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Educação em Revista

versión impresa ISSN 0102-4698versión On-line ISSN 1982-6621

Educ. rev. vol.39  Belo Horizonte  2023  Epub 15-Mayo-2023

https://doi.org/10.1590/0102-469835586 

Artigos

RELAÇÃO ENTRE PRESSUPOSTOS TEÓRICOS, CURRÍCULO E ORGANIZAÇÃO DO ENSINO

RELACIÓN ENTRE PRESUPUESTOS TEÓRICOS, CURRÍCULO Y ORGANIZACIÓN DE LA ENSEÑANZA

MARIA SANDREANA SALVADOR DA SILVA LIZZI1  , Autora do Projeto de Pesquisa, participação ativa na coleta e análise dos dados e escrita do texto
http://orcid.org/0000-0002-7556-6055

MARTA SUELI DE FARIA SFORNI2  , Orientadora da Pesquisa, participação ativa na elaboração do projeto, na análise dos dados e na revisão da escrita final
http://orcid.org/0000-0002-9614-2075

1 Instituto Federal do Paraná (IFPR) - Campus de Pitanga. Cascavel, Paraná (PR), Brazil.

2 Universidade Estadual de Maringá (UEM). Maringá, Paraná (PR), Brazil.


RESUMO:

Na elaboração de currículos escolares e projetos políticos pedagógicos (PPPs) é exigido que sejam evidenciados os pressupostos teóricos, os encaminhamentos metodológicos e os processos de avaliação. Todavia, nem sempre esses elementos são vistos de modo articulado, por isso, esses documentos não orientam o trabalho pedagógico. A partir dessa problemática, este artigo, com o objetivo de evidenciar a relação entre o currículo prescrito e as ações de ensino, apresenta parte de uma pesquisa, de natureza qualitativa, cujos dados de campo foram coletados em um grupo de estudos do qual participaram professores envolvidos na elaboração de uma proposta curricular fundamentada no materialismo histórico-dialético, na teoria histórico-cultural e na pedagogia histórico-crítica. Os resultados apontam que a participação dos professores no processo de elaboração de currículos e de PPPs provoca neles reflexões acerca da articulação desses documentos com a prática pedagógica e gera a necessidade de compreender ações de ensino que podem ser derivadas dos fundamentos anunciados no currículo.

Palavras-chave: currículo; projeto político pedagógico; organização do ensino; materialismo histórico-dialético; teoria histórico-cultural

RESUMEN:

En la elaboración de currículos escolares y proyectos político-pedagógicos (PPPs), se requiere que se evidencien los presupuestos teóricos, lineamientos metodológicos y procesos de evaluación. Sin embargo, los elementos no siempre se ven de forma articulada y, por tanto, estos documentos acaban por no estar orientados al trabajo pedagógico. A partir de esta problemática, este artículo, con el fin de resaltar la relación entre el currículo prescrito y las acciones docentes, presenta parte de una investigación cualitativa, cuyos datos de campo fueron recolectados a través de un grupo de estudios en los que los docentes participaron en la elaboración de una propuesta curricular basado en el materialismo histórico-dialéctico, la teoría histórico-cultural y la pedagogía histórico-crítica. Los resultados indican que la participación de los docentes en el proceso de elaboración de currículos y PPPs provoca en ellos reflexiones sobre la articulación de estos documentos con la práctica pedagógica, generando la necesidad de comprender acciones docentes que puedan derivar de los fundamentos enunciados en el currículo.

Palabras clave: currículo; proyecto político pedagógico; organización docente; materialismo histórico-dialéctico; teoría histórico-cultural

ABSTRACT:

Theoretical foregrounding, methodology, and assessment processes are required to prepare school curricula and pedagogical policy projects (PPPs), although these factors are not always perceived in an articulated form. Consequently, these documents fail to direct the pedagogical issue. A section of qualitative research in this paper evidence the relationship between the prescribed curriculum and teaching activities. Field data were collected by the studied group, and integrated by teachers involved on the curriculum proposal development, based on Historical and Dialectical Materialism, Historical and Cultural Theory, and Historical and Critical Pedagogy. Results show that teachers’ participation in curricula and PPPs development favors discussions on the articulations of such studies coupled with pedagogical practice. Thus, it is essential to investigate teaching activities that may be derived from the curriculum´s basic concepts.

Keywords: curriculum; pedagogical policy project; teaching organization; historical and dialectical materialism; historical and cultural theory

INTRODUÇÃO

Na elaboração de currículos e projetos políticos pedagógicos das instituições de ensino da educação básica, é exigido que sejam evidenciados os princípios filosóficos e conceituais que os fundamentam, além dos componentes curriculares acompanhados dos respectivos encaminhamentos metodológicos e processos de avaliação adotados1. Veiga (1998) explica que a construção do Projeto Político-Pedagógico é marcada por três atos distintos: ato situacional, no qual se descreve a realidade da escola; ato conceitual, que diz respeito à concepção de sociedade, homem, educação, escola, currículo, ensino e aprendizagem; e ato operacional, que trata das ações para a operacionalização do projeto.

Em cada um desses atos, estão presentes as concepções já citadas que, de modo articulado, formam a base de todo o trabalho pedagógico. Elas expressam a idealização do ponto de chegada do processo formativo que diz respeito ao tipo de sociedade que se almeja, as finalidades da educação escolar frente a esse projeto societário, bem como os meios didático-pedagógicos para que se atinja esse fim.

Um currículo e um projeto político-pedagógico têm valor real quando se estruturam como uma bússola que orienta as decisões acerca do caminho a seguir rumo ao destino almejado. Os pressupostos teóricos, denominados de aspectos filosóficos e conceituais (PARANÁ, 2018), nos quais são explicitadas as concepções de sociedade, de homem, de conhecimento e de educação escolar, de modo articulado, oferecem os critérios para definir quais conteúdos priorizar, quais livros didáticos selecionar, quais projetos a serem encampados, quais ações a serem realizadas para promover a aprendizagem dos estudantes, etc. Isso revela a estreita relação entre as concepções expostas no currículo e a organização do ensino.

Em atendimento às exigências legais, os documentos elaborados pelas secretarias de educação e escolas contemplam os tópicos determinados, todavia, não raro, esses elementos pouco dialogam entre si. Desse modo, não se constituem uma base que orienta e expressa, de fato, o trabalho pedagógico realizado ou a se realizar. Ao se assumir a nomenclatura utilizada por Veiga (1998), é possível afirmar que nem sempre há coerência entre o ato conceitual e o ato operacional. Com isso, a prática pedagógica segue muito parecida em diferentes escolas e municípios, sem um diferencial que seria correspondente à especificidade das concepções teórico-metodológicas anunciadas.

A partir dessa problemática, este artigo com o objetivo de analisar a relação entre o currículo prescrito e as ações de ensino, apresenta parte de uma pesquisa cujos dados de campo foram coletados via um grupo de estudos do qual participaram professores dos anos iniciais do ensino fundamental, envolvidos na elaboração de uma proposta curricular fundamentada no materialismo histórico-dialético, na pedagogia histórico-crítica e na teoria histórico-cultural. Inicialmente, destacamos como esses professores evidenciam a necessidade de compreender a relação entre aspectos teóricos destacados no currículo e a prática pedagógica. Posteriormente, apresentamos estudos sobre a organização do ensino que revelam a particularidade das ações docentes e discentes quando assentadas nos pressupostos teóricos presentes no currículo desse município.

DO CURRÍCULO ÀS AÇÕES DE ENSINO: UM CAMINHO A TRILHAR

A relevância que a elaboração do currículo2 e do projeto político-pedagógico3 assume é bastante diferenciada em cada município ou estado. Em alguns locais, a elaboração desses documentos ocupa um lugar especial nas discussões e na formação continuada de professores. Normalmente, esses documentos são produzidos de modo coletivo, e envolvem um grande número de professores em sua elaboração, por essa razão, são valorizados por esses profissionais. Em outros locais, restritos à exigência burocrática, a produção desses documentos não envolve o coletivo escolar e, muitas vezes, não chegam a ser do conhecimento de todos os profissionais da educação. Nessa segunda situação, o currículo e o projeto político pedagógico passam à margem da formação continuada de professores e, contraditoriamente, não são referências para as discussões sobre a organização do ensino.

Porém, onde há envolvimento dos professores na elaboração desses documentos, percebe-se maior reflexão por parte desses profissionais em busca de coerência entre os pressupostos afirmados no currículo e a atividade de ensino que realizam, já que eles esperam que haja, e deve haver, um diferencial no trabalho pedagógico realizado nas redes de ensino em que há maior consciência acerca dos fundamentos teóricos em que se ancoram.

É o que pode ser evidenciado porque participaram de um grupo de estudos que teve como finalidade estudar a concepção de conhecimento e organização do ensino na Teoria Histórico-Cultural4. As professoras pertenciam a uma rede municipal de ensino cujo currículo e projetos políticos pedagógicos das escolas apresentavam como fundamentos o Materialismo Histórico-Dialético5 elaborado por Marx e Engels (2007), a Teoria Histórico-Cultural6 que tem como principais referências Vigotski (2009), Leontiev (1978) e Luria (1991) e a Pedagogia Histórico-Crítica7 desenvolvida por Dermeval Saviani (2005).

O grupo de estudos fez parte de um experimento didático8 que teve como objetivo analisar em que medida a compreensão, pelo professor, do conceito como instrumento mediador, permite alterações no seu modo de organizar o ensino e superar práticas descontextualizadas e/ou fragmentadas. O grupo foi composto por cinco pessoas, quatro professoras dos anos iniciais do ensino fundamental e a pesquisadora. De forma geral, o experimento didático foi realizado em três etapas, com carga horária de 40 horas totais, sendo 32 horas de estudos presenciais e 08 horas dedicadas à elaboração do planejamento de ensino pelas professoras. Inicialmente, as professoras elaboraram individualmente um planejamento de ensino sobre um conteúdo presente no currículo, conforme sua escolha. Um novo planejamento de ensino foi elaborado após a realização dos estudos sobre a concepção de conceito de acordo com a lógica dialética, sobre os processos de aprendizagem e desenvolvimento psíquico conforme a Teoria Histórico-Cultural e princípios didáticos presentes na Teoria do Ensino Desenvolvimental. Analisamos os planejamentos iniciais e finais com o objetivo de identificarmos possíveis mudanças e permanências na forma de organizar o ensino pelos professores, tendo em vista conceitos teórico-metodológicos que foram objetos de estudo pelo grupo.

O currículo desse município e os PPPs das escolas foram elaborados coletivamente e seus fundamentos teóricos são sistematicamente abordados em cursos de formação continuada. O movimento reflexivo provocado pela elaboração do currículo e as formações continuadas geraram nessas profissionais a necessidade de coerência entre o preconizado no currículo e as ações em sala de aula. Apresentaremos, inicialmente, algumas falas das professoras com a intenção de evidenciar problemas e necessidades advindas da prática para, posteriormente, tratar da organização do ensino com base nos referenciais teóricos já citados.

As professoras demonstraram valorizar o fato de o município ter um currículo com clara fundamentação teórica e concordam com a perspectiva de formação assumida nele. Mas apontam que a maior dificuldade que elas sentem é a de ensinar o conteúdo de acordo com a lógica dialética. De modo mais específico, a professora 19 afirma:

Eu gostaria de pontuar que essas questões me angustiam bastante. Acho que é isso aí o nosso grande desafio. Às vezes fico pensando como fazer para implementar de forma efetiva o materialismo histórico dialético na aula. Sobre o conteúdo, esse deve ser o conteúdo científico, produzido e acumulado historicamente pela humanidade (Professora 1).

A fala da Professora 1 indica que a fundamentação teórica no campo filosófico é reconhecida por ela, o que lhe possibilita identificar que há uma lacuna entre essa fundamentação prescrita no currículo e o trabalho que efetivamente ocorre em sala de aula. Ao falar sobre o conteúdo, ela recorre à expressão presente na teoria e no currículo, de que “o conteúdo escolar deve ser o conteúdo científico, produzido e acumulado historicamente pela humanidade”. Todavia, a Professora 1 não avança na explicação sobre o que o fato de compreender ser esse o conteúdo central da escola significa ou diferencia-se de outras práticas que não são tão enfáticas nessa afirmação.

A Professora 2 também destacou o valor atribuído ao conteúdo científico como central no trabalho escolar, mas não vincula essa valorização a algum aspecto metodológico específico: “Eu acho que a valorização do conteúdo científico é uma questão essencial. Não dá para ensinar sem entender a importância do conhecimento científico. Isso é um pressuposto. Mas, não acho que a definição do conteúdo interfere na metodologia” (Professora 2).

A Professora 3 concorda com a afirmação da Professora 1 sobre considerar a dialética na compreensão do ensino e da aprendizagem. Ela reafirma a importância de no ensino se considerar a relação conteúdo, sujeito e forma (assunto que foi discutido anteriormente no grupo de estudo), mas não explicita como seria o ensino que leva em consideração essa relação. Em seguida, essa Professora faz menção à proposta curricular do município: “Também penso ser o nosso grande desafio, garantir a implementação da proposta curricular em sala de aula. Ensinar e aprender dialeticamente. Sobre a importância entre conteúdo, método e sujeito, isso é essencial” (Professora 3).

A Professora 4 também fez menção à relação conteúdo, método e sujeito. Esse assunto chamou sua atenção por não ser comum em estudos já realizados por ela. Especificamente, a consideração do sujeito da aprendizagem para organizar o ensino é para ela um elemento novo. Mas, confirma que a sua preocupação, dentre esses três elementos, é maior com a aplicação do método materialista histórico dialético nos processos de ensino e de aprendizagem.

Eu sei que temos que levar em consideração o sujeito da aprendizagem no processo de ensino, mas geralmente ouço e estudei autores que falam apenas da relação entre conteúdo e forma, ou conteúdo e método. Isso é novo para mim. Assim, trazendo os três juntos. Mas, o grande desafio para mim, é garantir a aplicação do método em sala de aula, na aula mesmo (Professora 4).

A problemática acerca da busca de sintonia entre a lógica dialética e o ensino não é nova, tampouco apenas da realidade educacional brasileira e de um município específico. A preocupação apresentada por essas professoras aproxima-se de preocupações e dificuldades encontradas por psicólogos e pedagogos russos que visavam superar uma perspectiva de ensino vinculada à lógica formal que era comum em escolas soviéticas.

Nossos psicólogos e didatas aceitam a dialética como método geral do conhecimento científico e o empregam em suas investigações. Ao mesmo tempo, o problema consiste em refletir os princípios do pensamento dialético e expressá-los na “tecnologia” de desenvolvimento do material didático, nos procedimentos de formação dos conceitos nos escolares, nos meios para organizar a atividade do pensamento daqueles. No entanto, a “tecnologia” concreta destes processos se estrutura, na atualidade, pelo geral sobre a base dos princípios do pensamento discursivo empírico (DAVIDOV, 1988, p. 108, tradução nossa, grifo nosso).

Compreendida a dialética como lógica primordial para entender a natureza do conhecimento, a preocupação desses autores centrava-se essencialmente em como expressar a dialética no ensino e nos recursos utilizados pelo professor, e não em transpor de modo mecânico as categorias do método da produção do conhecimento para o processo de ensino e apropriação do conhecimento.

Preocupação semelhante está presente em Vygotsky (1996) ao estabelecer a relação entre a psicologia e o método materialista histórico-dialético. Ele ressaltou o cuidado em não se fazer aplicação direta desse método para o campo da psicologia e afirmou ser necessária a criação de uma teoria que utilizasse o método dialético como fundamento, para garantir a produção de categorias próprias do campo epistemológico da psicologia. É possível afirmar o mesmo em relação ao ensino, ou seja, o método materialista e a própria psicologia que nele se fundamenta não podem ser aplicados de modo direto para o campo do ensino, mas são fundamentos para se produzir categorias próprias do campo pedagógico.

A discussão sobre a relação e a especificidade entre o método materialista histórico dialético, e o trabalho pedagógico, chama a atenção da Professora 2, que afirma: “Nossa, isso não é uma questão fácil de se entender. [pausa] Significa que não aplicamos o método na aula especificamente?” (Professora 2).

As categorias do método materialista histórico dialético não são aplicadas diretamente em sala de aula, pois constituem fundamentos filosóficos para a compreensão da realidade objetiva. O ensino deve contemplá-las, mas, ao ter como finalidade a promoção da aprendizagem, também requer a mediação de outras ciências que oferecem corpus teóricos específicos sobre a aprendizagem e os meios para a organização do ensino de conhecimentos científicos, como a psicologia e a didática, respectivamente. Ou seja, o método materialista histórico dialético apresenta conceitos essenciais que, em articulação com outras ciências, permitem a estruturação de uma teoria pedagógica que orienta o trabalho do professor.

Davidov (1988), ao expor a necessidade de superar uma perspectiva de ensino pautado na lógica formal, versa sobre a importância da estruturação das disciplinas escolares e do conteúdo para se pensar a organização do ensino na perspectiva dialética.

O problema do ensino e a educação que impulsionam o desenvolvimento estão estreitamente ligados à fundamentação lógico-psicológica da estruturação das disciplinas escolares. O conteúdo destas e os meios para empregá-los no processo didático-educativo determinam essencialmente o tipo de consciência e de pensamento que se forma nos escolares durante a assimilação dos correspondentes conhecimentos, atitudes e hábitos. Por isso, as questões referentes à estruturação das disciplinas escolares não têm uma importância estreita, mas ampla, desde o ponto de vista das particularidades do desenvolvimento psíquico dos escolares (DAVIDOV, 1988, p. 99, tradução nossa, grifo nosso).

A problematização anunciada pelo autor subjaz a compreensão de que o currículo escolar, mediante a escolha e organização dos conteúdos, possibilita ou não o trabalho na lógica dialética e, consequentemente, impulsiona ou limita o desenvolvimento psíquico, de modo especial, a formação do pensamento teórico dos alunos. Com base no excerto, é possível evidenciar a estreita relação entre a psicologia e a didática, na medida em que a estruturação das disciplinas escolares e seus respectivos conteúdos no currículo direciona a organização do ensino do professor. Diante dessa reflexão, a Professora 2 afirma:

Então... eu compreendo que hoje temos um currículo que traz a questão do materialismo dialético de forma bem clara. Mas, percebo que não há diferença na forma de ensinar na sala de aula. Para mim é difícil entender a relação entre o materialismo e, efetivamente, o processo de ensino com os alunos. Parece que o que prevalece é o ensino de conceitos como definição (Professora 2).

No currículo dessa rede municipal de ensino, é destacada a importância do conhecimento científico no processo de ensino e de aprendizagem:

A escola deve assegurar aos alunos o contato com os conhecimentos científicos mais elaborados, pois são estes que efetivamente possibilitarão a autonomia e a tomada de consciência da classe trabalhadora, tendo um enfoque principal no “o que ensinar”, aproximando os alunos da riqueza intelectual produzida historicamente. Neste sentido, a atuação do professor na escola pública deve ser comprometida com este objetivo, com a transmissão dos conhecimentos científicos (CASCAVEL, 2008, p. 22, grifo nosso).

Esse excerto foi lido no grupo de estudo e reafirmou-se o consenso em torno da função primordial da escola. Disse a Professora 1: “Olha, eu acho que não há dúvida de que a função da escola é ensinar o conhecimento científico. Essa para mim é a questão fundamental do ensino” (Professora 1). A Professora 4 acrescenta: “A questão do conteúdo científico pra mim é essencial. Também a intencionalidade do professor. Essas duas questões dão qualidade ao ensino” (Professora 4).

A Professora 2, como exposto na citação a seguir, chama atenção para um elemento que não estava presente no excerto: a relação entre o conhecimento científico e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, como exposto por Vygotski (1993). A lembrança dessa relação resulta, provavelmente, da leitura feita por ela de outras partes da proposta curricular e de estudos realizados anteriormente. Mas, ela não explicita as razões de a aprendizagem de conhecimentos científicos propiciar o desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

Pra mim está correta! (referindo-se a afirmação presente no excerto do currículo) O trabalho do professor deve ser o ensino do conhecimento historicamente acumulado pela humanidade. Isso que desenvolve as funções psicológicas superiores dos alunos: a aprendizagem de conhecimento científico (Professora 2).

Mais uma vez, a Professora 3 retoma a discussão sobre a unidade conteúdo, sujeito e forma, e, além de afirmar a importância do conhecimento científico, destaca que, ao organizar o ensino, a ênfase não pode estar em apenas um elemento, mesmo que ainda não tenha segurança sobre como seria pensar os demais elementos em unidade.

Eu considero a importância do conhecimento científico no ensino, mas como o próprio slide traz outras questões tão importantes quanto. Por exemplo, os outros elementos: sujeito e a forma. Então seria a unidade: o conteúdo, o sujeito e a forma? (Professora 3).

As afirmações das professoras evidenciam um elemento fundamental para um ensino promotor do desenvolvimento dos estudantes: o conhecimento científico. Essa é uma posição geral do grupo de professores dessa rede de ensino, construída com um intenso trabalho de formação continuada com teóricos que ressaltam a importância desse conteúdo como primazia no processo de ensino.

Porém, outros elementos, como o sujeito da aprendizagem e a forma de organização do ensino, foram mencionados apenas pela Professora 3. De certa forma, de acordo com a exposição das demais, parece haver a compreensão de que a clareza sobre a importância do trabalho com o conhecimento científico seria suficiente para se garantir um trabalho de qualidade e fundamentado nos pressupostos do método materialista histórico-dialético.

No entanto, o conhecimento científico também é valorizado na lógica formal e pela pedagogia tradicional, mesmo que assentados em outra concepção de conhecimento. Desse modo, o fato de se valorizar o conhecimento científico, não é suficiente para promovermos uma educação que possibilite o desenvolvimento da consciência, como exposto na proposta curricular.

O próprio Vygotski (1993), apesar de não se ocupar de investigações sobre a organização do ensino, quando anuncia a importância da apropriação de conceitos para o desenvolvimento, afirma que “[...] uma correta organização da aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental” (VIGOTSKII, 1998, p. 115, grifo nosso). Infere-se dessa afirmação que o trabalho com o conhecimento científico, por si só, não garante que o ensino esteja assentado na lógica dialética e possibilite o desenvolvimento dos estudantes. Assim, é importante pensar sobre uma organização do ensino que leve em consideração o conteúdo, o sujeito e a forma de ensino.

A necessidade de buscar apoio teórico-metodológico para o planejamento das ações de ensino é sentida de modo mais evidente quando se percebe que os livros didáticos disponíveis não organizam o ensino de conceitos de acordo com essa perspectiva teórica, já que seguem outros pressupostos teórico-metodológicos (BACARO, 2018). Mesmo que o livro didático não seja utilizado na íntegra nas escolas, ele exerce influência sobre as ações de ensino, já que, muitas vezes, constitui-se no principal material de consulta pelos professores para a preparação das aulas.

É necessário, porém, que o professor tenha autonomia na organização do próprio trabalho, que não dependa de aulas prontas disponibilizadas por editoras, sites ou sistemas de ensino. Para isso, ele precisa dispor de conhecimentos que o ajude a dominar um modo geral de ensino que seja promotor do desenvolvimento dos estudantes. O trabalho docente é “uma atividade que exige não apenas o saber técnico, mas o domínio teórico das ações de ensino e de aprendizagem” (SFORNI, 2020, p. 21). Esse domínio se adquire com conhecimentos presentes nos pressupostos filosóficos, psicológicos, pedagógicos e didáticos.

ELEMENTOS PARA A ORGANIZAÇÃO DO ENSINO NA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL: EM BUSCA DA SINTONIA ENTRE O CURRÍCULO PRESCRITO E O TRABALHO PEDAGÓGICO

Fundamentados na Teoria Histórico-Cultural e compreendendo a relação entre a psicologia e a didática para pensar a organização do ensino, princípios e ações didáticas foram estruturados por pesquisadores internacionais (DAVIDOV, 1982; 1987; 1988; 1999; DAVYDOV; MARKOVA, 1987; SEMENOVA, 1996; REPKIN, 2014; RUBTSOV, 1996) e nacionais (LIBÂNEO, 2009; MOURA, 1996; 2000; SFORNI, 2004; FREITAS, 2016; NASCIMENTO, 2010, entre outros).

Destacamos que as nossas reflexões estão fundamentadas nas contribuições desses autores para pensarmos um modo geral para organizar o ensino, à medida que constituem aspectos norteadores da atividade docente no planejamento, ensino e avaliação.

Por mais que um conteúdo curricular seja considerado importante pela sociedade ou pelo professor, essa importância, normalmente, ainda não é percebida pelo estudante. O fato de o aluno frequentar ou estar presente na sala de aula não significa que ele esteja interessado ou tenha vontade de aprender. Pelo contrário, por vezes, o aluno frequenta ou participa da aula apenas por medo, obrigação ou hábito, em um processo mecânico. Todavia, a aprendizagem, seja em contexto escolar ou fora dele, requer ter motivos para aprender.

Isso não significa, porém, que estejamos fazendo a defesa de que a aula tenha que se constituir de atividades divertidas cotidianamente, como se a vontade, a atenção e o interesse em aprender e estudar estivessem sempre vinculadas a um ambiente festivo ou práticas docentes “mirabolantes”. Instigar, questionar, estar atento e interessado no conteúdo a ser estudado, normalmente, decorre do modo como o conhecimento é apresentado ao estudante e das ações que ele passa a realizar com esse conteúdo.

Leontiev (1978) destaca que só haverá motivo para o estudo quando este passar a ser uma atividade para o estudante e “está associada a uma classe particular de impressões psíquicas: as emoções e os sentimentos” (LEONTIEV, 1978, p. 297). Ainda, segundo o autor, “nem todo o processo é uma actividade. Nós designamos apenas por este termo os processos que, realizando tal ou tal relação do homem com o mundo, respondem a uma necessidade particular que lhe é própria” (LEONTIEV, 1978, p. 296).

O conhecimento ensinado como definições e termos sistematizados como conteúdos escolares foi produzido em decorrência de necessidades sociais ao longo do desenvolvimento histórico da humanidade. Porém, na sistematização desses conhecimentos, perde-se seu movimento, suas contradições e relações mediatas, pois constituem abstrações que, aparentemente, afastam-se da dinâmica real do mundo. Se apresentados desse modo, pouco interesse demonstram os estudantes na aprendizagem.

Todavia, a compreensão dos aspectos lógico e histórico do conhecimento permite identificar a necessidade histórica e social de sua produção, isto é, o desvelar da gênese e a necessidade do conhecimento no processo histórico da humanidade. Kopnin (1978) assevera que “para revelar a essência do objeto é necessário reproduzir o processo histórico real de seu desenvolvimento, mas este é possível somente se conhecemos a essência do objeto” (KOPNIN, 1978, p.184).

Como fazer isso no processo de ensino em sala de aula?

É imprescindível recriar a necessidade e os motivos de produção do conhecimento a ser ensinado para que faça sentido aos estudantes. Compreendemos, no entanto, ser impossível recriar a situação real de sua gênese. Assim, são necessárias ações didáticas que, de modo abreviado, desencadeiam nos estudantes a necessidade que levou a humanidade a produzir determinado conhecimento.

Em sua atividade de aprendizagem, os estudantes reproduzem o processo real pelo qual os homens criam os conceitos, imagens, valores e normas. Por isso o ensino de todas as matérias na escola deve ser estruturado de maneira que, de forma concisa e abreviada, seja reproduzido o processo histórico real da gênese e desenvolvimento dos conhecimentos (DAVIDOV, 1988, p.174).

É importante destacar que esta necessidade não é apresentada pelo professor mediante exposição ou explicação, mas por meio de tarefas que coloquem os estudantes diante da necessidade de elaborações mentais em busca de respostas que requeiram novos conhecimentos. Nesse sentido, o conhecimento constitui-se em respostas a necessidades e perguntas realizadas no processo de sua criação. O procedimento que provoca um processo ativo de pensamento para compreender os meios de resolução do problema pode, por sua vez, desencadear no aluno necessidades e motivos para aprender.

Sforni (2015) destaca, nesse sentido que

[...] a necessidade e o motivo para aprender um determinado conteúdo não existem a priori no aluno, são criados no decorrer da atividade. Portanto, oferecer o conteúdo sem que o aluno esteja envolvido com as problematizações relacionadas a tal conteúdo, sem que esteja inserido na compreensão das razões humanas da elaboração dessa síntese, assemelha-se a oferecer a alguém respostas a perguntas que não fez. A falta de sentido da informação para o sujeito manifesta-se em sua apatia diante dela (SFORNI, 2015, p. 387).

Assim, no processo de ensino, o conhecimento perde sua essência se for tomado apenas como uma síntese compilada nos manuais didáticos mediante palavras, termos ou definições. Como conceito teórico, além das abstrações, conhecer pressupõe o processo de desenvolvimento de ações mentais conexas ao conteúdo que o sujeito aprende, referente às necessidades e aos motivos históricos de sua criação.

Esse entendimento, por sua vez, leva à necessidade da problematização do conhecimento.

Ao assinalar a necessidade de incluir no processo do ensino de crianças em idade escolar a solução independente das tarefas cognoscitivas, M. Skatkin fala também da possibilidade de fazer um uso eficaz, na escola, da chamada exposição de caráter problemático dos conhecimentos [...] O aspecto principal desta exposição consiste em que o professor não somente comunica às crianças as conclusões científicas finais, mas em certo grau, ele também reproduz o caminho pelo qual estas conclusões foram alcançadas (“a embriologia da verdade”). Ao usar esta abordagem, o professor, demonstra aos alunos o mesmo caminho percorrido pelo pensamento científico, forças alunos a seguirem o movimento dialético do pensamento’ para a verdade, tornando-os, de certo modo, coparticipantes da busca científica (DAVIDOV, 1988, p. 92, tradução nossa, grifo do autor).

Moura (2010), mediante a estruturação da Atividade Orientadora de Ensino - AOE10, explica que é possível, no processo de ensino, recriar a necessidade, e o motivo de criação do conhecimento mediante o encaminhamento metodológico problema desencadeador e/ou situações desencadeadoras de aprendizagem. Esse encaminhamento constitui uma ação inicial da aula, em que o professor, ao fazer uso de diversos recursos como uma história, uma representação, uma situação-problema, um jogo ou experimentos, recria a necessidade que os homens tiveram para elaborar o conhecimento que será trabalhado com a turma. O objetivo principal desse encaminhamento é “proporcionar a necessidade de apropriação do conceito pelo estudante, de modo que suas ações sejam realizadas em busca da solução de um problema que o mobilize para a atividade de aprendizagem-apropriação dos conhecimentos” (MOURA et al., 2016, p. 116).

Nesse sentido, Moura (2000) destaca que

a atividade, [...], é do sujeito, é problema, desencadeia uma busca de solução, permite um avanço do conhecimento desse sujeito por meio do processo de análise e síntese e lhe permite desenvolver a capacidade de lidar com outros conhecimentos a partir dos conhecimentos que vai adquirindo à medida que desenvolve a sua capacidade de resolver problemas (MOURA, 2000, p. 35).

Por outro lado, o problema desencadeador possibilita ainda a interação entre aos alunos em um processo coletivo de “cooperação” como já apontava Rubtsov (1996) e como confirmam Moura et al. (2016) ao afirmarem que “[...] mobilizados a partir do movimento de desenvolvimento da situação desencadeadora, interagem com outros, segundo as suas potencialidades e visam chegar a outro nível de compreensão[...]” (MOURA et al., 2016, p. 118).

Ainda, ao explicar o problema desencadeador no processo de ensino de conceitos matemáticos, Moura (1996) cita que ele pode ser realizado pelo que se intitula de “história virtual do conceito”.

São situações-problema colocadas por personagens de histórias infantis, lendas ou da própria história da matemática como desencadeadoras do pensamento da criança de forma a envolvê-la na produção da solução do problema que faz parte do contexto da história. Dessa forma, contar, realizar cálculos, registrá-los poderá tornar-se para ela uma necessidade real (MOURA, 1996, p. 20).

É importante destacar que a história virtual pode ser utilizada para o ensino dos mais variados conceitos das diversas disciplinas (SFORNI, SERCONEK, BELIERI, 2019). Este encaminhamento está vinculado à compreensão da necessidade social do conhecimento estudado e ao mesmo tempo seu desenvolvimento teórico. O problema desencadeador possibilita que o aluno compreenda que o conhecimento é produzido somente mediante um problema presente na realidade objetiva, uma necessidade que precisa ser resolvida.

O problema desencadeador, assim, evidencia a dimensão teórico-prática do conhecimento à medida que este precisa estar vinculado a uma necessidade humana. Ao mesmo tempo, a sua realização pressupõe evidenciar que na produção de determinado conhecimento houve uma pergunta, uma dúvida ou um problema a ser resolvido. Por outro lado, este procedimento metodológico está vinculado também à necessidade de criação de motivos nos alunos no processo de apropriação, pois possibilita que eles o compreendam como parte da sua vida e que respondam às necessidades humanas ainda hoje. Por esse motivo, ao resolver o problema desencadeador, a dimensão lógico-histórica do conhecimento se avulta ao aluno, torna-se vivo e possibilita a compreensão mais profunda do objeto. Nesse sentido, Kopnin (1978) assevera que

o estudo da história do desenvolvimento do objeto cria por sua vez, as premissas indispensáveis para a compreensão mais profunda de sua essência, razão por que, enriquecidos da história do objeto, devemos retomar mais a definição de sua essência, corrigir, completar e desenvolver os conceitos que o expressar. Desse modo, a teoria do objeto fornece a chave do estudo de sua história, ao passo que o estudo da história enriquece a teoria, corrigindo-a, completando-a e desenvolvendo-a (KOPNIN, 1978, p.186).

Se, por um lado, o domínio do aspecto lógico e histórico do conceito possibilita ao professor a condição de problematizar o conhecimento a ser trabalhado e o entendimento de sua necessidade histórica e social, por outro, permite que ele identifique os conceitos essenciais para a sua compreensão.

Compreendemos que esse procedimento constitui um elemento importante no processo de planejamento do professor, pois ao tomarmos como base a explicação de Vygotsky (1996), na qual ele afirma que o conceito precisa necessariamente ser compreendido em um sistema de relações, nenhum conceito pode ser explicado por ele mesmo. Assim, ao identificar o processo de gênese e criação do conceito, o professor definirá, mediante a elaboração de um sistema conceitual, os conceitos necessários à aprendizagem.

Nesse mesmo sentido, Libâneo (2009), ao discutir a didática para o desenvolvimento humano, explicita que

o planejamento de ensino começa com a análise de conteúdo, em que primeiramente se buscam as relações fundamentais, essenciais, ou seja, a formulação de uma ideia que expressa o princípio interno do tema em estudo (que é o conceito nuclear), e descobrir como esta relação aparece em muitos problemas específicos (LIBÂNEO, 2009, p.13).

Pensemos no exemplo: No ensino do conteúdo energia nuclear, anteriormente à aula, é importante que o professor identifique os conceitos essenciais, considerando que a apropriação desse conteúdo demanda o domínio do conceito geral de energia, que ocorre por meio da compreensão do seu processo histórico, marcado por movimento, transformação e mudança. Assim, poderá propor tarefas que contemplem os conceitos supra-ordenados e os conceitos subordinados, e possibilitem aos estudantes a identificação das relações conceituais que orbitam esse sistema. Nesse processo, especificamente, evidencia-se o movimento de “ascensão do abstrato ao concreto”, o qual ocorre mediante a relação entre o universal e suas manifestações particulares.

A elaboração de um sistema conceitual, na tentativa de identificar outros conceitos para a explicação de um conteúdo específico, permite ao professor evidenciar o que é nuclear do conceito. Ao desvelar a sua essência, compreende seu aspecto mais generalizante, isto é, o aspecto geral que deverá ser conhecido por seus alunos para a resolução de tarefas que abrangem as manifestações particulares desse conhecimento. Neste processo, a tarefa da abstração, destaca Kopnin (1978, p. 161), “não é separar um dos outros indícios sensorialmente perceptíveis, mas através deles descobrir novos aspectos no objeto que traduzam as relações da essência”.

Para a compreensão da essência do conceito, consideramos necessário o uso da linguagem científica mediante o trabalho com textos. Tal ação está relacionada à necessidade de utilizar textos e linguagem que tenham consistência teórica nas diversas áreas do conhecimento. O texto teórico, além de expor e desenvolver os conceitos conforme aceitos pela área de conhecimento a que estão vinculados, traz outros conceitos necessários à sua compreensão.

Destacamos, que a linguagem científica, além de estar presente em textos teóricos, pode também ser expressa em esquemas e modelos iconográficos e semióticos que sintetizam e/ou representam a relação universal de objetos e fenômenos de determinado corpo explicativo. Nesse sentido, a utilização de modelos teóricos favorece a compreensão da essência do conceito e possibilita aos estudantes a realização de tarefas que exijam o uso do conceito.

O entendimento sobre o aspecto lógico e histórico do conhecimento, que permite identificar o que é nuclear do conceito, possibilita “olhar” para vários elementos da realidade que apesar de diferentes na aparência podem ser compreendidos com base no conhecimento apropriado. Isso fica mais evidente quando tomamos ainda como exemplo o conteúdo energia. Se, no processo de ensino do conceito de energia, os alunos identificarem e compreenderem seus traços essenciais, isto é, suas propriedades estáveis e universais, ao observarem suas manifestações particulares na realidade na forma de energia eólica, solar, elétrica, dentre outras, os alunos reconhecerão que esses diferentes modos de se produzir energia podem ser compreendidos, em parte, pelo conceito geral já estudado. Esse procedimento está vinculado à ação definida por Davidov (1988, p. 181) de “construção do sistema de tarefas particulares a serem resolvidos por um procedimento geral. Desta forma, os alunos resolvem tarefas utilizando um conceito geral”.

Ressalta-se que tais tarefas devem exigir que os alunos operem mentalmente com o conceito estudado, e que o simples fato de definirem, relatarem ou narrarem o que leram não garante esse procedimento mental, pois eles podem permanecer apenas no aspecto da abstração, sem realizarem o processo de ascensão do abstrato ao concreto. É necessário, na formulação e/ou escolhas das tarefas que elas sejam relacionadas a situações que exijam o uso do conceito para a sua resolução.

As tarefas que exigem a mediação do conceito estudado e a organização de momentos em que os alunos pensem, discutam e elaborem sínteses coletivas constituem encaminhamentos essenciais, que envolvem os processos de análise e síntese. Em um primeiro momento, essas sínteses poderão ser provisórias. Esse procedimento possibilita a compreensão daquilo que é a essência do conceito estudado e, ao mesmo tempo, suas manifestações na realidade, evidenciando os processos de abstração e de generalização.

Os processos de discussão, análise e sínteses coletivas, por sua vez, pressupõem o uso adequado dos conceitos estudados e evidenciam um processo mental com o conceito em que se explicita seu significado. Neste sentido, Sforni (2017, p. 95) explicita que, neste procedimento, há “união entre a linguagem dos estudantes e a linguagem científica”. Por outro lado, como afirmou Rubtsov (1996), a realização dessas tarefas, por exigirem a cooperação de todos para a sua realização, constituem processo de fortalecimento da atividade coletiva.

Diante dos elementos apresentados, outro questionamento se faz essencial: Como avaliar o processo de apropriação do conhecimento? Está na própria concepção do que é o conhecimento a base para se pensar a avaliação. Se o conceito é um instrumento mediador na relação do sujeito com a realidade, sua apropriação revela-se na função instrumental que ele passa a ter para o estudante.

Como o conceito é um instrumento que potencializa a inteligibilidade da realidade objetiva pelo sujeito, pois desenvolve nele a capacidade de compreender nexos e relações que não podem ser captadas apenas pelos órgãos dos sentidos, o processo avaliativo deve acompanhar nas manifestações (orais, escritas ou comportamentais) dos estudantes se as ações mentais deles são mediadas pelo conceito ou sistema conceitual que foi objeto de ensino.

Segundo Leontiev (1991), a aquisição de conhecimentos por parte de cada sujeito ocorre por meio da formação de ações e operações intelectuais. Tal entendimento exclui a possibilidade de se avaliar essa aquisição apenas mediante a capacidade de o estudante definir o conceito. Com a definição, fica evidente apenas a descrição de algo em sua forma mais abstrata, mais pura, e não é evidenciado se o estudante estabelece relações entre a forma pura geral e as manifestações particulares nos fenômenos da realidade. A definição deixa evidente apenas a dimensão abstrata do conhecimento e não sua unidade teórico-prática, na qual se desvelam as relações entre o geral, o particular e o singular.

Nesse sentido, reiteramos, com base em Sforni (2017) que, no processo de avaliação, faz-se necessária a proposição de tarefas que exijam dos alunos o uso do conceito para sua realização e não apenas a descrição ou definição que devem ser requeridas. Assim, por exemplo, ao trabalhar com o conceito de fotossíntese, ao invés de recorrer a questões como: o que é a fotossíntese? Ou ainda, como ocorre a fotossíntese? Seria conveniente a realização de tarefas com situações singulares diferentes das quais foram apresentadas em sala de aula para explicar o conceito, que exigisse dos alunos a análise dessas novas situações pela mediação do conceito de fotossíntese, explicitando as razões do fenômeno em análise, o porquê ocorre em uma, e não em outra situação. Nesse processo, o aluno precisará ter abstraído o que é geral do conceito, as leis gerais, que se apresentam em situações particulares.

Nessa perspectiva, o que se pretende é que o estudante pense situações reais com base no conceito. Isso exige que, em seu pensamento, o conceito seja conteúdo e forma de pensar, seja ação mental e possibilita que o estudante “olhe” para os fenômenos de modo que eles ganhem inteligibilidade pela mediação do conceito, para assim superarem as aparências imediatas com que se manifestam na realidade.

Dessa forma, no processo de avaliação, não está em evidência apenas a definição verbal, o aspecto formal do conhecimento, o qual é compreendido como um processo importante, mas também se requer o movimento do abstrato ao concreto, que explicita o processo do pensamento mediado pelo conceito. É justamente esse processo do pensamento que potencializa a compreensão da realidade em suas múltiplas conexões e associações, desvelando nuances, perspectivas e compreensões equivocadas sobre o real.

Essa concepção de avaliação está ligada à compreensão de que o conceito é um instrumento mediador, que potencializa a ação do homem sobre a natureza para modificar a forma e o conteúdo do seu pensamento. Por esse motivo, apenas as definições e/ou descrições dos objetos e fenômenos não oferecem ao professor indicadores seguros acerca da apropriação de determinado conceito pelo sujeito. Com base nessa avaliação, é possível reconhecer se o aluno pensa com o conceito, ou seja, se ele se apropriou desse mediador cultural ou apenas reproduz frases feitas que desvinculam a unidade teórico-prática do conhecimento estudado.

Ao exigir que o aluno apenas diga o que é ou como ocorre determinado fenômeno ligado ao conceito, conforme foi explicado pelo professor, está se exigindo primordialmente dele o uso da memória. Apesar de ser uma importante função psíquica superior, a memória é apenas uma entre outras que se desenvolve no processo de aprendizagem, portanto, é preciso que outras funções também sejam requeridas. Além disso, a memória pode ser compreensiva ou mecânica, e na explicação com base na memória pode estar em cena apenas a memória mecânica, sem a compreensão efetiva do significado da palavra, sendo este outro motivo para não se reduzir à avaliação a exigências de definições e exemplificações. O processo de avaliação como um dos momentos privilegiados do processo de ensino demanda possibilitar que o aluno desenvolva ao máximo suas potencialidades e não se caracterize apenas como um momento formal do ritual escolar.

Como afirmado anteriormente, os elementos apresentados ao longo do artigo fazem parte de sistematizações de pesquisadores que têm se empenhado a pensar a organização do ensino e a atividade de ensino como promotores do desenvolvimento do pensamento teórico. Parte dessas sistematizações são apresentadas no quadro síntese (Quadro 1) elaborado por Sforni (2017), o qual contribui consideravelmente para a compreensão dos princípios e ações apresentadas.

Fonte: SFORNI (2020)

Quadro 1 Quadro síntese das ações para a organização do ensino 

Por fim, consideramos que os elementos anunciados anteriormente podem orientar a atuação docente quando se defende uma educação promotora do desenvolvimento psíquico dos estudantes. Cientes de um modo geral de organização do ensino, os professores podem elaborar o planejamento definindo conteúdo, objetivos, metodologia, recursos e avaliação de modo mais coerente ao que é anunciado no currículo e na proposta político-pedagógica.

Os elementos para a organização do ensino apresentados em forma de uma breve síntese nesse subitem foi conteúdo de estudo e discussões no grupo de professoras. Apesar de os estudos estarem voltados para a compreensão dos processos de ensino e aprendizagem, duas professoras, apoiadas nos conceitos estudados, apresentaram situações que extrapolaram o objetivo do estudo e analisaram a própria forma de estruturação do currículo, em relação a um componente curricular específico:

Quando fala aí que a concepção de conhecimento na dialética pressupõe uma forma de organizar o ensino entra a questão da tríade. Entra a questão do sujeito, conteúdo e forma [...]. Especialmente é preciso pensar quem é o meu sujeito, quais as suas necessidades de aprendizagem. Um exemplo seria o currículo de [componente curricular específico]. A forma como ele está organizado não atinge o sujeito professor. Da forma como foi organizado, o professor da sala de aula não consegue compreender os conteúdos. Seria mais para uma pessoa formada naquela área específica. Então, até assim, uma das indagações e dos questionamentos em relação à problemática encontrada com a organização do currículo nessa área é que a gente não consegue compreender, por isso não trabalha ou a gente trabalha e não sabe o que está trabalhando porque o que o está escrito ali não é entendido (Professora 1).

A constatação por parte da Professora 1 de que a redação do currículo em determinado componente curricular não leva em conta o sujeito, no caso, o sujeito professor em seu nível de desenvolvimento, de modo que ele compreenda os conteúdos a serem ensinados, possibilitou que a Professora 4 elaborasse um importante argumento: Olha que fantástico isso! O currículo tem que levar em consideração o sujeito que vai ensinar e o sujeito que vai aprender. Por isso tem que levar em consideração a didática e a concepção de desenvolvimento (Professora 4).

As manifestações acerca da pertinência do modo como o currículo está organizado revelam um movimento de generalização realizado pelas professoras que foi, de certa forma, inesperado, já que esse aspecto não foi objeto direto de discussão durante o experimento. Todavia, fica evidente que se trata de uma nova qualidade de pensamento provocado pela ascensão das abstrações dos elementos para a organização do ensino e a situação concreta e singular vivenciada por elas na elaboração do currículo. Situação que ganhou inteligibilidade com a mediação dos novos conceitos apropriados no grupo de estudo. Embora os processos de ensino e aprendizagem dos estudantes tenham sido o foco das discussões, as professoras reconheceram-se como sujeitos da aprendizagem e, nessa condição, apontaram a necessidade de serem levadas em consideração no momento de elaboração dos documentos educacionais. Fatos dessa natureza sinalizam que a busca de coerência teórico-metodológica dos documentos prescritos (currículo e PPP), importante para melhoria da qualidade de ensino é, também, um meio para colocar o professor em atividade de estudo e, desse modo, promover o seu desenvolvimento como profissional da educação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando se fala em currículo escolar, normalmente, se remete às propostas curriculares, ou seja, àquilo que é prescrito em documentos oficiais, mas, conforme definição de Sacristán (2000), há também o currículo em ação. E, como já afirmamos, não é incomum haver uma grande distância entre o currículo em ação e o currículo prescrito. Ou seja, um estado ou município pode ter uma proposta curricular bem elaborada, no entanto, a ação docente realizada nas escolas pode não corresponder àquilo que está definido nessa proposta, sendo guiada por outros pressupostos teóricos, inclusive contrários a ela. O mesmo ocorre com os Projetos Político Pedagógicos.

A exigência de se conter nesses documentos os princípios filosóficos e conceituais, componentes curriculares, encaminhamentos metodológicos e processos de avaliação visa, justamente, tecer as linhas que articulam a sociedade que almejamos, que é um projeto muito mais amplo, e a formação que vai ocorrendo no dia a dia da escola.

Portanto, as concepções teóricas e gerais sobre sociedade e educação devem estar em sintonia e materializar-se nos conteúdos, encaminhamentos metodológicos e avaliação que se fazem presentes na prática pedagógica. Obviamente o trabalho escolar não consegue ser assegurado na integralidade pelos ideais educacionais dos profissionais da educação, ele é resultado de múltiplas determinações que, muitas vezes, escapam do controle das pessoas que nele estão envolvidas.

No entanto, quanto mais claro o destino almejado e os caminhos para se chegar a ele, melhores são as possibilidades de não nos perdemos nas constantes encruzilhadas. Um dos meios para compartilhar, no coletivo escolar, o destino e os caminhos do trabalho escolar é a participação dos professores na elaboração do currículo e do PPP. Quando esses documentos são vistos como orientadores da prática pedagógica e, coerentemente, seus pressupostos teórico-metodológicos fazem parte dos conteúdos trabalhados na formação continuada, aos poucos, os professores passam a sentir a necessidade de maior explicitação acerca de uma organização do ensino fundamentada teoricamente. Assim, “[...] oscilando entre momento de reflexão teórica e ação prática e complementando-os simultaneamente, o professor vai se constituindo como profissional, por meio de seu trabalho docente, ou seja, da práxis pedagógica” (MORETTI, 2007, p. 101).

A busca pela coerência entre pressupostos teóricos expressos nos documentos curriculares e a prática pedagógica faz com que o professor permaneça em movimento de reflexão e análise dos aspectos teórico-práticos da atividade docente. Por essa razão, além de resultar em melhor qualidade de ensino, constitui-se, concomitantemente, em uma atividade promotora do desenvolvimento profissional.

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1Ver Deliberação n. 02/2018 - Normas para a Organização Escolar, o Projeto Político-pedagógico, o Regimento Escolar e o Período Letivo das instituições de educação básica que integram o Sistema Estadual de Ensino do Paraná (PARANÁ, 2018).

2Partimos da compreensão de Saviani ao afirmar que “[...] o currículo é o conjunto das atividades nucleares desenvolvidas pela escola.” (2016, p. 57). Nessa perspectiva, o autor explica que “pode-se considerar que o currículo em ato de uma escola não é outra coisa senão essa própria escola em pleno funcionamento, isto é, mobilizando todos os seus recursos, materiais e humanos, na direção do objetivo que é a razão de ser de sua existência: a educação das crianças e jovens” (SAVIANI, 2016, p.54).

3Documento que orienta o trabalho pedagógico na escola, o qual deve expressar o compromisso coletivo e intencional da comunidade escolar com o processo de formação dos estudantes, o Projeto Político Pedagógico escolar não pode estar vinculado a uma perspectiva pragmática e burocrática, mas deve “estar intimamente articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos da população majoritária” (VEIGA, 2002, p. 38).

4Em razão dos dados coletados durante a realização do curso serem utilizados para fins de pesquisa, o projeto foi submetido à avaliação do Comitê Permanente de Ética em Pesquisa com Seres Humanos - COPEP-UEM, via Plataforma Brasil, e aprovado em 22 de novembro de 2017(CAAE: 77680317.3.0000.0104).

5O materialismo histórico dialético refere-se às produções teóricas elaboradas por Marx em parceria com Engels, que tinham como problemática central o desvelamento “da gênese, da consolidação, do desenvolvimento e das condições de crise da sociedade burguesa, fundada no modo de produção capitalista, [...] tornando conscientes os seus fundamentos, os seus condicionamentos e os seus limites - ao mesmo tempo em que se faz a verificação dos conteúdos desse conhecimento a partir dos processos históricos reais, em contraposição a filosofia de Hegel, os economistas políticos ingleses (especialmente Smith e Ricardo) e os socialistas que o precederam (Owen, Fourier)” (NETTO, 2011, p. 17-18). Para tanto, os autores elaboraram premissas fundamentais para o desvelamento da realidade objetiva e para a realização do percurso metodológico utilizando as categorias totalidade, contradição e mediação.

6Teoria da ciência psicológica produzida por Vigotski, Leontiev e Luria, fundamentada no método materialista histórico dialético, com a finalidade de compreender o desenvolvimento do psiquismo do homem pelo processo de apropriação dos bens culturais produzidos historicamente pela humanidade, com base em alguns princípios educativos gerais: “a) a concepção de homem como sujeito histórico; b) a compreensão da formação social da consciência; c) a definição da educação como um processo de apropriação da experiência social da humanidade; d) a defesa do desenvolvimento do psiquismo como resultado da atividade prática humana, mediada pelos signos e instrumentos; e) o entendimento de que as funções psíquicas superiores são primeiro compartilhadas entre os sujeitos (interpsíquicas) e posteriormente internalizadas (intrapsíquicas); f) a defesa de que a apropriação dos conhecimentos é sempre uma atividade mediada por outras pessoas (colaboração dos mais experientes)” (NASCIMENTO, 2010, p. 102).

7Teoria pedagógica elaborada por Dermeval Saviani no final da década de 1970 que, fundamentada no materialismo histórico dialético, tem como pressuposto pensar a educação escolar como dimensão para o desenvolvimento humano e a superação da sociedade capitalista (SAVIANI, 2008).

8O experimento didático como metodologia de pesquisa está fundamentado no método de investigação criado por Vigotski e seus colaboradores, denominado de método genético experimental. Para o autor, este método era considerado o mais adequado para o estudo do desenvolvimento do psiquismo humano, pois possibilitava a compreensão dos processos psíquicos desde a sua origem e todo o seu complexo desenvolvimento posterior. No contexto das pesquisas que têm como base teórica a Teoria Histórico-Cultural, “O método do experimento formativo caracteriza-se pela intervenção ativa do pesquisador nos processos mentais que ele estuda. Neste sentido, ele difere substancialmente do experimento de verificação (constatação, comprovação) que somente enfoca o estado já formado e presente de uma formação mental. A realização do experimento formativo pressupõe a projeção e modelação do conteúdo das formações mentais novas a serem formadas, dos meios psicológicos e pedagógicos e das vias de sua formação” (DAVIDOV apudLIBÂNEO; FREITAS, 2013, p. 328).

9Para preservar o anonimato das professoras que participaram da pesquisa e citadas neste artigo, optou-se por denominá-las como Professora 1, Professora 2, Professora 3 e Professora 4.

10Atividade Orientadora de Ensino (AOE) constitui uma proposta de organização da atividade de ensino e de aprendizagem produzida pelo professor Manoel Oriosvaldo Moura (MOURA, 1996), fundamentada nos pressupostos da teoria histórico-cultural e se apresenta como uma possibilidade de realizar a atividade educativa tendo por base o conhecimento produzido sobre os processos humanos de construção de conhecimento.

Recebido: 09 de Agosto de 2021; Aceito: 03 de Novembro de 2022

<sandreanajp@hotmail.com>

<martasforni@uol.com.br>

Os autores declaram que não há conflito de interesse com o presente artigo.

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