SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.37 número1Por uma história cultural do autodidatismo digital: mudanças nas narrativas culturais da educaçãoMídia, corpo e mercado: (im)possibilidades formativas diante do poder simbólico índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Compartilhar


Perspectiva

versão impressa ISSN 0102-5473versão On-line ISSN 2175-795X

Perspectiva vol.37 no.1 Florianopolis jan./mar 2019  Epub 18-Jul-2019

https://doi.org/10.5007/2175-795x.2019.e52467 

Dossiê Imagens, Mídias e Práticas Corporais

Cidadania da sexualidade na imprensa portuguesa do pós-Revolução dos Cravos

Sexual citizenship in the Portuguese press after the Carnation Revolution

Ciudadanía de la sexualidad en la prensa portuguesa del post-revolución de los Claveles

Isabel Marques Freire1 
http://orcid.org/0000-0003-0173-6637

1Universidade de Lisboa, Portugal


Resumo

Esperando contribuir para o debate sobre a mudança social das vivências afetivo-sexuais no Portugal de transição da ditadura para a democracia, analisei o conteúdo de revistas e jornais (Mulher - Modas & Bordados, Crónica Feminina, Expresso e Diário de Lisboa), publicados entre 1968 e 1978. De que se fala e o que se diz na imprensa sobre direitos sexuais e de gênero, neste período marcado pela euforia da Revolução de 25 de abril de 1974? Neste artigo, analiso uma carta, um manifesto e uma reportagem que marcaram a agenda midiática da cidadania da sexualidade logo após a Revolução dos Cravos. Os três conteúdos associam liberdade política à liberdade sexual e equacionam as nossas vivências íntimas enquanto assunto público e de cidadania: a história pessoal sexual de uma adolescente (Gisela) enviada à redação de uma revista feminina; o primeiro manifesto homossexual português, publicado na imprensa duas semanas após a Revolução dos Cravos; e um documento assinado por 500 prostitutas (reivindicando direitos sociais e políticos), que é trazido à agenda de uma reunião feminista do Movimento Democrático da Mulher. Na imprensa analisada, o direito à sexualidade feminina pré-conjugal (reivindicado por Gisela), o direito à “livre prática homossexual” e o direito ao “amor livre” marcaram, nesse período, a emergência de uma cidadania da sexualidade (ou cidadania íntima), em desenvolvimento até hoje. Porém, apenas a história pessoal sexual de Gisela desperta entre as leitoras um longo debate sobre a importância das questões da intimidade para a democracia.

Palavras-chave:  Revolução; Cidadania; Sexualidade

Abstract

Expecting to contribute for the debate on social change of affective and sexual intimacy in Portugal in transition from dictatorship to democracy, I analysed the content of four magazines and newspapers (Mulher - Modas & Bordados, Crónica Feminina, Expresso and Diário de Lisboa), published between 1968 and 1978. What is being said in the press about gender and sexual rights during this euphoric moment lived after the Carnation Revolution? In this article I analyze a letter, a manifest and a report, of extreme relevance for the setting of topics concerned to sexual citizenship in the media’s agenda shortly after the Carnation Revolution. The three discourses associate political freedom with sexual freedom, and discuss our intimate experiences as a public and citizenship issue: the sexual story of an adolescent (Gisela) sent to a women's magazine; the first Portuguese homosexual manifest published in the press two weeks after the Carnation Revolution; and a document signed by 500 prostitutes (claiming social and political rights) that is brought to a meeting of the feminist Movimento Democrático da Mulher. In the analyzed press, the right to premarital female sexuality (claimed by Gisela), the right to «homosexual free practice» and the right to «free love» marked the emergence of a sexual citizenship (or intimate citizenship) in this period. However, only the personal sexual story of Gisela leads to a long debate on the importance of the issues of intimacy for democracy, between the readers.

Keywords:  Revolution; Citizenship; Sexuality

Resumen

Esperando contribuir para el debate social sobre las vivencias afectivas e sexuales no Portugal de transición para la democracia, analicé el contenido de cuatro revistas y jornales (Mulher - Modas & Bordados, Crónica Feminina, Expresso y Diário de Lisboa), publicados entre 1968 y 1978. ¿Qué es lo que se dice en la prensa sobre derechos sexuales y de género, en este momento marcado por la euforia del 25 de abril de 1974? En este artículo analizo una carta, un manifiesto y un informe, de extrema relevancia para el establecimiento de temas relacionados con la ciudadanía sexual en la agenda de los medios de comunicación poco después de la Revolución de los Claveles. Los tres discursos asocian la libertad política con la libertad sexual, y discuten nuestras experiencias íntimas como un problema público y de ciudadanía: la historia sexual de una adolescente (Gisela) enviada a una revista feminina; el primer manifiesto homosexual portugués publicado en la prensa dos semanas después de la Revolución de los Claveles; y un documento firmado por 500 prostitutas (reclamando derechos sociales y políticos) que se lleva a una reunión del feminista Movimento Democrático da Mulher. En la prensa analizada, el derecho a la sexualidad femenina prematrimonial (reclamada por Gisela), el derecho a la «práctica libre de homosexualidad» y el derecho al «amor libre» marcaron el surgimiento de una ciudadanía sexual (o ciudadanía íntima) en este período. Sin embargo, solo la historia sexual personal de Gisela conduce a un largo debate sobre la importancia de los temas de intimidad para la democracia, entre los lectores.

Palabras clave:  Revolución; Ciudadanía; Sexualidad

Introdução

Num artigo publicado no semanário Expresso (COSTA, 1974, p. 30), logo a seguir à Revolução de 25 de abril de 1974, o ensaísta e crítico de cinema João Bénard da Costa, questiona-se se o ambiente “onírico” que então se vivia em Portugal, representava o “início dum novo País”, o início “da construção de um homem novo e de uma sociedade nova”, isentos “de qualquer forma de repressão”. Com a Revolução dos Cravos, cai a ditadura do Estado Novo, instaurada em 1933, e Portugal inicia um processo de transição para a democracia. Desaparece o exercício da censura1, encarregada de banir discursos passíveis de atentar contra o Estado, suas instituições, seus dirigentes, assim como de eliminar fontes de inquietação e ultraje à “moral pública” (FRANCO, 1993, p. 175). Ao longo de quatro décadas, os censores do regime conduzido por António de Oliveira Salazar e por Marcelo Caetano (entre 1968 e 1974) apagam da imprensa visões que remetem para um entendimento tendencialmente permissivo da sexualidade e igualitário do gênero2. Cenas de beijos fogosos, decotes ousados e diálogos em torno da emancipação feminina são amputados às fitas do cinema3. Canções com estrofes inspiradoras do desejo são proibidas de soar no rádio e na televisão. Derrubam-se das prateleiras das livrarias livros que falam da contracepção, do prazer sexual e de outros temas da intimidade afetivo-sexual (FREIRE, 2017)4. Como Natália Correia descreve em meados dos anos 1960, no prefácio da Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, a “verdade” das vivências íntimas é rebaixada pela “moral sexual” do Estado Novo “à situação de esgoto” (FREIRE, 2017, p. 14).

A intenção de convencer os(as) cidadãos (ãs) de que não há distinção entre as vidas privada e pública, sendo tudo do interesse do Estado, é – como defende Tisseron (2003) – uma característica das ditaduras. A Revolução de 25 de abril de 1974, que põe fim à ditadura do Estado Novo, traz às vivências íntimas dos(as) portugueses(as) possibilidades de mudança radicais do ponto de vista legal (ABOIM, 2011; ALMEIDA et al., 2001; WALL, 2011). A Constituição da República Portuguesa (1976) passa a consagrar o “direito à identidade pessoal, ao bom nome e reputação e à reserva da intimidade da vida privada e familiar”. Aproximam-se igualmente os direitos de trabalhador e trabalhadora, marido e mulher, pai e mãe, uniões seladas pelo casamento e pela coabitação, bem como dos filhos concebidos nesses diferentes registros (tanto na Constituição de 1976 como no Código Civil, cuja revisão entra em vigor em 1977) (FREIRE, 2016). A figura do chefe de família esfuma-se do texto da lei. O governo doméstico deixa de pertencer por direito legal à mulher. O imperativo da virgindade feminina à data do casamento é retirado do Código Civil5. E institui-se a obrigação do Estado na promoção e divulgação dos métodos de planeamento familiar, organizando estruturas que permitam o exercício da parentalidade consciente (Artigo 67º da Constituição Portuguesa). Aos casais que coabitam sem serem casados é reconhecida a possibilidade de exercerem em conjunto o direito parental (em vigor para pais casados) (ALMEIDA et al., 2001). E, a partir de 19756, casais unidos pela Igreja recuperam o direito ao divórcio civil, que lhes havia sido retirado em 1940, com a assinatura da Concordata entre o Estado Português e a Santa Sé.

Olhando para a sociedade portuguesa das últimas décadas, José Machado Pais (1998) defende que os comportamentos e estilos da vida familiar (incluindo atitudes perante a sexualidade e as relações amorosas) constituem uma das importantes dimensões do processo de mudança social. Mas como se operacionalizou esta mudança na vida dos portugueses entre 1960 e 1970, um período marcado por fortes protestos e reivindicações tendencialmente liberalizantes em escala mundial?

Cientistas sociais que se dedicam ao estudo das vivências dos afetos e sexualidades no século XX questionam a adequação da expressão revolução sexual para definir o ambiente político e social das décadas de 1960 e 1970, em diversos países do ocidente, marcados por movimentos de contracultura, movimentos feministas e de defesa dos direitos homossexuais (ESCOFFIER, 2015; GARTON, 2009; GIAMI, 2015; SEIDMAN, 2010; WEEKS, 2007). Argumentam que a mudança não foi suficientemente súbita, radical, profunda e ampla, para que possamos falar em revolução. O assunto das sexualidades entra de rompante e, como nunca, em esferas públicas de muitas sociedades, nomeadamente a norte-americana, mas essa visibilidade não evidencia a mudança das práticas nas esferas pessoais e privadas (ESCOFFIER, 2015). As transformações foram mais retóricas do que reais, defende Seidman (2010). A chamada revolução sexual mantém-se em processo no “mundo hexagonal” em que vivemos, ou seja, perdura há mais de cinco décadas (MOSSUZ-LAVAU, 2015, p. 245).

Jeffrey Weeks (1998) propõe que se use a expressão “momento permissivo” para designar este período, cujos ganhos se centram sobretudo na emancipação das mulheres, no reconhecimento dos direitos civis dos gays e lésbicas e na consagração de direitos sexuais para solteiros(as) e para jovens, baixando a idade consentida para a sua iniciação sexual (GIAMI, 2015, p. 51). E no contexto português? Que mudanças e que permanências se defendem para as “sexualidades da sexualidade” e para os “amores do amor” (PAIS, 1998, p. 408) no período de transição para a democracia, coincidente, no plano internacional, com a afirmação de novas permissividades?

Neste artigo, analiso discursividades (FOUCAULT, 1994) presentes na imprensa escrita portuguesa, no pós-Revolução dos Cravos, associando liberdade política à liberdade sexual: a carta de uma adolescente em torno da sua iniciação sexual (Dossier Gisela, com publicação na Mulher – Modas & Bordados, em 1975); o primeiro manifesto homossexual português (publicado no Diário de Lisboa, em 1974) e o manifesto das prostitutas de Lisboa (reportado no Diário de Lisboa, em 1975). Nas três narrativas está patente a reivindicação do direito a uma sexualidade excluída da vivência íntima modelar promovida durante o Estado Novo: heterossexual, matrimonial e reprodutiva, embora dual em termos de gênero.

Com esta análise, pretendo contribuir para a reflexão sobre a emergência de uma cidadania da sexualidade (EVANS, 1993; WEEKS, 1998) ou cidadania íntima (PLUMMER, 2003) numa sociedade em transição da ditadura para a democracia, pensando o impacto das histórias pessoais (storytelling) para o agendamento do debate em torno dos direitos sexuais, nas esferas midiáticas, mas também educacionais. Refira-se que, até à década de 1990, as palavras “sexualidade” ou “sexual” não haviam surgido em documentos internacionais intergovernamentais, à exceção da Convenção dos Direitos da Criança (1989), que previa o combate à exploração e ao abuso sexual infantis (GIRARD, 2008). Referências a direitos sexuais surgem apenas de forma indireta, através de temas como o casamento ou o planeamento familiar, portanto circunscritas a contextos heterossexuais conjugais e reprodutivos. O termo direitos sexuais é apenas reconhecido – e de forma controversa – na IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Organização das Nações Unidas, 1995, Pequim), como nos refere Rosalind Petchesky, citada por Plummer (2003, p. 64-65).

Plummer (2003, p. 14) diz-nos que a cidadania íntima diz respeito às decisões que tomamos para controle (ou não) sobre o corpo, sobre os sentimentos e relacionamentos, bem como às escolhas com base social (ou não) acerca das identidades, experiências de gênero e experiências eróticas.

Fiz amor na noite da Revolução dos Cravos!”

No ano de 1975, chega à redação da revista Mulher – Modas & Bordados (M&B) uma carta anônima, assinada por Gisela. A autora desta narrativa autobiográfica (então com 15 anos) descreve o contexto da sua iniciação sexual (aos 14) na noite da Revolução dos Cravos:

No dia 25 de Abril estava eu em Lisboa como o meu primo. Ele estava esfuziante, parecia doido, pulava, ria, gritava! Segui-o por toda a parte, ele contagiava-me, ofereci flores aos soldados, juntei a minha voz à do povo. E não sei o que nos levou a fazê-lo, talvez a sensação de liberdade, na noite de 25 para 26 de Abril, fizemos amor, até ao fim! Foi maravilhoso embora a princípio ficasse decepcionada. Tinha 14 e ele 18. Hoje, volvidos quase 12 meses estou aqui a escrever a história da minha vida. (GISELA, 1975, p. 3).

Maria Antónia Fiadeiro7 (jornalista e chefe de redação da M&B) apercebe-se da importância da narrativa pessoal e publica-a na integra com o título Fiz amor na noite do 25 de Abril, na seção editorial Esta é a minha história. As reações das leitoras a este manifesto não se fazem esperar. Dezenas de cartas ‘chovem’ na redação da M&B ao longo de 17 meses, sendo publicadas em 33 edições da revista feminina, na seção A palavra às leitoras. A história pessoal sexual da adolescente gera prolongada controvérsia entre as leitoras. Os comentários são elogiosos, emocionados e agradecidos, mas também críticos, chocados e enfurecidos. A revista Mulher - Modas & Bordados não toma posição. Limita-se a transformar a polêmica num ficheiro temático (que designa por Dossier Gisela) e a valorizar o diálogo, publicando com igual destaque as visões tendencialmente liberalizantes e conservadoras das leitoras. Nas cartas que comentam o caso da adolescente, debate-se o direito à sexualidade feminina, à sexualidade juvenil, à sexualidade pré-conjugal, à livre expressão sobre a sexualidade em esferas midiáticas e públicas, à educação sexual, mas também à contracepção e ao aborto.

Gisela conta que nasceu em 1960, no seio de uma família “burguesa” e conivente com a ditadura do Estado Novo. É fruto de um casamento infeliz (mantido para evitar o escândalo social) e educada num colégio religioso.

Tirei a instrução primária num colégio de freiras que eu detestava porque sempre fui muito amiga da justiça e tudo quanto via e não me agradava, tratava logo de contestar e de dizer que não queria, fosse o que fosse! Isto era um suplício para as freiras que se desculpavam, dizendo que as coisas se deviam aceitar como eram, como um sacrifício, por Deus. Deus, Deus, só me falavam em Deus e mais nada, era tudo por Deus. De qualquer modo, já estava habituada e até gostava d’Ele. Um belo dia descobri que estava para chegar um irmão! Eu tinha 7 anos. Durante os 9 meses de espera o irmãozinho querido viveu comigo, para me abandonar, logo depois de 48 horas, de ter nascido. Era tão lindo e eu amava-o tanto! Nasceu no fim das férias e quando voltei ao colégio as freiras disseram-me que ele tinha morrido por vontade de Deus. A minha reacção imediata foi gritar que odiava Deus, que ele era mau, que o meu irmão nunca lhe tinha feito mal e que eu nunca mais rezava. E não rezei! Obrigaram-me a ir à missa o que me revoltava ainda mais. Quando já tinha 9 anos acabei de receber a hóstia, saí da igreja e cuspi-a na rua. (GISELA, 1975, p. 3).

Na sua carta, a jovem de 15 anos considera o casamento um “disparate”, recusa o modelo da mulher-mãe-esposa dedicada em exclusivo ao lar e aos filhos, vivendo na dependência social e econômica do marido: pretende investir na sua formação, estudar e trabalhar ao mesmo tempo. Acerca do jovem com quem se inicia sexualmente (socialista, opositor do regime e preso político), escreve:

[…] falámos muito, de tudo, de Caxias [estabelecimento onde esteve preso], e eu beijava-o na face, molhando-o com as minhas lágrimas. Passados 6 meses sobre o início dos nossos encontros secretos, ele quis fazer amor comigo; eu era liberal nessas coisas mas tinha 13 anos e a minha mãe com as suas ideias ainda imperava em mim. Não o fiz nessa altura, mas prometi-lhe que no dia em que eu tivesse a certeza de amá-lo que o fazíamos. (GISELA, 1975, p. 3).

A jovem inicia-se sexualmente na noite de 25 para 26 de abril de 1974 e declara-o publicamente. A sua história pessoal sexual é manifesto de uma expectativa: a revolução política traz liberdade de escolha e de expressão, política, moral e sexual. Na metade dos anos 1960, movimentos sociais encabeçados por jovens, mulheres e comunidades LGBTs defendem a “noção de consentimento” como fundamental para o exercício da autonomia da sexualidade (GIAMI et al., 2015, p. 51).

A carta que Gisela envia à M&B remete-nos para o conceito de desejo de extimidade (TISSERON, 2003), ou seja, a vontade de comunicar em público elementos do nosso mundo interior (do nosso ser íntimo), tendo por fundamento um desejo de enriquecer a intimidade do próprio indivíduo e, simultaneamente, um desejo de reivindicar alterações aos valores familiares e sociais. “O desejo de extimidade é inseparável do desejo de encontrar-se através do outro e de assumir riscos” (TISSERON, 2011, p. 85, grifo do autor). A adolescente torna pública a sua intimidade, torna política a sua escolha pessoal. Enquanto jovem e enquanto mulher, reclama o direito a decidir o que fazer com o seu corpo e com a sua sexualidade, e a participar na construção política, social e moral de um país em mudança: “[…] não deixarei que a minha liberdade morra, a minha e a dos outros, todos devem ser livres. Quero ajudar Portugal seja como for” (GISELA, 1975, p. 3).

No depoimento da jovem que fez amor no 25 de abril de 1974 estão patentes elementos que Giddens (2001) reconhece como fundamentais às transformações da intimidade das últimas décadas, próprios da modernidade tardia. Gisela “assume publicamente a sua busca identitária (projeto reflexivo do self), a sua pretensão de um relacionamento afetivo igualitário (relação pura), e a aceitação de uma sexualidade que vale por si, independente da reprodução (sexualidade plástica)” (FREIRE, 2016, p. 310, grifos do autor). O indivíduo sente-se responsável pelo seu destino, partilha-o publicamente, assume que a sua intimidade é política (DAOUST, 2005, p. 256).

Tavares (2000, p. 25) defende que o fim da ditadura portuguesa abre “lugar a um processo revolucionário, onde as mulheres soltam a palavra, num espaço de liberdade até aí nunca vivido”, participando em reuniões, manifestações, assembleias, valorizando e afirmando direitos de uma cidadania feminina, muito embora o feminismo não se transforme então num movimento amplo e massivo. Considerando o tipo de intervenção e discurso, Tavares (2000, p. 123) aponta a existência de três correntes feministas no Portugal da época: radical, socialista/marxista e liberal. O feminismo radical equaciona a reprodução como principal fator de opressão, manifesta preocupações pelo fim da subordinação da sexualidade feminina às exigências masculinas, bate-se pela contracepção, pela legalização do aborto e contra a violência sobre as mulheres (TAVARES, 2000). A vertente socialista/marxista entende a luta pelo direito ao trabalho como um fator emancipatório, denunciando o capitalismo como sistema discriminatório e opressor. A corrente liberal surge em Portugal a partir de finais dos anos 80 e defende “estratégias de constituição de ‘lobbies’ ou grupos de pressão junto do poder político, gerando-se a ideia de que o acesso das mulheres ao poder político e económico é, por si só, factor transformador da sociedade” (TAVARES, 2000, p. 119-120).

Nos anos 1970, o discurso das feministas em Portugal é muito atacado – “[...] são chamadas de ‘mal fodidas’, ‘excitadas, raivosas, ululantes’, ‘guerreiras de um exército em movimento’, ‘sórdidas’, ‘monstros’, ‘vaginas revolucionárias’, ‘taradas sexuais’” (NEVES, 1987, p. 99). A escritora Natália Correia a elas se refere pejorativamente no diário que escreve logo após o 25 de abril:

E agora vos desmascaro, ó grotescas feministas que berrais serem as mulheres oprimidas devido a serem do pobre sexo feminino, ai dele, colonizado pelo feroz Rei Macho. Invertei essa vossa ridícula lamúria e achareis que a mulher é só sexo feminino enquanto oprimida pelos homens que oprimem enquanto só sexo masculino. [...] Nisto deveis ponderar, carpideiras do vitimismo feminino. Como sois detestáveis a espernear nessa posição de montadas. [...] Por isso vos digo, ó cadelas do feminismo com serpentes na trunfa: em vez de esmurrar o falo que vos reduz as rodilhas de gozo, além de que é ordinário dizer mal do que nos é imprescindível, descobri-o no vosso espírito a penetrar a vulva da vossa alma (CORREIA, 1978, p. 111-112).

A carta de Gisela é exemplar da valorização e afirmação dos direitos das mulheres (no trabalho, na educação, na família, na conjugalidade, na parentalidade e na sexualidade), mas não faz qualquer referência explícita ao feminismo. Na discussão longa que as leitoras fazem do manifesto desta jovem, o feminismo também não é invocado ou analisado. As cartas que chegam à redação pensam o direito à sexualidade feminina sem equacionar propostas de movimentos feministas. O que descrevem as leitoras nas suas cartas laudatórias ou indignadas? Entre visões tendencialmente liberalizantes, a jovem Gisela é descrita como um exemplo de sabedoria, de força e de liberdade (“luz da humanidade”, “chama forte no mundo”, “heroína”, “vedeta nacional”). Nalgumas cartas enviadas à redação da M&B, apela-se a que se batizem crianças com o nome da adolescente rebelde, promovendo assim a emancipação e a liberalização da sexualidade feminina: “E que nasçam muitas Meninas Mulheres chamadas Giselas” (A PALAVRA..., 1976b, p. 2). Para as leitoras tendencialmente conservadoras, são imorais e perigosos os valores, atitudes e comportamentos da jovem, não merecendo, portanto, qualquer aplauso ou promoção. A adolescente é apelidada de “heroína do mal”, “vedeta de telenovela”, “mulher-a-dias” e associada de forma velada à prostituição. As “Giselas” são pessoas caídas em desgraça, “sem respeito por si próprias”, “fracas” e “sujas”.

Ao longo do Dossier Gisela, leitoras com uma perspectiva tendencialmente liberal defendem que as rédeas do corpo e da sexualidade feminina só à mulher dizem respeito. A virgindade pré-nupcial é descrita como uma “hipocrisia da moral”, uma “falsa análise da dignidade” feminina, um “mito”, um preconceito de outro século, que se limita a objetificar a mulher, a torná-la passiva, servindo apenas ao prazer masculino. Considera-se a exigência da virgindade como desvalorizante do prazer sexual feminino, abafante de “desejos não realizados” e de “frustrações” sexuais, prévias e posteriores ao casamento. Segundo esta perspectiva mais progressista, a iniciação sexual pré-conjugal não representa uma perda (uma desqualificação moral), mas um ganho identitário: “Tu, Gisela, ao contrário do que dizem, não perdeste a virgindade, ganhaste-te a ti própria” (A PALAVRA..., 1975a, p. 3).

Em Portugal, um inquérito8 da Juventude Universitária Católica (realizado entre 1963 e 1964, em contextos universitários de Lisboa, Porto e Coimbra) revela-nos que as posições dos jovens em relação à sexualidade pré-conjugal eram ainda tendencialmente conservadoras, mas numa lógica dual de gênero: 40% dos universitários e 19% das universitárias consideravam “úteis” as relações sexuais pré-conjugais, se praticadas pelos rapazes. Mas apenas 9% dos universitários e 6% das universitárias tinham a mesma opinião positiva em face da sexualidade pré-conjugal feminina (FREIRE, 2016).

Em muitos países do ocidente, na passagem dos anos 1960 para os anos 19670, a castidade pré-nupcial feminina perde valor social. Hekma (2015) refere que, em 1965, 70% dos holandeses concordavam com ela, mas que dez anos depois apenas 21% faziam a sua defesa.

No Dossier Gisela, mesmo entre posições de leitoras tendencialmente liberais, o direito à sexualidade feminina desenquadrada do casamento depende – sempre – da condição do amor. As jovens e as mulheres solteiras podem “fazer amor”, “entregar-se” ou “dispor de si”, podem até ter vários parceiros antes de casar, se o fizerem de forma ponderada e se na raiz desses encontros estiver invariavelmente o amor.

Em certas cartas enviadas por leitoras à M&B, afirma-se que Gisela praticou o “amor livre” (liberdade para se relacionar sexualmente com a pessoa a que se ama). O sexo sem amor – o prazer sexual em si e por si, desagarrado da relação afetiva – não é mencionado nem defendido no Dossier Gisela e está praticamente ausente dos artigos analisados nas quatro publicações, entre 1968 e 1978.

AQUI

Duas construções sociais modelares da intimidade evidenciam-se no debate que se gera em torno da carta enviada pela adolescente de 15 anos à revista Mulher – Modas & Bordados. Numa perspectiva tendencialmente liberalizante, consideram-se fundamentais a informação, a educação e o debate (na mídia, nas escolas, nas famílias), para que a sexualidade seja vivida com saúde, numa lógica que nos aproxima da humanidade. Defende-se nesta visão o direito à liberdade e autodeterminação na esfera das vivências íntimas, em coerência com uma sociedade democrática. Noutra perspectiva, tendencialmente conservadora, considera-se que a informação, a educação e o debate (nas esferas midiáticas e públicas, nas escolas, nas famílias, na música, literatura, cinema e teatro) conduzem à degradação física (doenças sexuais, aborto, morte) e à degradação moral, aproximando-nos da animalidade. Defende-se nesta perspectiva a obediência a determinações morais, sociais e religiosas, definidas de forma rígida para o coletivo (FREIRE, 2016).

Leitoras com visões tendencialmente liberais encaram o pós-Revolução dos Cravos como um momento “maravilhoso”, de “evolução”, de destabuização de temas longamente proibidos pela ditadura. Protestam contra a “sexualidade refreada no passado” e apelam às mulheres e aos jovens para protagonizarem a mudança. Para estas leitoras, a adolescente que fez amor na noite de 25 de abril de 1974 representa uma nova ordem sexual em florescimento, sintomática de uma nova ordem democrática: “[...] aquilo que agora [no Dossier Gisela] se manifesta é a procura de uma sexualidade à medida dos homens e mulheres livres que hoje somos [...]” (A PALAVRA..., 1975a, p. 3).

O debate em torno do caso Gisela dura cerca de um ano e meio, e contém dezenas de referências na seção A palavra às leitoras. Este agendamento prolongado e contínuo do tema da sexualidade feminina deve-se ao caráter controverso do problema/questão (pode ou não uma jovem iniciar-se sexualmente antes do casamento e afirmá-lo publicamente?), mas também à visibilidade dada pela publicação a visões tendencialmente opostas. Plummer (2003a, p. 37) defende que a contestação dá “visibilidade”, “foco” e “clareza argumentativa” a um problema. Que a cidadania íntima se constrói na pluralidade de vozes, na divergência de posições, sendo fundamental o agendamento da sua discussão em diferentes esferas. Mesmo não sendo o único dossiê temático (e problemático) promovido pela M&B entre 1975 e 1976, Gisela é o assunto mais debatido (e debatido de forma mais participativa e envolvente) pelas leitoras. As mais progressistas descrevem a discussão como “irrecusável”, “colossal”, “espinhosa”, mas “compensadora”. Apontam a vida sexual como um tema importante, concreto, real e necessário, sobretudo para os jovens (mas não só). Aconselham a revista a prosseguir a mesma estratégia de incentivo à informação e discussão: “Continuem da forma como estão a fazer para bem dos jovens sobretudo, e tão ignorantes que ainda estamos e tão abandonados” (A PALAVRA..., 1975b, p. 3). O agendamento da história pessoal sexual de Gisela é definido como educativo, promotor do diálogo intergeracional: “Pela minha experiência digo-vos que é uma revista que estabelece diálogo entre mãe e filha. Há assuntos que só agora eu e a minha filha discutimos pois lemos a mesma revista” (A PALAVRA..., 1976a, p. 3).

Manifesto homosexual e manifesto das prostitutas de Lisboa

No mesmo ano do Dossier Gisela, o recém-criado Movimento de Libertação da Mulher (MLM) organiza uma manifestação no Parque Eduardo VII, em Lisboa. Propõe-se a denunciar a discriminação das mulheres em Portugal, queimando símbolos da opressão feminina, nomeadamente o Código Civil, revistas pornográficas, brinquedos sexistas, objetos da lida doméstica, entre outros. A manifestação do MLM constitui-se em um momento simultaneamente transgressivo e reivindicativo da afirmação da cidadania da sexualidade em Portugal (WEEKS, 1998). Mas não se faz sem contestação. A iniciativa é surpreendida por uma contramanifestação de homens e mulheres investidos em humilhar e desmobilizar as feministas. No artigo Mulher Portuguesa vítima de duas ditaduras, publicado na revista Mulher – Modas & Bordados (MULHER...1975, p. 3-5), descrevem-se os insultos que escutam as manifestantes: “mulheres só na cama”, “vão para casa coser meias, o vosso lugar é em casa, não é na ruas” (MULHER..., 1975, p. 4). Os contramanifestantes estavam investidos em desmobilizar, descredibilizar e silenciar os protestos contra os papéis sociais desiguais de gênero. Ao contrário do Dossier Gisela, o tema da manifestação feminista e da contramanifestação não inspiram significativamente a participação e o debate midiático das leitoras nos dias seguintes.

Em 1974, duas semanas após a Revolução dos Cravos, é publicado, no Diário de Lisboa (DL), um manifesto homossexual pioneiro em Portugal. Intitula-se Liberdade para as Minorias Sexuais e vem assinado pelo recém-criado Movimento de Acção Homossexual Revolucionária (MAHR). Reivindica-se no texto “a abolição imediata do art. 71, n.° 4 do Código Penal, que reputa, ambiguamente, de passíveis de medidas de segurança as práticas homossexuais”. Exige-se o direito à “livre prática homossexual”; o direito a contestar-se juridicamente os “actos de chantagem, extorsão e perseguição” de que eram alvo os homossexuais portugueses à época; o direito à “livre reunião de núcleos homossexuais”; o direito à participação em órgãos informativos (para esclarecimento sobre liberdade homossexual); e o direito à educação sexual em todas as escolas (não discriminatória das práticas homossexuais) (LIBERDADE..., 1974, p. 28). Mas rapidamente o manifesto, que define a homossexualidade como um “facto estatística e socialmente irreversível”, é alvo de críticas por parte de um membro do Conselho da Revolução. Num comunicado lido na televisão pública portuguesa (RTP), o General Galvão de Melo condena “a ignóbil transcrição em jornais, que estão ao alcance de qualquer criança, do comunicado das prostitutas e dos homossexuais, numa demonstração de imoralidade sem precedentes em qualquer país em que a família e a moral existem ainda como valores” (BRANDÃO, 2008, 16). Nesta comunicação televisiva há referências a um outro manifesto. Trata-se de um documento subscrito por 469 prostitutas de Lisboa, reivindicando direitos sociais e políticos, nomeadamente a possibilidade de participação destas mulheres na construção de um novo país democrático. Este manifesto, que defende “o amor livre”, é entregue para discussão numa reunião do Movimento Democrático das Mulheres (MDM), conforme se descreve na reportagem publicada no Diário de Lisboa, a 18 de maio de 1974. As prostitutas reivindicam às feministas do MDM (surgido em 1968), a importância da criação de um sindicato e de um instituto de caráter assistencial, a definição de medidas de combate ao exercício exclusivo em “boîtes de luxo” e a realização de um “trottoir livre” nas ruas de Lisboa, com o objetivo de contribuir para o turismo nacional (REUNIÃO..., 1974, p. 4). No manifesto das prostitutas propõe-se ainda que sejam efetuados descontos (50%) em todos os serviços prestados aos elementos do Movimento das Forças Armadas (com patentes abaixo de alferes), pelo prazo de um ano. As subscritoras, que pretendem participar do processo de construção democrática, terminam o documento dando vivas ao “amor livre”, à revolução e a Portugal.

Na reportagem do Diário de Lisboa, lê-se que o manifesto das prostitutas foi recebido com “incômodo” na reunião do MDM. Citadas pelo jornal, as feministas alegam que a prostituição serve ao capitalismo, que o documento não aborda a questão com profundidade, que “o sexo não deve ser uma razão de existir” e que não defendem o “amor livre” (REUNIÃO..., 1974, p. 4).

Embora sejam diversos os assuntos da intimidade que chegam à agenda dos media entre 1968 e 1978, nem todos potenciam a discussão aprofundada e participativa entre jornalistas, opinion makers e leitores(as). A manifestação feminista do MLM e os manifestos pela defesa dos direitos dos homossexuais e das prostitutas não geram diálogo como o caso da adolescente que fez amor na noite de 25 de abril de 1974, apesar de as suas reivindicações serem descredibilizadas ou atacadas por organizações (formais ou informais) de natureza política e social.

Poucos meses após a Revolução dos Cravos, Fernando Ribeiro de Mello (criador e editor da Afrodite) escreve, num artigo de opinião publicado no semanário Expresso (MELO, 1974, p. 27), que Portugal precisava urgentemente de uma revolução sexual. Que era preciso legalizar a homossexualidade, emancipar a mulher e conceder o “direito à plena expressão da personalidade sexual de cada um”, através de medidas legislativas e de educação sexual “frontal” e “clara”, desde a escola (FREIRE, 2016). Para o editor da Afrodite, uma sociedade democrática não podia tratar de forma discriminatória e desigual (portanto contrarrevolucionária) os seus cidadãos, fosse em função da sua sexualidade ou do seu gênero. Segundo Fernando Ribeiro de Mello, o que estava em causa eram direitos políticos e de cidadania:

Enquanto as chamadas minorias sexuais ou eróticas continuarem marginalizadas dos Estatutos Sociais, enquanto, por exemplo, a ilegalidade e clandestinização da homossexualidade masculina e feminina continuar a ser o prato forte da moralidade à portuguesa, os problemas manter-se-ão e viveremos numa sociedade contra-revolucionária. [...] nada será possível ou verdade enquanto à mulher não forem garantidos os meios sócio-económicos, culturais e profissionais (políticos) necessários à sua livre e plena expressão, ou seja, à sua intervenção. (MELO, 1974, p. 27).

No final dos anos 1970, numa entrevista que o poeta Eugénio de Andrade concede ao jornalista Vicente Jorge Silva (1978), a sociedade portuguesa é descrita como não se tendo democratizado no plano da sexualidade, mantendo-se profundamente intolerante em relação à homossexualidade e profundamente machista.

Ainda no outro dia, eu vinha com um grupo de jovens num comboio e todos falavam com grande liberdade. A certa altura eu perguntei “e se entre vocês se verificasse que havia um homossexual?” Ficaram todos muito atrapalhados. Vê? E nas relações entre homens e mulheres é a mesma coisa. Você não acha que o machismo continua de uma maneira escandalosa? (SILVA, 1978, p. 23).

Eugénio de Andrade defende que o 25 de abril de 1974 não representou uma mudança efetiva no âmbito – político e cívico – da intimidade.

O debate sobre cidadania íntima a partir de histórias pessoais

A narrativa da adolescente que fez amor na noite de 25 de abril de 1974 promove um debate sobre a forma como queremos viver o corpo, a sexualidade, os afetos, os relacionamentos, a maternidade, a identidade, estimulando uma reflexão sobre cidadania íntima (PLUMMER, 2003a).

O direito à sexualidade feminina, juvenil e pré-conjugal, reivindicado por Gisela na carta enviada à M&B remete-nos para o conceito de would-be sexual citizen, alguém que se coloca na vanguarda, um experimentador com o self e com os relacionamentos (WEEKS, 1998). A importância deste(a) would-be sexual citizen passa por colocar desafios e reivindicações a uma audiência, requerendo também respostas de um corpo institucional político (WEEKS, 1998). Relembramos que o artigo 1636 do Código Civil de 1966 estabelecia que o matrimônio podia ser anulado em caso de falta de virgindade da mulher ao tempo do casamento, preceito que só desaparece em 1977, com a entrada em vigor da revisão do Código Civil.

Plummer (2003a, p. 16) defende que precisamos encontrar respostas para as interrogações com que nos confrontamos nos nossos dias – e. g. como devemos conduzir a nossa vida pessoal – não em discussões sobre princípios abstratos, mas em histórias de vida, autobiografias e outras narrativas pessoais (storytelling). Ao coro de vozes que refletem o pessoal, o local e o situacional, evidenciando emoções, Plummer (2003a) chama moralidades concretas ou enraizadas e apela às ciências sociais para que lhes dediquem mais atenção e estudo. A expressão destas moralidades pela narração de histórias é fundamental para a vida social, uma vez que os sistemas éticos se constroem em seu torno (PLUMMER, 2003a). É certo que a importância do storytelling não é de hoje. Porém, atualmente temos mais meios de comunicação e novas esferas públicas onde contar as nossas histórias. Há mais gente a dizê-las e mais gente a ouvi-las, mais gente de acordo e em desacordo, maior diálogo (PLUMMER, 2003a). “Deparamo-nos com uma sociedade que vai perdendo cada vez mais uma qualquer grande narrativa de como viver a vida pessoal. [...] quase toda a gente acredita que tem o direito de escolher a forma como quer viver a sua” (PLUMMER, 2005, p. 80). Dos talk shows aos filmes caseiros, dos Parlamentos à mídia, das ruas aos blogs pessoais na Internet, escutamos agora as verdades de diferentes vozes, ouvimos todos os que querem falar, mas enquanto algumas barreiras são removidas, outras são levantadas (WEEKS, 2007).

Analisando narrativas pessoais sexuais entre jovens da China atual, Farrer (2007) defende que as esferas públicas de partilha das histórias são ‘apanhadas’ por projetos comerciais, políticos, científicos, entre outros; e que todos os discursos de cidadania da sexualidade são simultaneamente discursos de exclusão, produzindo constantemente novas narrativas de resistência.

Kornatzki e outros (2015) valorizam as possibilidades pedagógicas do digital storytelling (histórias produzidas para meios digitais que implicam o uso de texto, imagem, vídeo, áudio, música) na problematização da sexualidade e do gênero, entre professores(as) e alunos(as). Os projetos que envolvem a aplicação destas narrativas digitais em contexto educativo com enfoque na cidadania íntima são cada vez mais numerosos e diversificados no mundo, havendo um interesse crescente pelo estudo das suas potencialidades (KORNATZKI et al., 2015). Estas narrativas digitais expressam expectativas sociais, suas fugas e resistências, abrindo diferentes possibilidades de ser e existir no mundo: “pelas possibilidades de expressão de si, de sujeitos e subjetividades, contribuem para a construção da sexualidade e do gênero” (KORNATZKI et al., 2015, p. 1053).

Existem razões para que as histórias pessoais sexuais se afirmem com sucesso no seu tempo ou para que se mantenham adormecidas, dormentes, dissidentes, até inoperantes (PLUMMER, 1996).

[...] pouco a pouco as histórias pessoais começam a sair de um pequeno espaço da imaginação para uma língua, através de alguns narradores e numa comunidade já amadurecida e pronta para escutar. O que é crucial neste processo é o momento em que estes contadores de histórias pessoais aparecem à vista do público: escrevendo livros, revistas, aparecendo em outros meios de comunicação, etc. (PLUMMER, 1996, p. 43).

A força das histórias pessoais sexuais passa por existir quem as ouça e aprecie, quem as integre numa comunidade (de suporte e interpretação) mais ampla, que lhes permita prosperar. Estes mundos sociais não precisam ser comunidades localizadas, basta que haja “um sentido de pertença partilhando tradições e tendo memórias em comum” (PLUMMER, 1996, p. 36).

Alguns destes mundos sociais podem já pré-existir, enquanto outros podem ser formados pelas histórias. Assim, há muitos mundos sociais pré-existentes em função da idade (mundos juvenis, mundos infantis), da raça (mundos afro, hispânicos, asiáticos), do género e da classe, que fornecem fóruns para conversar e contar histórias. [...] Outros “mundos” parecem surgir em torno destas histórias. (PLUMMER, 1996, p. 43-44).

A carta de Gisela traz-nos uma história pessoal sexual. Trata-se de uma moralidade enraizada no quotidiano. A adolescente levanta a sua voz contra um padrão de ausência de diversidade na expressão de escolhas íntimas. As leitoras-comentadoras que expõem as suas visões e escolhas nas cartas que enviam à redação representam igualmente uma nova possibilidade de pensar, dizer e viver a intimidade. Em causa está um sentido de democratização das narrativas sexuais, uma ‘vontade’ de fazer baixar barreiras morais (WEEKS, 2007).

A narrativa de Gisela encontrou na revista M&B e nas suas leitoras o suporte e a interpretação de que nos fala Plummer (1996). Além disso, o período em que a história pessoal da adolescente deixa a ‘dormência’ é propício ao coming out de narrativas em torno da sexualidade em geral e da sexualidade feminina em particular. As décadas de 1960 e 1970 representam uma tendência de sexualização das sociedades capitalistas modernas, de feminização do sexo e de democratização da intimidade.

Seidman (2010) lembra que, entre os anos 1920 e 1930, ocorre nos EUA uma sexualização do amor e uma erotização do sexo, contextualizadas por uma enxurrada de livros, monografias e publicações periódicas que escrutinam exaustivamente todo e qualquer aspecto da intimidade. Esta vasta produção discursiva sugere que as convenções matrimoniais estavam a mudar, que aos cônjuges era então permitido explorar o prazer, estudando e experimentando técnicas, posições, zonas eróticas, mas o prazer sexual não deixa de estar casado com a cultura do amor romântico (SEIDMAN, 2010, p. 179). Com a chamada revolução sexual das décadas de 1960 e 1970, perde-se a conexão entre erotismo e amor romântico. O prazer sexual passa a ser tolerado mesmo que dissociado do amor ou do casamento. Valoriza-se o sexo como fonte de prazer e de expressão do self (SEIDMAN, 2010).

Na imprensa portuguesa, na passagem da ditadura para a democracia, não parece haver lugar para uma consistente transgressão e reivindicação do direito ao erotismo e ao prazer sexual desagarrados dos afetos (WEEKS, 1998). O sexo sem amor (o prazer sexual em si, por si) não é um discurso que se afirme nas mídias analisadas. Entre os finais de 1960 e 1970, o “amor livre” ensaia-se nas páginas dos jornais e revistas, mas apenas enquanto liberdade para amar (exatamente como acontece no Dossier Gisela).

Conclusões

Laura Larcher Graça defende em 1968, na publicação sobre o Casamento (O CASAMENTO, 1968, p. 168), a importância de se substituir a “moral sexofóbica” do Estado Novo por uma moral “afirmadora do sexo”. Na imprensa portuguesa do período pós-25 de abril de 1974, revelam-se sinais de uma tendência evocativa e “afirmadora” da sexualidade. Em certos jornais e revistas (Diário de Lisboa, Expresso e Crónica Feminina) ganham voz denúncias (pessoais e coletivas) em torno da desigualdade, da discriminação, do estigma, da ilegalidade, da patologização e da desproteção social de vivências íntimas afetivas e sexuais. As notícias dão conta de lutas que se travam no pós-Revolução dos Cravos em defesa da emancipação feminina e da igualdade de gênero, em defesa da sexualização do amor, em defesa da sexualidade juvenil, do divórcio, da contracepção, do aborto, da pornografia, da homossexualidade e da prostituição. Noticiam-se iniciativas de cidadãos(ãs), de grupos de cidadãos(ãs) ou de organismos, envolvidos com as questões do gênero e da saúde sexual e reprodutiva (Movimento de Libertação da Mulher, Movimento Democrático das Mulheres, Associação para o Planeamento da Família, Movimento para a Contraceção e Aborto Livre e Gratuito, Movimento Pró-divórcio, Movimento de Acção Homossexual Revolucionária, 469 prostitutas de Lisboa).

Embora o pós-Revolução dos Cravos se revele um momento de ‘desoclusão’ dos discursos em torno dos afetos e sexualidades veiculados na mídia (FREIRE, 2017), em publicações sensíveis à discussão do lugar da mulher na sociedade, fala-se mais, com maior visibilidade, maior regularidade e numa perspectiva tendencialmente mais liberalizante. O Dossier Gisela, o manifesto “Liberdade para as Minorias Sexuais” (do Movimento de Acção Homossexual Revolucionária) e o manifesto das 469 prostitutas de Lisboa são marcos de relevo nas reivindicações por uma “pluralidade conjugatória” dos afetos e das sexualidades, no contexto da imprensa do pós-revolução de 25 de abril de 1974 (PAIS, 1998, p. 408). Trazem às esferas midiáticas novas narrativas sobre a vida pessoal, novas subjetividades e a afirmação da necessidade de democratizar os relacionamentos (WEEKS, 1998). Os três discursos remetem-nos para a ideia de um(a) cidadão(ã) sexual em construção, emergindo no contexto de novas histórias sobre o self, sobre a sexualidade e o gênero, denunciando a exclusão (pelo gênero, pela orientação sexual) e reivindicando a inclusão por direitos iguais (políticos e sociais) (WEEKS, 1998). Gisela, os homossexuais que redigem o manifesto e o fazem publicar, ou as prostitutas que levam as suas preocupações à reunião do MDM contribuem para uma “descolonização do privado”, que o público longamente colonizou (DAOUST, 2005).

Efetivamente, no período de transição da ditadura para a democracia, a sexualidade afirma-se, na mídia portuguesa, um assunto de interesse público, político e social, embora de forma variável e pleno de contradições. Dão-se passos importantes para o seu entendimento enquanto elemento de um processo mais vasto de construção da identidade e da cidadania, ainda hoje inacabado. Richardson (2017) diz-nos que podemos diferenciar duas expressões na reinvindicação da cidadania íntima: uma que é pessoal e individual, outra que é coletiva, de grupos sociais (RICHARDSON, 2017). Gisela reivindica direitos de cidadania através da sua história pessoal sexual. Segundo Plummer (1994), as reivindicações da intimidade desenvolvidas a partir da ideia de storytelling, de casos vividos, revelam-se da maior importância. A história pessoal da iniciação sexual de Gisela é contada em 1975 (um ano depois de vivida, na noite da Revolução dos Cravos), num contexto editorial sensível à emancipação feminina, à igualdade de gênero, à liberalização da sexualidade, à promoção da saúde sexual e reprodutiva. A comunidade de leitoras reage positivamente, participando da reflexão, debatendo os termos da denúncia (de falta de liberdade sexual para as jovens em Portugal) e discutindo a reivindicação do direito de todas as mulheres à sexualidade, independentemente da idade, do estado civil e da motivação (reprodutiva ou recreativa). Enquanto promotora do debate, também a revista M&B se envolve na construção dessa nova cidadania da sexualidade (ou cidadania íntima).

Nas discursividades analisadas há uma preocupação com o self e uma disponibilidade para falar dele, contrastante com gerações anteriores (educadas a não olhar para dentro, a não pensar em sentimentos, a não tomar decisões e a não falar delas no espaço público) (PLUMMER, 2003). Defende-se a autodeterminação em sede da sexualidade, por oposição a uma ideia de regulação social por princípios absolutos. Vai-se ao encontro de uma tendência crescente nas últimas décadas, de substituição dos controles e disciplinas externas aos indivíduos por controles e disciplinas internas (BOZON, 2005; GIDDENS, 2001; SCOTT, 1998; WEEKS, 1995) – com a mídia a revelar-se fonte influente para a sua definição (e controle) (BOZON, 2006). E com as histórias pessoais sexuais a revelarem-se importantes para refletir sobre os nossos sistemas éticos da sexualidade, sobre o sentido da intimidade, facilitando-nos a compreensão das identidades, da cidadania, do presente e do passado (PLUMMER, 1996).

1Redefinida em 1972 como “exame prévio” pelo Governo de Marcelo Caetano.

2Num caderno do Expresso intitulado O que a Censura Cortou entre 1973 (data da criação do semanário) e 1974 (data da Revolução dos Cravos), editado pelo jornalista José Pedro Castanheira (em 2009), elencam-se cortes operados pelo Exame Prévio, relativos à temática da sexualidade: partes de uma notícia sobre O Último Tango em Paris, de um artigo sobre o aborto em França, as “cenas de amor vibrante” num conto de Luís Cajão (A Flor e a Nuvem), sugestões de leitura de Wilhelm Reich numa peça sobre educação sexual, os nomes das testemunhas abonatórias das três Marias (autoras das Novas Cartas Portuguesas), no seu julgamento por atentado à moral pública, entre outras.

3Cinema, alguns cortes: censura é um documentário que Manuel Mozos realiza em 1999. Compila cenas amputadas pela censura aos filmes estrangeiros que se exibiram em Portugal, entre 1930 e 1970.

4Antologia de Poesia Portuguesa Erótica e Satírica, organizada por Natália Correia em 1966 ou As Novas Cartas Portuguesas, de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, publicadas em 1972, são exemplos de como o Estado Novo levou a tribunal escritores e editores por obscenidade e ofensa à moral pública.

5O artigo 1636 do Código Civil de 1966 estabelecia que o matrimônio podia ser anulado em caso de falta de virgindade da mulher ao tempo do casamento.

6Os casamentos celebrados pela Igreja passam a poder obter divórcio civil com o Decreto-Lei nº 187, de 4 de abril de 1975.

7Maria Antónia Fiadeiro foi uma das fundadoras da Liga dos Direitos das Mulheres. Teve um papel relevante no desenvolvimento da saúde sexual e reprodutiva em Portugal, após 25 de abril de 1974. Entre 1978 e 1981, integrou a Direção da Associação para o Planeamento da Família (criada em 1967). Em 2003, publicou uma biografia de Maria Lamas, escritora, jornalista, diretora da M&B nos anos 1930 e 1940, e presidente do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, marcando a luta pela emancipação feminina no Estado Novo.

8O inquérito foi realizado pelo Gabinete de Estudos e Projectos de Desenvolvimento Sócio-Económico/Juventude Universitária Católica e intitula-se Situação e opinião dos universitários (1967).

Referências

A PALAVRA às leitoras. O Século, Suplemento Mulher - Modas & Bordados, Lisboa, nº 3317, p. 3, 10 set. 1975a. [ Links ]

A PALAVRA às leitoras. O Século, Suplemento Mulher - Modas & Bordados, Lisboa, nº 3322, p. 3, 15 out. 1975b. [ Links ]

A PALAVRA às leitoras. O Século, Suplemento Mulher - Modas & Bordados, Lisboa, nº 3326, p. 3, 21 jan. 1976a. [ Links ]

A PALAVRA às leitoras. O Século, Suplemento Mulher - Modas & Bordados, Lisboa, nº 3334, p. 2, 24 mar. 1976b. [ Links ]

ABOIM, Sofia. Vidas conjugais: do institucionalismo ao elogio da relação. In: ALMEIDA, Ana Nunes. (coord.). História da vida privada em Portugal: os nossos dias. Lisboa: Círculo de Leitores, 2011. v. 3, p. 80-111. [ Links ]

ALMEIDA, Ana Nunes; WALL, Karin. Família e quotidiano: movimentos e sinais de mudança. In: BRITO, J. M. Brandão. (coord.). O país em revolução. Lisboa: Editorial Notícias, 2001. p. 277-309. [ Links ]

BEBIANO, Rui. O poder da imaginação: juventude, rebeldia e resistência nos anos 60. Coimbra: Angelus Novus, 2003. [ Links ]

BOZON, Michel. Libération sexuelle ou déplacement des controles? Discours, normes et conduites. In: DORIN, Elsa; FASSIN, Éric. (org.). Genres & Sexualités. Paris: Bibliothèque Centre Pompidou, 2006. p. 145-160. [ Links ]

BOZON, Michel. Sociologie de la sexualité. Paris: Armand Colin, 2005. [ Links ]

BRANDÃO, Ana Maria. Breve contributo para uma história da luta pelos direitos de gays e lésbicas na sociedade portuguesa. In: SEMANA PEDAGÓGICA DA UNIÃO DE MULHERES ALTERNATIVA E RESPOSTA, 1. Braga, Portugal, 2008. Anais [...]. Braga: Universidade do Minho, 2008. p. 1-22. Disponível em: https://bit.ly/2EjSxqY. Acesso em: 2 set. 2018. [ Links ]

CORREIA, Natália. Não percas a rosa: diário e algo mais (25 de abril de 1974 - 20 de dezembro de 1975). Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1978. [ Links ]

COSTA, Bénard da. O acto e a aposta. Expresso, Lisboa, nº 70, p. 30, 4 maio 1974. [ Links ]

DAOUST, Valérie. De la sexualité en démocratie: l’individu libre et ses espaces identitaires. Paris: Press Universitaires de France, 2005. [ Links ]

ESCOFFIER, Jeffrey. La pornographie, la perversité et la révolution sexuelle. In: GIAMI, Alain; Hekma, Gert. (org.). Révolutions sexuelles. Paris: La Musardine, 2015. p. 303-326. [ Links ]

EVANS, David. Sexual citizenship: the material construction of sexualities. London: Routledge, 1993. [ Links ]

FARRER, James. Sexual citizenship and the politics of sexual story-telling among chinese youth. In: JEFFREYS, Elaine. (ed.). Sex and sexuality in China. Londres: Routledge, 2007. p. 102-123. [ Links ]

FOUCAULT, Michel. História da sexualidade: a vontade de saber. Lisboa: Relógio d'Água, 1994. v. 1. Originalmente publicado em 1976. [ Links ]

FRANCO, Graça. A censura à imprensa (1820-1974). Lisboa: Imprensa Nacional, 1993. [ Links ]

FREIRE, Isabel. A intimidade afetiva e sexual na imprensa em Portugal (1968-1978). 2016. Tese (Doutorado em Sociologia) – Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal, 2016. [ Links ]

FREIRE, Isabel. Amor e sexo no tempo de Salazar. Lisboa: Esfera dos Livros, 2010. [ Links ]

FREIRE, Isabel. Lugares d'Infância. In: REGO, Paula. Histórias & segredos. Cascais: Casa das Histórias Paula Rego, 2017. p. 13-19. [ Links ]

GARTON, Stephen. História da sexualidade: da antiguidade à revolução sexual. Lisboa: Estampa, 2009. [ Links ]

GIAMI, Alain. Les thérapies de la libération sexuelle en France: entre politique et psychologie. In: GIAMI, Alain; HEKMA, Gert. (org.). Révolutions sexuelles. Paris: La Musardine, 2015. p. 161-196. [ Links ]

GIDDENS, Anthony. Transformações da intimidade, sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. Oeiras: Celta Editora, 2001. [ Links ]

GIRARD, Françoise. Negotiating sexual rights and sexual orientation at the UN. In: PARKER, Richard; PETCHESKY, Rosalind; SEMBER, Robert. (ed.). Sex politics: reports from the front lines. [S. l.]: Sexuality Policy Watch, 2008. p. 311-358. Disponível em: https://bit.ly/2In38Wf. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

GISELA [pseudônimo]. Fiz amor na noite do 25 de abril. O Século, Suplemento Mulher - Modas & Bordados, Lisboa, nº 3300, p. 3, 1975. [ Links ]

HEALEY, Dan. La revolution sexuelle en URSS: des changements dynamiques sous la glace. In: GIAMI, Alain; HEKMA, Gert. (org.). Révolutions sexuelles. Paris: La Musardine, 2015. p. 279-301. [ Links ]

HEKMA, Gert. Déclin et permanence des normes puritaines. In: GIAMI, Alain; HEKMA, Gert. (org.). Révolutions sexuelles. Paris: La Musardine, 2015. p. 251-276. [ Links ]

HERZOG, Dagmar. Sexuality in the postwar west. The Journal of Modern History, [S. l.], v. 78, n. 1, p. 144-171, mar. 2006. Disponível em: https://bit.ly/2EkzgWx. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

IRVINE, Janice. Is sexuality research ‘dirty work’? Institutionalized stigma in the production of sexual knowledge. Sexualities, [S. l.], v. 17, n. 5/6, p. 632-656, 2014. Disponível em: https://bit.ly/2TUmfYU. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

KORNATZKI, Luciana; CHAGAS, Maria Isabel Seixas da Cunha. Histórias e narrativas digitais na educação sexual na infância: possibilidades e limitações. Perspectiva, Florianópolis, v. 33, n. 3, set./dez. 2015. p. 1041-1068. Disponível em: https://bit.ly/2TWUjDZ. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

LIBERDADE para as Minorias Sexuais, Diário de Lisboa, Lisboa, Ano 54, nº 18.456, p. 28, 13 maio 1974. [ Links ]

MCCOMBS, Maxwell. A Teoria da Agenda: a Mídia e a opinião pública. Petrópolis: Editora Vozes, 2009. [ Links ]

MELLO, Fernando Ribeiro de. Deve censurar-se a pornografia?. Expresso, Lisboa, nº 93, p. 27, 12 out. 1974. [ Links ]

MOSSUZ-LAVAU, Janine. Révolution ou libération sexuelle des françaises? In: GIAMI, Alain; HEKMA, Gert. (org.). Révolutions sexuelles. Paris: La Musardine, 2015. p. 227-247. [ Links ]

MULHER Portuguesa vítima de duas ditaduras. O Século, Suplemento Mulher - Modas & Bordados, Lisboa, nº 3287, p. 3-5, 12 fev. 1975. [ Links ]

NEVES, Helena. O Movimento Feminista. In: GOMES, Francisco Allen; ALBUQUERQUE, Afonso; NUNES, J. Silveira. (coord.). Sexologia em Portugal – sexualidade e cultura. Lisboa: Texto Editora, 1987. v. 2, p. 89-102. [ Links ]

O CASAMENTO. Cadernos O Tempo e o Modo, Lisboa, p. 129-241, 1968. [ Links ]

PAIS, José Machado. (coord.). Gerações e valores na sociedade portuguesa contemporânea. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais, 1998. [ Links ]

PLUMMER, Ken. “I can’t even think straight” - “Queer” theory and the missing sexual revolution in sociology. Sociological Theory, [S. l.], v. 12, n. 2, p. 178-187, jul. 1994. Disponível em: https://bit.ly/2BCTHMz. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

PLUMMER, Ken. Intimate citizenship and the culture of sexual story telling. In: WEEKS, Jeffrey; HOLLAN, Janet. (ed.). Sexual cultures. Communities, values and intimacy. London: Macmillan Press, 1996. p. 34-52. [ Links ]

PLUMMER. Ken. Intimate citizenship: private decisions and public dialogues. Seattle: University of Washington Press, 2003. [ Links ]

PLUMMER. Ken. Intimate citizenship: private decisions and public dialogues. Seattle: University of Washington Press, 2003a. [ Links ]

REUNIÃO de esclarecimento promovida pelo Movimento Democrático das Mulheres, Diário de Lisboa, Lisboa, Ano 54, nº 18461, p. 4, 18 maio 1974. [ Links ]

RICHARDSON, Diane. Rethinking Sexual Citizenship. Sociology, [S. l.], v. 51, n. 2, p. 208-224, 2017. Disponível em: https://bit.ly/2EiMR0c. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

SCOTT, Jacqueline. Changing attitudes to sexual morality: A cross-national comparison. Sociology, [S. l.], v. 32, n. 4, p. 815-845, 1998. [ Links ]

SEIDMAN, Steven. The social construction of sexuality. 2. ed. New York: W. W. Norton & Company, 2010. Originalmente publicado em 2003. [ Links ]

SILVA, Vicente Jorge. Eugénio de Andrade [entrevista]. Expresso, Lisboa, nº 291, p. 22-23, 27 maio 1978. [ Links ]

TAVARES, Manuela. Movimentos de mulheres em Portugal: décadas de 70 e 80. Lisboa: Livros Horizonte, 2000. [ Links ]

TISSERON, Serge. Intimité et extimité. Communications, [S. l.], n. 88, p. 83-91, 2011. Disponível em: https://bit.ly/2EiH6zS. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

TISSERON, Serge. Le désir “d'extimité” mis à nu. Le Divan Familial, v. 2, n. 11, p. 53-62, 2003. Disponível em: https://bit.ly/2Inqxqv. Acesso em: 10 set. 2018. [ Links ]

WALL, Karin. A intervenção do Estado: políticas públicas de família. In: ALMEIDA, Ana Nunes. (coord.). História da vida privada em Portugal: os nossos dias. 1. ed. Lisboa: Círculo de Leitores, 2011. v. 3, p. 340-374. [ Links ]

WEEKS, Jeffrey. Invented moralities: sexual values in an Age of Uncertainty. Cambridge: Polity Press, 1995. [ Links ]

WEEKS, Jeffrey. The sexual citizen. Theory culture society, [S. l.], v. 15, n. 3-4, p. 35-42, 1998. [ Links ]

WEEKS, Jeffrey. The world we have won: the remaking of erotic and intimate life. London: Routledge, 2007. [ Links ]

XAVIER FILHA, Constantina. Discursos da intimidade: imprensa feminina e narrativas de mulheres-professoras brasileiras e portuguesas na segunda metade do século XX. 2005. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997. [ Links ]

Recebido: 05 de Setembro de 2017; Aceito: 06 de Dezembro de 2018

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado.