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Educação em Revista

versión impresa ISSN 0102-4698versión On-line ISSN 1982-6621

Educ. rev. vol.37  Belo Horizonte  2021  Epub 23-Nov-2021

https://doi.org/10.1590/0102-469833828 

Dossiê: FORMAÇÃO DOCENTE E PRÁTICA PEDAGÓGICA - TEMPOS, TENSÕES E INVENÇÕES

DISPOSITIVOS FORMATIVOS NAS LICENCIATURAS: ANÁLISE DE EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS À LUZ DA LITERATURA FRANCÓFONA

DISPOSITIVOS DE FORMACIÓN EN CURSOS DE LICENCIATURA: ANÁLISIS DE EXPERIENCIAS BRASILEÑAS A LA LUZ DE LA LITERATURA FRANCÓFONA

GISELA LOBO TARTUCE1 
http://orcid.org/0000-0002-2645-7231

CLAUDIA LEME FERREIRA DAVIS2 
http://orcid.org/0000-0002-0003-3510

PATRÍCIA CRISTINA ALBIERI DE ALMEIDA3 
http://orcid.org/0000-0002-4081-4573

1 Fundação Carlos Chagas. São Paulo, SP, Brasil<gtartuce@fcc.org.br>

2 Fundação Carlos Chagas e Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil<claudialfdavis@gmail.com>

3 Fundação Carlos Chagas e Unasp. São Paulo, SP, Brasil<patricia.aa@uol.com.br>


RESUMO:

Muito se discute, do ponto de vista teórico, a formação inicial de professores, a despeito de se saber pouco do que se passa no âmbito das licenciaturas brasileiras. Com base em resultados inéditos de pesquisa anterior, aqui ampliados e aprofundados, o objetivo deste artigo é duplo: (a) analisar e divulgar as propostas pedagógicas voltadas à formação inicial docente nos países francófonos, importante grupo de referência no Brasil, e (b) verificar como - e com quais configurações - aspectos afeitos a essa literatura aparecem no país. Para tanto, recorreu-se às experiências vencedoras do Prêmio Professor Rubens Murillo Marques (PPRMM), que valoriza o formador de professores e divulga as experiências que contribuem para aprendizagem da docência. Os resultados indicam que, apesar dos entraves de ordem macro, há também iniciativas pontuais que conseguem promover a unidade entre teoria e prática, ao favorecer a aproximação do licenciando com a escola em outros momentos do curso que não apenas nas disciplinas de estágio. Com isso, os futuros professores aprendem a utilizar as teorias disponibilizadas nas universidades no contexto de escolas de educação básica, refletindo, analisando e questionando os dispositivos que utilizam, à luz dos resultados esperados e obtidos.

Palavras-chave: Formação de professores; Literatura francófona; Práticas pedagógicas inspiradoras; Dispositivos de formação

RESUMEN:

En Brasil, la formación inicial del profesorado es muy estudiada desde un punto de vista teórico, a pesar de que poco se conoce sobre lo que ocurre en el contexto de sus licenciaturas. A partir de resultados inéditos de investigación anterior, aquí ampliada y profundizada, el objetivo de este artículo es doble: (a) analizar y difundir las propuestas pedagógicas orientadas a la formación inicial docente en los países francófonos, importante grupo de referencia en Brasil y (b) verificar cómo - y con qué configuraciones - aparecen en el país aspectos relacionados con esta literatura. Para ello, utilizamos las experiencias ganadoras del Premio Profesor Rubens Murillo Marques (PPRMM), que valora al formador de futuros docentes y difunde las experiencias que contribuyen al aprendizaje de la enseñanza. Los resultados indican que, a pesar de los macro obstáculos, también existen iniciativas específicas que logran promover la unidad entre teoría y práctica, al favorecer la aproximación del estudiante con la escuela en otros momentos del curso que no sean los de las asignaturas de prácticas. Con esto, los futuros docentes aprenden a utilizar las teorías conocidas en la universidad en el contexto de las escuelas de educación básica, reflexionando, analizando y cuestionando los dispositivos que utilizan, contrastando los resultados esperados y los obtenidos.

Palabras-clave: Formación del profesorado; Literatura francófona; Experiencias pedagógicas intrigantes; Dispositivos de formación

ABSTRACT:

There has been considerable discussion, from a theoretical perspective, around the topic of Initial Teacher Education (ITE), but there has been little focus or understanding relating to ITE with respect to Brazilian undergraduate programs. Building on the unpublished results of previous research, the objective of this article is twofold: (a) to analyze and disseminate the pedagogical proposals for initial teacher education in French-speaking countries, an important reference group for Brazil, and (b) to identify how - and in what form - aspects derived from this literature appear in Brazil. With this objective in mind, we have drawn on the experiences of winners of the Professor Rubens Murillo Marques Award (PPRMM), which places great value on the education and development of teachers and has shared experiences that contribute to this end. The results indicate that, despite the obstacles seen at a macro-level, there are specific initiatives that can unite theory and practice, promoting opportunities for contact with the class environment at other times on the program than simply during the internship phase. From this contact, future teachers learn how to implement the theories discussed on the university programs in the context of basic education, assessing and evaluating the tools used in the light of the results obtained.

Keywords: Teacher training; Francophone literature; Inspiring pedagogical practices; Training devices

INTRODUÇÃO

No contexto das pesquisas sobre a formação inicial de professores, muitas têm se dedicado a estudar as experiências formativas necessárias ao exercício do magistério, investigando quais são os conhecimentos teóricos (SHULMAN, 1987), o saber-fazer, as habilidades (TARDIF; GAUTHIER, 2001; FEIMAN-NEMSER, 2003) e as competências (PERRENOUD, 2001; DESIMONE; HOCHBERG; MCMAKEN, 2016) imprescindíveis à atuação docente. Fica claro, portanto, que, se o que deve ser ensinado aos professores é importante, igualmente o são as práticas pedagógicas a serem empregadas no magistério, notadamente para aqueles que atuarão junto às novas gerações. Assim, como bem sugerem Ball e Cohen (1999), é grande a necessidade de investigar, propor e implementar novas maneiras de agir, pensar e sentir que possam, na aprendizagem da docência, atender aos estudantes que frequentam a educação básica.

Há, de fato, ampla literatura (internacional e nacional) que, ao discutir propostas teóricas variadas sobre formação docente, busca facilitar a aprendizagem da docência por parte de futuros professores, auxiliando-os a compreender e a manejar aspectos inerentes ao magistério, que envolvem desde a motivação para o aprender até a avaliação do desempenho dos alunos (DARLING-HAMMOND et al., 2005). No entanto, no Brasil, pouco se sabe sobre essas propostas formativas nos cursos de licenciatura, ou seja, quais são elas, se são efetivamente utilizadas e, notadamente, como o são. Buscando contribuir para a superação dessa lacuna, a pesquisa “Ensinando professores a ensinar”, realizada entre 2018-2019, teve um duplo objetivo: levantar e examinar a produção acadêmica no Brasil, nos EUA e em países francófonos que discutia a formação inicial (teórica e pedagógica) de futuros professores e, também, analisar as práticas formativas de dez professores que atuavam nas licenciaturas do país. Para selecioná-los, foi utilizado o banco de dados do Prêmio Professor Rubens Murillo Marques (PPRMM4), uma iniciativa da Fundação Carlos Chagas, cujo objetivo é valorizar os professores que lecionam nos cursos de licenciatura (em todas as áreas do conhecimento) e divulgar experiências formativas5 que contribuam para a aprendizagem da docência na educação básica.

Este artigo foi em parte baseado na pesquisa referida e, tal como ela, tem duplo objetivo: (a) analisar e divulgar as propostas pedagógicas voltadas à formação docente inicial nos países francófonos6; e (b) verificar como e com quais configurações elas aparecem no Brasil, recorrendo, para isso, às iniciativas premiadas pelo PPRMM nos últimos cinco anos.

Em termos metodológicos, o empenho centrou-se, no primeiro objetivo, em retomar e aprofundar a literatura em língua francesa que discute dispositivos formativos adotados em programas de formação inicial de professores, para identificá-los e analisá-los. A escolha dessa literatura decorre do fato de que, no Brasil, autores como Maurice Tardif e Claude Lessard formam7, segundo Gatti (2005), “grupos de referência”, cujas propostas são estudadas, seguidas e implementadas. Para essa autora, esses grupos são fundamentais na educação e, notadamente, na pesquisa porque:

O professor não trabalha sozinho, nem produz sozinho. A intercomunicação com pares, o trabalho em equipe, as redes de trocas de ideias e disseminação de propostas e achados de investigação, bem como os grupos de referência temática, constituem hoje uma condição essencial à realização de investigações científicas e ao avanço dos conhecimentos. (GATTI, 2005, p. 30)

Já para atingir o segundo objetivo, ampliaram-se as experiências de ensino selecionadas, incluindo os anos de 2019 e 2020. Dessa maneira, investigaram-se os casos premiados nos últimos cinco anos - edições de 2016 a 2020.

Todos os 19 textos dessas edições foram lidos e constatou-se, em um primeiro momento, que dez faziam uso de pelo menos um tipo de estratégia formativa sugerida pela literatura que será aqui descrita. Dentre esses, optou-se por selecionar, para fins deste artigo, aproximadamente um terço das iniciativas, buscando garantir diversidade em relação às estratégias empregadas e às áreas de formação. Assim, compuseram o corpus de análise sete experiências desenvolvidas nas seguintes áreas e cursos:

  • na disciplina de Antropologia do curso de Pedagogia;

  • na disciplina de Inglês do curso de Letras;

  • na disciplina de Psicologia do curso de Letras;

  • nas disciplinas de Formação Pedagógica do curso de Biologia e Ciências Agrárias;

  • nas disciplinas de Instrumentação para o Ensino de Química e Estágio Curricular Supervisionado do curso de Química;

  • nas disciplinas de Metodologia do Ensino de Educação Física do curso de Educação Física;

  • nas disciplinas de Estágio Supervisionado do curso de Música.

No processo de análise dessas sete experiências, buscou-se apreender como elas empregam dispositivos presentes na literatura e na realidade francófona, mesmo que não os nomeando. Por fim, uma vez apresentada essa literatura em seus aspectos teóricos e implicações práticas, bem como descritas as experiências brasileiras escolhidas, procurou-se discutir as possibilidades e desafios que se colocam aos formadores de futuros professores, em sua tentativa de contribuir para o aprimoramento da qualidade do ensino a ser oferecido, quiçá um dia, na educação básica de nosso país.

GRUPO DE AUTORES DE PAÍSES FRANCÓFONOS

O movimento de reforma na formação de professores - ligada, ela própria, às reformas curriculares do ensino fundamental e médio - ocorre em âmbito mundial a partir dos anos 1990, apoiando-se sobre uma “estrutura conceitual idêntica [...], que apela à profissionalização, à abordagem das competências, à interdisciplinaridade, à transversalidade, à educação para a cidadania, à perspectiva construtivista”8 (LENOIR, 2002, p. 91). Todavia, esse autor e vários outros do mundo francófono vão afirmar que essa estrutura é apenas aparentemente igual, pois uma análise mais aprofundada permitirá ver importantes diferenças de interpretação e de apropriação das noções e concepções presentes nessas reformas (LENOIR, 2002; TARDIF, 2010; TUTIAUX-GUILLON, 2011). Maurice Tardif (2010), por exemplo, defende que o caráter altamente cultural da profissão docente faz com que as tendências internacionais homogeneizantes sejam filtradas e transformadas nos contextos nacionais e locais.

Quais são as causas apontadas para esse movimento reformista nos modelos de formação inicial? Quais são as concepções que o sustentam? No que elas diferem quando se olha especificamente para o mundo francófono e anglófilo? Essas duas tradições e culturas diversas têm pontos em comum ou são lógicas apartadas que dialogam não sem resistências? Busca-se responder a essas questões, sem a pretensão de esgotá-las. É importante frisar que, para falar sobre as concepções de formação de professores que são adotadas pelos grupos de referência francófonos, a perspectiva comparativa - especialmente com os Estados Unidos - faz-se muito presente, não só porque o novo modelo tem suas origens nesse país, mas também porque os pesquisadores de língua francesa lançam mão dessa abordagem para pensarem a si próprios.

Genericamente, pode-se dizer que essa onda reformista está associada à globalização e ao movimento neoliberal que atinge os países já desde o fim da década de 1970 e, mais especificamente, a partir dos anos 1990. Mas alguns autores tentam qualificar e especificar melhor essas transformações que impactam a educação e, mais detidamente, a formação de professores. Como dito, Lenoir (2002) aponta a profissionalização, a abordagem por competências, a perspectiva construtivista, a interdisciplinaridade como causas e/ou características dessas mudanças, às quais se pode acrescentar a noção de “prático reflexivo”. Todas essas concepções estão intimamente imbricadas e têm o mesmo pressuposto de fundo - uma lógica baseada na ação (LENOIR, 2002; TARDIF, 2010) -, influenciando o modelo de formação defendido pelo grupo de referência francófono.

De fato, Paquay e Sirota (2001) e Tardif (2010) retomam a conceituação do “prático reflexivo”, importada da América do Norte - pautada na obra de Schön -, e mostram que o trabalho dos professores e os saberes colocados em jogo tomam lugar no centro da análise, que se volta para a ação e “postula que a prática profissional é um espaço original e relativamente autônomo de aprendizagem e de formação para os professores”. A influência desse postulado fez-se muito presente nas profissões da interação humana, especialmente na educação, na qual houve estudos e desenvolvimento de dispositivos9 de acompanhamento dessa reflexão dos profissionais sobre sua prática, no sentido de auxiliar o professor a desvendar o que ele já sabe e a maneira pela qual utiliza esse saber. É uma nova epistemologia da prática:

O profissional não é um aplicacionista de princípios teóricos nem de regras metodológicas. [...] Ele constrói seu saber profissional pela ação e pela reflexão na e sobre a ação [...] e é capaz de deliberar sobre suas próprias práticas, de objetivá-las, de partilhá-las, de melhorá-las e de introduzir inovações suscetíveis de aumentar sua eficácia. (PAQUAY; SIROTA, 2001, p. 5)

Apesar das diferenças entre e intrapaíses apontadas por Paquay e Sirota (2001) e Tardif (2010), não se pode negar o impacto das discussões sobre a profissionalização e sobre o profissional reflexivo no desenvolvimento de novos modelos de formação inicial: se “o que” deve ser ensinado é importante (“saberes a ensinar”), os meios pelos quais conceitos, habilidades e práticas são transmitidos pelos formadores de professores aos docentes principiantes também o são (“saberes para ensinar”). Nessa direção - “embora os historiadores da educação tenham sido mais sensíveis aos conteúdos a ensinar do que às práticas de ensino e à maneira de lhes adquirir” (CARRAUD, 2010) -, o movimento de profissionalização e as reformas que ele enseja colocam os saberes docentes no centro do debate e trazem a atuação profissional para o lugar central da formação.

Não se trata mais e apenas do domínio de conteúdos e saberes disciplinares, mas de um conjunto de saberes e competências para lidar com situações complexas e singulares que demandam formação pedagógica e didática (BORGES; TARDIF, 2001; PERRENOUD, 2003): “a formação de professores vê um deslocamento de seu centro tradicional de gravidade, passando de uma formação disciplinar e teórica a uma formação mais pedagógica, reflexiva e prática” (TARDIF; LESSARD; GAUTHIER, 1998 apud LENOIR, 2002, p. 93).

Paralelamente ao movimento de profissionalização, a dinâmica da sociedade voltada para o conhecimento, na qual as pessoas têm de lidar com situações complexas e imprevisíveis no dia a dia e no mundo do trabalho, atinge o campo da formação docente, pois, além de se profissionalizarem, os professores são chamados a fazê-lo por meio de uma reconversão de suas concepções e práticas de ensino. Nesse contexto, ensinar não pode mais ser associado a uma simples transmissão de conhecimentos, tal como ocorria no denominado “ensino tradicional”. Assim, a ênfase em um ensino centrado no aluno, em sua aprendizagem ativa - que não são novos na literatura: apoiam-se no construtivismo de Piaget e Vygotsky e na “escola nova” de John Dewey -, afeta igualmente a formação de professores.

É forte o discurso sobre a necessidade de se buscar tanto a compreensão dos mecanismos pelos quais os estudantes aprendem como também a promoção de um ensino que leve, para além da aquisição de conhecimentos, ao desenvolvimento de competências básicas e ao “aprender a aprender” (ALTET, 1997). Esse deslocamento da ênfase no ensino para a aprendizagem, no “ensino tradicional” para as “pedagogias da aprendizagem”, modifica o papel do docente, que se torna um guia, um mediador, um organizador das condições externas de aprendizagem (ALTET, 1997).

Vê-se, aqui, um laço muito estreito entre essa concepção que põe o foco no aluno e a corrente que propõe um ensino por competências, tanto para a aprendizagem dos estudantes da educação básica quanto para a dos professores, pois ela “preconiza uma visão holística e sistêmica da formação, onde a estrutura tradicionalmente fragmentada do ensino dá lugar a novas formas curriculares que asseguram uma melhor coerência interna dos programas”, uma vez que a prática profissional e suas exigências - e não os saberes disciplinares - são tomadas como o princípio de organização do currículo (BOURDONCLE; LESSARD, 2003 apud DESJARDINS et al., 2012, p. 4).

Em um texto que discute a universidade e a formação profissional dos docentes, Lessard (2006, p. 210) afirma que “os referenciais de competências estão no cerne das políticas de profissionalização da mão-de-obra”, mas o autor mostra, ao longo de várias páginas, que esses referenciais não podem ser tomados em bloco, pois há diferenças entre a lógica anglo-saxã e a lógica francófona: no primeiro caso, o referencial por competências apoia-se nos “padrões” (standards) americanos de saberes e know-how, que são centrados no desempenho e nas capacidades práticas, devendo ser aplicados a todos os docentes - independentemente das diferentes finalidades objetivadas por diversos programas de formação -, de modo que possam ser avaliados por meio dos testes padronizados que medem a aprendizagem dos alunos:

O referencial de competências serve de quadro para construir “padrões” (standards) de desempenho e, portanto, contribuir para racionalizar a avaliação do desempenho dos docentes em exercício. Tal desenvolvimento está muito presente nos Estados Unidos, onde a ideologia da performatividade prevalece. De fato, mais do que a profissionalização do ensino, o que preocupa no mais alto grau os políticos americanos é a eficácia do ensino, concebida como efeito direto e medida nas aprendizagens dos alunos, ou, dito de outro modo, a profissionalização surge nesse caso como um meio que deve garantir maior eficácia, e não como um fim em si. (LESSARD, 2006, p. 211)

Já no caso francófono, o autor aponta que a inspiração é o socioconstrutivismo: a competência não é definida por padrões de desempenho, pela padronização de práticas ditas eficazes, mas sim construída por um sujeito que pensa, interpreta e se apropria dos referenciais para atuar em uma dada situação profissional. Trata-se de uma abordagem que Lessard (2006) denomina situacional-interpretativa (em oposição à empírico-analítica), caracterizada por prescrições mais abertas, apoiadas em uma prática reflexiva:

Desenvolver competências não é tanto aprender por comportamentos precisos e específicos - por assim dizer, extirpados tanto da experiência e da trajetória do sujeito como da situação e, assim, objetivados e “essencializados” - ou “métodos” (isto é, o acionamento metódico de um procedimento previamente estabelecido), mas antes saber mobilizar e combinar um conjunto de recursos cognitivos e não-cognitivos para levar em conta a complexidade da situação educativa e nela agir de modo finalizado, adaptado e “eficaz”. Aí, competência e desempenho distinguem-se, ou, pelo menos, uma não é reduzida ao outro. (LESSARD, 2006, p. 211-212)

Como se viu, a busca pelo desempenho dos resultados pode entrar em conflito com a postura de um profissional reflexivo, preocupado com o desenvolvimento de todos os seus alunos. Assim, Lessard (2006) assume a interessante, importante e difícil posição de tensionar e conciliar as duas abordagens, articulando tanto a eficácia quanto a reflexividade - polos que, de resto, são “sociologicamente necessários” a todas as profissões.

Optar por uma ou pela outra apresenta limites: em um caso pode dar lugar a perspectivas tecnicistas, a uma linguagem pretensiosa e a prescrições sem sentido, amparadas por uma burocracia controladora [...], que invoca de modo imperioso demais a autoridade da “ciência” e da “pesquisa” para regular a prática. Em outro pode levar a um enclausuramento no singular, no único, no local, no situacional e, ultimamente, em práticas não-transferíveis, não-exportáveis ou não-generalizáveis. [...] Em nome da eficácia, o primeiro tende a uniformizar, normalizar e reduzir a variância ou a dispersão das práticas, ao passo que, em nome do pluralismo e do sujeito autor de sua prática, o segundo insiste no desenvolvimento de um estilo pessoal de ensino etc. (LESSARD, 2006, p. 214)

Com base nessa citação, parece quase óbvio que uma ou outra posição não levará, sozinha, a um melhor desenvolvimento na formação de professores. E é aí que entraria o papel da universidade.

A universidade, lugar onde a dúvida e o questionamento se praticam normalmente, pode ser propícia a essa colocação em tensão, contanto que, ao contrário da Torre de Pisa, ela não penda sempre para o mesmo lado! [...] Se, na formação de docentes, a universidade não conseguir colocar numa tensão fecunda abordagens plurais da melhoria da prática e das escolas, ter uma resposta sofisticada à obrigação de resultados, nem desenvolver nos docentes uma relação crítica com a ciência, quem conseguirá? Por uma vez, a universidade e as ciências sociais e humanas estão objetivamente aliadas nesse combate. (LESSARD, 2006, p. 214-215)

Lessard (2006) finaliza seu artigo com indagações e uma recomendação que nos direcionam para o modelo de formação de professores proposto pelo grupo de referência aqui selecionado:

Nesse espírito, para os formadores de professores universitários, a pergunta central não é mais: Qual a participação das disciplinas que contribuem para a formação dos professores? Nem mesmo: Como formar bons docentes, tais como definidos por um referencial de competências? Mas: Como formar docentes aptos a aprenderem a partir de sua prática, sendo esta submetida a prescrições abertas? Nesse caso, a entrada privilegiada não é a dos saberes, nem mesmo a das tarefas; é a do sujeito confrontado com situações profissionais complexas e parcialmente indeterminadas. (LESSARD, 2006, p. 224)

O grupo de referência francófono selecionado defende e propõe, para a formação inicial de professores, um modelo de alternância integrativa entre teoria e prática, entre formação acadêmica e formação pedagógica, entre o local de formação e a escola (PERRENOUD, 2003; ALTET, 2013; SARTI, 2013). Baseado em competências, tal modelo busca desenvolver, nos docentes, uma postura reflexiva, ou seja, “formar práticos reflexivos, capazes de tomar decisões na ação, apoiando-se sobre uma sólida base de conhecimentos” (DESJARDINS et al., 2012, p. 4). Como afirma Sarti (2013, p. 219),

não se trata mais de observar o modelo [do professor “exemplar”] para aplicá-lo às situações de ensino, mas de experimentar o trabalho docente sob a orientação de um formador capaz de empregar dispositivos formativos que ofereçam suporte, face a face, a um iniciante ou a um profissional menos experiente, a fim de que ele descubra suas próprias possibilidades de atuação.

Por trás desse modelo, está o pressuposto de que a escola é lócus privilegiado no processo de formação docente, e o estágio, dispositivo central para prática profissional dos futuros professores. Para isso, é imprescindível que haja efetiva parceria entre as instituições do ensino superior e as unidades escolares, com definição clara dos agentes envolvidos nas duas esferas e dos papéis e estatutos a lhes serem atribuídos (BENITES; SARTI; SOUZA NETO, 2015). Em outras palavras, é preciso planejamento, orientação e reconhecimento ao professor colaborador, seja o que acompanha o estagiário na formação acadêmica, seja o que recebe o futuro docente na escola.

Um exemplo de tentativa de aplicação do modelo de alternância integrativa se deu com a criação dos Instituts Universitaires de Formation des Maîtres (IUFM), na França, no fim dos anos 1980. Essa iniciativa balança a lógica tradicional até então vigente, baseada nos saberes científico e disciplinar, isto é, na crença de que as ciências da educação contribuem de maneira significativa à profissionalidade docente e são suficientes para o ato de ensinar (LENOIR, 2002). A partir de 1989, a França introduz oficialmente o lema de que “o aluno é o centro do sistema educativo” (ALTET, 1997; ROBERT, 2005), deslocando o foco do ensino para a aprendizagem e implicando, assim, um modelo de formação de professores que dá ênfase à ação, à prática, às situações profissionais, ao acompanhamento por pares, à escola como lócus de formação: “a ênfase é posta na prática profissional como organização de situações de aprendizagem e de um conjunto de atividades escolares implicando os alunos diferenciados, mais do que os saberes em si mesmo” (ROBERT, 2005, p. 89).

Instituía-se, então, via IUFM, a alternância, que era desenvolvida no ano seguinte à aprovação dos futuros docentes em concursos para atuar no ciclo primário ou secundário: no primeiro caso, os alunos passavam primeiramente por um estágio de observação de professores mais experientes nas escolas e, depois, lecionavam sozinhos em uma classe, nos chamados “estágios de responsabilidade”; no segundo caso, a alternância se configurava na permanência em escolas dos anos finais do ensino fundamental ou do ensino médio, ensinando suas disciplinas específicas (WITTORSKI, 2014).

Embora esse modelo tenha sido questionado na sua efetiva capacidade de integração entre teoria e prática, entre saberes da pesquisa e saberes da prática, entre saberes disciplinares e de formação geral, entre “saberes a ensinar” e “saberes para ensinar”, Altet (2010 apud CARRAUD, 2010) defende que as tensões e os conflitos nesse sentido haviam diminuído. Todavia, a integração dos IUFM às universidades, a partir de 2005 - seguindo a reforma do ensino superior europeu que preconiza a formação de professores em nível de mestrado -, teve consequências para o componente ativo da formação, isto é, para os ensinamentos práticos (SARTI, 2013). De fato, com essa mudança, foi suprimido um ano da formação em alternância e a formação prática foi reduzida a algumas horas de estágio, realizado de modo pouco estruturado no que se refere ao acompanhamento.

Outra ideia discutida pelo grupo francófono que forma suas concepções acerca da formação inicial de professores e que tem origem igualmente nos Estados Unidos é a coerência, mais recentemente introduzida no mundo francófono, que lhe dedicou um livro em 2012: La formation des enseignants en quête de cohérence. Na introdução dessa obra, Desjardins et al. (2012) reportam-se aos trabalhos estadunidenses - especialmente aqueles liderados por Linda Darling-Hammond - para mostrar que foi por meio deles que a questão da coerência foi posta em evidência. Apoiando-se sobre análise de programas de formação inicial tidos como mais eficazes, a pesquisadora dos Estados Unidos demonstrou que a coerência interna desses programas foi um dos fatores mais importantes para garantir uma formação de qualidade aos professores: “os programas que propõem uma visão coerente e partilhada por todos os atores do ensino e da aprendizagem são aqueles que têm o maior impacto sobre as concepções indiciais e sobre as práticas dos professores” (DARLING-HAMMOND; BRANSFORD, 2005 apud DESJARDINS et al., 2012, p. 5).

Todavia, a literatura francófona não deixa de refletir sobre as eventuais críticas que podem incidir sobre essa ideia da coerência. Por um lado, os organizadores da obra se perguntam se não há o risco de a busca por coerência interna engendrar um enquadramento, uma doutrinação e uma simplificação dos referenciais teóricos necessários para que o estudante compreenda os desafios da educação (DESJARDINS et al., 2012). Nesse sentido, não seria melhor colocá-lo diante de múltiplas perspectivas para que ele próprio compreendesse a complexidade da educação e escolhesse a sua concepção de ensino e aprendizagem? Por outro lado, os autores também se reportam à psicologia cognitiva - que afirma que a aprendizagem é favorecida quando o contexto facilita a articulação entre conteúdos, experiências etc. - para demandar se não é responsabilidade justamente dos formadores da instituição (e não somente do estudante) buscar e propiciar as condições que favorecem essa integração.

Nessa direção, Tardif e Petropoulos (2012, p. 19), que defendem um modelo sistêmico baseado na aprendizagem dos estudantes e na coerência interna, fazem-no afirmando que essa coerência exige a pluralidade de perspectivas, e não seu enquadramento: “a coerência interna, concebida como a finalização da aprendizagem na profissão, exige que a complexidade das situações profissionais esteja constantemente no centro da formação e de todas as situações de aprendizagem”. Essa visão parece ir ao encontro do que já escrevia Lessard (2006) alguns anos antes, embora não estivesse falando especificamente da coerência, e sim e justamente da complexidade das situações profissionais:

Em formação dos professores, não é preciso que todos os formadores compartilhem a mesma epistemologia da prática. O pluralismo é uma garantia de ceticismo perante toda ortodoxia e, independentemente da necessidade de segurança dos estudantes, o desenvolvimento neles de um verdadeiro sentimento de competência passa certamente pela aprendizagem dirigida do ofício, mas também pela construção de uma relação crítica e pragmática para com a regra. [...] É melhor contribuir para que os futuros docentes compreendam que o ensino, como qualquer ofício do humano, é atravessado por dilemas, escolhas de valores, apostas e incertezas, do que os iludir com falsas garantias de uma engenharia científica da aprendizagem. (LESSARD, 2006, p. 214-215, 223)

De qualquer forma, é fato - como já atestado por Perrenoud (2003) e retomado por Tardif e Petropoulos (2012) - que os “formadores não partilham de uma visão comum da profissão docente, especialmente no que se refere à natureza das práticas pedagógicas e didáticas que melhor embasariam as aprendizagens dos estudantes” (TARDIF; PETROPOULOS, 2012, p. 16). Porém, mais importante do que ter uma visão consensual do ensino e da aprendizagem, o que importa, na visão dos defensores do modelo integrado e coerente de formação, é reconhecer a complexidade das situações profissionais e, por isso mesmo, a necessidade de o professor ser capaz de exercer seu juízo ao vivenciá-las - em oposição à mera aplicação de métodos. Nessa direção, Perrenoud (2003, p. 217-218) defende uma “visão menos mágica da construção de competências” nos programas de formação e enfatiza que a orientação de um programa de formação voltado para a prática reflexiva modifica as expectativas sobre o campo:

Não se trata de oferecer um “banho de realidade”, nem de apresentar uma prática admirável, mas de participar na construção de competências por um procedimento clínico e reflexivo. O domínio pedagógico exemplar do prático importa menos que sua capacidade de explicar suas escolhas, de comentar seus fracassos tanto quanto seus êxitos, de introduzir o estagiário nos “bastidores da ação”. (PERRENOUD, 2003, p. 207)

Na mesma linha, Lessard (2006, p. 218), ao distinguir a lógica anglo-saxã e a francófona das competências, afirma que, mais importante do que formar um professor eficaz, é desenvolver nele “uma competência para compreender o que o torna eficiente (ou não) dentro de tal situação com tal ou tal grupo de alunos”. Ele ressalta que, nesse tipo de formação com prescrições mais abertas, trata-se da (co)construção de práticas inovadoras, que se detém “menos com o que os docentes sabem ou devem saber” e mais com o “como os docentes aprendem e poderiam aprender de sua prática, e como eles constroem seu saber e sua identidade profissional no âmago de comunidades de prática” (LESSARD, 2006, p. 213). Ou, como afirma Paquay et al. (2007), “em um modelo de formação de professores reflexivos, o objetivo não é dizer como fazer, mas antes ajudar o docente iniciante a compreender o que se passa em sua classe e como funciona sua prática”.

Lessard (2006), Thurler e Perrenoud (2006) e Carraud (2010) defendem que as inovações didáticas, ou simplesmente a problematização e resolução de problemas pedagógicos, devem ser “construídas, experimentadas e modelizadas por equipes de docentes” (LESSARD, 2006, p. 213), por comunidades de práticas que têm a cooperação como princípio - seja na formação inicial e continuada, seja nos locais de trabalho -, de maneira que a análise das práticas registre suas dificuldades e sucessos. Todavia, esses autores preocupam-se e chamam a atenção para o fato de que a estrutura das instituições de ensino superior não favorece a construção de uma cooperação de alto nível, inviabilizando ocasiões para que os estudantes vivenciem aquilo que deles se exige.

Para superar esses entraves estruturais presentes nas instituições de ensino superior, Carraud (2010) destaca e recomenda práticas de acompanhamento na formação por alternância, que não podem ser vistas como práticas informais ou de camaradagem (uma “companhia artesanal”), mas antes devem ser profissionalizadas e institucionalizadas: “o essencial é a forma como a alternância é prevista e acompanhada” (CARRAUD, 2010, p. 124), o que exige um trabalho de longa duração, com grupos estáveis, com os quais se possa construir uma verdadeira cooperação na formação. Anos mais tarde, invoca-se a coerência interna nos programas de formação para reforçar que as práticas formativas precisam ser previstas e planejadas, já que não brotam espontaneamente; e elas devem ser previstas e planejadas por meio das finalidades da profissão docente e das responsabilidades profissionais que seus membros devem assumir (TARDIF; PETROPOULOS, 2012).

Levando-se em consideração as potencialidades e limitações já analisadas, volta-se agora para os dispositivos de formação (ou práticas formativas) sugeridos pelo grupo de referência francófono para formar o professor capaz de reconhecer a complexidade das situações profissionais, conscientizar-se das práticas implementadas e explicar suas escolhas. Embora não tenha como tradição nomear diretamente “melhores práticas”, “práticas eficazes” ou “práticas bem-sucedidas”, a literatura francófona aqui pesquisada recomenda diversas modalidades de dispositivos de formação também utilizadas nos Estados Unidos: “procedimento clínico, prática reflexiva, orientação para competências, articulação teoria-prática, parcerias com o campo e os estabelecimentos de ensino” (Perrenoud, 2003, p. 217-218) - ou, ainda, em outros termos, postula procedimentos semelhantes para se estabelecer “unidades de integração”:

Grupos de referência, seminários de análise da prática, laboratórios didáticos, oficinas de explicitação ou de ética, grupos de análise dos problemas profissionais, grupos de supervisão. Essas denominações não recobrem exatamente os mesmos dispositivos. Eu as reuni aqui em razão de uma ambição comum: tomar a prática como objeto de análise e saber, em sua globalidade, sua complexidade, suas múltiplas referências, sua ambuiguidade, sua opacidade, compreendidos seus aspectos não-refletidos, não-racionais, não-ditos. [...] Essas unidades objetivam treinar o saber analisar, a escrita profissional, a prática reflexiva, a tomada de consciência e o trabalho sobre o habitus. (PERRENOUD, 2003, p. 216)

Outras estratégias de formação, sob diversas nomenclaturas, são citadas por outros autores como propiciadoras de tomar a prática como objeto de reflexão: escritos reflexivos, memória profissional, biografia, portfólio, observação de sala de aula, visitas de formação, casos de ensino, entrevista de explicitação, seminário de explicitação de práticas, vídeo-formação etc., mas Altet (2013) ressalta que as práticas de formação são ainda pouco analisadas. Cabe destacar que todas as modalidades de análise de práticas ou dispositivos de formação descritos pela literatura francófona parecem se referir e concretizar-se nos estágios, o que faz pensar como a articulação teoria-prática efetivamente pode se dar nos demais componentes dos cursos de formação inicial.

DISPOSITIVOS FORMATIVOS NO CONTEXTO FRANCÓFONO

Na França, para levar os futuros docentes a perceberem como o magistério é complexo, diferentes estratégias formativas são empregadas durante o estágio docente, como já mencionado. As práticas formativas podem ser agrupadas em três grandes grupos e são usadas isolada ou combinadamente, implicando intensa interação de formadores e formandos. São elas: (a) atividades que recorrem à observação de aulas e às interações verbais entre estagiários e docentes ligados à universidade ou à escola; (b) atividades que empregam recursos audiovisuais para analisar as práticas pedagógicas; (c) atividades de escrita. Cada agrupamento será descrito a seguir.

A observação e as interações verbais consideram que a própria prática pedagógica é um importante objeto de estudo, observação, reflexão e construção de conhecimentos passíveis de serem aprimorados, razão pela qual são as mais frequentemente empregadas nos estágios. A observação do que é feito e as interações verbais mantidas pelos formandos entre si e com professores mais experientes permitem múltiplos olhares sobre uma mesma situação. Para descrever o que se passou, explicitando a interdependência de papéis, posturas e atitudes (LINARD; ALTET; BRITTEN, 1985), roteiros de observação e de entrevistas são construídos. Algumas dessas estratégias merecem ser aqui destacadas:

  1. ) o microensino é considerado, na França, como uma possibilidade de evidenciar aos futuros docentes que o ensino faz parte de um sistema intrincado de interações psicossociais. De acordo com Jacquet-Francillon (1996), a docência, em situações curtas e bem delimitadas, diminui a complexidade da sala de aula, permitindo identificar aspectos a serem aperfeiçoados em forma e em conteúdo. O planejamento, implementação, gravação e análise do desempenho dos formandos são geralmente feitos em duplas assistidas pelo supervisor, que procura discutir e aprimorar as ações observadas. Feedback é, portanto, tido como essencial, por ampliar o saber-fazer, ao contrastar a própria visão com a dos demais (JACQUET-FRANCILLON, 1996);

  2. ) os estudos de caso, de natureza etnográfica, requerem a ida às escolas para conhecê-las de perto, observar sua gestão, suas salas de aula, seus professores, seus alunos e a natureza das interações sociais que se passam nela e em seu entorno. A imersão na escola faz dela um “laboratório social a ser estudado, criticado, discutido e potencialmente transformado” (DE COCK, 2007, p. 21), permitindo estudar aspectos que demandam observação direta e prolongada no local onde eles ocorrem, compreender suas especificidades e articular aspectos factuais e observáveis à luz do ponto de vista dos envolvidos. Os resultados obtidos por meio dessa estratégia configuram um processo de aprendizagem de caráter exploratório, que permite teorizar acerca de um processo de ensino formal, como é, por exemplo, a alfabetização;

  3. ) os casos de ensino propõem, no contexto formativo, o estudo de um problema a ser solucionado pelos formandos. Ainda que específicos a uma dada situação, os achados do caso permitem compreender processos semelhantes vividos por outros docentes, ao buscar soluções para obstáculos similares (LALANCETTE, 2014). Por meio da observação e de discussões em grupo, os formandos constroem e aperfeiçoam as competências e habilidades necessárias ao magistério, tecendo análises que articulam os achados do caso aos conhecimentos teóricos. O formador guia e ampara as discussões e as propostas dos formandos, requerendo deles explicitação de sentimentos experimentados; adequação entre os procedimentos seguidos e objetivos buscados; verificação de quanto do planejado foi cumprido etc. (ALTET, 2016);

  4. ) as entrevistas de explicitação partem do pressuposto de que muitas competências e habilidades envolvidas na docência são tácitas e, portanto, inscritas na ação, mas nem sempre diretamente acessáveis. Por outro lado, a possibilidade de falar sobre a prática pedagógica (representá-la, verbalizá-la e objetivá-la) pode ser compartilhada, centrando-se em como a ação foi planejada, executada e avaliada. Para não fugir de seu foco, a entrevista segue um roteiro, mas sem induzir as respostas dos formandos. O entrevistador (em geral o formador) acompanha e guia a conversa, fazendo perguntas que descrevam e expliquem o que se passou (MARTINEZ, 1997).

As atividades que empregam videogravações permitem registrar sequências pedagógicas, que poderiam ser perdidas na dinâmica mais ampla da sala de aula, estudando tanto aspectos específicos da interação professor-aluno quanto do contexto físico e social no qual ela se dá. Por poderem ser vistas, revistas e avaliadas com maior precisão e detalhes e por permitirem estudar fenômenos fugazes (como reações a gestos e expressões faciais), elas são bastante usadas na análise de práticas pedagógicas. Além disso, possibilitam construir uma referência comum para os envolvidos: o sujeito filmado, o formador e os formandos, tornando a discussão mais objetiva. Em geral, as cenas gravadas são recortadas em episódios definidos em razão dos propósitos formativos. Para Altet (2016, p. 66), recortar a cena gravada em um ou mais episódios permite identificar e compreender a organização, o encadeamento e o desenvolvimento da sequência pedagógica, de acordo com a abordagem teórica adotada.

O emprego da escrita é considerado central na formação inicial dos professores, por mobilizar conhecimentos já alcançados e permitir certo distanciamento da situação em estudo que, por ser mais objetivamente analisada, leva a decisões mais acertadas. A escrita fomenta habilidades cognitivas e metacognitivas que tendem a não ser intencionalmente ensinadas, promove o raciocínio crítico e identifica valores que possam prejudicar o desempenho docente. Escrever é uma possibilidade de o formando transformar sua ação, motivo pelo qual deve ser empregada desde a formação inicial. Por sua importância, algumas dessas situações serão aqui discutidas:

  1. portfólio é uma estratégia que pode atender a diferentes propósitos, embora sempre envolva selecionar e organizar os trabalhos realizados para fins formativos, de certificação ou, mais comumente, de ambos. Os formandos aprendem, na interação com seus pares e com o supervisor, a fazer da escrita um meio para identificar, refletir e aquilatar o desenrolar de suas próprias aprendizagens, os progressos alcançados e as necessidades formativas a serem supridas. Nesse sentido, portfólios “podem ser vistos como instrumentos reflexivos de natureza mista, que combinam seleção sistemática de materiais escritos e escrita reflexiva” (BUYSSE; VANHULLE, 2009, p. 88);

  2. jornal de bordo é uma estratégia que, quando os formandos têm uma sala de aula real sob sua responsabilidade, requer a escrita de um texto no qual possam refletir sobre as atividades realizadas no estágio, impressões e descobertas, além de estruturarem seus conhecimentos, conceituarem e significarem a ação, construindo uma visão particular acerca do exercício do magistério (BUCHETON; DECRON, 2003);

  3. relatório de estágio é um registro crítico de cada formando sobre as decisões que tomou nesse período, justificando-as com base na teoria, nas situações das escolas e de seus alunos. É, assim, uma reflexão necessária sobre a própria experiência no estágio. Os formadores levam os formandos a problematizarem o que viveram nas escolas, considerando seus contextos históricos e conjunturais; as razões que orientaram as ações tomadas e a configuração que, intencionalmente, foi dada à prática pedagógica realizada, justificando-a por meio dos quadros teóricos estudados (MERHAN, 2007).

ALGUMAS PRÁTICAS FORMATIVAS ANALISADAS NO CONTEXTO BRASILEIRO

A seguir, serão analisadas algumas práticas formativas selecionadas por meio do PPRMM, que foram desenvolvidas em cursos de formação inicial no Brasil e que empregam dispositivos presentes na literatura e na realidade francófona. Cabe ressaltar que esses casos não se inspiram nos dispositivos aqui descritos nem os nomeiam. Boa parte deles foi desenvolvida por formadores de cursos que nem sempre dialogam com - ou produzem - a literatura sobre formação docente. De qualquer forma, por estarem no campo da formação de professores e de haver grande interação de acadêmicos francófonos com autores brasileiros - especialmente pelo intercâmbio de pesquisadores -, pode-se inferir que a discussão lá feita tem aqui, direta ou indiretamente, forte influência.

Antes de passar à análise dos casos, ressalta-se um aspecto que perpassa todos eles: a preocupação dos formadores em promover a unidade entre teoria e prática e em favorecer a aproximação do licenciando com a escola - situação que vai ao encontro do modelo de alternância, apresentado no início deste artigo. Da mesma maneira, a maioria das experiências apresentadas recorre a mais de um dos dispositivos descritos anteriormente. Por outro lado, há dispositivos presentes nas referências francófonas que não foram utilizados nas experiências selecionadas, como os “casos de ensino”, “entrevista” e “portfolio”.

Dentre os casos dos últimos cinco anos premiados pelo PPRMM, há um que explicitamente afirma empregar micropráticas, no sentido do microensino já referido. Por meio de um projeto de extensão no curso de Licenciatura em Letras - Português/Inglês, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS) - campus, Rafaela Drey (2019) desenvolveu o projeto: “O ensino de Língua Inglesa na prática: micropráticas de ensino como estratégia de formação inicial de professores de língua estrangeira”. O objetivo principal foi o de propiciar aos licenciandos a vivência do contexto escolar e da regência, “a atuação prática em ambientes de sala de aula, para que pudessem, efetivamente, realizar a transposição didática entre os conteúdos teóricos discutidos ao longo do curso e as práticas de sala de aula” (DREY, 2019, p. 40). Para tanto, as atividades do semestre foram divididas em etapas de preparação e vivência propriamente dita, que englobaram: (i) discussões teóricas sobre o ensino de língua estrangeira, seguidas de atividades práticas simuladas em sala de aula; (ii) preparação de planos de aula envolvendo a análise de materiais didáticos, socialização com demais licenciandos e orientação da professora formadora; (iii) o emprego desse plano no ambiente escolar, envolvendo observação da escola de educação básica e das turmas onde ministrariam suas aulas, bem como entrevistas com as professoras regentes de Língua Inglesa; (iv) realização das micropráticas executadas em duplas, em turmas dos anos finais do ensino fundamental previamente escolhidas pelas docentes da escola parceira, com a presença delas e da professora formadora. Como projeto de extensão, essa experiência foi facilitada pela presença de poucos alunos. Entretanto, ela revela a importância de que atividades práticas anteriores ao estágio da licenciatura sejam desenvolvidas e integrem todo o currículo da formação inicial docente.

A iniciativa desenvolvida por Taitiâny Bonzanini (2019) segue a mesma linha de Drey: “aprender fazendo”, por meio de vivências em situações reais da sala de aula, com orientação da professora formadora e compartilhamento com docentes mais experientes da escola básica. Assim, embora não nomeie suas estratégias como micropráticas, o projeto “A formação docente e os diferentes momentos de instrumentação para o exercício da profissão” - da Licenciatura em Biologia, Licenciatura em Ciências Agrárias, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, Departamento de Economia, Administração e Sociologia, Piracicaba (SP) - pode ser também visto como uma estratégia de microensino aplicada em escolas de educação básica. O método centrou-se em Oficinas Pedagógicas para a Instrumentalização Docente (Opid), que procuravam não apenas integrar a teoria ao “aprender com e na prática”, mas, também, propiciar ao futuro professor contato com ferramentas de ensino diversificadas, de modo a não reproduzir o modelo tradicional, de aulas expositivas, que prepondera na educação básica. Bonzanini planejou as oficinas pressupondo que o licenciando se forma e forma simultaneamente. Assim, foram executadas de maneira simultânea o que a formadora denominou Tempo Universidade (oficinas formativas) e Tempo Escola (oficinas didáticas): no primeiro, os licenciandos participavam das disciplinas e reuniões extraclasse, para debater, planejar e produzir material didático; no segundo, as ações eram realizadas na escola, por meio de observação do contexto escolar, registros, regências e intervenções, sempre com orientação e acompanhamento da professora formadora. Os futuros professores “participavam das oficinas formativas ao mesmo tempo que planejavam e conduziam oficinas para os estudantes da educação básica em um movimento de estudar, pensar, fazer, refletir” (BONZANINI, 2019, p. 57).

Diferentemente das micropráticas de Drey, as Opids de Bonzanini envolveram três disciplinas, sendo uma delas o estágio propriamente dito. O que é interessante notar, em um e outro caso, é que ambas as formadoras chamam a atenção para os problemas do estágio curricular supervisionado nos cursos de licenciatura no país. Baseadas em vários estudos, elas ressaltam que o futuro professor acaba ocupando posição passiva na observação de aulas, com pouco ou nenhum espaço para a regência. O papel do professor supervisor também é questionado, pois, em muitos casos, ele não conhece a realidade escolar na qual o estágio foi praticado. Talvez seja por isso que muitas escolas resistam a aceitar os estagiários, a despeito de as normatizações legais preconizarem a articulação teoria e prática. Nesse sentido, são muito interessantes os casos apresentados por Bernadete Beserra e Claudia Prioste, ambos desenvolvidos em disciplinas de fundamentos da educação e, tidas, geralmente, como teóricas, abstratas e de difícil visualização e aplicação prática.

A experiência de Bernadete Beserra (2016) pode ser vista como mais um exemplo de dispositivo que recorre à observação de aulas e às interações verbais para tornar a própria prática pedagógica um objeto de estudo. Até por ministrar a disciplina Antropologia da Educação, campo que tem como tradição a pesquisa etnográfica, Beserra propôs que seus licenciandos convertessem os professores da universidade e suas práticas/aulas em objeto de estudo, o qual deveria ser posteriormente discutido entre a formadora e os futuros professores. Assim, apesar de não ter tido a escola de educação básica como lócus de pesquisa, o projeto “A construção do olhar antropológico na formação docente” - desenvolvido no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Ceará - pode ser visto como representante dos estudos de caso anteriormente descritos. O projeto teve por objetivo proporcionar aos licenciandos do curso de Pedagogia a reflexão sobre a alteridade e as consequências que o encontro com ela produz, levando-os a refletir antropologicamente sobre suas próprias práticas escolares. Para tanto, a formadora desenvolveu estratégias para estimular o aprendizado prático dos conceitos da Antropologia na formação do professor, por meio da escrita de diários de campo, feitos a partir da observação de toda a faculdade de educação. Trata-se de identificar e indagar-se sobre os processos de socialização que constituem e fazem os docentes serem o que são, com o objetivo de desatualizá-los, transformando-os em objetos de reflexão (BESERRA, 2016).

Inicialmente, os alunos foram convidados a observar e registrar, nos diários de campo, as aulas de todos os professores de seu curso, incluindo aquelas da formadora. Todavia, esse movimento gerou críticas no interior da instituição e somente a aula da formadora pôde ser objeto da observação e reflexão dos licenciandos. Os diários, como recurso didático, propiciam sistematização e análise das relações que se estabelecem no contexto da instituição (no caso, a universidade, e futuramente, a escola), desejo de autoria e tratamento individualizado. Eles também se transformam em um potente instrumento de avaliação: da aprendizagem do aluno e da própria didática do professor, que se enxerga através do olhar do estudante sobre sua prática docente. Ambos se tornam, portanto, sujeito e objeto de análise (BESERRA, 2016).

O projeto de Cláudia Prioste (2020) - “Estágio em Psicologia da Educação: problemáticas contemporâneas no contexto educacional brasileiro”, desenvolvido no curso de Licenciatura em Letras da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp), campus Araraquara - também é um estudo de caso, assim definido e nomeado pela autora. Assim como as demais descritas até aqui, a experiência de Prioste buscou articular teoria e prática, reflexão e ação, propiciando aos licenciandos de Letras, nas disciplina Psicologia da Educação e Estágio Supervisionado em Psicologia da Educação, intervenções didáticas significativas em contextos reais e variados de ensino. Para tanto, utilizou a abordagem estágio-pesquisa, centrando-se em eixos temáticos atuais e mais contextualizados no âmbito da Psicologia da Educação, tais como: fracasso escolar, questões étnico-raciais, desigualdade de gênero, bullying, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), além de medicalização dos problemas de aprendizagem.

Tais temas foram estudados na universidade com a professora formadora, que orientou como realizar um estudo de caso, desde a delimitação do problema e elaboração da questão principal, passando pela elaboração de hipóteses, coleta de dados (questionários, entrevistas, observação) e a análise. Se a escola do estágio permitisse interação com alunos, os estagiários poderiam propor regência de aulas e discutir, com os professores, possibilidades de intervenção. Se não era possível solucionar o problema ou a situação encontrada, os formandos traziam, de suas investigações, exemplos de ações para reflexão coletiva, com a ajuda da formadora da universidade, por meio de seminários, nos quais se estimulava que eles “repensassem futuras intervenções diante dos problemas e contextos estudados” (PRIOSTE, 2020, p. 20). Essas intervenções didáticas propiciaram, assim, que os licenciandos entrassem em contato com os desafios da realidade escolar e analisassem situações problemas, articulando-as às novas e às clássicas perspectivas teóricas da Psicologia da Educação. Ao pesquisarem o impacto das temáticas referidas na aprendizagem, os futuros professores desenvolveram atitudes investigativas relevantes ao magistério e refletiram sobre as muitas possibilidades de atuação docente.

O projeto “A implementação de unidades didáticas multiestratégicas na formação inicial de professores de química”, realizado por Amadeu Moura Bego (2016), da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), foi o único dentre os premiados nos últimos cinco anos que utilizou a videogravação, embora ela não seja o principal centro da iniciativa. Ela será aqui destacada dada sua pouca presença nos cursos de formação inicial de professores. A experiência baseou-se no conceito de Unidade Didática Multiestratégica (UDM), que consiste em um procedimento de ensino que integra, de modo organizado e sequenciado, diversas estratégias didáticas de acordo com objetivos de aprendizagem previamente definidos. O processo de implementação das UDM em duas disciplinas envolveu três etapas: (i) planejamento da UDM; (ii) intervenção didático-pedagógica nas salas de aula das unidades escolares parceiras - onde se deu a videogravação; (iii) replanejamento da UDM por meio da reflexão crítica sobre a intervenção realizada, via videogravações.

Para preparar as intervenções, os licenciandos fizeram um estágio de observação nas escolas parceiras durante aproximadamente um mês e meio, para conhecer melhor o local da intervenção e as características dos alunos. Com base nas observações, os futuros professores produziam diários de aula e elaboravam os conteúdos das seções da UDM, período que ocupou aproximadamente dois meses da disciplina. Nela, os grupos apresentavam a UDM ao formador, recebiam devolutivas e revisavam o material, até chegar à versão final que seria implementada. Já a aplicação das atividades nas escolas teve a duração de oito aulas, filmadas e acompanhadas pelos professores supervisores e, de modo amostral, pelo formador. Ao final dos encontros, cada grupo de licenciandos se reunia para debater o desenvolvimento das aulas e para realizar reflexões sobre:

a adequação das estratégias didáticas utilizadas na aula (motivação e interesse dos alunos; complexidade de execução; participação dos alunos; adequação do tempo previsto; consecução dos objetivos); a adequação dos materiais de aprendizagem e dos recursos utilizados na aula (compreensão das informações pelos alunos; a capacidade dinamizadora do trabalho individual ou em grupo; nível de autonomia do trabalho); reflexões sobre as concepções prévias, os obstáculos epistemológicos, o objetivo da sequência didática e os resultados da avaliação. (BEGO, 2016, p. 65)

Ao final das intervenções, o formador realizou grupos focais com os estudantes, com o intuito de assistir a episódios de aulas e refletir criticamente sobre as potencialidades e limitações da utilização e da execução das UDMs. Por fim, após os grupos focais, os licenciandos tiveram, com base em seus diários de aula10 e nas discussões coletivas nos grupos focais, de replanejar as respectivas UDM, propondo adequações necessárias, caso os licenciandos fossem utilizá-la novamente. A proposta de Bego é um exemplo do uso simultâneo de dispositivos que recorrem à observação de aulas e às interações verbais, que empregam recursos audiovisuais para analisar as práticas pedagógicas e, ainda, que utilizam a escrita. A maioria dos projetos analisados faz algum tipo de composição de estratégias, ao buscar garantir momentos de reflexão individual e coletiva dos formandos.

Assim como as micropráticas, observou-se que os registros escritos são frequentemente utilizados como estratégia formativa nas licenciaturas. O diário de campo, por exemplo, é mencionado em cinco projetos, muito embora nem todos os formadores detalhem como ele foi empregado. Beserra, por exemplo, relata que o utilizou para que os estudantes pudessem, no curso de pedagogia, aprender a observar antropologicamente o próprio contexto escolar, no caso a Faculdade de Educação ou a sala de aula da disciplina Antropologia da Educação. Já na proposta de Bego, os diários eram utilizados para que os licenciandos conhecessem melhor o local da intervenção, principalmente as características dos alunos, planejando, com base nesses resultados, a intervenção didático-pedagógica que, uma vez aplicada, requereria voltar ao diário, para replanejar a UDM.

No conjunto dos casos, dois projetos desenvolvidos em disciplinas de estágio supervisionado utilizaram-se de relatos de experiência11 como dispositivo formativo. O primeiro foi desenvolvido por Marcos Neira (2017), da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, com licenciandos da Educação Física. O segundo foi realizado por Thaís Lobosque Aquino (2018), da Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás, com estudantes de licenciatura em Música.

Desafiado a diminuir o distanciamento entre o que se ensina na universidade e a realidade escolar, Neira criou o projeto “Análise e produção de relatos de experiência da educação física cultural: uma alternativa para a formação de professores”, que conferiu centralidade à análise e produção de relatos de experiência que, mais tarde, foram adotados como recursos didáticos. Inicialmente, o formador recorreu às narrativas escritas (ou orais) de professores em exercício e, mais tarde, os formandos foram estimulados a redigirem seus registros de estágio, ou seja, “elaboraram as próprias narrativas por meio da escrita e reescrita de relatos das intervenções didáticas desenvolvidas durante o estágio regência” (NEIRA, 2017, p. 59). Nesse processo, os estudantes eram instigados pelos comentários dos colegas e do professor.

Os relatos utilizados no primeiro momento provinham de uma experiência do formador em uma formação continuada que envolvia a produção de relatos de experiência e serviram como materiais didáticos a serem analisados nas aulas, à luz de pressupostos teóricos que fundamentam a perspectiva cultural da educação física. Os licenciandos eram provocados a identificar as influências teóricas nas narrativas docentes e as orientações didáticas que caracterizavam as propostas dos professores. Neira explica que o relato de experiência “é um artefato importante nas atividades de formação inicial e contínua de professores, pois possibilita apreender as significações do autor sobre a efetivação do trabalho pedagógico, ou melhor, como concebe o que acontece e o que lhe acontece (NEIRA, 2017, p. 55).

Após a leitura dos relatos de experiência pelos licenciados, ocorriam debates nos quais dúvidas e críticas eram calorosamente mediadas pelo formador. Os debates sobre as questões metodológicas relacionadas ao ensino de educação física pautavam-se na análise de produções acadêmicas em que a prática pedagógica da educação física cultural fora objeto de investigação; nos relatos orais de professores convidados, acompanhados, na maioria das vezes, da apresentação de portfólios digitais ou filmagens; e, por fim, na redação das próprias experiências de estágio. Os relatos dos licenciandos incluíam desde o tema abordado, a definição dos objetivos e a organização das aulas, passando pelas respostas das crianças, adolescentes, jovens ou adultos, bem como a coerência das atividades com os objetivos, as estratégias adotadas, os instrumentos de avaliação e, ainda, a descrição de como seriam desenvolvidas as aulas subsequentes. Um tempo considerável era reservado para esses relatos, que ocorriam paralelamente à realização do estágio. Neira (2017, p. 60) relata que o “trabalho com os relatos orais e escritos potencializava o debate e a análise não só das experiências acessadas, mas também daquelas que perpassavam as vidas dos futuros docentes, estimulando-os a se tornarem narradores”. Explica que esse processo tem um efeito cíclico, já que a leitura e análise dos relatos estimulava os licenciandos à produção das próprias narrativas. Na condição de orientador do estágio, Neira insistia que as dúvidas, empecilhos, dificuldades vivenciadas na realização do que haviam planejado deveriam compor o registro escrito e que essas reflexões, primeiro no âmbito individual e depois no coletivo, trariam muitas contribuições à formação: “não foram poucas as vezes em que a turma se debruçou sobre uma situação narrada, emitiu comentários e coletivamente propôs encaminhamentos. Quase sempre o processo prosseguia na semana seguinte, quando o grupo ansiava por notícias dos resultados que o colega alcançara” (NEIRA, 2017, p. 60).

O segundo caso, intitulado “Música, estágio e pesquisa: ações formativas com o tema mulheres na música”, desenvolvido por Aquino, teve por objetivo oportunizar aos professores em formação, com base no tema gerador Mulheres na Música, a compreensão e a vivência do estágio enquanto momento de pesquisa e de desenvolvimento de aspectos indispensáveis à construção da identidade e dos saberes próprios ao exercício profissional da docência em música. No desenvolvimento do projeto, Aquino recorreu a dois dispositivos que envolvem a escrita: diário de campo e relato de experiência, ambos conduzidos com base nos pressupostos da etnografia e da observação participante. Nas palavras da formadora: “o estágio engloba tanto a aproximação com as práticas pedagógicas das instituições educativas, via observação participante, quanto a intervenção direta nessas práticas com o intuito de transformá-las, mediante ações docentes planejadas e reflexivas” (AQUINO, 2018, p. 85).

A formadora relata que a observação participante foi utilizada para que o licenciando aprendesse não só a perceber o fenômeno educativo, como também a registrá-lo com propósitos científicos, algo que também favoreceu a integração dos estagiários com a cultura escolar e seus atores. Os licenciandos eram orientados a utilizar o diário de campo para o registro das experiências vividas e dos recursos didáticos utilizados nas atividades: partituras, textos, imagens etc. Era o diário de campo que fornecia, assim, os dados a serem analisados com minúcia quando da escrita do relato de experiência. Durante o estágio, os futuros docentes planejaram e realizaram ações docentes (individualmente ou em grupo), que foram registradas no diário de campo e, posteriormente, discutidas coletivamente, tendo em vista promover uma avaliação reflexiva conjunta, que envolvia a seguinte sequência: (i) autoavaliação da aula pelo(s) licenciando(s); (ii) avaliação discente coletiva, quando os demais estagiários apresentavam seus apontamentos; (iii) avaliação docente compartilhada das professoras que acompanhavam os estagiários. Nesse processo a discussão era orientada pela problematização de questões com base no relato da experiência vivida e descrita no diário de campo e, também, pelos referenciais trabalhados nas disciplinas de estágio e nos demais componentes curriculares do curso de Música-Licenciatura. Aquino aborda a dificuldade da passagem do trabalho de campo etnográfico para a elaboração do discurso científico, destacando que, embora essa dificuldade permeie todo o processo de construção do texto, o relato de experiência, quando se leva em consideração a objetividade, a clareza metodológica, a necessidade de uso de aporte teórico, “oferece maior liberdade para tecer considerações em uma linguagem mais pessoal. Seu caráter é, portanto, híbrido: atenta-se às exigências da racionalidade científica, mas se abre aos aspectos subjetivos suscitados pelas ações em campo de estágio” (AQUINO, 2018, p. 89).

Observa-se que ambos os formadores - Neira e Aquino - dão significado ao relato de experiência ao promoverem reflexões sistemáticas no âmbito coletivo, em diferentes momentos do estágio. Seu uso não se restringe ao registro solitário do estagiário, pois é resultado de um processo sistemático de reflexões compartilhadas que ocorrem em diferentes momentos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do reconhecimento da importância do professor no processo de aprendizagem dos alunos da educação básica, da lacuna de pesquisas que tenham por objeto as práticas pedagógicas na formação inicial de professores e, igualmente, diante do pouco registro dessas práticas pelos próprios docentes, este artigo buscou analisar algumas experiências formativas reconhecidas como inspiradoras no Brasil, à luz do que vem sendo discutido na literatura francófona.

A ideia foi reunir essas iniciativas desenvolvidas por formadores de licenciaturas, com o objetivo de sistematizar e nomear alguns dos dispositivos por eles utilizados. Não se trata de propor “receitas” ou de divulgar a técnica pela técnica, mas, sim, de reconhecer que os saberes/conhecimentos profissionais docentes - dentre eles, por exemplo, o saber experiencial, nos dizeres de Tardif (2012), e o conhecimento pedagógico do conteúdo, conforme Shulman (1987) - são fundamentais para o exercício do magistério e caracterizam a especificidade da docência. Em outras palavras, há um componente da técnica e da prática do ato de ensinar que não pode ser desprezado. Como afirma Gatti (2020, p. 25), “o debate não é simples, pois o temor da volta a um tecnicismo sem fundamento nas formações está presente na cultura educacional e é ponto importantíssimo para ponderação”.

Como se sabe, esse debate foi intensificado com a Resolução CNE/CP n. 2, de 19 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2002), momento em que se assume a ideia de Prática como Componente Curricular. Desde então, as diretrizes para a formação de professores no contexto brasileiro preconizam que a prática não seja restrita ao estágio supervisionado nem desarticulada dos demais componentes curriculares do curso e, sim, que esteja presente durante todo o itinerário formativo do futuro professor, de modo que o fazer concreto, orientado pelo saber teórico, integre e consolide a formação do profissional. Esse movimento teórico-prático é favorecido à medida que o planejamento dos cursos de formação preveja diferentes experiências em diferentes tempos e espaços curriculares: a) no interior das áreas ou disciplinas; b) numa perspectiva interdisciplinar com ênfase nos procedimentos de observação e reflexão para compreender e atuar em situações contextualizadas (estudo de caso, narrativas orais e escritas, situações simuladas etc.); c) nos estágios a serem realizados nas escolas de educação básica.

Não obstante, ainda conforme Gatti (2020), permanece a necessidade de se discutirem as práticas formativas nos cursos de licenciatura. De fato, como salienta a autora, essas práticas precisam ser mais bem compreendidas, uma vez que os currículos tendem a ser vagos e genéricos, bem como os estágios sem projeto e sem acompanhamento. Essa situação exige que se estude mais detalhadamente o que se passa nas salas de aula das licenciaturas e nas atividades que são nelas ministradas para a formação de professores da educação básica.

A importância de se articular teoria e prática e de desenvolver a reflexividade nos cursos de formação inicial é ponto consensual. A dificuldade reside, portanto, em saber os motivos pelos quais esse consenso teórico não consegue ser concretizado nas licenciaturas do país. Certamente, há questões de estrutura e organização dos cursos que impactam fortemente essa possibilidade de institucionalizar a integração teoria-prática. Todavia, esse artigo mostrou que, apesar dos entraves de ordem mais macro, há iniciativas realizadas por formadores em cursos de formação inicial que conseguem promover a unidade entre teoria e prática e favorecer a aproximação do licenciando com a escola - e isso não apenas nas disciplinas de estágio.

Microensino, estudos de caso, videogravação e diários de aula foram alguns dos dispositivos presentes na literatura francófona que foram encontrados nas experiências brasileiras analisadas. De diferentes maneiras, os premiados pelo PPRMM e, mais especificamente, os formadores aqui analisados conseguiram simular ou se aproximar do real, ou mesmo praticar o real, coconstruindo as teorias aprendidas na universidade na realidade de uma escola parceira. Se a sistematização dessas práticas é importante como registro do processo, sua relação com os dispositivos elencados pela literatura francófona também é relevante, por possibilitar a visualização de diferentes formas pelas quais a teoria pode ser integrada à prática. Mas é mister enfatizar não só que as fronteiras entre os dispositivos são muito fluídas, mas que o seu sucesso depende da reflexão acerca da forma como eles são utilizados pelo docente formador.

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4Desde 2011, foram inscritos 741 projetos, dos quais 33 foram premiados depois de um rigoroso processo de avaliação e seleção. Esses projetos constituem, portanto, uma amostra de práticas instigantes, implementadas nas licenciaturas do país.

5Essas experiências formativas devem ter sido desenvolvidas junto aos licenciandos, no máximo, três anos antes de sua submissão ao Prêmio.

6A parte teórica do estudo não foi publicada; a parte empírica está no livro MORICONI, Gabriela M. (org.). Ensinando futuros professores: experiências formativas inspiradoras. Curitiba; São Paulo: CRV; Fundação Carlos Chagas, 2020. 248 p.

7No Brasil, as pesquisas no campo da formação de professores são também influenciadas por autores estadunidenses, tais como David Schön, Lee Shulman, Kenneth Zeichner, Marylin Cochran-Smith, Linda Darling Hammond.

8Todas as traduções são livres.

9Boudjaoui e Leclercq (2014, p. 10), ao estudarem a pedagogia de alternância, mostram que “dispositivo de formação” é um conceito teórico que designa arranjos ideais, funcionais e de atuação que, em conjunto, formam um sistema que envolve objetivos pedagógicos, contextos, atores, ações e relações, bem como materiais necessários para os alcançar. Nesse sentido, há nos dispositivos de formação um aspecto virtual (pois não se sabe ainda se ele será efetivo) e outro material (as ações e os recursos empregados para chegar aos fins pretendidos). Ao ser implementado, o dispositivo formativo ganha concretude, o que lhe permite ser objeto de estudo e de reflexão.

10“Diários de aula” e “diários de campo” são também denominações que correspondem ao dispositivo “jornal de bordo” descrito anteriormente.

11Esses relatos de experiência correspondem aos “relatórios de estágio” descritos anteriormente.

Recebido: 10 de Maio de 2021; Aceito: 04 de Agosto de 2021

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