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Perspectiva

versão impressa ISSN 0102-5473versão On-line ISSN 2175-795X

Perspectiva vol.36 no.3 Florianopolis jul./set 2018  Epub 30-Jul-2019

https://doi.org/10.5007/2175-795x.2018v36n3p1072 

Artigos

Colaborações entre professores e monitores do Programa Escola Integrada de Belo Horizonte

Collaboration between teachers and monitors of the Integrated School Program of Belo Horizonte

Colaboraciones entre profesores y monitores del Programa Escola Integrada de Belo Horizonte

1Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG

2Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG


Resumo

Este artigo apresenta a síntese dos resultados de pesquisa voltada para investigar as relações entre o trabalho desenvolvido pelos professores da escola regular e pelos profissionais que atuam no Programa Escola Integrada (PEI) na Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte (RMEBH), em Minas Gerais, Brasil. Buscou-se verificar como os professores e profissionais do PEI interagem, articulam e colaboram entre si para a realização de suas atividades. Observaram-se também quais tensões, problemas e dificuldades ocorrem ao longo da instauração do movimento de colaboração no trabalho. Para responder a essas questões, foi realizado um estudo qualitativo, tendo sido selecionadas três escolas para a pesquisa de campo. Os instrumentos de coleta de dados foram a pesquisa documental, a observação e a entrevista semiestruturada. Participaram, como sujeitos dessa investigação, os professores da escola regular, os profissionais do PEI, as diretoras das escolas e os coordenadores do Programa. Os resultados mostram as dificuldades organizacionais e as precárias condições de trabalho das escolas da RMEBH para a concretização de um trabalho conjunto entre os professores e profissionais do PEI, considerando principalmente: os dois turnos de realização da escola regular e os horários do Programa nos contraturnos escolares; a falta de regulamentação de horários comuns para o encontro dos sujeitos da pesquisa; as diferenças de formação, contrato, salário e jornada de trabalho. Obteve-se também como resultado a existência de uma colaboração confortável entre professores e profissionais do PEI, baseada em uma aproximação espontânea entre esses sujeitos para a realização de atividades pontuais de natureza mais imediata..

Palavras-chave:  Política Educacional; Educação Integral. Trabalho Colaborativo; Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte

Abstract

This article presents a synthesis of a research's results focused investigating the relationship established between the work of regular school teachers and professionals from the Integrated School Program (PEI) in the Education Network of Belo Horizonte (RME/BH). It was aimed to check how the teachers and professionals of PEI interact, articulate and collaborate to carry out their activities. It also observed which tensions, problems and difficulties occur along the establishment of collaboration at work. To answer these questions it was conducted a qualitative study, three schools were selected for field research. The data collection instruments were documental research, observation and semi-structured interview. Participated, as subjects of this research, the regular school teachers, PEI’s professionals, the school’s principals and coordinators of the program. The results show the organizational difficulties and the precarious working conditions of schools in RME/BH for the implementation of a joint work between the teachers and professionals from PEI, especially considering: both shifts of regular school and the schedules of PEI between school's shifts; the lack of regulation for common hours to get all the research subjects together; the differences in training, contract, wages and working hours. It was also obtained as a result the existence of a comfortable collaboration between teachers and PEI’s professionals, based on a spontaneous approach between these subjects to perform specific activities of more immediate nature.

Keywords:  Educational Policy; Integral Education; Collaborative Work; Municipal Education of Belo Horizonte

Resumen

Este artículo presenta la síntesis de los resultados de una investigación dedicada a indagar sobre las relaciones establecidas entre el trabajo desarrollado por los profesores de la escuela regular y el realizado por los profesionales que actúan en el Programa Escola Integrada (PEI) de la Red Municipal de Educación de Belo Horizonte (RME/BH) en Minas Gerais, Brasil. Se busca verificar de qué manera los profesores y profesionales del PEI inter-actúan, se articulan y colaboran entre ellos para la realización de sus actividades. Se observa también las tensiones, problemas y dificultades que ocurren durante la instauración del movimiento de colaboración en el trabajo. Para responder a esas cuestiones se realizó un estudio cualitativo, seleccionando tres escuelas para el trabajo de campo. Los instrumentos de recolecta de datos fueron la investigación documental, la observación y la entrevista semiestructurada. Participaron, como sujetos de esta investigación, los profesores de la escuela regular, los profesionales del PEI, las directoras de las escuelas y los coordinadores del Programa. Los resultados muestran las dificultades de organización y las precarias condiciones de trabajo de las escuelas de la RME/BH para la concreción de un trabajo conjunto de profesores y profesionales del PEI, considerando principalmente: los dos turnos de la escuela regular y los horarios del Programa en contraturnos; la falta de reglamentación de horarios comunes para el encuentro de los sujetos de la investigación; las diferencias de formación, contrato, salario y jornada de trabajo. Se obtuvo también como resultado la existencia de una colaboración confortable entre profesores y profesionales del PEI, basada en una aproximación espontánea entre estos sujetos para la realización de actividades puntuales de naturaleza más inmediata.

Palabras clave:  Educational Policy; Integral Education; Collaborative Work; Municipal Education of Belo Horizonte

Introdução1 1

Este artigo apresenta a síntese dos resultados de uma pesquisa cujo objeto focou as relações estabelecidas entre os professores da escola regular e os profissionais que atuam no Programa Escola Integrada (PEI), da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte (RMEBH), no exercício de suas atividades laborais.

De acordo com a Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte (SMED/BH), esse Programa foi organizado com o objetivo maior de promover a inclusão dos estudantes e, ao mesmo tempo, contribuir para a melhoria da qualidade da formação do aluno, ampliando a jornada escolar para contemplar novas necessidades formativas dos estudantes, segundo as dimensões afetivas, éticas, estéticas, sociais, culturais, políticas e cognitivas (COELHO, 2010).

O PEI começou a ser implantado em março de 2006, quando foi instituída a coordenação geral do Programa a cargo da SMED/BH, e passou a ser executado como programa-piloto em sete escolas municipais localizadas nas regiões consideradas as mais vulneráveis do município, no segundo semestre do mesmo ano.

A expansão desse Programa às demais escolas da Rede começou a ser realizada em 2007 e foi facilitada com a implantação do Programa Mais Educação (PME)2 proposto pelo Governo Federal, que instituiu diretrizes nacionais para a educação integral, além de disponibilizar suporte financeiro para os municípios e estados que aderissem a ele. Dessa forma, o Governo Federal buscou induzir, como política nacional, a expansão da jornada diária de permanência dos estudantes na escola.

O PME organizou 10 macrocampos em diferentes áreas do conhecimento3 e relacionou as temáticas e atividades possíveis de serem desenvolvidas nos Programas de Educação Integral. Dessa maneira, estabeleceu a perspectiva de território para direcionar programas de Educação Integral e a necessidade de se pensar o significado da construção de espaços educativos e a articulação das redes de proteção em tempo integral para crianças e adolescentes (MACEDO, 2012).

Com a chegada do PME, as escolas municipais de Belo Horizonte puderam fazer a sua adesão a esse Programa, passando a receber recursos financeiros do Governo Federal para o incremento de atividades que dependiam da aquisição de recursos materiais, como insumos pedagógicos, esportivos, artísticos, instrumentos musicais, equipamentos e outros, necessários ao funcionamento das oficinas desenvolvidas. Em 2014, o PEI já estava implantado em 173 escolas municipais de Belo Horizonte, abrangendo 53% dos estudantes da RMEBH (BELO HORIZONTE, 2014).

O PEI provocou a reorganização dos tempos e espaços das escolas municipais de Belo Horizonte e a entrada de outros saberes nessas instituições, considerando a incorporação de novos profissionais4 para o desenvolvimento das oficinas previstas no Programa. Todos esses elementos em conjunto trouxeram desafios para a equipe gestora, professores, monitores, estudantes. Entre esses desafios encontra-se o aspecto relativo à interação entre os docentes e os monitores nas atividades realizadas no decorrer do trabalho de ambas as categorias.

Nesse sentido, esta investigação se propôs a responder as seguintes questões: os docentes e monitores do PEI se articulam e colaboram entre si para realizar suas atividades cotidianas e propor atividades conjuntas? Como isso acontece? Quais tensões, problemas e dificuldades ocorrem ao longo desse processo? Como esses percalços são enfrentados? Que resultados são obtidos?

Para responder a essas questões, foi feito um estudo qualitativo, tendo sido definidas três escolas municipais de Ensino Fundamental para a pesquisa de campo, realizada no decorrer de 2014. Essas escolas foram selecionadas entre as sete que implantaram o programa-piloto de Educação Integral em 2006 e que, portanto, haviam passado por todos os processos de mudanças ocorridos no Programa até o ano da pesquisa de campo (2014). Os instrumentos de coleta de dados foram a pesquisa documental, a observação e a entrevista semiestruturada.

Os sujeitos que concederam as entrevistas5 foram: três diretoras, três professores coordenadores, nove professores e nove monitores, em cada escola selecionada. Ao todo, foram realizadas 24 entrevistas semiestruturadas. Neste trabalho, estes sujeitos serão citados obedecendo a codificação mostrada no Quadro 1.

Quadro 1 Sujeitos participantes da pesquisa 

Cargos Escola 1 Escola 2 Escola 3
Diretor(a) D1 D2 D3
Professor(a) Coordenador(a) PEI PC1 PC2 PC3
Professor(a) Escola Regular P1.1, P1.2, P1.3 P2.1, P2.2, P2.3 P3.1, P3.2, P3.3
Monitor(a) M1.1, M1.2, M1.3 M2.1, M2.2M2.3 M3.1, M3.2, M3.3

Os dados coletados (acervo documental, notas de campo, transcrição das entrevistas) foram analisados por meio da técnica de análise de conteúdo. O referencial6 foi construído com base no estudo das políticas de Educação Integral no Brasil e em outros países; dos novos processos de divisão de trabalho na escola; dos procedimentos de colaboração entre os professores e os novos profissionais da escola.

O presente artigo está organizado nesta introdução e mais três seções. Na primeira seção, buscou-se apresentar os novos profissionais e a nova divisão do trabalho na Escola Básica, bem como os principais conceitos relativos à colaboração entre sujeitos nas unidades escolares. Na segunda, discutiu-se a organização escolar e do trabalho a partir das mudanças promovidas nas escolas pelo PEI. Na terceira, buscou-se apresentar e analisar as colaborações possíveis de serem realizadas entre docentes e monitores, as dificuldades e resistências, bem como as proposições de trabalho conjunto, de acordo com os sujeitos entrevistados para esta pesquisa.

Novos profissionais e nova divisão do trabalho nas escolas

Esta seção apresenta o debate acadêmico realizado no Brasil e em outros países sobre profissionais que têm adentrado os muros das escolas, com formações diversas e que cumprem papéis diferenciados. A segunda parte desta seção trabalha os principais conceitos que dão o suporte teórico para a análise dos dados empíricos.

Em estudos realizados no Canadá, Le Vasseur e Tardif (2004) analisam a introdução no espaço escolar de novos profissionais trabalhando em torno dos docentes e se encarregando de diferentes dimensões da educação dos alunos. Esses autores identificaram novos cargos no interior da escola, denominados ajudantes instrucionais, ajudantes educacionais e assistentes de educação. Tais cargos são ocupados por profissionais que desenvolvem atividades que os professores, regentes de classe, não conseguem mais assumir, como o acompanhamento de estudantes com problemas de comportamento, com dificuldade de aprendizagem, que apresentam indisciplina escolar e que sofrem violência na escola (LE VASSEUR; TARDIF, 2004).

Para esses autores, assiste-se, assim, a um processo de divisão de trabalho nas escolas, no qual a atividade realizada pelo conjunto dos novos agentes escolares se torna muito específica, subdividindo-se em tarefas particulares, consideradas de apoio ao trabalho do professor. Esses autores estudam especificamente o caso do Quebec, onde se registram distintos níveis de formação desses agentes, mas eles informam ser também a realidade de escolas americanas e inglesas, já estudadas por eles.

De acordo com Le Vasseur e Tardif, no Quebec os professores, bem como os especialistas (psicólogos, pedagogos, fonoaudiólogos) que atuam nas escolas têm uma formação universitária especializada. Além disso, os chamados técnicos têm uma formação de ensino secundário e os paratécnicos, uma formação de nível ainda inferior a essa última. Esses técnicos e paratécnicos, geralmente, são estudantes que recebem uma bolsa de estudos (LE VASSEUR; TARDIF, 2004).

A conclusão a que Le Vasseur e Tardif (2009) chegam é que há uma nova divisão do trabalho escolar no plano das funções assumidas pelos diversos agentes escolares, como também essa divisão se assenta em uma diferenciação nos estatutos desses profissionais. Eles vão observar que, na experiência no Quebec, esses agentes têm acompanhado um número cada vez maior de estudantes e ocorre uma diminuição da contratação de professores regulares, o que na opinião desses autores dá lugar a uma desqualificação do trabalho escolar, escondendo implicações sociais importantes no próprio seio da escola (LE VASSEUR e TARDIF, 2009).

O movimento de novos profissionais nas escolas foi encontrado também em experiências de países europeus como Alemanha, Espanha, Finlândia e Portugal, considerando a jornada integral nas escolas públicas. Esses profissionais costumam ser integrantes de associações de pais; membros de organizações públicas e privadas que atuam com temas da juventude e da criança; estagiários de universidades; e os próprios docentes da escola (neste caso, trata-se de trabalho voluntário exercido fora da jornada remunerada). As atividades desenvolvidas por esses profissionais estão relacionadas à cultura, arte, lazer e apoio familiar.

Nos países da América Latina, como Chile, Uruguai, Argentina e Venezuela, têm ocorrido distintos programas de ampliação da jornada escolar que mantêm traços comuns. Em todos esses países, a implementação de programas desse tipo vem acompanhada do discurso de melhoramento da qualidade educativa e maior equidade social. Verifica-se também, em todos esses países, a extensão do horário escolar, acarretando novas exigências sobre o trabalho docente e novos sujeitos para as escolas.

Pode-se destacar, no Chile, a presença nesses programas de docentes da própria escola, professores de apoio, professores de matérias especiais, como línguas estrangeiras, tecnologias da informação e conhecimento (TIC), artes e esportes, monitores de projetos de ciências, jornalismo escolar, agricultura e outros. No Uruguai, encontramos os docentes das escolas, professores especializados, professores de apoio fixos e itinerantes, professores oficineiros e auxiliares, como o monitor educativo. Na Venezuela, é possível encontrar o professor integral, o assistente ou auxiliar de educação inicial. Na Argentina, encontramos docentes das escolas, professores de apoio, professor bibliotecário, professor de matérias especiais, professores coordenadores de oficinas, estagiários e oficineiros contratados de acordo com os projetos e oficinas (FANFANI; MEO; GUNTURIZ, 2010).

No Brasil, a pesquisa “O trabalho docente na Educação Básica no Brasil”7 (GESTRADO, 2010) confirma a existência de uma nova divisão técnica do trabalho nas escolas públicas. Segundo essa pesquisa, a emergência de novos postos, cargos e funções foi derivada de exigências postas às escolas advindas das propostas de democratização da educação, universalização do acesso e o direito a uma educação de qualidade, contidas na Constituição Federal de 1988 (CF/1988) e regulamentadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/1996), entre outras regulamentações. Essa pesquisa vai mostrar ainda que o fortalecimento das políticas de educação integral pelo Governo Federal, estados e municípios, vai impulsionar a contratação de novos profissionais para atuar nas escolas públicas.

Pode-se afirmar que, na Educação Básica brasileira, as experiências que mais se aproximam às analisadas por Le Vasseur e Tardif no Quebec são as de contratação de pessoal para auxiliar os docentes no acompanhamento dos estudantes que apresentam alguma deficiência física ou mental, ou que precisam de reforço escolar ou de acompanhamento para a realização do dever de casa. Essa contratação ocorre por meio de bolsas para estudantes universitários e/ou de pessoas que possuem Ensino Médio completo (SANTOS; OLIVEIRA, 2009).

A ampliação das funções escolares no Brasil, na opinião de Cavaliere (2002), vem ocorrendo de forma a cumprir um papel sociointegrador, por urgente imposição da realidade e não por uma escolha político e educacional deliberada. Nessa perspectiva, a autora afirma que a institucionalização desse fenômeno pelos sistemas educacionais, que já despontava nas políticas públicas, envolvia concepções e decisões políticas, tanto podendo desenvolver aspectos inovadores e transformadores embutidos em uma prática escolar rica e multidimensional, como podendo ser exacerbados os aspectos reguladores e conservadores, inerentes às instituições em geral.

De acordo com Cavaliere (2002), é necessário avançar em direção aos aspectos inovadores, pois diante da ampliação das tarefas escolares, as necessidades sociointegradoras têm assumido uma posição primordial no cotidiano escolar (CAVALIERE, 2002). Ambas as situações têm ganhado força no Brasil com a implantação, na década de 2000, dos programas de educação integral.

Para Nóvoa (2009), a escola amplia as suas funções a partir do século XX, perdendo um pouco o foco do que é referência ou prioridade no seu trabalho e abarcando outros projetos sociais em seu interior. Para esse autor, o conceito de Educação Integral é aquele que melhor simboliza esse movimento e as suas ambições, pois prega que a escola deveria encarregar-se da formação humana dos estudantes, em todas as dimensões da sua vida. No entanto, ele considera um objetivo quase impossível que se acreditou que a escola cumpriria.

No Brasil, pode-se dizer que a entrada mais expressiva de profissionais que não têm a formação em licenciatura, nas escolas públicas (como os agentes culturais, oficineiros, estagiários, monitores, entre outras nomenclaturas), se deu em maior volume com a implantação dos programas de Educação Integral. Muitos deles foram organizados por meio de oficinas contemplando atividades artísticas, culturais, esportivas, multimídias (cinema, fotografia, rádio, vídeo, informática, internet), para serem executadas por profissionais que possuem outras formações, saberes e experiências advindas de suas práticas e que têm reconhecimento em suas comunidades.

No entender de Santos (2012), os programas de educação integral vão colocar outros elementos para o debate da educação, considerando principalmente dois aspectos: o primeiro se refere à entrada de profissionais sem a formação em licenciatura, exigida historicamente, para exercer uma função pedagógica no interior das escolas. Para essa autora, mesmo os professores que possuem formação adequada têm dificuldades no enfrentamento das salas de aula, do ensino e da complexidade da dinâmica da escola pública. O segundo elemento reforça o que foi ressaltado por Nóvoa acima, ou seja, a justificativa da criação desses programas vinculada ao enfrentamento das desigualdades sociais, ou seja, colocar essa questão como responsabilidade da escola pública.

De acordo com as análises realizadas por Nóvoa (2009), pode-se acrescentar um terceiro aspecto a este debate, ou seja, à questão da formação dos docentes. Para esse autor, ao alargarmos o espaço da escola pública para incluirmos um conjunto de outros parceiros, estamos inevitavelmente tornando ainda mais complexa a formação dos professores, pois esta passa a ter que dar conta não apenas da relação pedagógica que se estabelece nas escolas, como também da relação social com as comunidades locais (NÓVOA, 2009).

Pode-se dizer que quando a escola se abre para receber novos profissionais e provoca outra divisão do trabalho, instala-se também no seu interior um campo de disputas que podem se refletir em processos de cooperações, conflitos, resistências e tensões que acabam por se expressar nas relações que se estabelecem entre os professores e esses novos profissionais. Daí a importância de se estudar como essas questões estão ocorrendo no interior das escolas públicas.

Em estudo bibliográfico realizado para esta pesquisa, verificaram-se menções sobre a difícil relação/articulação entre os professores da escola regular e os profissionais que atuam no horário estendido, conforme se mostrará a seguir. No entanto, o foco dessas pesquisas não estava em investigar especificamente esses aspectos.

A dissertação de Coelho (2011), por exemplo, já assinalava a ausência de diálogo entre os profissionais da escola regular e aqueles que trabalham na jornada ampliada. Em artigo de Maurício (2012), está demarcado o importante papel desenvolvido pelo professor comunitário ou coordenador local (aquele se encontra no espaço escolar) como um mediador entre docentes e monitores. Esse trabalho assinala também a falta de coesão entre a proposição da jornada integral nos programas/projetos de Educação Integral e a jornada do professor da Educação Básica muito variada nas redes públicas e em poucas experiências com a duração de 40 horas.

A investigação realizada por Silva (2013), que também possuiu como campo de pesquisa a RMEBH, mostra que a diferença de formação, o estranhamento dos docentes em relação ao PEI e a falta de proximidade entre os professores da escola regular e os monitores têm marcado o distanciamento das relações entre esses profissionais. Essa autora destaca a segmentação entre o que ocorre no turno considerado regular e no contraturno escolar quando são desenvolvidas as atividades do PEI. Segundo ela, há uma separação nítida, no interior da escola, entre aqueles que ministram o currículo regular e os monitores que ministram as oficinas. Silva (2013) registra ainda que os profissionais do PEI relatam que suas relações com os professores da escola regular têm sido marcadas pela separação, rejeição e discriminação.

Cabe destacar ainda na revisão de literatura efetuada a dissertação de Boy (2011), que estudou o trabalho coletivo entre professores da escola regular no Ensino Fundamental na RMEBH8. A autora concluiu que o que ocorre no interior das escolas se aproxima mais do trabalho colaborativo, ou seja, estratégias e arranjos construídos pelos próprios professores, e às vezes pela direção escolar, por meio da utilização de momentos informais, buscando favorecer momentos de encontro entre os professores, discussão sobre o desenvolvimento do trabalho, troca de experiências (BOY, 2011). Essa autora verificou que os professores entrevistados “consideraram que os tempos e espaços destinados ao trabalho coletivo, na forma como estão configurados atualmente nessa Rede, são insuficientes para o desenvolvimento do que na visão deles seria trabalhar em conjunto” (BOY, 2011, p. 241).

Os achados da revisão de literatura efetuada reforçaram a necessidade de se trabalhar nesta pesquisa com conceitos que dessem conta também das relações/interações/colaborações entre os professores da escola regular e os profissionais do PEI, proposto no objeto de estudo. Para isso, serão apresentados, a seguir, as concepções de trabalho colaborativo e seus desdobramentos desenvolvidos por Hargreaves (1998), Tardif e Lessard (2005), Borges (2006, 2010) e Boy (2011).

Para os autores acima citados, existem muitas formas de exercer o trabalho colaborativo, pautadas pelos objetivos dos sujeitos envolvidos, pelas relações estabelecidas entre eles e pelas condições de trabalho existentes. Nesse sentido, "o trabalho colaborativo deve ser pensado em suas diferentes possibilidades de configuração e dos fatores que levam a este ou aquele desenho" (BOY; DUARTE, 2014, p. 85).

Para Tardif e Lessard (2005), a pluralidade de conceitos sobre o trabalho colaborativo ocorre devido ao contexto escolar, em que as relações se apresentam tanto codificadas quanto pautadas por amizades, conflitos pessoais, colaborações pontuais e intercâmbios imprevistos. Apoiando-nos nesses autores, o trabalho colaborativo foi compreendido para esta pesquisa a partir da noção de atividades realizadas em comum, compreendendo as práticas interativas entre um ou mais docentes do ensino regular com qualquer outro profissional (estagiário, oficineiro, monitor) que atua no PEI.

No trabalho colaborativo ideal os sujeitos de um mesmo grupo operam em conjunto, apoiando-se uns nos outros, pois pretendem atingir os mesmos objetivos, elencados coletivamente: “assim, eles estabelecem relações que tendem à não hierarquização, liderança compartilhada, confiança mútua e corresponsabilidade pela condução das ações” (BOY; DUARTE, 2014, p. 86).

Outra possibilidade de configuração do trabalho colaborativo, agora segundo Borges (2010), é a cooperação inserida nas formas de trabalho partilhado e entendida pela interdependência decorrente da partilha de um espaço e de tempos de trabalho, assim como de recursos comuns. Isso implica, sobretudo, a comunicação, a tomada de decisão, assim como um objetivo comum partilhado pelos agentes escolares (BORGES, 2010).

A colaboração, para Hargreaves (1998) e Fullan e Hargreaves (2001), ocorre a partir do que eles chamam de culturas colaborativas, entendidas como o ensino em equipe, a tomada de decisões de forma compartilhada e a responsabilidade coletiva como princípio articulador das ações e do planejamento. Para esses autores, as culturas colaborativas constituem-se nas relações entre os professores por meio da ajuda, do apoio, da confiança e da abertura, valorizando os indivíduos como pessoas e os grupos a que pertencem (HARGREAVES, 1998; FULLAN; HARGREAVES, 2001).

No contexto escolar, para se ter uma cultura de colaboração entre os professores, são necessários o engajamento, a discussão e a avaliação coletiva, além de se garantir tempos e espaços de trabalho coletivo (FULLAN; HARGREAVES, 2001). Nessa perspectiva, a existência de uma cultura colaborativa "se refere a um grau mais elevado do processo de colaboração" entre professores na prática escolar. Considerando as experiências escolares, Fullan e Hargreaves (2001) classificam a colaboração que tem sido desenvolvida em quatro tipos: balcanização, colegialidade artificial, colaboração confortável e trabalho em conjunto, abaixo explicitadas.

A balcanização é um tipo de colaboração que divide, ou seja, os professores são separados em subgrupos menores, organizados por trabalhar de maneira mais próxima. Ou seja, esse tipo de colaboração, facilmente encontrada em escolas de Ensino Médio e Fundamental, organiza subgrupos de professores que ministram a mesma disciplina, ou pertencem a um mesmo ciclo, ou ao mesmo ano (FULLAN; HARGREAVES, 2001). Esses autores observaram em suas pesquisas que a balcanização inibe a discussão aberta, bem como pode prejudicar a discussão aberta e a criação de uma perspectiva da escola em sua totalidade, impedindo o crescimento profissional contínuo dos professores e a sua capacidade de resposta diante das mudanças educacionais (FULLAN; HARGREAVES, 2001).

A colegialidade artificial está presente nas relações profissionais que se referem a práticas formais, burocráticas e obrigatórias de trabalho em conjunto, regulamentadas pela administração e fixas no tempo e no espaço. Normalmente, trata-se de atividades de planejamento, reuniões programadas formalmente e projetos de formação propostos por órgãos externos. Mesmo com essas características, Fullan e Hargreaves (2001) consideram que a colegialidade artificial pode ser um passo inicial para a instauração de uma cultura colaborativa na escola, quando for utilizada de forma facilitadora e não controladora dos professores (FULLAN; HARGREAVES, 2001).

A colaboração confortável é circunscrita aos aspectos práticos, imediatos e de curto prazo que envolvem o trabalho docente, como a troca de conselhos e dicas e a partilha de materiais. Esse tipo de colaboração não atinge a privacidade da sala de aula e evita as discussões e os desacordos relativos aos princípios e às práticas de ensino. Nesse sentido, também não leva a uma reflexão sobre os valores, os objetivos e as consequências do que fazem (FULLAN; HARGREAVES, 2001).

O trabalho em conjunto é orientado por um objetivo comum, envolvendo o empenho, a negociação, a responsabilidade partilhada, o aperfeiçoamento coletivo, além da disponibilidade de revisão e crítica do que foi realizado. Nesse sentido, é uma forma de colaboração que cria interdependência mais forte entre os docentes (HARGREAVES, 1998).

As formas de colaboração apresentadas principalmente por Hargreaves (1998) e Fullan e Hargreaves (2001) foram utilizadas na análise dos processos de colaboração/interação entre os professores da escola regular e os profissionais do PEI, realizada na última seção deste artigo.

As mudanças na organização do trabalho escolar e na organização escolar frente à implantação do PEI

Esta seção contempla as concepções de organização do trabalho escolar e organização escolar e descreve como a implantação do PEI provocou mudanças nas unidades municipais de ensino pesquisadas, apoiando-se em depoimentos dos entrevistados relativos aos espaços, tempos, condições de trabalho e formação dos monitores. Traz, enfim, uma síntese dos processos que envolveram a criação e implantação da escola integral nesta rede, o que pode ajudar a explicar porque ocorrem ou não processos de interação/colaboração entre docentes e monitores.

De acordo com Oliveira (2002), há uma distinção entre o conceito de organização do trabalho escolar e organização escolar, embora sejam interdependentes. Essa autora defende que “a organização do trabalho escolar é um conceito econômico, refere-se à divisão do trabalho na escola” (OLIVEIRA, 2002, p. 131), ou seja, trata-se de colocar o foco em como o trabalho do professor e dos demais trabalhadores é organizado na instituição escolar, visando atingir os objetivos da escola ou do sistema a que pertence. Nesse sentido, Oliveira (2002) considera que a organização do trabalho escolar se refere à forma como “as atividades estão discriminadas, como os tempos estão divididos, a distribuição das tarefas e competências, as relações de hierarquia que refletem relações de poder, entre outras características” (OLIVEIRA, 2002, p. 131). É importante destacar também que a organização do trabalho escolar, para essa autora, reflete a maneira como ele é organizado na sociedade, embora apresente as especificidades de ser desenvolvido em estabelecimentos que são públicos.

O termo organização escolar refere-se às condições objetivas sob as quais o ensino está estruturado. Nessa perspectiva, Oliveira (2002) entende que abarca as “competências administrativas de cada órgão do poder público ao currículo que se pratica em sala de aula, passando pelas metodologias de ensino e processos de avaliação adotados, tudo seria matéria da organização escolar” (OLIVEIRA, 2002, p. 132).

As escolas municipais de Belo Horizonte, conforme mencionado anteriormente, funcionam em dois turnos para o ensino regular, e o PEI foi implantado para ser desenvolvido no contraturno escolar. A falta de espaço interno das escolas para realizar a ampliação do tempo necessário ao desenvolvimento desse Programa, bem como a questão dos tempos da escola regular e das atividades da Integrada apareceram como problemáticos nos depoimentos dos entrevistados nas três escolas pesquisadas.

No período de implantação do PEI (2006), ainda na fase piloto, os espaços ocupados pelo Programa nas escolas pesquisadas estavam localizados somente em seu interior, bem como havia muitas reclamações e queixas dos professores da escola regular e também dos monitores quanto à ocupação e compartilhamento desses espaços.

Os professores assustaram quando a Integrada começou, assustaram mesmo: uma turma de meninos, um grupo de monitores, (...) no começo, fazendo um barulho, uma confusão, um batuque, uma algazarra, nos espaços que eles consideravam deles, que, às vezes, a gente usava a quadra deles, ficava num canto na escola, porque não tinha lugar, entendeu? E aí atrapalhava a aula, criava aquele sentimento ruim... (M3.2)

O depoimento acima mostra que o PEI foi implantado sem infraestrutura adequada, ou seja, sem a escola ter sido reformada para a realização de suas atividades. Os monitores utilizavam os espaços já existentes nas escolas (quadra, refeitório, auditório, sala de informática, sala de vídeo, biblioteca) quando não estavam sendo ocupados pelos docentes.

Era muito difícil estar aqui dentro porque a gente não tinha espaço nenhum (...). Então, a gente tinha que dividir os espaços com os professores. Eles entendiam que a gente tomava os espaços deles, sendo que o aluno é o mesmo. Tanto que chegou um dia e uma professora falou assim: a Escola Integrada toma os nossos espaços todos. (PC1)

Os depoimentos acima, do monitor da escola 3 e do professor coordenador da escola 1, deixam transparecer, na visão desses entrevistados, haver por parte dos docentes um sentimento de pertencimento em relação aos espaços internos das escolas e daí a dificuldade de compartilhá-los para as atividades do PEI.

O monitor da escola 3 relata também o incômodo dos professores com o ruído produzido pelas atividades, realizadas no contraturno, considerando que elas estavam sendo desenvolvidas no mesmo tempo das aulas do turno regular. Para os professores, a algazarra e o barulho intenso interferiam nas aulas e no processo de aprendizagem dos estudantes.

Essa insatisfação com os espaços dispensados ao Programa aparecia também entre os monitores, que se queixavam da improvisação feita para acolher o Programa, conforme depoimento abaixo.

E uma outra questão que a gente cobra bastante também é o problema do espaço, (...) tem monitores aqui que o espaço não é bom. (...) Temos a nossa colega do esporte, que dá aula e a quadra dela é descoberta, ela trabalha o dia todo no sol. Quando chove, ela fica sem lugar para dar aula. (M3.3)

A falta de espaço interno nas escolas pesquisadas levou as equipes gestoras das escolas a buscar, em seu entorno, outros locais para instalar principalmente as oficinas realizadas pelo PEI. Nas três escolas pesquisadas, buscaram-se locais próximos à unidade escolar (casas, igrejas, quadras públicas), que em alguns casos eram cedidos, outros alugados ou públicos, conforme sistematiza o Quadro 2.

Quadro 2 – Espaços internos e espaços externos utilizados pelo PEI nas escolas pesquisadas 

ESCOLA 1 ESCOLA 2 ESCOLA 3
Espaços internos Espaços externos Espaços internos Espaços externos Espaços internos Espaços externos
Refeitório Casa alugada Refeitório Casa alugada 1: salas Refeitório Casa alugada: salas
Quadra Complexo Esportivo da Comunidade Quadra e pátio Casa alugada 2: salas e cozinha Quadra Salas da Igreja
Auditório Auditório Salão da Igreja Auditório Ginásio da Igreja
Sala de Informática Sala de Informática Horta da Igreja Sala de Informáti-ca Sala de Informáti-ca
Salas de aula não ocupadas pela escola e Laboratório de Ciências Salas de aula não ocupadas pela escola e Laboratório de Ciências Pátio da Igreja Banheiros
Banheiros/ Vestiário Biblioteca
Banheiros/Vestiário

Fonte: Elaboração própria.

No entanto, o aluguel de espaços resolve de forma precária o problema, pois ao mesmo tempo em que as oficinas passam a ter um local específico para ocorrerem, trata-se de lugares adaptados, improvisados, pequenos, que nem sempre respondem às necessidades do trabalho que está sendo desenvolvido e nem comportam o número de estudantes que frequentam essas oficinas.

Eu acho que a Prefeitura deveria proporcionar espaços de qualidade para essas crianças terem oficinas. (...) As casas foram feitas para receber residências, então, o espaço é adaptado, não tem condição, não tem sala, não tem quarto, não tem nada, que caiba 25 crianças. Eu acho que isso tem que ser repensado. Eu acho o seguinte: a criança tem que usar os espaços da comunidade sim, quando tem espaço, (...) Eu acho que isso é falho, a Prefeitura tem que evoluir, nem que seja para desapropriar uma área e fazer um espaço público. (PC1)

Em relação aos tempos, verificou-se o problema da desconexão entre os horários e as atividades da escola regular e do PEI, estruturados em turno e contraturno, o que vem dificultando o encontro e a aproximação dos docentes com os monitores e vice-versa.

Os turnos manhã e tarde na escola regular estão organizados das sete às 11:20 e das 13 às 17:20 horas, e do PEI das oito às 17 horas. Os docentes são contratados para uma jornada semanal de 22 horas e 30 minutos; já os monitores têm contratos de 30, 40 e 44 horas semanais. Porém, cada categoria está em tempos e espaços diferentes na relação com os estudantes.

(...) No dia a dia, o que acontece: às sete horas os professores estão em sala de aula com os alunos da regular; os monitores chegam às oito horas e pegam os meninos e vão lá para o espaço deles. Eles não ficam aqui (na escola), eles vêm só para o horário de almoço. Então, neste horário, nesse intervalo é que alguns monitores vêm pra escola e eles ficam por pouco tempo. (Diretora 3)

Não estão previstos formalmente horários de reuniões entre professores e monitores, planejamentos conjuntos, nem mesmo facilitados os encontros nos espaços informais, como a sala de café, onde usualmente os professores conversam, trocam experiências, enfim se relacionam.

(...) Sabe, porque na verdade o lanche dos professores é às 15 horas, até às 15h20, quando os professores saem, é que vão as outras pessoas, sabe? Aí que vão os monitores. É chato isso? É, mas isso faz parte da organização da escola. Então, nesse momento de tomar um cafezinho, o que é muito legal, né, esse horário do café é ótimo, pra gente confraternizar, nem isso a gente tem. Eles (monitores) saem com a turma depois do almoço e depois eles já voltam no final (...). Então, a gente não se encontra hora nenhuma. (P1.1)

O descompasso entre os tempos da escola regular e do PEI com os horários das famílias também foram mencionados como um problema. Alguns alunos do PEI chegam bem antes das 8 horas, horário de início de suas atividades. Isso ocorre porque o horário de trabalho dos pais ou responsáveis não é compatível com o do PEI e/ou porque aquela família possui mais de uma criança na escola em horários distintos e não consegue levá-las separadamente. Como os monitores ainda não estão nas escolas às sete horas, quando inicia a aula da escola regular, as crianças que chegam mais cedo ficam sob os cuidados do porteiro e/ou das faxineiras, que não têm essa obrigação.

Quando eu cheguei aqui na escola (2013), os meninos chegavam às seis horas da manhã, as mães colocavam todos aqui dentro, (...), os meninos ficavam aqui só com o porteiro, não tinha ninguém mais cuidando deles. (...) Eu tive uma reunião com os pais, para que eles deixassem às oito horas. Diminuiu muito, mas ainda tem alguns que chegam aqui às sete horas, porque o irmão estuda na regular, então, a mãe traz o irmão e ele fica sentadinho esperando a hora da Integrada. É difícil porque esse é um problema social, de políticas públicas, porque a mãe sai para trabalhar, o pai também, eles não têm com quem deixar os filhos. (...) Eu entendo isso, mas a dificuldade nossa é não ter a pessoa para cuidar deles, a gente não dispõe de funcionário para ficar ali tomando conta deles e cuidando. (...). (Diretora 3)

As oficinas organizadas nas escolas pesquisadas, em 2014, foram sistematizadas no Quadro 3. Destaca-se, segundo depoimentos dos entrevistados, que essas oficinas foram criadas de acordo com a capacidade e a possibilidade dos espaços cedidos, alugados ou públicos; com as demandas da RMEBH, dos monitores, dos professores, dos estudantes, além da existência, em cada escola, de monitores com habilidades para ministrá-las.

Quadro 3 – Oficinas realizadas pelo PEI nas escolas pesquisadas 

ESCOLA 1 ESCOLA 2 ESCOLA 3
1 Jiu-Jitsu (M) (EE) Cursinho (M) (EI) Esportes e Jogos (M/T) (EE/EI)
2 Música – flauta (M) (EE) Rádio (M) (EI) Informática (M/T) (EE)
3 Jogos e brincadeiras (M/T) (EE/EI) Horta e jardim (M) (EE/EI) Artes (M/T) (EE)
4 Cineclube (M/T) (EI) Artes (M/T) (EE/EI) Capoeira (M/T) (EE)
5 Informática (M/T) (EI) Informática (M/T) (EI) Dança de salão (M/T) (EE)
6 Esporte (M/T) (EE/EI) Taekwondo (M/T) (EE) Percussão (M/T) (EE)
7 Percussão (T) (EE) Música – flauta e violão (M/T) (EE/EI) Para casa (M/T) (EE)
8 Fotografia (T) (EE/EI) Esporte (M/T) (EE/EI)
9 Para casa9 (M/T) (EE/EI)
10 Jogos e brincadeiras (T) (EE/EI)

Fonte: Elaboração própria. Legenda: M – manhã; T – tarde; EE – espaço externo; EI – espaço interno.

Todas as oficinas listadas no Quadro 3 são convergentes com as propostas contidas nos dez macrocampos do PME e na Matriz Curricular do PEI/SMED, que buscam incentivar a ampliação do cenário educativo e as oportunidades formativas oferecidas pelas escolas. Entre as atividades dos monitores, encontram-se também as aulas-passeios – atividades de cultura, lazer e recreação que buscam ocupar os espaços existentes na cidade e no entorno da escola, realizadas em museus, cidades históricas, grutas, cinemas, teatros, clubes, parques, quadras, praças, entre outros.

Nas escolas pesquisadas, os monitores possuem horário específico para planejamento das suas oficinas. No turno da manhã, os monitores contam com pelo menos uma hora da sua jornada para essa atividade, que pode ser feita individualmente ou com o apoio do coordenador do PEI. Esse tempo de planejamento também ocorre no horário da tarde, diariamente, de 16h20 às 17 horas, quando os monitores já terminaram suas atividades com os estudantes e aguardam o final da jornada. Nesse intervalo, eles costumam planejar as suas oficinas ou reunir-se com a coordenação do PEI ou mesmo descansar.

Os docentes também possuem horário de planejamento em sua jornada semanal. No entanto, nunca foi previsto algum momento de planejamento conjunto com os monitores, aproveitando os horários de planejamento de ambos, o que poderia ser um incentivo à troca de ideias, experiências, afinidades, estimulando a realização de atividades conjuntas. Os professores alegam que

Existe uma questão estrutural, da organização da escola. Coloca-se tanto que a gente (professores) tem uma hora de projeto, mas a gente tem tanta coisa para fazer nesta uma hora que a gente acaba tão envolvida com o conteúdo a ser trabalhado, com as questões próprias da escola regular, que a gente acaba deixando essa integração de lado (...). (P3.2)

Tanto os docentes como os monitores apresentam a mesma queixa sobre o horário de planejamento, dizendo que ele tem ficado prejudicado, pois eles precisam cobrir a falta ou o atraso de colegas. De acordo com os monitores,

A questão dos atrasos, das faltas, dos atestados é um problema porque interfere no planejamento (...). Aí o monitor que está de projeto, de planejamento, perde esse projeto, esse planejamento, para cobrir aquele monitor que faltou. Então, isso causava um desconforto. Então, nessa equipe aqui, o problema que a gente tem é esse. (M3.3)

Os monitores alegam também que às vezes é a própria demanda de trabalho que exige a reorganização das turmas10 ou a participação deles em outras atividades de apoio à coordenação do Programa ou aos próprios estudantes, sacrificando o horário de planejamento.

As condições de trabalho11 dos monitores que atuam no PEI aparecem ainda em outros problemas enfrentados nas unidades escolares, como o processo de contratação que se deu no início do Programa, para uma jornada de 40 horas, por meio da Associação Mineira de Assistência Social (AMAS) e, posteriormente, passou a ser realizado via Caixa Escolar para jornadas de 30 e 44 horas (incluindo os sábados). Os contratos e as jornadas diferenciados promovem, consequentemente, salários distintos entre os monitores, desconforto, desistência e dificuldade de reposição do quadro.

(...) Dificilmente você consegue monitor para trabalhar 30 horas, porque o salário é muito baixo. O que muitas vezes engrossa o salário de um monitor é o ticket, mas quem faz 30 horas não o recebe. Essa ideia da Prefeitura de querer acabar com o monitor de 40 horas e 44 horas será uma grande perda. Se já não tem profissionais de qualidade com 30 horas, você vai ter menos ainda, pois o salário não atrai. Esse ponto merece uma avaliação bem profunda da PMBH. (PC2)

A diferenciação das condições de trabalho entre os monitores e os docentes também foi exposta nas entrevistas, como no depoimento abaixo:

(...) Por exemplo, há uma lei que rege a gente e outra lei que rege os professores. Eles têm duas férias no ano, já a gente tem que trabalhar e não tem nenhum aluno na escola. Por que a gente tem que vir? Só para cumprir hora? Eu não concordo com isso. Por que que os professores não vêm? Ah, porque eles são assim, assado... Quem fala isso são os diretores. Então, está tudo bem? Por que não mudou até hoje? Não quer que o negócio dê certo? (...) Porque a gente podia descansar... Já teve vez que a gente foi fazer curso no período que a gente estava trabalhando, entende? (M3.1)

Outra polêmica que sempre vem à tona no interior das escolas pesquisadas é a falta de formação pedagógica dos monitores necessária às tarefas assumidas com os estudantes. Há uma cobrança tanto dos docentes, quanto daqueles que coordenam o Programa nas escolas.

(...) Nenhum monitor apresenta qualidade ou especificidade de estudo para lidar com as crianças. A maioria trabalhou em loja, torneiro mecânico, auxiliar de escritório, venda por telefone, não sabe nada da área pedagógica. (...) Eles têm muita dificuldade em tudo que você propõe, por exemplo, uma leitura de texto, compreensão do que se pede, porque a formação da maioria é a formação do Ensino Médio, da escola pública. Então, a interpretação de texto eles têm grande dificuldade, tudo tem que ser muito esmiuçado. (PC2)

(...) Assim, fico preocupada com relação à formação (dos monitores). (...) quem é esse que está com meu aluno? Às vezes o meu aluno sabe mais do que o próprio monitor, né? Que contribuição que esse monitor, que não possui tanta formação, vai poder trazer para o meu aluno? (P3)

As dificuldades para a existência de trabalhos colaborativos entre os docentes e monitores vão se revelando a partir da própria organização escolar e do trabalho vigentes nas escolas pesquisadas, conforme descrito nesta seção. Ficou evidenciada a fragmentação dos espaços, dos tempos, dos currículos e do planejamento. Foram expostas ainda as precárias condições de trabalho dos monitores, principalmente aquelas relativas ao vínculo, salário, jornada, carga de trabalho, além da inexistência de formação pedagógica. Em relação a esta, verifica-se a dificuldade encontrada por alguns docentes em reconhecer outros saberes, advindos das experiências, que entram nas escolas públicas por meio da jornada integral.

Dentro do contexto apresentado até aqui, é possível alguma colaboração entre docentes e monitores? É o que a seção seguinte busca responder.

A colaboração entre docentes e monitores é possível?

Esta seção buscou descrever e analisar em que situações os sujeitos entrevistados relatam desenvolver algum tipo de interação/colaboração entre si em meio às adversidades de tempo, espaço, formação e condições de trabalho. Procurou também mostrar em que situações eles entendem que essa interação poderia se concretizar ou porque não se consegue estabelecer essas relações. A resposta para a questão, expressada no título da seção, nos levou a apresentar aqui as considerações finais do artigo.

As entrevistas e as observações feitas nas escolas, de forma geral, mostraram que as atividades realizadas pelos profissionais do PEI são pouco conhecidas ou reconhecidas pelos professores e vice-versa, ou seja, não se tem uma noção mais abrangente do que o outro faz, por que faz, como faz, além de não se ter espaço de discussão e planejamento conjunto, onde se pudesse proporcionar esse conhecimento. Quando perguntados, tanto os monitores quanto os professores responderam de forma muito geral sobre o trabalho do outro, sem mostrar maior informação ou envolvimento de ambas as partes. Alguns verbalizaram esse desconhecimento.

Então, é uma situação muito complexa para a gente tentar levar uma mensagem, porque o preconceito só nasce da desinformação. Quando o meu colega fala mal da Integrada, ele não conhece a Escola Integrada, nem quer conhecer. Porque se ele viesse um dia aqui, no horário da ACPATE (de planejamento), eu mostrava. (PC3)

No entanto, alguns docentes demonstraram reconhecimento pelo trabalho realizado pelos monitores, que acaba por refletir nas salas de aula, conforme depoimento abaixo.

Porque eu acredito que tem professores que reconhecem que o aluno, ao desenvolver uma dança, uma capoeira, (...) ele não está lidando só com questões corporais, mas também com coisas bacanas para o intelecto dele. Tipo assim, um aluno violento que aprende um esporte que requer disciplina, ele vai melhorar na sala de aula. É consequência. Um aluno que não tem paciência para nada, conseguir fazer um desenho elaborado, onde ele tem calma, tem técnica... Ele vai conseguir melhorar a concentração lá na matemática. Então, alguns professores realmente reconhecem isso. (...) (M3.2)

No que se refere às atividades realizadas, a aproximação entre professores da escola regular e os monitores do PEI tem se dado quando esses profissionais atuam na mesma área. Nas escolas pesquisadas, os jogos esportivos e as intervenções artísticas conseguiram aproximar os professores dos monitores, como relatado abaixo.

Eu vejo a monitora de artes, ela está ajudando a professora de artes. Outro dia, inclusive, estavam as duas passeando pelo bairro, fazendo umas intervenções artísticas, entrevistas e tal. Elas têm essa jogada. Elas têm essa afinidade. (M2.3)

É uma troca, muito legal. O monitor de esporte tem uma equipe de handball, eu estou sabendo que ele está ensinando handball, (...), eu não sei o método que ele está usando para ensinar esse esporte. Mas a gente acaba buscando saber pela conversa com os monitores e com os alunos. Isso é um facilitador muito grande do meu trabalho, quando eu vou ensinar um esporte, eu já sei que eles já viveram isso na Escola Integrada, só tem que dar uma lapidada. E, às vezes, um esporte que eu não domino muito e os meninos já vêm com uma base bem consolidada da Integrada e acaba que eu que aprendo um pouco com eles, em relação a isso. (P2.1)

Pelos depoimentos mostrados acima, o que vem ocorrendo nas escolas pesquisadas em termos de cooperação entre docentes e monitores é o que Fullan e Hargreaves (2001) chamaram de “colaboração confortável”. Trata-se de uma aproximação espontânea entre professores e monitores, circunscrita a aspectos práticos, que possui uma natureza mais imediata para a realização de atividades específicas, neste caso, artísticas e esportivas.

Verificou-se também esse tipo de colaboração quando alguns docentes buscam um maior conhecimento da realidade dos estudantes e da comunidade onde a escola está inserida, por meio da troca de experiências, informações e dicas com os monitores. Os docentes têm feito esse movimento em relação aos monitores, conforme depoimento abaixo.

Os alunos têm mais proximidade com o monitor mesmo, porque o monitor é aqui da comunidade. Sabe muita coisa da vida particular deles, (...) e aí, às vezes, você está com problema com o aluno em sala de aula, você vai ao monitor e pergunta o que está acontecendo? Eles sabem dizer pra gente, de tudo. Aí a gente vai começar a entender uma série de questões, de comportamento, de aprendizagem, eu acho isso, assim, fantástico, riquíssimo. (...) Com a troca de experiências, você pode saber como é que você vai lidar. Ou o contrário, também acontece, do monitor nos perguntar: ô, professora, o que você faz com o fulano que com você ele não dá problema nenhum e é só dar 11h20 que ele se transforma? Aí eu falo, dentro de sala comigo é tranquilo, aí senta perto de mim, converso muito, então, as trocas são muito de corredores, (...). (P2.2)

Eu recebo muita ajuda deles (monitores). Por exemplo, agora eu estou fazendo um trabalho com os meninos, de fazer umas excursões pelo bairro, para eles conhecerem, pra gente desenhar o bairro, as figuras típicas do bairro, os locais, os problemas. Sempre tem um monitor da Integrada saindo comigo, como eles conhecem muito a região, eles é que são meus guias aqui no bairro, de pedir um morador antigo do bairro pra falar alguma coisa com os meninos. Eles me apresentam os moradores, me contam os casos típicos da região, como é que foi surgindo, como é que eles conseguiram algumas melhorias. Então, eles têm sido uma ponte entre mim e os meninos. (P2.3)

Na perspectiva da colaboração confortável registrou-se ainda a participação conjunta de monitora e professora em reunião com pais, promovida pela coordenação pedagógica, que se desdobrou em trocas de experiências, de acordo com o depoimento abaixo.

E, por exemplo, quando tem reunião de pais de determinados alunos, a coordenação tem o costume de me chamar também, se é aluno meu, ela me chama. Aí eu participo junto com a professora. Então, às vezes, no meu projeto eu tenho costume de procurar a professora para conversar. A turma dela é a de seis anos, a gente troca ideias, ela fala como que está cada um, eu dou minha opinião, assim, às vezes um pouco mais leiga, porque ela tem muita experiência, né? Sempre tem esse tipo de liberdade. (...) Tem esse tipo de envolvimento, de troca de experiência (...). (M2.3)

Entre os próprios monitores, observou-se uma colaboração chamada por Fullan e Hargreaves (2001) de “artificial”, porque responde, entre outros aspectos, a espaços de planejamentos formais estipuladas pela instituição, mas que podem ser o início de uma maior colaboração entre eles. Nas escolas pesquisadas, há formalmente um horário previsto na parte da manhã e outro na parte da tarde para essas atividades, que podem ser realizadas individualmente, em grupo ou em parceria com o coordenador do PEI na escola. Nelas têm sido realizadas, além do planejamento das oficinas, que é mais comum, reuniões com desenvolvimento de temáticas com vistas a preencher a lacuna da formação pedagógica, conforme exposto abaixo.

(...) Aí eu tomei a decisão de formar um grupo. Então, todos os dias, após o trabalho e lanche deles (monitores), de 16h20 às 17 horas, a gente reúne e eu faço a discussão sobre a importância do jogo, do brincar, dos cuidados essenciais, de como se portar com essa criança. (PC2)

Esse tipo de atividade realizada pelo coordenador do PEI da escola 2 pode ser um passo inicial para fortalecer os monitores e facilitar o processo de aproximação com os docentes, na medida em que atua naquela lacuna que muitas vezes é ressaltada pelos docentes. Tanto monitores como docentes vislumbram atividades que poderiam fazer em conjunto e ressentem dessa não aproximação.

(...) Igual, por exemplo, eu (monitora) mexo com a consciência negra (exposição de fotografias da pele negra). Aí, chega o dia 20 de novembro, a gente podia trabalhar uma coisa superlegal com os meninos. Assim, da escola regular junto com a Escola Integrada. (...) Uma dinâmica com os alunos, umas brincadeiras, que seria legal fazer isso no dia 20 de novembro, mas não existe isso. (M1.1)

(...) Eu tenho que me despir dos meus preconceitos, o monitor também. E nós somos colegas, nós somos uma equipe, precisa ser proativo, e (...) ter interação. (P2.1)

(...) Acho que talvez a gente deveria ter uma reunião de diálogo, de proposta de interação. Por exemplo, a direção podia chegar e falar: gente, vamos fazer um projeto pedagógico que envolve a Integrada? Ou então, a gente fazer uma reunião com os monitores, vamos ver o que eles podem oferecer e a gente vê onde a gente pode inserir eles no nosso trabalho. Talvez grande parte dos professores poderia se abrir, chamar a gente e desenvolver um trabalho legal. (...) Tá faltando ter um contato inicial, esse ponto de partida, sabe, assim, de conversar e fazer a escola como se fosse, assim, uma coisa só (...). (M3.2)

Os depoimentos registrados nesta seção mostram que, ao mesmo tempo em que os professores levantam suas críticas e resistências ao Programa, revelam também o seu valor social; a contribuição das atividades artísticas, culturais, esportivas, para o desenvolvimento cognitivo, comportamental e de concentração das crianças e adolescentes; a aproximação desses profissionais com a comunidade e com as próprias crianças, o que facilita a circulação pelo bairro e as relações com os estudantes.

Este estudo apontou dificuldades organizacionais e precárias condições de trabalho tanto para os professores como para os profissionais que atuam no PEI. Todavia, ele identificou também a construção de estratégias por parte desses sujeitos, dentro da realidade atual, para alargar o processo de aproximação entre professores e monitores do PEI, mesmo que de forma tímida em ações pontuais, intercâmbios imprevistos, apoios diversos – a colaboração confortável (FULLAN e HARGREAVES, 2001), indicando a importância e o desejo de que essa interação possa vir a ocorrer dentro dessas escolas.

Apesar dos desafios enfrentados pelos professores e monitores, é pertinente considerar que nas três escolas pesquisadas há, em ambos os grupos profissionais, pessoas buscando se aproximar e reconhecer a importância do trabalho dos monitores para o enriquecimento curricular dos estudantes.

É preciso investir para que esse reconhecimento se dê a partir da valorização dos saberes produzidos tanto pelos docentes como pelos monitores, para que haja possibilidades de diálogo entre eles. É necessário investir nas condições de trabalho de ambos, principalmente naquilo que se refere aos espaços, tempos, contratos de trabalho, jornadas e salários. É necessário ainda propiciar condições para que haja disponibilidade para o planejamento conjunto, a revisão dos projetos político-pedagógicos das escolas, em que o currículo e a organização do trabalho escolar dêem conta de fundir as duas escolas, existentes hoje, em uma só.

2O Programa Mais Educação (2007) foi instituído pela Portaria Normativa Interministerial n. 17, de 24 de abril de 2007, e o Decreto n. 7.083/2010, que dispõe sobre o PME. Este Programa contemplou a construção de um arcabouço teórico em torno desse modelo de educação, apresentado à sociedade por meio do documento “Educação Integral: texto referência para o debate nacional” publicado em 2008 pelo MEC. Além disso, chamou a atenção para a questão dos campos de conhecimento, bem como possibilitou um diálogo com as experiências de Educação Integral que estavam acontecendo em diversos municípios do país (MACEDO, 2012).

3Acompanhamento pedagógico; educação ambiental e desenvolvimento sustentável; esporte e lazer; educação em direitos humanos; cultura, arte e educação patrimonial; cultura digital; promoção da saúde; comunicação e uso de mídias; investigação no campo das ciências da natureza; educação econômica/economia criativa

4Esses novos profissionais eram constituídos por monitores, agentes culturais e oficineiros. Essas nomenclaturas foram depois uniformizadas e esses sujeitos passaram a ser denominados de monitores (aqueles contratados pela CLT) e estagiários (os que recebem bolsa de estudos das instituições de educação superior conveniadas). Neste artigo, os novos profissionais vão ser chamados de monitores.

5Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da UFMG em 2014.

10Para o horário de oito às 16 horas de funcionamento do PEI, o número de turmas é multiplicado por 1,25 monitores com carga horária de 30h/semanais; para as demais cargas horárias, a relação é de um monitor por turma (BELO HORIZONTE, 2014).

11De acordo com Assunção e Oliveira (2010), as condições de trabalho reúnem um conjunto de recursos que possibilita a realização do trabalho, envolvendo as instalações físicas, os materiais e insumos disponíveis, os equipamentos e meios de realização das atividades e outros tipos de apoio necessários. Por outro lado, diz respeito também às condições de emprego, como formas de contratação, remuneração, carreira e estabilidade. Essas questões exercem influência nos próprios trabalhadores e sobre os resultados almejados (ASSUNÇÃO; OLIVEIRA, 2010).

9As oficinas de Para Casa, alfabetização, letramento, contação de histórias, jogos pedagógicos e jogos matemáticos são consideradas pertencentes ao macrocampo - Acompanhamento Pedagógico, de acordo com a Matriz Curricular do PEI/SMED e são realizadas pelos monitores nas escolas pesquisadas.

Referências

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Recebido: 23 de Novembro de 2016; Aceito: 24 de Junho de 2017

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Língua Portuguesa

Luiz Gonzaga Morando

E-mail: luizmorando@gmail.com

Língua Inglesa

Lívia Aguiar

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Língua Espanhola

Lívia Aguiar

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