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Estudos em Avaliação Educacional

versão impressa ISSN 0103-6831versão On-line ISSN 1984-932X

Est. Aval. Educ. vol.30 no.74 São Paulo maio/ago 2019  Epub 22-Out-2019

https://doi.org/10.18222/eae.v30i74.3861 

ARTIGOS

A LITERATURA EM PROVAS E EXAMES: VESTIBULAR DA UFPE E ENEM

LA LITERATURA EN PRUEBAS Y EXÁMENES: EXAMEN DE INGRESO A LA UFPE Y ENEM

LITERATURE ON TESTING AND EXAMS: THE ENTRANCE EXAM OF UFPE AND ENEM

IUniversidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife-PE, Brasil; livia.suassuna@ufpe.br

IIUniversidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife-PE, Brasil; lima.thays@hotmail.com


RESUMO

O objetivo deste artigo é analisar as provas de literatura do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e do vestibular da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) para averiguar se ambas estão em consonância com o princípio teórico-metodológico do letramento literário. Realizou-se uma pesquisa quanti-qualitativa, descritiva e interpretativa, mediante análise de um corpus formado pelas provas de literatura da UFPE e do Enem, aplicadas, respectivamente, em dezembro e outubro de 2013. Os resultados indicaram que os exames são condizentes com os seus documentos normatizadores; que a prova de literatura do Enem mais se aproxima da ideia de letramento literário e que entre elas há mais diferenças: a prova de literatura da UFPE é mais conteudista e valora mais o cânone do que a prova do Enem, que é mais construtivista e cognitivista.

PALAVRAS-CHAVE: VESTIBULAR; ENEM; LETRAMENTO LITERÁRIO; AVALIAÇÃO.

RESUMEN

El objetivo de este artículo es analizar las pruebas de literatura del Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) y del examen de ingreso de la Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) para averiguar si ambas están en consonancia con el principio teórico-metodológico de cultura literaria. Se realizó un estudio cuanti-cualitativo, descriptivo e interpretativo, mediante análisis de un corpus formado por la prueba de literatura de la UFPE y del Enem aplicadas, respectivamente, en diciembre y octubre de 2013. Los resultados indicaron que los exámenes resultan acordes con sus documentos reguladores; que la prueba de literatura del Enem se acerca más a la idea de cultura literaria y que entre ellas hay más diferencias: la prueba de literatura de la UFPE está más relacionada con el contenido y valora más el canon que la prueba del Enem, que es más constructivista y cognitivista.

PALABRAS CLAVE: EXAMEN DE INGRESO A LA UNIVERSIDAD; ENEM; CULTURA LITERARIA; EVALUACIÓN.

ABSTRACT

The aim of this article is to analyze the literature exams of the National Secondary School Exam (ENEM) and the entrance exam of the Federal University of Pernambuco (UFPE) to determine if both are consistent with the theoretical and methodological principle of literary literacy. A quantitative-qualitative, descriptive and interpretative study was conducted by analyzing a corpus formed by the UFPE and ENEM literature tests applied in December and October 2013, respectively. The results indicated that the exams are consistent with their standardizing documents; that the ENEM literature test is closer to the idea of literary literacy. Also, that there are other differences between them: the UFPE literature test is more content-oriented and gives more weight to the standard texts than the ENEM test, which is more constructivist and cognitivist.

KEYWORDS: ENTRANCE EXAM; ENEM; LITERARY LITERACY; ASSESSMENT.

INTRODUÇÃO

O presente estudo originou-se de uma pesquisa desenvolvida durante três anos no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Federal de Pernambuco (Pibic-UFPE). O grande projeto se intitulava “Ensino de literatura - representações e práticas” e tinha como principal baliza teórica a ideia de que o ensino de literatura, para além de uma abordagem historicista, deve consistir num

[...] trabalho voltado para a interação do aluno com o texto, no qual a seleção de obras que dialoguem com o horizonte de expectativas do leitor e a análise literária dessas obras permitam ao educando construir sentidos para o texto a partir de suas vivências. (RAMOS; ZANOLLA, 2009, p. 65)

As autoras citadas tecem uma crítica ao ensino de cunho historicista, marcado pela fragmentação e por informações externas e superficiais sobre a literatura, em prejuízo da fruição de textos e de sua compreensão e interpretação.

Tendo isso em mente, no Pibic 2011-2012, investigamos, por meio de dois subprojetos: (1) como a literatura estava posta nos documentos curriculares oficiais do estado de Pernambuco;1 e (2) como ocorria o ensino de literatura em salas de aula dos níveis fundamental e médio.2 Em 2012-2013, voltamos nossa atenção para as formas como professores e alunos constroem representações em torno do ensino de literatura; no primeiro caso, objetivamos conhecer o que professores de nível médio pensavam sobre os documentos curriculares oficiais de Pernambuco e como, a partir deles, fabricavam suas práticas de ensino; no segundo caso, nossa intenção era saber o que os alunos pensavam acerca da literatura e como percebiam o ensino desse conteúdo.

Os dados obtidos em tais pesquisas nos levaram a ter interesse pela inserção e tratamento dos conteúdos de literatura nos exames de acesso ao ensino superior, primeiramente, porque a literatura se constitui como disciplina autônoma no ensino médio (EM) e, em segundo lugar, porque alunos e professores se remetem a essas provas em seus discursos - seja por tomá-las como indicadores do que é preciso ensinar, seja por entender que o sucesso nos exames é garantia da qualidade do ensino. Com efeito, exames vestibulares, em larga medida, interferem na dinâmica da escola, do currículo e da sala de aula, como atesta Abaurre (1995).

De outra parte, os anos 1990 se caracterizaram pelo traçado de algumas políticas educacionais específicas, tendo em vista o processo de globalização, o reordenamento do capitalismo e dos modos de produção, e a divisão internacional do trabalho, os quais passaram a exigir reformas curriculares que adequassem o ensino a essa nova realidade, bem como a implantação de sistemáticas de avaliação de rede escolar. Nesse contexto, instituiu-se uma ampla reforma no ensino médio no Brasil, traduzida, principalmente, em um novo desenho curricular e na criação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Buscava-se, assim, enfrentar duas grandes problemáticas: (a) o elitismo, revelado no baixo índice de matrículas (próximo de 50% da população-alvo, muito longe, portanto, da universalização prevista na Constituição de 1988); e (b) o caráter dual historicamente estabelecido da escola média brasileira, que atendia às camadas privilegiadas da sociedade na sua versão propedêutica e vinha reservando às camadas trabalhadoras uma formação reduzida à profissionalização precoce (CURY, 1998).3

Em termos de legislação, a Lei n. 9.394/96, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (BRASIL, 1996), em seu art. 35, estabelece que o EM, entendido como etapa final da educação básica, tem como finalidades essenciais: o aprimoramento do educando como ser humano, sua formação ética, o desenvolvimento de sua autonomia intelectual e de seu pensamento crítico, sua preparação para o mundo do trabalho e o desenvolvimento de competências para continuar seu aprendizado.

No que se refere ao traçado do currículo para esse segmento da educação, e em consonância com a LDB, foram instituídas as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio - DCNEM (BRASIL, 2012); no art. 5º desse documento legal, estão indicadas as bases do EM em todas as suas formas de oferta e organização, entre elas: a formação integral do estudante; o trabalho e a pesquisa como princípios educativos e pedagógicos, respectivamente; a indissociabilidade entre educação e prática social, considerando-se a historicidade dos conhecimentos e dos sujeitos do processo educativo, bem como entre teoria e prática no processo ensino-aprendizagem; a integração de conhecimentos gerais e, quando for o caso, técnico-profissionais realizada na perspectiva da interdisciplinaridade e da contextualização; o reconhecimento e a aceitação da diversidade e da realidade concreta dos sujeitos do processo educativo, das formas de produção, dos processos de trabalho e das culturas a eles subjacentes; a integração entre educação e as dimensões do trabalho, da ciência, da tecnologia e da cultura como base da proposta e do desenvolvimento curricular. As DCNEM propõem, ainda, com o objetivo de superar o modelo curricular do tipo coleção, o agrupamento dos saberes e conhecimentos em quatro grandes áreas, a saber: Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas.4

Com relação ao Enem, este já estava previsto no art. 21 das DCNEM, no qual se afirma que o exame deve, progressivamente, compor o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, assumindo três funções principais: (1) avaliação sistêmica, que tem como objetivo subsidiar as políticas públicas para a educação básica; (2) avaliação certificadora, que proporciona àqueles que estão fora da escola aferir seus conhecimentos construídos em processo de escolarização, assim como os conhecimentos tácitos adquiridos ao longo da vida; e (3) avaliação classificatória, que contribui para o acesso democrático à educação superior. No ano de sua criação, 1998, o Enem objetivava, de modo mais determinante, funcionar como ferramenta voluntária de autoavaliação para alunos concluintes do ensino médio. Em 2009, as funções foram ampliadas e passaram a ser: (I) autoavaliação; (II) seleção para o mundo do trabalho; (III) seleção para continuidade nos estudos; (IV) meio de participação em programas governamentais; (V) certificação para jovens e adultos no nível de conclusão do ensino médio; avaliação de (VI) escolas e (VII) alunos (MARCELINO; RECENA, 2012).

Segundo a Matriz de Referência do Enem, para a realização das provas do exame, devem ser considerados, em todas as áreas de conhecimento, cinco grandes eixos cognitivos: (1) dominar linguagens - DL; (2) compreender fenômenos - CF; (3) enfrentar situações-problema - SP; (4) construir argumentação - CA; e (5) elaborar propostas - EP. Na especificação das áreas, foram determinadas grandes competências, desdobradas em habilidades, sendo estas mais diretamente relacionadas ao saber-fazer (BRASIL, 2005b).5

As provas do Enem, aplicadas anualmente, vêm trazendo consigo inúmeras tensões e polêmicas. Aqueles que advogam a pertinência do exame apresentam os seguintes argumentos: o modo de formulação das provas e questões aponta para uma abordagem sistêmica, contextualizada e interdisciplinar do conhecimento; as competências e habilidades estabelecidas para o exame dariam maior funcionalidade aos conteúdos trabalhados; o exame, no todo, teria o poder de influenciar positivamente a sala de aula, induzindo transformações curriculares e metodológicas significativas (PINTO; LETICHEVSKY; GOMES, 2003).

Já outros estudiosos identificam no Enem alguns problemas conceituais (mais do que operacionais), dos quais destacamos: (a) situado no contexto amplo das reformas educacionais dos anos 1990, o exame se constituiria como mais uma forma de ataque aos espaços públicos, por adotar a lógica competitiva e meritocrática do mercado; (b) a avaliação do rendimento acadêmico individual do aluno não é suficiente para se aquilatar a qualidade do EM ofertado no país; seria indispensável, para isso, incluir no processo avaliativo o conjunto dos atores envolvidos; (c) provas e exames de larga escala tendem a aumentar o controle do Estado sobre escolas, alunos e professores, sem necessariamente garantir uma reflexão coletiva sobre processos e resultados; (d) ainda que os resultados do exame possam ser utilizados para transformar e qualificar a educação, a regulação do sistema seria empreendida a posteriori, comprometendo o caráter emancipatório e preditivo da avaliação; (e) exames de larga escala tendem a enrijecer e unificar os currículos, desvalorizando práticas culturais locais e gerando, no limite, um movimento de busca acrítica por “bons resultados”.

Em meio às polêmicas, várias universidades brasileiras passaram, conforme previsto nos documentos que regulamentam e ordenam o Enem, a adotá-lo como parte de seus exames vestibulares, como é o caso da UFPE. Essa medida articula-se com outras de flexibilização nos mecanismos seletivos ao ensino superior, e também com o Programa Universidade para Todos, do Ministério da Educação (Prouni), que visa à ampliação do acesso ao ensino superior através do pagamento de bolsas de estudo para alunos matriculados em instituições privadas.

Alguns estudos específicos sobre o Enem apontaram aspectos interessantes da formulação das provas. Citamos aqui a pesquisa empreendida por Mildner e Silva (2002), que analisaram questões da área de língua e literatura, tomando como ponto de partida o princípio de que verificação e avaliação são processos distintos. Os autores demonstraram que é sempre importante investigar a validade de conteúdo das questões constitutivas do teste. Por sua vez, Cortelazzo (2003) e Santos (2011) realizaram estudos comparativos entre o Enem e o vestibular convencional, tendo constatado que o primeiro enfatiza competências, enquanto o segundo é mais centrado em conteúdos.

Em suma, é dentro de todo esse contexto de modificações operadas no EM no Brasil que inserimos nossa pesquisa, cujos objetivos são analisar e caracterizar as provas de literatura do Enem (aplicada em outubro de 2013) e do vestibular da UFPE (aplicada em dezembro de 2013), buscando estabelecer correlações entre elas, bem como verificar se ambas estão em consonância com o princípio teórico-metodológico de formar leitores proficientes de textos literários. Quanto aos critérios de análise, esses derivaram do nosso objetivo; observamos as provas, portanto, tendo em vista: (1) a caracterização das provas de literatura da UFPE e do Enem com relação a seus documentos normatizadores; (2) aproximações e distanciamentos entre a prova de literatura do Enem e a prova de literatura da UFPE; e (3) análise das provas na perspectiva do letramento literário. Os resultados da pesquisa serão mostrados a seguir.

CARACTERIZAÇÃO DAS PROVAS DE LITERATURA DA UFPE E DO ENEM COM RELAÇÃO A SEUS DOCUMENTOS NORMATIZADORES

O manual do candidato do vestibular da Comissão de Processos Seletivos e Treinamentos (Covest) é um documento que norteia todo o processo de seleção dos candidatos para o ingresso na UFPE e apresenta as diretrizes que fundamentam o certame. Além disso, vale salientar que esse documento também apresenta os conteúdos que deverão constar das provas aplicadas, como podemos observar no seguinte trecho do edital do processo seletivo do vestibular 2014:6

O Processo Seletivo será realizado pela Comissão de Processos Seletivos e Treinamentos (Covest-Copset), da Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da UFPE (FADE/UFPE), sob supervisão da Pró-Reitoria para Assuntos Acadêmicos (PROACAD), e o Manual do Candidato disponibilizará o conteúdo programático e demais instruções relativas ao processo. (UFPE/COVEST-COPSET, 2013, p. 9)

No manual, os assuntos para a prova de literatura são dispostos como mostrado no Quadro 1:

QUADRO 1 Conteúdos de literatura constantes do manual do candidato - Covest 

LITERATURA
1. Barroco e Arcadismo
1.1. Padre Antônio Vieira, Gregório de Matos
1.2. Tomás Antônio Gonzaga
2. Romantismo
2.1. Prosa: José de Alencar, Manuel Antônio de Almeida
2.2. Poesia: Gonçalves Dias, Castro Alves, Álvares de Azevedo
3. Realismo/Naturalismo
3.1. Machado de Assis
3.2. Aluísio de Azevedo
4. Parnasianismo/Simbolismo
4.1. Olavo Bilac
4.2. Cruz e Souza
5. Pré-Modernismo
5.1. Lima Barreto, Monteiro Lobato e Euclides da Cunha
6. Modernismo
6.1. Mário de Andrade, Oswald de Andrade
6.2. Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade
6.3. João Guimarães Rosa e Clarice Lispector
LITERATURA
7. Literatura nordestina, moderna e contemporânea
7.1. Graciliano Ramos, Jorge Amado, Rachel de Queirós
7.2. Ariano Suassuna, Osman Lins
7.3. João Cabral de Mello Neto, Joaquim Cardozo
7.4. Leituras recomendadas
Primeiras estórias - Guimarães Rosa
A hora da estrela - Clarice Lispector
Os melhores contos de Osman Lins - Sandra Mitrini
O auto da compadecida - Ariano Suassuna
O primo Basílio - Eça de Queirós
Dom Casmurro - Machado de Assis
7.5. Literatura portuguesa
• Eça de Queirós - Realismo prosa
• Fernando Pessoa - Modernismo poesia
• José Saramago - Prosa contemporânea

Fonte: Elaboração das autoras com base no Edital do Processo Seletivo de Ingresso Vestibular da UFPE (UFPE/COVEST-COPSET, 2013).

O modo como os conteúdos para a prova de literatura são apresentados permite-nos tecer algumas considerações: (1) há muito pouco detalhamento na lista de assuntos, o que ocasiona lacunas no programa; (2) a falta de detalhamento pode ser um indicador de vagueza com relação ao tratamento dado aos conteúdos; (3) o currículo é visto como um dispositivo de reforço do cânone literário;7 e (4) os elaboradores do programa e da prova da Covest parecem ter confundido o conceito de literatura contemporânea com o de literatura modernista.

Adicionalmente, o programa pode ser visto como simplista, pois, ao estipular como conteúdos possíveis de aparecer no exame apenas as escolas literárias, alguns autores e obras, parece indicar um fraco diálogo entre os elaboradores e as ideias e concepções contemporâneas priorizadas no estudo do texto literário, como questões de gênero, raça, etnia, poder, intertextualidade, etc. O que se vê na prova da Covest é que as abordagens conferidas aos textos quase sempre ficam restritas à concepção de literatura enquanto escola literária. Por outro lado, como citado anteriormente, o programa de literatura da UFPE por vezes também parece excessivamente amplo, na medida em que indica apenas movimentos literários, autores e obras recomendadas para a leitura. Ou seja, é imposto um conteúdo mínimo, e, por outro lado, há uma ampla margem para o tratamento de qualquer aspecto dos temas elencados, desde que esse aspecto se relacione com os autores e as escolas literárias propostas.

O fato é que, visto em suas lacunas ou em sua amplitude, o manual do candidato do vestibular da Covest é seguido pelos elaboradores da prova de literatura, pois nela se aborda tão somente o que está estipulado nesse documento, isto é, escolas literárias, autores e algumas obras de leitura recomendada. Esse tratamento dado à literatura evidencia uma postura mais tradicional, pois desconsidera alguns aspectos atuais que poderiam ser também priorizados.

Defendemos tal ponto de vista por estarmos cientes de que, ao “abrir” uma obra literária para o estudo de elementos que não propriamente os do campo literário, há de se ser cauteloso a fim de que esta não perca sua singularidade. Chiappini (2011) trata das diversas significações que a palavra “literatura” pode ter, das quais destacamos a acepção segundo a qual a literatura é vista como “qualquer texto, mesmo não consagrado, com intenção literária, visível num trabalho da linguagem e da imaginação, ou simplesmente esse trabalho enquanto tal” (CHIAPPINI, 2011, p. 21).

A terceira crítica que tecemos acerca dos conteúdos dispostos para a prova de literatura no manual do candidato da Covest diz respeito à ideia de currículo, que parece ser visto, nesse documento, tão somente como uma lista de conteúdos, muito embora o “currículo oculto” (enquanto conjunto de normas e valores implícitos, porém efetivamente transmitidos) permita perceber que há, de fato, uma valorização e (re)afirmação do cânone literário, pois todos os autores que constam no programa são consagrados pela crítica especializada. Pedra (1997), ao tratar do currículo, destaca: “Como o tempo escolar é finito e o conhecimento acumulado ultrapassa aquela finitude, não há outra via senão eleger alguns conhecimentos e recusar outros” (PEDRA, 1997, p. 51). Evidentemente, não estamos negando a importância dos autores selecionados; mas é fato que, sendo o currículo um recorte intencional, podemos questionar tais escolhas.

Na verdade, parece haver uma contradição entre o Manual do candidato e o que se discute mais recentemente no meio acadêmico. Conforme Cosson,

[...] o cânone passa a ser intensamente questionado nas universidades, de início pela crítica feminista e depois por outras correntes teórico-críticas que colocam sob suspeita a representatividade das obras selecionadas, denunciando preconceitos de gênero, classe e etnia, entre outros aspectos, na formação do cânone. (COSSON, 2006, p. 33)

Por outro lado, as instituições que começaram a pôr em questão o cânone literário são as mesmas às quais é atribuída a elaboração dos programas e provas de vestibular e, em larga medida, o discurso crítico contemporâneo não se traduz nesse tipo de exame. Sobre isso, afirma Oliveira:

A universidade é um desses espaços e o vestibular funciona como um instrumento da universidade na sociedade para perpetuar certa tradição cultural, inclusive uma determinada tradição literária, através da escolha de obras canônicas ou de fácil inserção no cânone, na determinação de padrões de recepção dessas obras, através da linguagem já consagrada de que elas se constituem e na forma de avaliação de sua leitura através das provas de seleção do vestibular. (OLIVEIRA, 2003, p. 112)

Outro aspecto para o qual gostaríamos de chamar atenção é o tópico do manual do candidato intitulado “Literatura nordestina, moderna e contemporânea”, como mostrado no Quadro 1. Curiosamente, nele se enquadram autores que não produzem literatura atualmente (com exceção de Ariano Suassuna que, à época do processo seletivo do vestibular 2014 para o ingresso na UFPE, ainda era vivo). Acreditamos que tal postura não é originária do desconhecimento do que seja literatura contemporânea, mas, sim, de outros elementos envolvidos nessa questão, a saber: em termos de imagem social, o candidato que almeja uma vaga na instituição superior não pode prescindir do conhecimento desses autores consagrados pela crítica, já que eles fazem parte da herança cultural literária. O segundo elemento dessa problemática diz respeito a uma questão metodológica: para se trabalhar com autores contemporâneos (e seus textos), faz-se necessário abandonar antigos critérios de análise e de crítica literárias ou, pelo menos, reconfigurá-los. Ademais, a própria universidade, ao invés de incentivar a leitura, na escola,8 do que se produz atualmente em literatura, desconsidera as novas vozes, na medida em que elabora uma prova unicamente pautada no cânone literário.

Por fim, a análise da prova de literatura da UFPE nos permite afirmar que esse exame, de fato, contempla a maior parte dos conteúdos dispostos no manual do candidato. Todas as escolas literárias e o tópico 7 (“Literatura nordestina, moderna e contemporânea”) foram apresentados na prova, e, dos 32 autores que constam no programa, 22 foram cobrados, com exceção de Paulo Leminski, que não estava incluído no programa, mas teve um de seus poemas abordados numa questão.

Passemos agora para a verificação da prova do Enem, aplicada em outubro de 2013, à luz dos documentos oficiais que a normatizam, que são a Matriz de Referência, lançada no ano de 2011 (BRASIL, 2011), e a Fundamentação Teórico-Metodológica, publicada em 2005.

O exame é composto de uma redação e de quatro provas objetivas, sendo que cada uma delas contém 45 questões de múltipla escolha. Para a realização das provas, devem ser considerados cinco grandes eixos cognitivos: (I) DL; (II) CF; (III) SP; (IV) CA; e (V) EP. As quatro provas objetivas e a redação avaliam as seguintes áreas do conhecimento: “Ciências Humanas e suas Tecnologias”, que diz respeito a história, geografia, filosofia e sociologia; “Ciências da Natureza e suas Tecnologias”, que compreende química, física e biologia; “Linguagens, Códigos, suas Tecnologias e Redação”, que abarca língua portuguesa, literatura, língua estrangeira (inglês ou espanhol), artes, educação física e tecnologias da informação e da educação e, por fim, “Matemática e suas Tecnologias”, na qual se insere matemática.

Para cada uma dessas áreas são estipuladas 30 competências (120 ao todo). Para o eixo do conhecimento “Linguagens, Códigos, suas Tecnologias e Redação”, o que nos interessa, já que o componente literatura nele está inserido, são determinadas nove áreas de competências, de modo que cada uma dessas competências se desdobra em habilidades (30 no total). É válido destacar as diferenças entre o que seria competência e habilidade. Segundo Berger, a primeira comporta

[...] esquemas mentais, ou seja, as ações e operações mentais de caráter cognitivo, sócio-afetivo ou psicomotor que mobilizadas e associadas a saberes teóricos ou experienciais geram habilidades, ou seja, um saber fazer. (BERGER FILHO, s.d., p. 3)

A análise da prova do Enem evidencia que, de fato, o exame é inteiramente baseado nas noções de competências e habilidades, porque todas as questões, para sua resolução, exigem do candidato algum tipo de habilidade. No tópico seguinte, “Uma análise das provas de literatura do Enem e da UFPE na perspectiva do letramento literário”, mostramos, por exemplo, duas questões - a 110 e a 116 - a partir das quais discorreremos com mais detalhes sobre as habilidades requeridas para cada uma delas.

Ainda há os chamados “Objetos de conhecimento associados às Matrizes de Referência” - esse tópico está também inserido no Edital 2013 (BRASIL, 2013) -, que seriam os conteúdos propriamente ditos a serem cobrados na prova, dos quais, no que diz respeito ao eixo “Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e Redação”, destacamos no Quadro 2 os que se referem à literatura:

QUADRO 2 Trecho do Edital 2013 - Objetos de Conhecimento Associados às Matrizes de Referência - Área: Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias 

• Produção e recepção de textos artísticos: interpretação e representação do mundo para o fortalecimento dos processos de identidade e cidadania - Teatro: estrutura morfológica, sintática, o contexto da obra artística, o contexto da comunidade, as fontes de criação.
• Estudo do texto literário: relações entre produção literária e processo social, concepções artísticas, procedimentos de construção e recepção de textos - produção literária e processo social; processos de formação literária e de formação nacional; produção de textos literários, sua recepção e a constituição do patrimônio literário nacional; relações entre a dialética cosmopolitismo/localismo e a produção literária nacional; elementos de continuidade e ruptura entre os diversos momentos da literatura brasileira; associações entre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário em seus gêneros (épico/narrativo, lírico e dramático) e formas diversas; articulações entre os recursos expressivos e estruturais do texto literário e o processo social relacionado ao momento de sua produção; representação literária: natureza, função, organização e estrutura do texto literário; relações entre literatura, outras artes e outros saberes.
• Estudo dos aspectos linguísticos em diferentes textos: recursos expressivos da língua, procedimentos de construção e recepção de textos - organização da macroestrutura semântica e a articulação entre ideias e proposições (relações lógico-semânticas).

Fonte: Trechos retirados do Edital do Enem 2013 (BRASIL, 2013).

Desses conteúdos, os objetos do conhecimento que se fazem presentes na prova de literatura do Enem são: questão 103 - “função e procedimento de construção e recepção de texto”; questão 110 - “interpretação e representação do mundo para o fortalecimento dos processos de identidade e cidadania”; questões 113, 114, 124 e 130 - “estudo dos aspectos linguísticos em diferentes textos: recursos expressivos da língua, procedimentos de construção e recepção de textos - organização da macroestrutura semântica e a articulação entre ideias e proposições (relações lógico-semânticas)”; questão 116 - “associações entre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário em seus gêneros (épico/narrativo, lírico e dramático) e formas diversas”; questão 120 - “articulações entre os recursos expressivos e estruturais do texto literário e o processo social relacionado ao momento de sua produção”.

Observamos, também, que a prova do Enem é condizente com o que é dito na Fundamentação Teórico-Metodológica a respeito da prática de leitura, pois todas as oito questões apresentam texto literário. Como se pode constatar a seguir, a leitura é o grande eixo norteador do Exame Nacional:

O grupo autor da matriz decidiu elegê-la [a leitura] como uma arquicompetência. Esse grupo, formado de professores de várias disciplinas, indicou que, sem o desenvolvimento pleno da atividade leitora, todas as competências e habilidades avaliáveis teriam suas possibilidades reduzidas ou interrompidas. (BRASIL, 2005a, p. 59)

APROXIMAÇÕES E DISTANCIAMENTOS ENTRE A PROVA DE LITERATURA DO ENEM E A PROVA DE LITERATURA DA UFPE

No que diz respeito às aproximações e aos distanciamentos entre a prova de literatura da UFPE e a do Enem, concluímos que elas apresentam mais diferenças do que semelhanças.

Nossa primeira constatação é que todas as oito questões de literatura do Enem apresentam texto literário. A predominância maior é do gênero poético - que aparece em cinco questões (103, 110, 114, 120 e 130) -, seguido do gênero prosa (questões 116 e 124); o gênero dramático é contemplado em apenas uma questão (113). Vale destacar que as questões 110, 116 e 124 trazem fragmentos de texto, o que não necessariamente é algo ruim, desde que o excerto, como aponta Soares (1999), se configure

[...] ele também, como texto, isto é: uma unidade de linguagem, tanto do ponto de vista semântico - uma unidade percebida pelo leitor como um todo significativo e coerente - quanto do ponto de vista formal - uma unidade [...] que seja percebida como um todo coeso. (SOARES, 1999, p. 30, grifo da autora)

A prova da UFPE, por sua vez, contém 16 questões de literatura, sendo que sete trazem o texto literário, cinco abordam o texto poético (1, 3, 8, 11 e 13), e as duas restantes (9 e 10) apresentam texto em prosa. Na prova da Covest, os excertos de textos aparecem nas questões 3, 9, 10 e 11. Verificamos que, em todos os casos, seja na prova da UFPE, seja no Enem, o uso do excerto não se configurou como um problema, na linha do que Soares (1999) defende.

O segundo elemento que diferencia as provas de literatura do Enem e da Covest é o fato de que a primeira segue uma orientação mais cognitivista e construtivista, ao passo que a segunda é mais conteudista. No que diz respeito à primeira posição, Dias (2002) assevera:

As competências que dão suporte à avaliação do Enem estão baseadas nas competências que os indivíduos desenvolvem. Estas competências são descritas nas operações formais da teoria de Piaget [...]. Ao mesmo tempo, nas avaliações do Enem, a inteligência é encarada não como uma faculdade mental ou expressão de estruturas cognitivas inatas, porém é compreendida como o uso de estratégias cognitivas básicas voltadas para a análise da realidade. (DIAS, 2002, p. 27)

Quanto ao viés construtivista do Enem, Macedo9 (2005a, 2005b, 2005c, apudGOMES; BORGES, 2009, p. 75) justifica tal caráter afirmando: “Suas provas [do Enem] têm sido elaboradas priorizando a resolução de problemas”. A filiação dos criadores do Exame Nacional a esses campos epistemológicos é verificável na própria “situação-problema” (questão), a qual se caracteriza por ser

[...] uma questão que coloca um problema, ou seja, faz uma pergunta e oferece alternativas, das quais apenas uma corresponde ao que é certo quanto ao que foi enunciado. Para isso, a pessoa deve analisar o conteúdo proposto na situação-problema e recorrendo às habilidades (ler, comparar, interpretar, etc.) decidir sobre a alternativa que melhor expressa o que foi proposto. (BRASIL, 2005a, p. 30)

A fim de exemplificarmos a orientação conteudista que embasa a prova de literatura da UFPE e de como esta ainda está muito apegada à noção de literatura enquanto “escola literária”, o Quadro 3 apresenta questão da prova:

QUADRO 3 Questão 2 da prova de literatura da UFPE 

2. No Romantismo brasileiro, o espírito nacionalista assumiu diversos enfoques. Na literatura, esses enfoques contribuíram para se configurar um discurso próprio da identidade nacional. Tomando como foco a poesia romântica e seus autores, analise o que segue.
0-0) A produção poética de Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo e Castro Alves manifesta três vertentes próprias da literatura romântica nacional, respectivamente: a indianista, a byronista e a condoreira.
1-1) Gonçalves Dias, em suas poesias indianistas, constrói uma imagem idealizada do índio, um bravo guerreiro que é violentamente subjugado pelos colonizadores. Uma de suas personagens mais conhecidas é Moacir, herói miscigenado, cujo nome significa “filho da dor”.
2-2) O ‘Mal do Século’ teve na poesia brasileira, como expoente, Álvares de Azevedo. As mulheres que avultam em sua poesia, todas brancas, são guerreiras que, junto a seus amantes, contribuíram para que a colonização portuguesa se realizasse a contento.
3-3) A poesia condoreira foi representada no Brasil por Castro Alves. Contrariamente às suas boas intenções políticas, Castro Alves, em sua poesia abolicionista, mostra o africano como sujeito frágil, propenso ao domínio do homem europeu, geneticamente mais forte que o africano.
4-4) Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo e Castro Alves contribuíram para a construção dos três pilares que configuram o discurso romântico acerca da identidade étnica brasileira: o índio americano, o branco europeu e o negro africano.
GABARITO - VFFFV

Fonte: Questão retirada da prova de literatura do Vestibular UFPE 2014. Disponível em: http://vestibular.brasilescola.uol.com.br/baixar/25447/. Acesso em: 30 mar. 2016.

Nessa questão, faz-se referência a aspectos das obras de três autores românticos, com apoio em discursos construídos pela teoria e crítica literárias. O candidato não é convidado a chegar a tais conclusões pelo contato direto com os poemas dos autores; basta que ele apenas julgue, utilizando a memória, se o que foi dito por terceiros é pertinente. Sobre isso, diz Rodrigues:

Ele demonstrará sua “competência” ao identificar a sentença que não apresenta nenhum erro, ao ser capaz de perceber as “pegadinhas” escondidas no decorrer da prova, demonstrando com isso ser um leitor mais atento e com memória melhor do que os outros candidatos. (RODRIGUES, 2012, p. 28)

O que Rodrigues pondera sobre as “pegadinhas” (distratores) contidas em prova de vestibular (sendo às vezes a competência do candidato comprovada mais em função delas do que do domínio mesmo do conhecimento) ressoa perfeitamente bem na questão reproduzida anteriormente. Nela, são fornecidos detalhamentos que mais parecem ter o intuito de “pegar” os candidatos desatentos e esquecidos do que verificar se o conhecimento sobre o que se pede é advindo do contato com textos literários. Na proposição I, por exemplo, afirma-se que o índio Moacir é um herói das poesias indianistas de Gonçalves Dias, quando, na verdade, ele é personagem do romance Iracema, de José de Alencar. Em II, diz-se que as mulheres que avultam na poesia de Álvares de Azevedo são guerreiras, mas basta o candidato lembrar que as mulheres representadas pelo viés da estética romântica eram predominantemente frágeis. Já em III, comenta-se sobre a poesia condoreira de Castro Alves e se diz que esta mostrava os negros como criaturas frágeis, propensos ao domínio do homem europeu. Pelo contrário, o que se vê na poesia alviana é a bravura dos africanos no contexto da escravidão.

Na Fundamentação Teórico-Metodológica do Enem, o apelo excessivo do uso da memória - tão necessária para a resolução da prova da UFPE - é comparado ao funcionamento de uma máquina:

[...] para avaliar se uma situação-problema é boa ou não, temos que julgar se a questão pede solução de problemas, na perspectiva das pessoas ou das máquinas. Tratar alguém como máquina é exigir ou esperar que ela seja ou aja como uma máquina, tenha memória de máquina, trate o conhecimento como jogo de informações [...]. (BRASIL, 2005a, p. 32)

Ainda no que diz respeito à memorização como recurso para reconhecimento dos distratores, na Fundamentação Teórico-Metodológica do Exame é dada mais ênfase a esse assunto:

Por isso, evitamos no elenco das alternativas afirmações preconceituosas, dicas ou indutores de respostas, “pegadinhas”. Ou seja, o que nos interessa é que o aluno tenha uma relação construtiva com o processo de conhecimento e não um jogo, em que a malícia, a esperteza, etc. ocupem o lugar mais importante. (BRASIL, 2005a, p. 35)

De fato, em todas as oito questões da prova de literatura do Enem, o candidato sequer precisa recorrer à memória para julgar as alternativas; o que lhe é necessário é aplicar adequadamente as mais diversas habilidades cognitivas - inferir, relacionar, destacar, sintetizar, etc. - para a resolução das situações-problema.

Outro elemento diferenciador das provas é o tratamento dado ao texto literário. Fischer et al. (2012) analisaram questões de literatura contidas no Enem, entre os anos de 1998 e 2010, e uma das conclusões obtidas no estudo foi que as aulas de literatura seriam dispensáveis para se responder cerca de 80% das questões, uma vez que o que se requisitava do candidato era apenas interpretação de texto. Concluíram também os autores que

[...] para os pedagogos e linguistas do MEC responsáveis pela prova que inclui, de algum modo, a literatura, não importa que o aluno reflita sobre os textos em sua dimensão estética ou que os entenda em sua historicidade, e isso é certamente uma perda. (FISCHER et al., 2012, p. 121)

Como já citado, todas as questões da prova de literatura do Enem apresentam texto literário. Porém, essa presença não é garantia de que se esteja realizando um adequado trabalho com tal tipo de texto. Verificamos que, das oito questões, quatro (110, 114, 120 e 124) exigem do candidato tão somente interpretação textual, o que nos faz concluir que uma obra literária ou um fragmento desta não se coloca como algo imprescindível, pois qualquer gênero textual, a princípio, se presta a esse objetivo. Dos textos presentes nessas questões, não se abordam elementos concernentes ao exercício realizado especificamente com a linguagem, quando, sem dúvida, é esse o aspecto que diferencia o gênero literário de outro qualquer. Já na prova da UFPE, quando o texto literário se faz presente na questão, são exigidas do candidato outras habilidades que não só a de interpretação; exploram-se, também, aspectos relativos à linguagem literária, por exemplo. Já nas questões em que não há texto, o foco recai mais nas habilidades de reconhecimento de estilos de época e de características gerais das obras, como enredo e personagens; nessa segunda perspectiva, vê-se uma cobrança de informações memorizadas.

Outro elemento que diferencia as provas investigadas diz respeito aos autores selecionados para constar nos exames. Como mencionado anteriormente, a prova da UFPE é mantenedora do cânone literário, ao passo que o Enem se volta para produções literárias contemporâneas, sem deixar de lado as que compõem a tradição literária brasileira. É assim que na prova do Enem se fazem presentes, ao mesmo tempo, obras/trechos de Adélia Prado, Plínio Marcos, Nuno Júdice, Jorge de Lima, Raimundo Correia, Machado de Assis, Oswald de Andrade e Clarice Lispector.

Por fim, vale lembrar que a UFPE, em seu manual do candidato, estipula previamente uma lista de obras a serem lidas, diferentemente do Enem, que não o faz. Essa postura da Covest induz a pensarmos que os títulos dessa lista que forem contemplados na prova serão trabalhados com maior profundidade, uma vez que se imagina que a leitura da obra foi realizada anteriormente. Contudo, isso pouco se evidencia. No tópico seguinte, será discutida uma questão que trata de uma dessas leituras recomendadas, a fim de mostrarmos como ela foi abordada.

ANÁLISE DAS PROVAS DE LITERATURA DO ENEM E DA UFPE NA PERSPECTIVA DO LETRAMENTO LITERÁRIO

Cosson (2006), no livro Letramento Literário, define o que seria essa perspectiva de trabalho com o texto literário e critica as práticas tradicionais de ensino de literatura, como podemos observar a seguir:

[...] a orientação fundamental é que o letramento literário precisa acompanhar, por um lado, as três etapas do processo de leitura e, por outro, o saber literário. No caso desse último, convém ter em mente a distinção feita por M. A. K. Halliday em relação à aprendizagem da linguagem, ou seja, a literatura é uma linguagem que compreende três tipos de aprendizagem: a aprendizagem da literatura, que consiste fundamentalmente experienciar o mundo por meio da palavra; a aprendizagem sobre a literatura, que envolve conhecimentos de história, teoria e crítica; e a aprendizagem por meio da literatura, nesse caso os saberes e as habilidades que a prática da literatura proporciona aos seus usuários. As aulas de literatura tradicionais, como já vimos, oscilam entre essas duas últimas aprendizagens e, praticamente, ignoram a primeira, que deveria ser o ponto central das atividades envolvendo literatura na escola. (COSSON, 2006, p. 47, grifos nossos)

É preciso termos em mente que os três tipos de aprendizagem referidos por Cosson, sobretudo a que se dá “sobre” a literatura, isto é, a que envolve conhecimentos de história, teoria e crítica literárias, não devem ocorrer sem a presença do texto literário, pois o autor defende que: “o ensino da literatura deve ter como centro a experiência do literário” (COSSON, 2006, p. 47). Deve-se também acrescentar que as três instâncias que integram a aprendizagem da linguagem literária têm, cada uma, sua importância, por isso mesmo é necessária, num contexto de vestibular, a avaliação de todas elas. O que não pode haver, portanto, é a supervalorização de um aspecto em detrimento de outro.

A fim de melhor analisarmos as provas de literatura da UFPE e do Enem na perspectiva do letramento literário, definimos três critérios: (a) questões que exigem do candidato a leitura do texto literário ou de partes dele; (b) questões que priorizam o conhecimento de aspectos da história, da teoria e da crítica literárias adquiridos não pelo contato com o texto, mas pelo recurso da memorização; e, por fim, (c) questões em que o texto literário serve de auxílio para a abordagem de outros elementos que não os literários. Antes de nos debruçarmos nas análises, é importante esclarecermos que, dado o fato de as questões da UFPE apresentarem proposições, seus itens podem se enquadrar em mais de um critério. Por isso, decidimos classificar a questão levando em consideração o que nela for predominante.

Das 16 questões contidas na prova da UFPE, oito (1, 3, 8, 9, 10, 11, 13 e 15) se enquadram no critério A - são questões que exigem, de fato, a leitura da obra para o julgamento das proposições, e oito (2, 4, 5, 6, 7, 12, 14 e 16) se enquadram no critério B - aquele que se refere à priorização de conhecimentos da história, da crítica e da teoria literárias, mas que o faz sem o auxílio de um texto literário. Como se pode concluir, o critério C - obra servindo de auxílio para a abordagem de outros elementos que não os literários - não se aplica a nenhuma questão da prova. Concluímos também que as questões que apresentam texto (sete), seja ele em prosa (9 e 10) ou em verso (1, 3, 8, 11 e 13), na íntegra ou em fragmentos (questões 9 e 10), têm, indubitavelmente, melhor qualidade, se comparadas às que não trazem sequer obra literária (nove questões), o que só ratifica o que já foi exposto: a construção dos saberes literários deve ser proveniente do contato direto com o texto, porque, se assim não for, o risco de a questão se tornar um mero instrumento de aferir tão somente a capacidade de memorização do candidato é iminente.10 O Quadro 4 apresenta a questão 3 da prova da UFPE, a fim de comprovarmos que uma questão que apresenta texto tem, sem dúvida, maior qualidade:

QUADRO 4 Questão 3 da prova de literatura da UFPE 

3. Apesar de ter participado de movimentos políticos e sociais, Tomás Antônio Gonzaga os omite como tema de suas obras. Revela mais preocupação com a valorização estética e a subjetividade, aspectos que ocupam lugar de destaque em suas poesias. A esse poeta, junta-se Cruz e Souza, cuja produção também se afasta de questões sociais. Com base nos poemas abaixo, analise as proposições seguintes.
TEXTO 2 TEXTO 3
Lira 57
Já não cinjo de loiro a minha testa,
Nem sonoras canções o deus me inspira.
Ah! Que nem me resta
Uma já quebrada,
Mal sonora lira!
Mas neste mesmo estado em que me vejo,
pede, Marília, Amor que vá cantar-te:
cumpro o seu desejo;
e ao que resta supra
a paixão e a arte.
[...]
Isso escrevia, quando, oh! Céus, que vejo!
Descubro a ler-me os versos o deus loiro:
Ah! Dá-lhes um beijo,
E diz-me que valem
Mais que letras de loiro
(Tomás Antônio Gonzaga)
Almas indecisas
Almas ansiosas, trêmulas, inquietas,
Fugitivas abelhas delicadas
Das colmeias de luz das alvoradas,
Almas de melancólicos poetas,
Que dor fatal e que emoções secretas
Vos tornam sempre assim desconsoladas,
Na pungência de todas as espadas,
Na dolência de todos os ascetas?!
Nessa esfera em que andais, sempre indecisas,
Que tormento cruel vos nirvaniza,
Que agonias titânicas são essas?!
Por que não vindes, Almas imprevistas,
Para missão das límpidas Conquistas
E das augustas, imortais Promessas?!
(Cruz e Sousa)
0-0) No texto 2, o eu lírico revela-se perfeito árcade, feliz por cantar os amores que nutre pela musa Marília, por quem é capaz de desafiar ‘o deus loiro’, forma metonímica de se referir a Cupido, em: Descubro-me a ler-me os versos o deus loiro.
1-1) O primeiro verso de Almas Indecisas caracteriza os poetas - de cuja alma se fala - sob uma perspectiva objetiva, distante, portanto, da pretensão figurada e alegórica do mundo literário.
2-2) Os poemas, Lira 57 e Almas Indecisas, apresentam discursos intimistas, que tratam do sentimento amoroso que os poetas nutrem por suas amadas. Diferem, no entanto: o primeiro por expressar um estado de euforia do eu lírico, que se mantém ao longo do poema; o segundo, por expressar um estado de inquestionável certeza e convicção.
3-3) Almas Indecisas é um soneto lírico no qual o autor faz uso de palavras pouco comuns ou eruditas. Esta utilização é característica do Simbolismo, movimento literário ao qual o texto se vincula.
4-4) Os dois poemas apresentam características que os integram, respectivamente, aos momentos estéticos: Barroco e Parnasianismo. Essa integração resulta, exclusivamente, do fato de suas temáticas não se referirem nem à realidade nem às visões políticas de seus autores.
GABARITO - VFFVF

Fonte: Questão retirada da prova de literatura do Vestibular UFPE 2014. Disponível em: http://vestibular.brasilescola.uol.com.br/baixar/25447/. Acesso em: 30 mar. 2016.

Dada a extensão do poema de Tomás Antônio Gonzaga que foi utilizado na questão, Lira 57, este teve uma parte suprimida, muito embora o fragmento apresente unicidade tanto semântica quanto estrutural.

Como podemos observar, quase todas as proposições, com exceção do item 4, fazem referência aos poemas dispostos, isto é, para cada item ser avaliado é necessária a leitura das obras, leitura essa que visa a distintos objetivos. As proposições 0, 1 e 2 requisitam do candidato a interpretação textual, a proposição 0, além disso, faz referência a um conhecimento teórico da estética literária. Ainda no que concerne a tal proposição, o candidato precisa também compreender o funcionamento de metonímia. A abordagem de um assunto gramatical amplia a compreensão semântica do poema e não faz do texto pretexto para a exploração de tópicos gramaticais. As proposições 1 e 2, além de solicitarem também do candidato a interpretação dos poemas, como já citado, abordam questões que tratam da linguagem literária. Na proposição 3, a leitura de Almas indecisas precisa ser efetivada para que o candidato identifique no poema, se houver, palavras eruditas, mas também é necessário saber que esse recurso é uma característica do Simbolismo. Por fim, para o item 4, basta conhecer de história e crítica literárias, para saber a qual escola literária pertence cada autor, sem ser necessária a leitura das obras.

A análise evidencia que essa é uma questão que prioriza a avaliação da aprendizagem da literatura, porque, das cinco proposições, quatro estão de fato amparadas na leitura das obras, mesmo em três itens (0, 3 e 4) sendo também necessário o domínio de outros saberes que, nesse caso, não decorrem da leitura dos poemas.

No Quadro 5, apresentamos um exemplo de questão com um fragmento de texto, para demonstrarmos que o recurso ao excerto, além de necessário quando não há condições de se publicar um texto na íntegra, não impede que seja dado à amostra tratamento satisfatório.

QUADRO 5 Questão 10 da prova de literatura da UFPE 

10. Segundo Aristóteles, a Literatura, enquanto arte, é mimese, isto é, recriação da realidade, daí refletir os problemas sociais, como os que se apresentam no texto a seguir, em que as questões climáticas e suas consequências sociais são tomadas como temas. Com base no texto 8, analise as proposições que seguem.
TEXTO 8
Encostado a uma jurema seca, defronte ao juazeiro que a foice dos cabras ia pouco a pouco mutilando, Vicente dirigia a distribuição de rama verde ao gado. Reses magras, com grandes ossos agudos furando o couro das ancas, devoravam confiadamente os rebentões que a ponta dos terçados espalhava pelo chão.
Era raro e alarmante, em março, ainda se tratar de gado. Vicente pensava sombriamente no que seria de tanta rês, se de fato não viesse o inverno. A rama já não dava nem para um mês.
Imaginara retirar uma porção de gado para a serra. Mas, sabia lá? Na serra, também, o recurso falta... Também o pasto seca... Também a água dos riachos afina, afina, até se transformar num fio gotejante e transparente. Além disso, a viagem sem pasto, sem bebida certa, havia de ser um horror, morreria tudo.
[...] Vicente marchava através da estrada vermelha e pedregosa, orlada pela galharia negra da caatinga morta. Os cascos do animal pareciam tirar fogo nos seixos do caminho. Lagartixas davam carreirinhas intermitentes por cima das folhas secas do chão que estalavam como papel queimado.
O céu, transparente que doía, vibrava, tremendo feito uma gaze repuxada.
Vicente sentia por toda parte uma impressão ressequida de calor e aspereza.
Verde, na monotonia cinzenta da paisagem, só algum juazeiro ainda escapou à devastação da rama; mas em geral as pobres árvores apareciam lamentáveis, mostrando os cotos dos galhos como membros amputados e a casca toda raspada em grandes zonas brancas. E o chão, que em outro tempo a sombra cobria, era uma confusão desolada de galhos secos, cuja agressividade ainda mais se acentuava pelos espinhos. [...]
(Raquel de Queiroz, O Quinze)
0-0) O romance O Quinze tem por trama acontecimentos ficcionais inspirados na grande seca que assolou o sertão nordestino em 1927. Com características nitidamente regionais, enquadra-se no ciclo do Romance regionalista da geração de 1930, cujo início se deu com a publicação, em 1927, de A Bagaceira, de José Américo de Almeida.
1-1) O narrador onisciente, no romance O Quinze, relata a triste realidade do povo nordestino, simbolizado na personagem Vicente, que, embora grande proprietário de terras, é forçado a, em decorrência da seca, sair da sua terra de origem, em busca de melhores condições de vida no sul do país.
2-2) No trecho: “em geral as pobres árvores apareciam lamentáveis, mostrando os cotos dos galhos como membros amputados e a casca toda raspada em grandes zonas brancas”, a linguagem que descreve a paisagem estabelece, por analogia, uma identidade entre o elemento natural e o elemento humano.
3-3) Vicente e sua mulher Conceição são personagens que formam um par perfeito. O desfecho do romance se dá com o retorno dos dois para a zona rural, quando ocorre uma nova seca, cruel, como sempre, pois: “Verde, na monotonia cinzenta da paisagem, só algum juazeiro ainda escapou à devastação da rama”.
4-4) Em: “O céu, transparente que doía, vibrava, tremendo feito uma gaze repuxada”, a autora se vale de uma comparação em que relaciona o céu e a alma ferida do sertanejo, que deixa sua terra em busca de uma nova vida na cidade grande.
GABARITO - VFVFV

Fonte: Questão retirada da prova de literatura do Vestibular UFPE 2014. Disponível em: http://vestibular.brasilescola.uol.com.br/baixar/25447/. Acesso em: 30 mar. 2016.

Na questão 10, das cinco proposições, quatro (0, 1, 2 e 4) fazem referência ao excerto da obra. No item 0, além de a leitura do fragmento se colocar como algo necessário, é importante também que o candidato tenha conhecimento da historiografia literária, já que se afirma que, “Com características nitidamente regionais, enquadra-se [O Quinze] no ciclo do Romance regionalista da geração de 1930, cujo início se deu com a publicação, em 1927, de A Bagaceira, de José Américo de Almeida”. O item 1 faz menção a duas informações: que o narrador da obra é onisciente e que a personagem Vicente, “embora grande proprietário de terras, é forçado a, em decorrência da seca, sair da sua terra de origem, em busca de melhores condições de vida no sul do país”. Para o julgamento da primeira, é possível fazê-lo a partir da leitura do excerto; já para a segunda, a leitura que se coloca como necessária não é a do fragmento, mas, sim, a da obra em sua totalidade. As proposições 2 e 4 tratam de aspectos da linguagem empregada no trecho d’O Quinze e, por isso, estão amparadas também na leitura do fragmento. Por fim, o item 3, por trazer uma informação acerca da obra que não está evidente no trecho disposto, poderia levar-nos a concluir que a leitura global da obra em questão é imprescindível; mas isso não ocorre, pois o que do livro é mencionado não ultrapassa a superficialidade da caracterização dos personagens, informações que podem ser obtidas através de resumos, sites, etc.

A análise da questão 10 evidenciou que, mesmo se fazendo uso de um trecho de uma obra, é possível, sim, dar à literatura um tratamento adequado, e ainda se aproximar da perspectiva defendida por Cosson (2006) para o letramento literário: a leitura de texto como condição primeira para que a partir dele se explorem diversas outras questões. É fato que para os itens 0 e 3 a leitura não é algo imprescindível, mas, ainda assim, para a maioria das proposições, ler o excerto é necessário.

Passemos agora para uma questão da prova da UFPE que trata do autor José Saramago, bem como de uma obra previamente recomendada no manual do candidato, O primo Basílio, de Eça de Queiroz.

QUADRO 6 Questão 16 da prova de literatura da UFPE 

16. Em Portugal, a crítica social é realizada, dentre outros, por dois grandes ficcionistas: Eça de Queirós e José Saramago. Ambos, em diferentes momentos, abordam problemas semelhantes. Sobre os autores e as obras referidas abaixo, analise as proposições seguintes.
0-0) A ficção de Eça de Queirós revela a atitude de um pensador liberal que critica a falsa moral burguesa, tal como no romance O Primo Basílio, quando Luísa sofre mais por ter que garantir o sigilo do adultério do que por trair o marido.
1-1) Eça de Queirós foi muito questionado, em vida, pelo modo crítico como, em suas obras, enxergou e revelou a sociedade portuguesa, sobretudo a lisboeta da segunda metade do século XIX.
2-2) A crítica à família burguesa e o triângulo amoroso, presentes no romance de Eça de Queirós, O Primo Basílio, revelam a forte influência exercida por Flaubert, em Madame Bovary, sobre o ficcionista português.
3-3) Em O ano da morte de Ricardo Reis, José Saramago tece críticas fortíssimas ao regime político português, quando recria o personagem nomeado no título do romance. Na ficção de Saramago, Ricardo Reis, republicano de formação clássica, sofreu perseguição política injustificada assim que regressou do Brasil, após ter recebido telegrama do heterônimo Alberto Caeiro.
4-4) Com discursos que se assemelham pela ironia contundente, tanto Saramago, no século XX, quanto Eça de Queirós, no século XIX, retrataram a sociedade de seus respectivos tempos, revelando o comportamento nada edificante que ela exibia.
GABARITO: VVVFV

Fonte: Questão retirada da prova de literatura do Vestibular UFPE 2014. Disponível em: http://vestibular.brasilescola.uol.com.br/baixar/25447/. Acesso em: 30 mar. 2016.

Todas as proposições da questão 16, com exceção do item 3, requisitam do candidato conhecimentos oriundos da teoria, da história e da crítica literárias, que, no momento da feitura da prova, deverão ser “recuperados” pelo candidato através da memória. A questão, mesmo trazendo informações a respeito da obra recomendada, de um livro de José Saramago (item 3) e de aspectos mais gerais das obras de Saramago e de Eça de Queiroz, o faz de maneira muito geral, de modo que o que nela é apresentado são conhecimentos que podem ser facilmente apreendidos sem a leitura das obras (para a proposição 3, no entanto, a leitura do texto literário ao qual o item se refere é imprescindível, porque nela se cobra um conhecimento pontual).

Gostaríamos de dar ênfase às proposições 0 e 2, que tratam do livro recomendado, O primo Basílio. Na primeira, fala-se sobre uma constante na prosa queirosiana - a crítica à falsa moral burguesa -, e, na segunda, discute-se acerca da influência de Flaubert sobre esse autor. Sendo essa obra previamente indicada, deveria ser dado a ela um tratamento que não se restringisse apenas à superficialidade da caracterização temática e da influência literária.

Diferentemente da prova da UFPE, a do Enem, em suas oito questões, traz texto literário, como já citado. Afirmamos, no tópico “Aproximações e distanciamentos entre a prova de literatura do Enem e a prova de literatura da UFPE”, que a presença do texto não é garantia de que a sua abordagem seja adequada; como exemplificação do exposto, comentamos que as questões 110, 114, 120 e 124 requisitam do candidato tão somente interpretação de texto, desconsiderando-se, portanto, a dimensão estética que toda obra literária possui. Contudo, refletindo sobre a prova do Enem em toda sua totalidade e não nos detendo às questões isoladamente, vemos que ela parece estar em maior consonância com o princípio do letramento literário, pois nela são articuladas as três dimensões da aprendizagem da linguagem literária. A seguir, reproduziremos duas questões do Enem, seguidas cada uma de sua respectiva análise.

QUADRO 7 Questão 110 da prova de literatura do Enem 

Olá! Negro
Os netos de teus mulatos e de teus cafuzos
e a quarta e a quinta gerações de teu sangue sofredor
tentarão apagar a tua cor!
E as gerações dessas gerações quando apagarem
a tua tatuagem execranda,
não apagarão de suas almas, a tua alma, negro!
Pai-João, Mãe-negra, Fulô, Zumbi,
negro-fujão, negro cativo, negro rebelde
negro cabinda, negro congo, negro ioruba,
negro que foste para o algodão de USA
para os canaviais do Brasil,
para o tronco, para o colar de ferro, para a canga
de todos os senhores do mundo;
eu melhor compreendo agora os teus blues
nesta hora triste da raça branca, negro!
Olá, Negro! Olá, Negro!
A raça que te enforca, enforca-se de tédio, negro!
LIMA, J. Obras completas. Rio de Janeiro: Aguilar, 1958 (fragmento).
O conflito de gerações e de grupos étnicos reproduz, na visão do eu lírico, um contexto social assinalado por
A. modernização dos modos de produção e consequente enriquecimento dos brancos.
B. preservação da memória ancestral e resistência negra à apatia cultural dos brancos.
C. superação dos costumes antigos por meio da incorporação de valores dos colonizados.
D. nivelamento social de descendentes de escravos e de senhores pela condição de pobreza.
E. antagonismo entre grupos de trabalhadores e lacunas de hereditariedade.
GABARITO: B

Fonte: Questão retirada da prova de literatura do Enem 2013. Disponível em: http://download.inep.gov.br/educacao_basica/enem/provas/2013/caderno_enem2013_dom_cinza.pdf . Acesso em: 30 mar. 2016.

Na questão apresentada no Quadro 7, são exigidas três habilidades: 4, 13 e 14. Na “Matriz de Referência de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias”, é possível identificar essas habilidades: (4) “Reconhecer posições críticas aos usos sociais que são feitos das linguagens e dos sistemas de comunicação e informação”; (13) “Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos”; e, por fim, (14) “Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos”.

Apesar de a questão não tratar da especificidade do texto literário, ela se fixa apenas a uma abordagem de nível temático; ainda assim, essa é uma questão que pode ser inserida na perspectiva do letramento literário, porque se enquadra na terceira instância proposta por Cosson (2006) - a aprendizagem por meio da literatura, uma vez que o poema Olá! Negro conduz o candidato a uma reflexão sobre aspectos raciais, étnicos e culturais; o mesmo vale para o princípio da “aprendizagem da literatura”, já que o que se pretende avaliar na questão está amparado, de fato, na leitura da obra.

Na questão 116 (Quadro 8), podemos observar como a avaliação do conhecimento de aspectos da crítica e teoria literárias pode se dar a partir da leitura de um texto.

QUADRO 8 Questão 116 da prova de literatura do Enem 

Capítulo LIV - A pêndula
Saí dali a saborear o beijo. Não pude dormir; estirei-me na cama, é certo, mas foi o mesmo que nada. Ouvi as horas todas da noite. Usualmente, quando eu perdia o sono, o bater da pêndula fazia-me muito mal; esse tique-taque soturno, vagaroso e seco parecia dizer a cada golpe que eu ia ter um instante menos de vida. Imaginava então um velho diabo, sentado entre dois sacos, o da vida e o da morte, e a contá-las assim:
- Outra de menos...
- Outra de menos...
- Outra de menos...
- Outra de menos...
O mais singular é que, se o relógio parava, eu dava-lhe corda, para que ele não deixasse de bater nunca, e eu pudesse contar todos os meus instantes perdidos. Invenções há, que se transformam ou acabam; as mesmas instituições morrem; o relógio é definitivo e perpétuo. O derradeiro homem, ao despedir-se do sol frio e gasto, há de ter um relógio na algibeira, para saber a hora exata em que morre.
Naquela noite não padeci essa triste sensação de enfado, mas outra, e deleitosa. As fantasias tumultuavam-me cá dentro, vinham umas sobre outras, à semelhança de devotas que se abalroam para ver o anjo-cantor das procissões. Não ouvia os instantes perdidos, mas os minutos ganhados.
ASSIS, M. Memórias póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992 (fragmento)
O capítulo apresenta o instante em que Brás Cubas revive a sensação do beijo trocado com Virgília, casada com Lobo Neves. Nesse contexto, a metáfora do relógio desconstrói certos paradigmas românticos, porque
A. o narrador e Virgília não têm percepção do tempo em seus encontros adúlteros.
B. como “defunto autor”, Brás Cubas reconhece a inutilidade de tentar acompanhar o fluxo do tempo.
C. na contagem das horas, o narrador metaforiza o desejo de triunfar e acumular riquezas.
D. o relógio representa a materialização do tempo e redireciona o comportamento idealista de Brás Cubas.
E. o narrador compara a duração do sabor do beijo à perpetuidade do relógio.
GABARITO: D

Fonte: Questão retirada da prova de literatura do Enem 2013. Disponível em: http://download.inep.gov.br/educacao_basica/enem/provas/2013/caderno_enem2013_dom_cinza.pdf. Acesso em: 30 mar. 2016.

A habilidade requerida para a resolução dessa questão é a de número 16, que é: “Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário”.

Em tal questão, o candidato terá que interpretar o trecho de Memórias Póstumas de Brás Cubas, no qual é significativa a presença da metáfora do relógio como a concretização do tempo, que redireciona o comportamento idealista do personagem Brás Cubas. O tempo não assume o caráter de um construto - aquilo que não se pode ser observado -, pelo fato mesmo de ele ser “visível”, quase palpável, como podemos verificar no trecho: “[...] esse tiquetaque soturno, vagaroso e seco parecia dizer a cada golpe que eu ia ter um instante menos de vida”. E é justamente pela ideia do tempo como algo do qual não se pode fugir que a idealização (nesse caso, a amorosa, um dos grandes paradigmas do Romantismo) é redirecionada. Sendo assim, para o candidato solucionar essa questão, ele precisa compreender o recurso da metáfora do relógio na relação com a desconstrução dessa concepção romântica.

Essa questão aglutina de maneira muito eficiente dois tipos de conhecimentos, na medida em que também avalia se o candidato foi capaz de traçar o raciocínio desejado: o saber relativo a um procedimento estilístico (a utilização metafórica da linguagem) e o saber de uma característica (idealização) de um estilo literário (o Romantismo), saberes esses ativados a partir do contato mesmo com o texto. O candidato pode não conhecer previamente esse paradigma romântico, mas a questão propicia isso quando, no enunciado, é dito que, “a metáfora do relógio desconstrói certos paradigmas românticos”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise das provas nos fez concluir que tanto a prova de literatura da UFPE quanto a do Enem são condizentes com os seus documentos normatizadores: a primeira segue os conteúdos estipulados no manual do candidato; e a segunda, as noções de competências e habilidades, os conteúdos apresentados no tópico “Objetos de conhecimento associados às Matrizes de Referência” (BRASIL, 2011), bem como a ideia da prática de leitura como “arquicompetência”, defendida na Fundamentação Teórico-Metodológica.

Observamos também que a prova do Enem segue uma orientação mais cognitivista e construtivista, ao passo que o vestibular da Covest apresenta um caráter conteudista. Tanto que, no Exame Nacional, não há sequer uma questão que exija do candidato a memorização de conceitos, definições, periodização, características de obras, etc., diferentemente da prova da UFPE, que requisita sobremaneira essa habilidade, sobretudo nas questões em que não figura texto literário. Essa conclusão se associa a outra: é melhor que se apresente o texto, mesmo que em fragmentos (desde que o excerto apresente unicidade), do que privar o candidato de lê-lo, porque a construção e a avaliação dos saberes literários devem partir do contato direto com a obra. Se assim não for, o risco de a questão se tornar tão somente um instrumento de avaliação da capacidade de memorizar é alto.

Verificamos também que quatro questões do Enem visam apenas à interpretação do texto e desconsideram a dimensão estética que há em qualquer exemplar do gênero literário. De acordo com nossa visão, qualquer texto de qualquer gênero pode se prestar a tal objetivo; por isso, é importante que, na formulação das questões, seja levado em conta o elemento que diferencia o gênero literário dos demais, que é o trabalho artístico que se faz com a linguagem. Já na prova da UFPE, em oito questões (metade da prova, portanto), além da abordagem de outros aspectos nas proposições, versa-se também a respeito do trabalho realizado no nível da palavra.

Vale destacar ainda que a prova da Covest reforça o cânone literário, porque todos os autores estipulados no programa são consagrados pela crítica especializada. A prova do Exame Nacional, por sua vez, é constituída tanto por amostras de textos de alguns autores que formam o cânone literário, como Raimundo Correia, Machado de Assis, Oswald de Andrade e Clarice Lispector, quanto por produções de autores contemporâneos.

Por fim, observamos que as questões do Exame Nacional conferem uma abordagem atual aos textos literários, em contraposição à prova da UFPE, que parece estar ainda muito apegada à noção de “escola literária”.

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1Base Curricular Comum para as Redes Públicas de Ensino de Pernambuco (BCC) e Orientações Teórico-metodológicas (OTM).

2Cf. Silva e Suassuna (2012) e Nóbrega e Suassuna (2011).

3Cury (op. cit.) destaca, inclusive, que as várias reformas ocorridas na educação secundária no Brasil ao longo da história, procurando equacionar as três funções básicas (formativa, propedêutica e profissionalizante), levaram o EM a oscilar entre um modelo conservador, de um lado, e a ampliação dos espaços de cidadania e democracia, de outro.

4Essas DCNEM atualizam a primeira versão, que fora lançada em 1998.

5Cf. o documento MEC-Inep - Matriz de referência para o Enem 2009 (disponível em: http://download.inep.gov.br/download/enem/matriz_referencia.pdf.

6Destacamos que, quando da realização do certame em tela, a UFPE ainda não havia aderido de forma plena ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu) para ingresso no ensino superior público via Enem.

7Seguimos a definição de “cânone” proposta por Fidelis: “[...] obras literárias aceitas como legítimas pelos círculos dominantes e dignas de serem perpetuadas”. (FIDELIS, 2008, p. 19).

8Acreditamos, assim como Abaurre (1995), que as provas de vestibulares exercem influência na dinâmica da escola: “as escolas procuram adequar suas práticas aos ‘moldes’ impostos pelos concursos vestibulares das universidades [...]” (ABAURRE, 1995, p. 482).

9MACEDO, L. de. A situação-problema como avaliação e como aprendizagem. In: BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Exame Nacional do Ensino Médio (Enem): fundamentação teórico-metodológica. Brasília, 2005a. p. 29-36. MACEDO, L. de. Competências e habilidades: elementos para uma reflexão pedagógica. In: BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Exame Nacional do Ensino Médio (Enem): fundamentação teórico-metodológica. Brasília, 2005b. p. 13-28. MACEDO, L. de. Propostas para pensar sobre situações-problema. In: BRASIL. Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Exame Nacional do Ensino Médio (Enem): fundamentação teórico-metodológica. Brasília, 2005c. p. 37-39.

10Vide análise da questão 2, no tópico “Aproximações e distanciamentos entre a prova de literatura do Enem e a prova de literatura da UFPE”.

Recebido: 31 de Março de 2016; Aceito: 24 de Maio de 2019

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