INTRODUÇÃO
A produção acadêmica nacional no campo da Política Educacional se utiliza, prioritariamente, do aporte teórico do ciclo de políticas públicas (policy cycle approach), desenvolvido por Stephen Ball e Richard Bowe (1992). De forma breve, podemos dizer que os autores destacam que uma política pública é constituída por um ciclo contínuo formado por três contextos - influência, produção de texto e prática - e que, embora sejam inter-relacionados, não são, necessariamente, temporais ou sequenciais, e por isso se caracterizam como um ciclo. Esta abordagem é muito utilizada para investigações sobre a trajetória da política, que envolve quatro fases: agenda, formulação, implementação e resultados.
No campo das pesquisas acadêmicas, as fases da agenda, da formulação (análise dos textos legais da política) e dos resultados da política (análise dos efeitos e impactos que a política tem sobre a qualidade da educação) são foco de muitos estudos, enquanto pesquisas sobre a fase da implementação ainda são incipientes nas diversas áreas do conhecimento (Lotta, 2015), sobretudo no campo educacional (Oliveira, 2019).
Em que pese os poucos estudos realizados sobre a implementação de políticas educacionais, alguns avanços podem ser observados tanto no campo da Ciência Política, com pesquisadores (Lotta et al., 2021) desenvolvendo estudos sobre a implementação da Reforma do Ensino Médio nos estados brasileiros, por exemplo, quanto no campo da Educação, que conta, desde 2014, com uma rede de pesquisadores, denominada Rede de Estudos sobre Implementação de Políticas Públicas Educacionais (REIPPE)1, que desenvolve estudos sobre implementação de políticas educacionais em diversos contextos nacionais.
A lacuna científica sobre a implementação de políticas educacionais é o objeto do presente trabalho, cuja finalidade consistiu em um levantamento da produção acadêmica nos anos de 2018 e 2019 sobre o tema da implementação de políticas educacionais. O objetivo principal foi mapear, na produção científica qualificada, a quantidade de estudos sobre a temática e analisar os aportes teóricos utilizados. Para tanto, analisamos os artigos publicados em periódicos classificados como A1 do Qualis da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e as teses e dissertações publicadas no portal da CAPES no período de referência.
A coleta e análise dos dados se deu em duas etapas: a primeira, de cunho quantitativo, para o levantamento e seleção do número de artigos, teses e dissertações publicadas nos anos de 2018 e 2019, e a segunda, de cunho qualitativo, para a análise do aporte teórico. Seguindo esta organização do trabalho empírico, o texto encontra-se dividido em quatro seções, incluindo esta breve introdução. Na seção seguinte, apresentamos a metodologia empregada, incluindo a descrição de como se deu o levantamento e a seleção dos trabalhos sobre o tema da implementação de políticas educacionais. Na seção três, analisamos os estudos selecionados a fim de identificar os principais aportes teóricos adotados nos artigos, teses e dissertações analisados. E, por fim, apresentamos algumas considerações finais na quarta seção.
METODOLOGIA
Este estudo se alinha à abordagem metodológica denominada metapesquisa, ou seja, pesquisa das pesquisas (Mainardes, 2018), que, diferentemente da revisão de literatura, do estado do conhecimento e do estado da arte, preocupa-se em identificar e analisar os fundamentos teóricos dos estudos desenvolvidos numa determinada área ou campo de investigação. Mainardes (2018, p. 306) explica a diferença entre metapesquisa e as demais abordagens metodológicas:
A metapesquisa difere da revisão de literatura, revisão sistemática, estado da arte, estado do conhecimento. A metapesquisa é orientada para a disciplina (área ou campo) e está engajada com os avanços da pesquisa na disciplina (área ou campo). Os estudos de revisão (revisão de literatura, revisão sistemática, estado do conhecimento, estado da arte) estão orientados para projetos de pesquisa: as pesquisas precedentes são revisadas principalmente como uma fase preparatória para a realização de novos projetos de pesquisa. É por meio da revisão de literatura que o pesquisador familiariza-se com o conhecimento já construído sobre a temática de pesquisa e identifica possíveis lacunas que necessitam ser preenchidas em novos projetos de pesquisa. Geralmente, os trabalhos de revisão de literatura preocupam-se mais em sintetizar os resultados de um conjunto de pesquisas, dispensando menos atenção aos fundamentos teóricos das pesquisas revisadas. A metapesquisa, por sua vez, busca analisar, especialmente, os fundamentos teóricos das pesquisas e o significado destes no desenvolvimento teórico do campo do qual as pesquisas fazem parte.
Nesse sentido, a metapesquisa tem como enfoque a análise dos referenciais teóricos mobilizados pelas pesquisas em uma temática específica. Tello e Mainardes (2015, p. 169) apontam que a metapesquisa
a) permite a ampliação do conhecimento produzido no campo; b) ajuda na reflexão sobre as possibilidades dos critérios de cientificidade e de vigilância epistemológica e c) contribui para intensificar o intercâmbio de informação e críticas sobre a produção de conhecimento do campo.
Assim, possibilita “identificar como os pesquisadores do campo estão desenvolvendo suas ideias e proposições, baseando-se em determinados referenciais teóricos” (TELLO e MAINARDES, 2015, p. 169). Portanto, a metapesquisa não se confunde com uma revisão de literatura pois tem como finalidade sistematizar os trabalhos sobre uma temática específica e analisar suas perspectivas teórico-epistemológicas, ao passo que a revisão de literatura focaliza os resultados obtidos pelas pesquisas.
Considerando que este estudo tem como objetivo fazer um mapeamento das pesquisas realizadas nos anos de 2018 e 2019 sobre implementação de políticas educacionais no campo da Educação, o trabalho se aproxima de uma metapesquisa, pois busca identificar as principais abordagens teóricas dos estudos alinhados ao tema da implementação de políticas, na área da Educação. Não se trata de sintetizar os resultados das pesquisas, mas sim de compreender quais são os conceitos mobilizados e os principais referenciais teóricos empregados nos trabalhos sobre implementação de políticas educacionais no campo da Educação.
Para isso, realizamos primeiro a seleção dos estudos publicados na área a partir da definição de alguns descritores (palavras-chave) e autores de referência que investigam o tema da implementação no campo da Ciência Política. A definição de quais descritores e de quais autores utilizaríamos como referência se deu com base na leitura de várias pesquisas (artigos, teses e dissertações) desenvolvidas no campo da Ciência Política sobre o tema da implementação de políticas em áreas como o Trabalho, a Saúde e a Assistência Social2. Essa literatura se apresentou para nós, especialmente, no âmbito da REIPPE - que vem utilizando esse arcabouço teórico e metodológico para o desenvolvimento de trabalhos investigativos. Essa rede de estudos vem promovendo, nos últimos anos, uma interação fecunda entre pesquisadores de outras áreas (especialmente da Saúde e da Assistência Social), o que contribuiu para ampliar o referencial teórico-metodológico no campo da implementação de políticas a partir de estudos que se dedicaram especialmente a esta fase do ciclo clássico de políticas. Assim, a partir do contato com essa literatura, elegemos 13 autores de referência (brasileiros e estrangeiros) e 18 descritores que utilizamos para guiar o nosso levantamento, conforme apresentado no quadro 1.
A discussão acadêmica sobre implementação de políticas, obviamente, não se esgota neste conjunto de descritores e de autores, mas, sem dúvida, são conceitos e referências importantes para os estudos sobre implementação de políticas públicas. Com a definição dos descritores e dos autores de referência, dedicamo-nos a selecionar os trabalhos que focalizaram o tema da implementação e que foram publicados no campo da Educação. A seguir apresentamos o processo de seleção dos artigos e, em seguida, o processo de seleção das teses e dissertações.
Seleção dos artigos
A seleção dos artigos se deu em duas etapas: primeiro selecionamos os periódicos, e depois os artigos. Na seleção dos periódicos, utilizamos como critério a classificação na CAPES3. Como o objetivo era mapear produções qualificadas, utilizamos como primeiro filtro a classificação A1 no Qualis CAPES do quadriênio 2017-20184, no qual identificamos 107 periódicos nacionais e internacionais e visitamos suas respectivas páginas online para mapear o foco e o escopo de cada um deles, que deveria ser, explicitamente, a Educação e todas as subáreas das Ciências Sociais (Antropologia, Sociologia e Ciência Política), uma vez que a Educação é uma Ciência Social e, por isso, estudos sobre Educação são publicáveis nesses periódicos. A aplicação deste filtro fez a nossa lista reduzir para 35 periódicos, seguindo-se a aplicação de um terceiro filtro: selecionar apenas os periódicos nacionais, uma vez que nossa intenção era verificar a produção acadêmica nacional no campo da implementação de políticas educacionais. Chegamos, então, a uma lista de 20 periódicos.
Selecionados os periódicos, passamos a definir os critérios para a seleção dos artigos. Optamos por analisar todos os artigos publicados em forma de demanda contínua ou chamada aberta, excluindo os artigos publicados em dossiês temáticos e, também, as publicações referentes às entrevistas, resenhas e apresentações/editoriais dos periódicos. A seleção dos artigos se deu a partir de dois critérios subsequentes: pelo menos um dos 18 descritores, conforme apresentado no quadro 1, deveria ser identificado no resumo e/ou nas palavras-chave dos artigos e, uma vez identificado um dos descritores, olhamos para as referências bibliográficas, a fim de verificar se algum dos 13 autores de referência foram citados nos artigos. Desta forma, os artigos que apresentaram pelo menos um descritor (no resumo e/ou nas palavras-chave) e um dos autores (na referência bibliográfica) foram selecionados para a leitura. No total, foram selecionados 25 artigos. O quadro 2 apresenta a distribuição desses artigos nos periódicos analisados, revelando a baixa representatividade do tema nas publicações analisadas. Conforme observado, dos 1747 artigos publicados no período, nos 20 periódicos selecionados, apenas 25 atendiam aos critérios definidos no estudo, correspondendo assim a apenas 1,43% da produção analisada. Esse dado revela que os periódicos qualificados publicam poucos artigos que abordam o tema da implementação de políticas públicas educacionais a partir dos conceitos e dos referenciais teóricos definidos no estudo.
Na análise dos artigos fomos levadas a fazer mais um filtro, definido empiricamente na leitura dinâmica dos artigos. Isso porque alguns artigos tinham escopo temático ampliado não tratando da implementação de políticas educacionais. É o caso, por exemplo, do estudo de Lotta (2018) que utiliza vários dos descritores e dos autores de referências (sendo inclusive uma dessas referências), mas que trata da implementação de políticas no campo da Saúde. O trabalho de Lavalle, Rodrigues e Guicheney (2019) também está nesta categoria de exclusão pois aborda uma política do campo da Assistência Social. As pesquisas de Moreira (2019) e de Sarue (2018) também são exemplos de estudos que atenderam aos critérios definidos na pesquisa, mas que não se alinham ao campo da Educação: o primeiro trata dos arranjos institucionais do Sistema de Justiça, e o segundo investiga o tema da governança urbana a partir da implementação do Porto Maravilha na cidade do Rio de Janeiro. Por fim, o estudo de Motta (2019) também foi excluído da análise por tratar da ação discricionária dos policiais-professores que atuam em Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) na comunidade Cidade de Deus, se tratando de um estudo alinhado à área da Segurança Pública. Os casos aqui exemplificados reforçam a predominância de pesquisas sobre a implementação de políticas em campos diversos ao da Educação e evidencia a lacuna científica de estudos sobre implementação de políticas educacionais.
Ao final, consideramos para a análise qualitativa apenas dez artigos, ou seja, 0,57% do total de artigos publicados em 20 periódicos A1 nos anos de 2018 e 2019. Esses dez artigos foram lidos na íntegra para a análise das abordagens teóricas empregadas nos estudos.
Seleção das teses e dissertações
Para o levantamento das teses e dissertações, realizamos uma busca no catálogo da CAPES, que funciona como um repositório das teses e dissertações defendidas e publicadas pelos Programas de Pós-Graduação do país. Devido ao formato da plataforma, esta seleção se deu por um procedimento diferente do adotado para a seleção dos artigos. No próprio portal há a opção de filtro que permite que a busca dos trabalhos seja feita por meio de palavras-chave. Nesta busca, elegemos o descritor implementação e o recorte temporal para que a plataforma disponibilizasse apenas os trabalhos publicados em 2018 e 2019.
O terceiro filtro foi determinar em quais áreas de conhecimento se daria a busca, dentre as quais definimos todas as opções que continham as palavras Educação ou Ensino. São elas: 1) Educação; 2) Educação de Adultos; 3) Educação em Periferias urbanas; 4) Educação Especial; 5) Educação rural; 6) Ensino; 7) Ensino de ciências e matemática; 8) Ensino profissionalizante; 9) Ensino aprendizagem. Depois de aplicados esses critérios, obtivemos 998 trabalhos publicados, dentre os quais selecionamos aqueles que mencionavam a palavra “implementação” no título ou resumo.
Com a aplicação desse novo filtro, selecionamos aqueles que tratavam de alguma política educacional, independentemente de qual fosse. O número de trabalhos diminuiu significativamente: em 2018 encontramos 60 dissertações e 17 teses, e em 2019 encontramos 24 dissertações e seis teses, totalizando 107 trabalhos. Destes, olhamos para as referências bibliográficas a fim de identificar a presença de pelo menos um dos autores de referência (Quadro 1). Com esse último critério adotado, selecionamos 37 trabalhos, que acabaram sendo reduzidos a 29, pois sete não tinham autorização para divulgação e um foi excluído da análise pois tratava do arranjo institucional de implementação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Guandu-RJ, sendo, portanto, uma dissertação fora da área da Educação, embora tenha sido desenvolvida no Programa de Pós-Graduação de Educação Agrícola da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Desta forma analisamos um total de 29 trabalhos, sendo 17 dissertações e quatro teses publicadas em 2018 e seis dissertações e duas teses publicadas em 2019. A tabela abaixo apresenta a distribuição regional dos trabalhos analisados.
Sul | Sudeste | Centro-Oeste | Nordeste | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|
Instituição | Nº | Instituição | Nº | Instituição | Nº | Instituição | Nº |
UFRGS | 1 | UFRJ | 1 | UFGD | 1 | UESC | 1 |
UNOESC | 1 | UNIRIO | 1 | UNICENTRO | 1 | UECE | 1 |
UFFS | 1 | UERJ | 2 | ||||
PUC-Rio | 3 | ||||||
PUC-SP | 1 | ||||||
UNICID | 2 | ||||||
UNICAMP | 5 | ||||||
UNIMES | 1 | ||||||
UNINOVE | 1 | ||||||
UFJF | 5 | ||||||
3 | 3 | 10 | 22 | 2 | 2 | 2 | 2 |
Fonte: Elaboração das autoras.
Chama a atenção a distribuição desigual da produção de teses e dissertações sobre a temática nas regiões brasileiras. Observamos que os 29 trabalhos foram produzidos em 17 Programas de Pós-Graduação, sendo a maioria (22 trabalhos) em Programas de instituições da região Sudeste, três da região Sul, dois da região Nordeste e dois da região Centro-Oeste, não havendo, nesta seleção, trabalhos produzidos por instituições da região Norte. Além disso, notamos que seis instituições são privadas e 11 são públicas. Uma vez selecionados os dez artigos e as 29 teses e dissertações, passamos para a análise dos fundamentos teóricos dos estudos, apresentados e discutidos na próxima seção.
APORTES TEÓRICOS DOS ESTUDOS SOBRE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS
Análise dos artigos
Os dez artigos selecionados para a análise foram publicados em sete periódicos, sendo a Revista de Políticas Públicas da UFMA aquela com o maior quantitativo de artigos selecionados. O quadro 3apresenta os artigos.
Os dez artigos versam sobre escopos temáticos diferentes, sendo que alguns deles não se referem direta e explicitamente à fase da implementação de políticas. É o caso, por exemplo, do trabalho de Torres, Camelo e Castro (2019) que investiga as falhas de coordenação da política de ensino fundamental por meio da criação de indicadores de permanência/migração de alunos entre as diferentes redes de ensino para estimar o efeito deste indicador sobre o desempenho dos alunos na Prova Brasil. Para tanto, o estudo mobiliza referenciais que discutem o modelo federativo do Estado brasileiro e as formas como o regime de colaboração é operacionalizado em diversos contextos. Nesse sentido, o trabalho não se alinha direta e explicitamente aos temas relacionados à fase da implementação da política (como, por exemplo, os arranjos institucionais de implementação, as práticas, as interações e a influência da discricionariedade da atuação dos agentes implementadores de médio escalão e de nível de rua, entre outras), situando-se mais no campo da avaliação da política, uma vez que objetiva verificar os efeitos da política de migração/permanência sobre o aprendizado dos estudantes.
Ações colaborativas entre entes federados também é tema discutido nos trabalhos de Batista (2018) e Veloso (2019), embora as lentes analíticas sejam diferentes. O primeiro aborda o regime de colaboração para investigar a implementação do Plano de Ações Articuladas (PAR) nos municípios do estado do Rio Grande do Sul. O estudo se debruça sobre a implementação do PAR tendo como referência teórica o ciclo de políticas, conforme definido nos trabalhos de Stephen Ball e colegas, não mobilizando os conceitos e os autores de referência deste estudo para analisar a implementação da referida política. Os autores encontrados na busca (Martha Arretche e Fernando Luiz Abrucio) aparecem apenas na introdução do texto, na discussão sobre as relações federativas. Já o segundo artigo investiga a política de Aprendizagem Profissional, apontando um certo descompasso entre a política federal para a qualificação profissional de jovens e as demandas e realidades dos contextos locais.
O autor advoga que esse descompasso pode ser mitigado se a política de Aprendizagem Profissional for implementada a partir do regime de colaboração, de forma descentralizada, onde a execução da política leva em consideração as decisões dos governos subnacionais, garantindo, assim, maior eficácia da política. O estudo se alinha a temas como descentralização e capacidades estatais locais, à luz de Fernando Luiz Abrucio e Martha Arretche.
Diferentemente dos trabalhos de Torres, Camelo e Castro (2019), Batista (2018) e Veloso (2019), os artigos de Laurentino e Alloufa (2019), de Lisboa, Mendes e Lima (2019) e de Gomes e Passos (2018) não possuem como pano de fundo o contexto federalista no provimento do serviço educacional, pois investigam políticas formuladas pelo governo federal em instituições de ensino federais, não prescindindo, para a sua execução, de ações colaborativas entre entes federados.
O trabalho de Laurentino e Alloufa (2019) aborda a implementação do Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba - IFPB - campus Picuí a partir da Abordagem Sequencial de Políticas Públicas (ou Ciclo de Políticas Públicas), com base nas contribuições de Klaus Frey e Leonardo Secchi. Os autores enfatizam a pertinência dessa abordagem para a “análise da vida de uma política”, uma vez que o agir público pode ser dividido em diversas fases (identificação do problema, formação da agenda, formulação das alternativas, tomada de decisão, implementação, avaliação e extinção), sendo foco do estudo a fase da implementação. Esse recorte é justificado a partir das contribuições de Sonia Draibe, que destaca a importância de se estudar a fase de implementação para se compreender e identificar não somente as possíveis falhas dos processos de implementação, como também os equívocos nas tomadas de decisão na fase da formulação da política. Assim, os autores utilizam a técnica de análise Anatomia do Processo Geral de Implementação, proposta por Sonia Draibe para a avaliação de sistemas e subprocessos da implementação, quais sejam: Sistema Gerencial e Decisório; Processos de Divulgação; Sistemas de Seleção; Sistemas de Capacitação; Sistemas Internos de Monitoramento e Avaliação; Sistemas Logísticos e Operacionais. Esses subsistemas ou subprocessos possuem interligações e interdependências, sendo possível verificar interferências entre eles e no próprio desenho da política, contribuindo para o conhecimento dos motivos que levam a política a ter sucesso ou fracasso nos seus resultados.
O trabalho de Lisboa, Mendes e Lima (2019), assim como o de Gomes e Passos (2018), define políticas públicas como um ciclo, sendo a implementação uma das fases desse ciclo, na qual ambos os trabalhos focalizam a discricionariedade dos agentes implementadores. Por um lado, o trabalho de Lisboa, Mendes e Lima (2019) investiga a implementação da Política de Atendimento às Pessoas com Necessidades Educacionais Específicas (NAPNEs) nos Institutos Federais brasileiros, com base nas abordagens clássicas da implementação de políticas - top-down e bottom-up -, apresentando o elemento discricionário da atuação dos agentes implementadores de nível de rua e de médio escalão na implementação da política a partir de autores como Gabriela Lotta, Maria das Graças Rua, Lars Tummers e Victor Bekkers, Estela Najberg, Nelson Barbosa, Luciana Lima e Luciano D'ascenzi. Já Gomes e Passos (2018) analisam a implementação do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) nos Institutos Federais discutindo o conceito de discricionariedade dos agentes implementadores à luz de Sonia Draibe, Pedro Luiz Barros Silva e Marcus André Barreto de Melo. Especialmente, o estudo se volta para a tradução da política nacional nas normativas locais (de cada IF pesquisado).
Outros três estudos possuem como escopo analítico o conceito de governança. No âmbito da Nova Gestão Pública e da ideia de Governança em Rede, o estudo de Tripodi e Sousa (2018) discute as lógicas privatizantes que têm guiado a formulação e a implementação de políticas públicas de educação no Brasil, a partir da categoria permeabilidade estatal. O conceito de governança em rede é definido com base nos trabalhos de Roderick Arthur e William Rhodes e nas contribuições de Eli Diniz e de Jan Kooiman. Já o conceito de permeabilidade estatal é abordado à luz de Fernando Henrique Cardoso, Marcus André Melo e Eduardo Marques. Segundo as autoras, o conceito de permeabilidade diz respeito a dois movimentos de atuação do Estado, que se realizam concomitantemente na implementação de políticas educacionais. O primeiro refere-se às iniciativas do poder público para assimilar, adaptar e implantar conhecimentos e lógicas de gestão próprias do setor privado, e o segundo é a transferência da prestação de serviços educacionais do setor público para o setor privado. A ideia de permeabilidade estatal se articula à tendência administrativa da Nova Gestão Pública (NPG) e da Governança em Rede, esta última entendida, a partir das ideias de Jan Kooiman, como “um conjunto de esforços governamentais realizados de modos variados e também por diferentes atores políticos ou sociais, públicos ou privados, ocorrendo entre vários níveis da administração pública” (TRIPODI e SOUSA, 2018, p. 238). Neste sentido, a regulação de políticas passa a ser exercida por atores que estão situados fora do aparelho do Estado. É essa dispersão da regulação que fundamenta a ideia de governança em rede.
Se o trabalho de Tripodi e Sousa (2018) teve como foco uma discussão teórica, o estudo de Tripodi, Senna e Rodrigues (2018) se valeu do conceito de permeabilidade estatal para uma análise empírica, qual seja: investigar as variadas formas de parcerias estabelecidas entre Estado e sociedade civil (chamado de terceiro setor ou público não estatal) para a oferta de Educação Infantil numa amostra de municípios brasileiros. Assim como em Tripodi e Sousa (2018), o estudo de Tripodi, Senna e Rodrigues (2018) discute o conceito de permeabilidade estatal à luz de Fernando Henrique Cardoso e Eduardo Marques no contexto da NPG, mas não discute a ideia de governança em rede. Os autores mobilizam os conceitos de permeabilidade estatal e arranjos institucionais para mapear tendências de modos de oferta de educação infantil, na etapa creche, explicitadas em Planos Municipais de Educação (PMEs), formulados e/ou reformulados em 2015.
O segundo artigo ancorado no conceito de governança é o trabalho de Martins e Junior (2018), que parte da hipótese de que a formulação e a execução da Política Nacional de Educação Museal (PNEM) são delineadas por atores que se organizam em redes e associações. Para os autores, os atores formuladores e implementadores coincidem na execução da PNEM justamente porque atuam em redes - conceito definido a partir das contribuições de Michael McGuire e Robert Agranoff e de Paulo Calmon e Arthur Costa como “um conjunto de relacionamentos entre atores heterogêneos e interdependentes, voltados para a atuação em um mesmo subsistema de políticas públicas” (MARTINS e JUNIOR, 2018, p. 320). Esses atores, organizados em redes, atuam dentro de uma estrutura de governança que possui regras formais e informais com diversas forma de interpretação e implementação. É sobre a análise das características das formas de governança da rede que formula e implementa a PNEM que o estudo se debruça.
Tanto o estudo de Tripodi e Sousa (2018) quanto o de Martins e Junior (2018) utilizam definições de governança em rede semelhantes, embora os autores de referência sejam diferentes.
O terceiro artigo que traz o conceito de governança como categoria analítica é o trabalho de Vieira, Plank e Vidal (2019). Para compreender as razões que contribuem para o bom desempenho de aprendizagem do estado do Ceará, o trabalho se valeu dos conceitos de Governança multiescalar, definido a partir de Paul Stephenson, Roderick Rhodes, Bob Jessop entre outros, e de Dependência da trajetória, abordado a partir de Paul Pierson, James Mahoney, Scott Page e Ian Greener. Um dos aspectos centrais é o regime de colaboração estabelecido no provimento do serviço educacional entre o governo do estado do Ceará e seus municípios. Formas colaborativas entre os entes federados na oferta da educação têm longa trajetória e foram, ao longo do tempo, criando condições específicas que levaram o estado a implementar formas próprias de governo e de governança junto aos seus municípios. Essas especificidades explicam, em certa medida, os bons resultados de aprendizagem obtidos no Ceará nos últimos anos.
O quadroa seguir busca sintetizar as abordagens teóricas encontradas nos artigos selecionados.
Análise das teses e dissertações
O levantamento das teses e dissertações analisadas revela a necessidade de se produzir resumos e de se definir palavras-chave que reflitam efetivamente a temática da pesquisa, o objeto da investigação e o escopo teórico utilizado como lente analítica dos dados empíricos. Isso porque a imprecisão dos dados pode provocar vieses não somente na análise como também na própria coleta dos dados de estudos sobre revisão de literatura, estado da arte, estado do conhecimento e metapesquisas.
Essa constatação foi feita quando verificamos que quatro estudos não tratavam do tema da implementação de políticas públicas educacionais. Em verdade, os trabalhos atenderam aos critérios estabelecidos para a busca, mas não se enquadraram como estudos sobre implementação de política públicas educacionais. Um estudo realizou uma metapesquisa sobre o conceito de accountability; o outro analisou a produção acadêmica sobre o regime de colaboração no Brasil; o terceiro investigou os documentos normativos sobre políticas voltadas para o incentivo à leitura, e o quarto se debruçou sobre os reflexos das avaliações em larga escala nas práticas pedagógicas dos docentes. Pode-se dizer, a partir da leitura dos resumos, que os três primeiros trabalhos se dedicaram a levantar pesquisas, artigos ou textos de políticas específicas (respectivamente), não abordando, de fato, a implementação de políticas educacionais. O quarto trabalho discute o conceito de avaliação em larga escala nas legislações educacionais e as reações docentes à sua aplicação sem, contudo, discutir a implementação de políticas de avaliação educacional. Os quatro trabalhos foram, assim, excluídos da seleção.
Pode-se dizer então que um total de 25 teses e dissertações focalizaram a fase da implementação de políticas públicas, sendo que cinco (Sousa, 2019; Faria, 2018; Marquet, 2018; Nascimento, 2018; Mesko, 2018) utilizaram como lente analítica o ciclo de políticas desenvolvido por Stephen Ball.
Em particular, a dissertação de Mesko (2018) utiliza as contribuições do ciclo de políticas para aprofundar a discussão sobre a Nova Gestão Pública e o modelo gerencialista do Estado brasileiro e o surgimento de redes de governança que se dão a partir de iniciativas de privatização - endógena e exógena - da Educação Básica. Baseando-se no trabalho de Stephen Ball e Deborah Youdell5, Mesko (2018, p. 75-76) define a privatização endógena como a incorporação no setor público, de “concepções, ideias e práticas oriundas do setor privado”, ao passo que a privatização exógena é entendida como “uma nova maneira de privatização em que consultorias e organizações sociais (sociedade civil) elaboram programas nas políticas públicas educacionais e nos sistemas de ensino público”.
Essa relação complexa entre mercado, Estado e setor público vem sendo denominada por Ball (2013) como nova filantropia, e é a partir dessa interação que se implementa o Programa Educação Compromisso de São Paulo - objeto de investigação da pesquisa de Mesko (2018).
O tema do gerencialismo e da NGP também se faz presente no trabalho de Silva (2018), que aborda a implementação do Programa Todos por Pernambuco, sendo caracterizado como uma política de orientação gerencialista e, também, na dissertação de Marcelino (2018), onde a Reforma do Estado e o modelo gerencialista de gestão aparecem como pano de fundo para situar o desenvolvimento do Programa de Apoio à Qualificação da Universidade Federal de Juiz de Fora (Proquali/UFJF). Ou seja, nesses dois trabalhos, o tema da Reforma do Estado, do gerencialismo e da NGP não são o objeto da investigação, mas aparecem para a descrição do contexto em que os Programas se desenvolvem. Em ambos os trabalhos, o autor de referência é Fernando Luiz Abrucio, que também é utilizado nas dissertações de Lins (2018) e de Matos (2018) para tratar do tema do federalismo. Já o trabalho de Moreira (2018, p. 71) utiliza as contribuições de Martha Arretche para tratar do tema da descentralização da oferta educacional no contexto federativo brasileiro, ressaltando os limites das gestões municipais “em razão da baixa capacidade econômica, expressiva dependência das transferências fiscais e fraca tradição administrativa”.
De um modo geral, percebemos uma certa predominância de estudos que utilizam como fundamentação teórica o conceito de discricionariedade da atuação dos agentes implementadores. Alguns estudos se dedicam à análise da discricionariedade dos burocratas implementadores de nível de rua e de médio escalão (Mota, 2018; Camargo, 2019; Silva, 2019; Gomes Moreira, 2018), enquanto outros se debruçam apenas sobre a ação discricionária dos agentes de nível de rua (Almeida, 2019; May, 2018; Gusto, 2018). Esses estudos se valeram, prioritariamente, das contribuições de Michael Lipsky e Gabriela Lotta.
Essas teses e dissertações se alinham à abordagem teórica bottom-up, que compreende a política como um continuum, no qual a ação do implementador transforma as regras da formulação da política. Compreende-se que o agente implementador, a partir de suas práticas e interações, modifica a formulação da política na execução de suas tarefas. Embora existam regras e normas previstas na fase da formulação, os agentes implementadores mobilizam suas próprias crenças e valores na tomada de decisões dos processos de implementação, fazendo com que esses agentes não sejam apenas executores, mas também fazedores de políticas.
Esses agentes são categorizados pela literatura como burocratas de nível de rua - aqueles que estão em contato direto e imediato com os usuários da política, como os médicos, os professores e os policiais - e como burocratas de médio escalão - definidos como aqueles que conectam a fase da formulação e da implementação, sendo elos entre os agentes do alto escalão e os de nível de rua. Ao abordar a implementação da autonomia financeira nas escolas do Ceará, através do PDDE, Gomes Moreira (2018), por exemplo, discute seu problema de pesquisa partir das fases do ciclo clássico da ciência política, dando destaque às abordagens bottom-up e top-down a partir de Hill, localizando esta discussão, contudo, na descrição da fase da avaliação e não da implementação. Ao analisar a empiria e discutir a autonomia financeira das escolas, o autor descreve os espaços de tomada de decisão e as reinterpretações da política, mobilizando a discussão sobre os condicionantes nas decisões dos burocratas a partir de Gabriela Lotta.
Inseridos nesta perspectiva teórica, Mota (2018), Camargo (2019), Silva (2019), Almeida (2019), May (2018), Gusto (2018), além de Gomes Moreira (2018), desenvolveram estudos sobre a implementação de políticas educacionais da Educação Básica, não havendo, entre os estudos selecionados, nenhum voltado para as políticas do Ensino Superior com base nesta fundamentação teórica.
A dissertação de Antoniolli (2019), embora não utilize como lente analítica o conceito de discricionariedade da atuação das burocracias implementadoras, vale-se do conceito de autonomia para tratar da atuação dos burocratas implementadores no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). À luz das contribuições de Martha Arretche, a pesquisa compreende os agentes implementadores como os responsáveis pela execução da política, traduzindo suas concepções e referências em ações concretas de intervenção. Assim, mesmo não utilizando o conceito de ação discricionária, a pesquisa de Antoniolli (2019) versa sobre o mesmo escopo temático que os demais trabalhos.
Entre as teses e dissertações selecionadas, dois trabalhos tratam do monitoramento ou da avaliação da implementação. Um deles é o de Santos (2018, p. 8), que, embora objetive trazer à tona “o monitoramento de políticas públicas para embasar a análise da implementação da política pública de EI”, o faz a partir de outros referenciais teóricos6 diferentes daqueles definidos neste estudo. O autor trabalha o conceito de “monitoramento da implementação” a partir de Veronica Cruz, Heloisa Höfling e Luciana Lago. Já Ribeiro (2018), também analisando a implementação de uma política pública voltada ao atendimento da Educação Infantil, discute os conceitos de análise e avaliação e propõe-se a trabalhar com as “avaliações do processo”, a partir das considerações de Sonia Draibe.
Um exemplo de estudo que trouxe uma abordagem diferente daquelas propostas nos descritores apresentados é a dissertação de Antunes (2018), que buscou analisar a implementação do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) em dois Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFs). A autora a articulou à análise de políticas públicas (policy analysis) e trabalhou com a lógica do backward mapping, a partir de Elmore, para classificar o desenho da implementação nos dois casos estudados. Essa perspectiva (forward mapping e backward mapping) seria uma outra opção à abordagem bottom-up tradicionalmente desenvolvida por Michael Lipsky.
O trabalho de Mercês (2018) pode ser um exemplo de sobreposição de referenciais, uma vez que focaliza a percepção de gestores escolares sobre a implementação de políticas de formação continuada e em serviço de professores, a partir de diferentes - e não necessariamente complementares - fontes:
Concluindo, a abordagem do ciclo de políticas apresentada por Mainardes, a discussão sobre as dificuldades com a implementação levantadas por Condé, as correntes top-down e bottom-up mencionadas por Segatto e a ideia da força da interação presente em Lotta trazem valiosas contribuições para esse estudo. (MERCÊS, 2018, p. 59)
Porém, essas referências são timidamente retomadas na análise dos dados, que se apoia mais nos estudos sobre a formação docente.
O estudo de Mengalli (2018), por sua vez, traz uma análise sobre a utilização de softwares de monitoramento e mensuração como ferramentas para a implementação de políticas públicas educacionais. A tese traz no título o descritor “implementação”, que aparece diversas outras vezes ao longo do texto em referência a uma ação - às vezes do estado, outras do gestor local e ainda do público - que efetiva e monitora a materialização da política pública. Contudo, a autora não recorre a nenhum dos autores mencionados para discutir ou conceituar esse processo de implementação. Mas mobiliza o conceito de redes sociais a partir de Martins e Lotta: “redes sociais podem ser uma alternativa robusta para compreensão e avaliação de políticas de educação no nível local” (MARTINS e LOTTA, 2010, p. 858, apud MENGALLI, 2018, p. 66).
A dissertação de Nascimento (2018) traz importantes contribuições para a produção científica sobre implementação de políticas públicas educacionais na medida em que faz uma extensa e rigorosa revisão de literatura sobre o tema, mobilizando diversos conceitos, dentre eles o de arranjos institucionais de implementação e o de burocracias implementadoras de nível de rua e de médio escalão e vários autores de referência, como Gabriela Lotta, Michael Lipsky, Roberto Pires, Paul Sabatier, Steven Maynard-Moody, Michael Musheno, Richard Matland, Martha Arretche e Fernando Luiz Abrucio. Tendo como escopo investigativo o arranjo institucional de implementação do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), Nascimento (2018) analisa os documentos normativos da política cumprindo três dos cinco passos propostos no modelo analítico de Gomide e Pires (2014). Esse modelo aponta que a análise do arranjo institucional de implementação de uma política deve seguir os seguintes passos: 1) Identificação dos objetivos da política; 2) Identificação dos atores envolvidos direta ou indiretamente na política; 3) Identificação dos processos, mecanismos e espaços na gestão da política; 4) Avaliação das capacidades estatais produzidas pelo arranjo; 5) Avaliação dos efeitos dos arranjos de implementação.
Tendo apresentado as abordagens teóricas das teses e dissertações selecionadas, o quadroque se segue busca sintetizar as tendências das abordagens encontradas no material analisado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir de um amplo levantamento realizado em publicações internacionais e nacionais, Lotta e colegas (2018) buscam, nas mais importantes revistas no campo de Administração Pública, Políticas Públicas e Ciência Política, artigos que abordassem “implementação”, “burocracias” e “burocratas” associados a “políticas públicas”.
O recorte temporal - 2003 a 2017 - foi o mesmo na busca em periódicos internacionais e nacionais. Para além da enorme diferença do volume de publicações internacionais (218) e nacionais (21) selecionadas, cabe destacar que a produção internacional foi categorizada em 11 grupos temáticos, enquanto a produção nacional abordou predominantemente três áreas: burocratas de nível de rua (incluindo o uso de sua discricionariedade e seus valores); estruturas de governança (arranjos institucionais e camadas federativas); outros (estudos de caso de políticas e programas específicos). Os autores consideram a lacuna e fragmentação na produção acadêmica sobre implementação de políticas públicas, sobretudo no campo da Ciência Política e Administração: “A análise dessa parca literatura nacional demonstra que, à luz do que aconteceu internacionalmente no campo, ainda há muita fragmentação nos estudos sobre implementação” (LOTTA et al., 2018, p. 798).
Tendo em vista as pesquisas sobre o tema, realizadas no campo da Educação, nota-se que essa produção é ainda mais escassa, como buscamos apresentar neste trabalho, a partir da busca de artigos publicados e teses e dissertações defendidas no período 2018-2019. Em relação às tendências das abordagens teóricas, destacamos que entre as teses e dissertações houve uma maior concentração de estudos sobre os agentes implementadores e, entre os artigos, uma maior concentração de estudos sobre estruturas de governança. Essa concentração coincide com o encontrado por Lotta e colegas (2018) no levantamento que teve um escopo mais abrangente em se tratando de áreas de produção. O terceiro grupo mencionado pelos autores, que incluiu análises de políticas e programas específicos, não foi aplicado em nossa análise pois estes estudos estavam diluídos em todas as outras categorias, uma vez que a grande maioria dos trabalhos se dedicou à análise de uma política ou programa.
Cabe destacar a presença (mais volumosa entre as teses e dissertações) de trabalhos que se apoiaram no referencial teórico-metodológico do Ciclo de Políticas, de Stephen Ball e colegas, muito presente no campo educacional.
Destacamos, ainda, os trabalhos que se voltaram para estudar a avaliação ou monitoramento da implementação, propondo uma interseção entre as fases do ciclo clássico da política, onde a avaliação do processo se faz presente. Nestes trabalhos, a principal referência foi Sonia Draibe.
Ademais, é importante considerar a aproximação “em construção” à literatura específica do campo da Ciência Política, sobre implementação, pelos pesquisadores da área educacional. Entre as teses e dissertações, apesar dos filtros aplicados, encontramos estudos que não definiam claramente o seu referencial analítico para analisar a política ou programa em foco ou, ainda, a apresentação de um referencial teórico no início do trabalho que não era mobilizado na análise da empiria recolhida.
Finalmente, como em outros estudos que envolvem levantamentos bibliográficos, reconhecemos que os resultados encontrados se limitam aos critérios de seleção e referencial de categorização definidos pelas autoras. Consideramos que, ainda que possam não expressar uma generalização das tendências da produção acadêmica sobre implementação de políticas educacionais, seus resultados lançam luz para um campo ainda pouco explorado. Essa lacuna traz algumas implicações para a pesquisa, sendo uma delas a construção de um aporte teórico e metodológico para o estudo das políticas públicas no próprio campo da Educação. Se, até o momento, os estudos se desenvolveram a partir de referenciais advindos de outras áreas do conhecimento - em especial da Ciência Política -, um dos desafios postos é a construção de um referencial teórico e metodológico no campo educacional. Assim, além de fazer avançar a lacuna existente, o campo tem o desafio de formar pesquisadores que construam um aporte teórico e metodológico sobre implementação de políticas no próprio campo da Educação.