conhecimento nas áreas biomédica e biofisiológica. Trabalhamos com a ideia de que essa ênfase decorre, em parte, de uma orientação político-epistemológica (CUNHA, 2005) presente na formação e na produção científica desses professores.

Sob essa perspectiva, observamos a pista de que há professores que se autointitulam da área da saúde no sentido de desenvolverem ou se aproximarem de estudos na área biológica. Uma problemática que pode decorrer de tal cenário se vincula ao fato de que as ações desses professores influenciam na constituição dos currículos de formação do CEFD/UFES. Dessa forma, a ênfase biofisiológica e biomédica concorrerá na constituição de uma formação unilateral, pois se concentra na relação causa-efeito e corre o risco de recair em uma perspectiva meramente “aplicacionista” dos conceitos/protocolos científicos (REZER; FENSTERSEIFER, 2008).

Outro momento em que observamos a ênfase cientificista, biofisiológica e biomédica se materializou no cotidiano das práticas das disciplinas acompanhadas. As ações dos atores que perpassam o cotidiano refletem (e reproduzem) tal ênfase, uma vez que os dados empíricos nos mostram a produção de discursos e práticas que se vinculam a protocolos e teorias que estão ligadas às Ciências Naturais e Biológicas; não apenas à sua orientação político-epistemológica, mas, também, ao seu modus operandi, assim produzindo uma consciência prática (GIDDENS, 2009) que corrobora tal ênfase.

As ênfases biofisiológica e biomédica, tomadas isoladamente na formação, estão associadas à redução da complexidade do tema da saúde a um conceito restrito como mera “ausência de doença”. Também pode resultar no processo de moralização das ações de saúde, gerando, dessa forma, práticas que culpabilizam o sujeito pelo seu estado de (ausência) de saúde (CAPONI, 2003). Somam-se a isso as tentativas de se produzir um conceito (científico) de saúde, envolto em protocolos e regras orgânicas, individualizadas e normalizadoras, o qual acaba por atenuar o entendimento estrito de que apenas à ciência cabe dizer o que é ser saudável (normal) ou patológico (CANGUILHEM, 2009).

Ao contrário, Caponi (2003, p. 57), baseada em Canguilhem, afirma que “[...] não é possível reduzir o conceito de saúde a um termo ‘científico’”. Tal fato se deve à perspectiva de que a vida não se restringe ao modelo científico hegemônico (biomédico) e necessita de outros olhares para ser compreendida. Portanto, saúde e doença são dimensões da vida que necessitam ser analisadas não como opostos ou como sinônimos de normalidade/anormalidade (CANGUILHEM, 2009).

Consideramos que os fenômenos que decorrem das ênfases cientificista, biofisiológica e biomédica, quando tomados como única forma de se abordar o tema da saúde nos currículos e nas experiências curriculares, podem produzir implicações nas práticas de formação em EF. Destacamos aquela que orienta uma redução das possibilidades de compreensão do tema da saúde que produz práticas e saberes centrados em uma pedagogia da transmissão e uma perspectiva biomédica.

Ênfases pedagógica, pública e coletiva

As ênfases pedagógica, pública e coletiva emergem a partir da crítica às ênfases abordadas anteriormente. Podemos observar, no tempo-espaço, que essas ênfases podem ser ancoradas a partir da década de 1980, período que abrigou a redemocratização da sociedade brasileira, a promulgação da Constituição Federal, o movimento sanitarista, a constituição do SUS, congregado por concepções ampliadas de ser humano, sociedade e saúde.

No âmbito da EF, vemos a aproximação de parcela de seus professores/intelectuais com os conhecimentos advindos das Ciências Sociais e Humanas e, também, da Saúde Coletiva, o que gerou um movimento de crítica ao cenário tradicional reproduzido no tempo e no espaço. Essa aproximação permitiu a crítica ao fenômeno esportivo (no qual se desenvolveu a noção de saúde relacionada à aptidão física) até então predominante na área.

Essa vertente vai representar não só um polo de resistência política no campo, mas, também, resistência acadêmica ao cientificismo das Ciências do Esporte. Mais recentemente, é visto um movimento que reforça a necessidade de construção de uma teoria da EF, entendida esta como uma prática pedagógica, uma vez que ela foi quase que alijada do campo enquanto objeto (BRACHT, 2014).

No cenário apresentado por Bracht (2014 11), a trajetória da mudança é assumida no sentido da orientação pedagógica, refletindo-se, dessarte, em novas formas de se teorizar o campo e seus conteúdos/conhecimentos. Temos, assim, uma visualização da reflexividade que acompanha os processos de transformação que apresentam íntima relação com a ênfase, a qual, por ora, nos propomos a discutir.

Observamos, na presença “curricular”, especialmente no curso de licenciatura do CEFD/UFES - iniciando no currículo de 1991 e sendo radicalizado em 2006 -, a constituição de uma nova racionalidade com relação à formação em EF. O PPC-L de 2006 apresenta uma narrativa que rompe com a tradição biológica centrada na aptidão física e na perspectiva de que praticar esporte promove saúde (no sentido estrito, unicamente, da exercitação corporal). Tais ações são possíveis dentro de uma reflexividade institucional pela qual se rompe com as premissas dominantes, sendo assim corroboradas pelo agenciamento de linhas de fraturas encontradas na estruturação do sistema social vigente (GIDDENS, 2009). Isso significa dizer que é nas contradições encontradas no sistema que emergem as críticas originalmente advindas daqueles sujeitos que estão vinculados à orientação político-epistemológica das Ciências Sociais e Humanas.

Foi observado, também, nas presenças disciplinar e da prática como eixo formador, a emergência de disciplinas nos cursos investigados em que as ênfases pedagógica, pública e coletiva são desenvolvidas. Nessas disciplinas, sobrepõe-se a orientação político-epistemológica (CUNHA, 2005) vinculada nas Ciências Humanas e Sociais e na Saúde Coletiva.

Com relação à ênfase pedagógica, Paiva et al. (2015) desenvolvem um estudo sobre tal dimensão na relação da EF com a saúde. Os autores destacam “[...] que a dimensão pedagógica, como objeto de intervenção profissional, em Educação Física, se faz presente em diferentes espaços de atuação, inclusive no âmbito da saúde” (PAIVA et al., 2015, p. 458). A dimensão pedagógica é considerada como um eixo que perpassa a formação de licenciatura e bacharelado, construindo, assim, subjetividades profissionais voltadas para o âmbito pedagógico (PAIVA et al., 2015).

Nesse sentido, a formação para o campo da saúde deixa de ser considerada estritamente de cunho cientificista e passa a receber uma ênfase pedagógica. Tal perspectiva corrobora a visualização de que o PEF que atua na área da saúde também possui uma identidade pedagógica (PAIVA et al., 2015).

Observamos que, no cotidiano das práticas, na disciplina “Educação Física e Saúde” (Licenciatura), a dimensão pedagógica vinculada à educação para a saúde é desenvolvida. No curso de bacharelado, a ênfase pedagógica apareceu nas duas disciplinas acompanhadas, com distintas perspectivas. Na disciplina “Educação Física, Saúde e Sociedade”, observamos a dimensão pedagógica referente ao trato crítico das intervenções em saúde.

Com os dados produzidos e a reflexão com Paiva et al. (2015), percebemos que a ênfase pedagógica se manifesta em algumas disciplinas que contemplam ambos os cursos. Nesse sentido, entendemos a necessidade de se agregar a ênfase pedagógica com referências críticas e ampliadas para não se recair em um cientificismo que prega ações científico-centradas, médico-centradas e descontextualizadas.

A prática como eixo formador aparece claramente na disciplina de estágio no curso de bacharelado e em algumas ações cotidianas da disciplina “Educação Física, Saúde e Sociedade” do mesmo curso. Essa presença, em parte, demonstrou-se afinada com a ênfase pedagógica, pública e coletiva (já que no bacharelado há uma concorrência no estágio de espaços nos quais prevalecem as ênfases do tópico anterior).

Observamos que, na presença citada, as ênfases pública e coletiva coadunam com os contextos do serviço público, no qual os alunos podem ampliar suas percepções sobre o trabalho a ser aí desenvolvido. Carvalho, Prado e Alonso (2013) corroboram essa ideia ao chamarem a atenção para a contextualização das ações, de modo a garantir a integralidade da atenção em saúde, e não apenas recair na mera transmissão de conteúdos (pedagogia da transmissão) fora do contexto de prática.

Aproximar a formação dos cenários de prática relaciona-se com o desenvolvimento de ênfases capazes de traçar caminhos comuns entre ensino e serviço, entre Universidade e Comunidade, assim horizontalizando as relações. Os dados, inclusive aqueles vinculados à experiência curricular que vivemos na disciplina “Educação Física, Saúde e Sociedade”, apontam para o desenvolvimento da ênfase pedagógica, pública e coletiva, no sentido de reorientar a formação, aproximando, dessa forma, os contextos de prática e alimentando redes de colaboração.

Observamos as ênfases pedagógica, pública e coletiva na presença “acadêmica”. Com Giddens (2009), compreendemos que é aí que podemos constatar o início da reprodução de tal perspectiva, pois é na agência que encontramos o poder para a tessitura dos feixes de disputa nos currículos de formação e nas experiências curriculares. Os dados demonstram que essas ênfases se dão quando os professores apresentam uma formação próxima das Ciências Sociais e Humanas e da Saúde Coletiva.

Tais ênfases resguardam um potencial na configuração de linhas de fratura diante das contradições das ênfases técnico-cientificista, biofisiológica e biomédica. Nesse sentido, observamos o surgimento de pequenas ações que passam a tangenciar algumas mudanças, agregando, assim, maior presença às ênfases pedagógica, pública e coletiva. Destarte, notamos que tais ações vão tecendo as redes curriculares do CEFD/UFES no sentido de irromper novas formas de se fazer e pensar o currículo de formação no tocante ao tema da saúde.

Apesar da potencialidade, notamos que essas ações ainda são tímidas diante da hegemonia posta no campo da EF. Nesse sentido, percebemos que as ênfases pedagógica, pública e coletiva ainda se mostram tímidas nos currículos de formação, muito em decorrência do fenômeno que temos denominado de presença mínima (ou embrionária). Tal fenômeno pode ser explicado diante da recente aproximação da EF com a Saúde Coletiva, o que nos coloca no horizonte de que tal perspectiva pode se tornar potente e promover significativas mudanças nos currículos de formação.

Nesse sentido, observamos que as ênfases pedagógica, pública e coletiva expressam oportunidades para galgar uma formação condizente com os contextos de prática e com o SUS, contribuindo, assim, para a promoção da (e atenção em) saúde das populações. No entanto, essas são relações por se fazerem/construírem e estão envolvidas nas tramas institucionais na quais se assenta a reflexividade dominante e outras emergentes.

Logo, compreendemos que é nas relações desenvolvidas no cotidiano e monitoradas reflexivamente que tais ênfases poderão emergir, dessarte criando condições de possibilidades para o desenvolvimento de outras perspectivas para a formação em EF no tocante ao tema da saúde. Tal processo é permeado pela contingência e, sob essa perspectiva, compreende-se que ela faz parte do processo ao mesmo tempo em que se faz nele. Para finalizar, vale destacar o pensamento baumaniano de que: em vez de tentar extirpar a contingência, podemos fazer dela o nosso destino (BAUMAN, 1999).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo foi elaborado de forma indutiva, uma vez que foi o campo que nos solicitou a equalização do método de forma contextualizada. Os conceitos arregimentados na teoria da estruturação mostraram-se pertinentes para nossa investigação. A relação de dualidade da estrutura possibilitou-nos observar algumas das linhas da rede que constituem os currículos de formação do CEFD/UFES. Nesse sentido, entendemos que há uma série de linhas tênues entre agência e estrutura que necessitam ser levadas em consideração nas análises, não sobrepondo uma à outra, mas considerando-as como uma trama complexa.

Na investigação, consideramos alguns dos fenômenos que contribuem para a constituição das presenças e ênfases do tema da saúde nos currículos de formação em EF. São eles: as políticas macrossociais, as construções/reajustes curriculares, as orientações político-epistemológicas dos professores (currículos vitae e interesses) e os concursos públicos. Esses elementos empíricos, juntamente com os conceitos arregimentados de dualidade da estrutura e das orientações político-epistemológicas, criaram as condições de possibilidades para conceituarmos as presenças e as ênfases.

Dentro da perspectiva da teoria da estruturação, observamos que as políticas macrossociais são influenciadoras de como se (re)produzem as práticas cotidianas. Políticas como o REUNI e o próprio sistema de pós-graduação foram/são peremptórias como constrangedoras dos rumos em que a formação em EF vem se conformando.

Já no nível microssocial, vimos como as construções/reajustes curriculares também influenciaram as presenças e ênfases dadas ao tema da saúde no CEFD/UFES. Nesse sentido, a orientação político-epistemológica dos professores é um elemento profícuo para compreendermos suas ações.

No entanto, é preciso considerar que as orientações político-epistemológicas não estão soltas ou refletem apenas a decisão individual do sujeito; senão, fazem parte de uma consciência prática monitorada reflexivamente, expressando, assim, a dualidade da estrutura - ou seja, as orientações político-epistemológicas são, concomitantemente, o meio e o resultado das condutas por elas recursivamente organizadas.

Nesse sentido, foram observadas cinco presenças e duas ênfases dadas ao tema da saúde nos currículos de formação do CEFD/UFES. Observar as presenças e ênfases dadas ao tema da saúde nos currículos de formação faz com que consideremos as potencialidades que esse conhecimento providencia para a análise crítica (e, quem sabe, para a produção) de políticas de formação para os cursos de EF, seja de licenciatura ou de bacharelado.

Consideramos a importância da emergência de ênfases vinculadas às Ciências Sociais e Humanas e à Saúde Coletiva, tanto quanto o fortalecimento dessas mesmas nos currículos de formação. Essa é uma aposta que já tem gerado mudanças nos currículos de formação (ou, pelo menos, problematizado a hegemonia neles reproduzida), permitindo, assim, outras formas de se olhar o complexo fenômeno de que trata a EF, que é o movimento corporal humano em sua interface com as PCAF produzidas no tempo-espaço, especificamente, relacionando-os com o campo da saúde.

Este estudo limita-se a um recorte temporal, desenvolvido anteriormente à publicação das novas Diretrizes Curriculares da EF. No entanto, tais diretrizes reforçam o ensejo por promover novas pesquisas em torno do tema da saúde na formação em EF, visando refletir criticamente sobre seus desdobramentos.

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3O Guia foi apresentado no formato de consulta pública, não estando ainda disponível em sua versão final. Chama a atenção que esse guia apresente um capítulo específico para a Educação Física escolar. Disponível em: https://aps.saude.gov.br/noticia/9516. Acesso em: 27 dez. 2020.

4A CBO, do Ministério do Trabalho, divulgou o novo código 2241-40 Profissional de Educação Física na Saúde. Além do novo código, a descrição sumária estabelece: “Estruturam e realizam ações de promoção da saúde mediante práticas corporais, atividades físicas e de lazer na prevenção primária, secundária e terciária no SUS e no setor privado”. Disponível em: http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/home.jsf. Acesso em: 20 fev. 2020.

5Com relação aos paradigmas hegemônico e emergente, Cunha toma Santos (2010) como referência.

6O zoom refere-se a uma espécie de mudança da escala de atenção na produção do campo de pesquisa. No nosso caso, deu-se quando observamos que havia uma intensidade diferente na “figura do professor”, o que nos levou a reconfigurar nosso campo para observar mais atentamente esse fenômeno.

7A reflexividade institucional é conceituada por Giddens (2002, p. 26) como “[...] o uso regularizado de conhecimento sobre as circunstâncias da vida social como elemento constitutivo de sua organização e transformação”. Aí, necessariamente, a reflexividade institucional está vinculada ao agente e à sua capacidade de agir.

8O SOE é um serviço desenvolvido no município de Vitória/ES desde 1990, vinculado à Secretaria Municipal de Saúde. Ele antecede a estratégia de Saúde da Família e foi responsável pela inserção do PEF nesse município na saúde pública. O serviço é realizado em diversos pontos do município com a oferta de PCAF (BECCALLI; GOMES, 2014).

9Além do SOE, os alunos podem optar por fazer o estágio em academia de ginástica ou no NUPEM (que congrega laboratórios de pesquisa do CEFD). Esses dois últimos não se vinculam à saúde pública ou Saúde Coletiva.

10Foram observados cinco concursos realizados no CEFD/UFES voltados para a área da saúde. Todos os concursos foram ofertados pelo Departamento de Desportos nas áreas/ano: Ciências do Esporte e Saúde (2008); Ciências Biológicas ou da Saúde (2008); Movimento Corporal Humano e Saúde Coletiva (2009); Esporte e Saúde (2011); Ciências da Saúde/Educação Física/Fisiologia de Órgãos e Sistemas (2017). Os concursos são orientados, majoritariamente, na perspectiva biológica. Esse é um tema mais bem aprofundado em Oliveira e Gomes (2019).

11Apesar de o autor se referir à dimensão pedagógica como algo vinculado à EF como componente curricular, compreendemos que é profícuo ampliar essa noção para outros campos de atuação, inclusive o SUS, espaço dos encontros, das potencialidades, dos sujeitos e das possibilidades de projetar as PCAF em uma perspectiva além da clínica hegemônica (biomédica).

* O presente trabalho contou com fomento da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES), na modalidade bolsa de doutorado

Recebido: 21 de Maio de 2020; Aceito: 17 de Janeiro de 2021

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