SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.32FORMAS DE INGRESSO NOS CURSOS TÉCNICOS DE NÍVEL MÉDIO DA REDE FEDERAL DE ENSINOMARCO REGULATÓRIO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Compartilhar


Estudos em Avaliação Educacional

versão impressa ISSN 0103-6831versão On-line ISSN 1984-932X

Est. Aval. Educ. vol.32  São Paulo  2021  Epub 21-Dez-2021

https://doi.org/10.18222/eae.v32.7560 

Artigos

AVALIAÇÃO COMO APRENDIZAGEM: CONCEPTUALIZAÇÃO E MAPEAMENTO DE ESTUDOS

EVALUACIÓN COMO APRENDIZAJE: CONCEPTUALIZACIÓN Y MAPEO DE ESTUDIO

ASSESSMENT AS LEARNING: CONCEPTUALIZATION AND MAPPING STUDY

CAIO MÁRIO GUIMARÃES ALCÂNTARAI 
http://orcid.org/0000-0003-3176-3409

MARIA JOÃO LOUREIROII 
http://orcid.org/0000-0002-5041-8689

RONALDO NUNES LINHARESIII 
http://orcid.org/0000-0002-3400-4910

IUniversidade de Aveiro (UA), Aveiro, Portugal; Universidade Tiradentes (UNIT), Aracaju-SE, Brasil; caioalcantara@ua.pt

IIUniversidade de Aveiro (UA), Aveiro, Portugal; mjoao@ua.pt

IIIUniversidade Tiradentes (UNIT), Aracaju-SE, Brasil; ronaldo_linhares@unit.br


RESUMO

Apresenta-se uma revisão sistemática da literatura sobre a Avaliação como Aprendizagem (AcA), modelo no qual o aluno torna-se o centro da avaliação do próprio percurso de aprendizagem. A revisão considera os procedimentos de Cardoso, Alarcão e Celorico (2010) e Faria (2016). Foi estabelecido um protocolo para seleção de um corpus de 11 artigos. A pesquisa teve dois objetivos: mapear a produção acadêmica sobre a AcA, considerando período de surgimento do conceito, estudos publicados até o presente, autores de referência e revistas em que os artigos foram publicados; e analisar a conceptualização da AcA dos autores de referência. Infere-se que AcA é um conceito recente e que os estudos relacionados têm sido publicados sobretudo na última década, centrados no ensino básico.

PALAVRAS-CHAVE: AVALIAÇÃO DO ALUNO; REVISÃO DE LITERATURA; CONCEITO

RESUMEN

Se presenta una revisión sistemática de la literatura sobre la Evaluación como Aprendizaje (EcA), modelo en el que el alumno se convierte en el centro de la evaluación del propio recorrido de aprendizaje. La revisión considera los procedimientos de Cardoso, Alarcão y Celorico (2010) y Faria (2016). Se estableció un protocolo para seleccionar un corpus de 11 artículos. La investigación tuvo dos objetivos: mapear la producción académica sobre EcA, considerando el periodo de aparición del concepto, estudios publicados hasta el presente, autores de referencia y revistas en las que los artículos han sido publicados; y analizar la conceptualización de EcA de los autores de referencia. Se infiere que EcA es un concepto reciente y que los estudios relacionados han sido publicados sobre todo en la última década, centrados en la educación básica.

PALABRAS CLAVE: EVALUACIÓN DEL ESTUDIANTE; REVISIÓN DE LITERATURA; CONCEPTUALIZACIÓN

ABSTRACT

This article presents a systematic literature review about Assessment as Learning (AaL), a process where the student becomes the center of their own path of learning. The review appraises the research conducted by Cardoso, Alarcão, and Celorico (2010) and Faria (2016). A protocol was established to select a body of 11 articles. The review had two objectives: to map the academic production on AaL, considering the period the concept was introduced and the studies published to date; map the reference authors and the journals in which the articles are published; and to analyze the conceptualization of the AaL of the reference authors. It is inferred that AaL is a recent concept and that related studies have been published mainly in the last decade, focusing on basic education.

KEYWORDS: STUDENT EVALUATION; LITERATURE REVIEW; CONCEPTUALIZATION

INTRODUÇÃO

A Avaliação Formativa (AF) tem sido descrita em diversos estudos como objeto relevante para o campo da pesquisa sobre Avaliação Educacional, especialmente pelos contributos dessa abordagem da avaliação para a aprendizagem (CROOKS, 1988; SADLER, 1989; BLACK; WILLIAM, 1998; BENNETT, 2011). O primeiro uso do termo de que se tem registro foi feito por Scriven (1966), que descreveu uma avaliação que possibilita ajustes para o desenvolvimento e experimentação de um novo currículo ou método de ensino. Naquele contexto, a AF servia para a avaliação de metodologias e materiais de cursos.

Anos mais tarde, Bloom, Hasting e Madaus (1971) utilizaram pela primeira vez o termo Formative Evaluation na definição do processo de avaliação da aprendizagem desenvolvido ao longo de toda a formação que serve para professores e alunos verificarem o seu desempenho. Percebe-se uma influência do pensamento de Scriven (1966) no que se refere à processualidade da avaliação, mas a AF passa a ser entendida não mais como uma avaliação de caráter institucional, e sim como avaliação de desempenho.

Apesar do surgimento de um novo entendimento sobre a AF, não houve preocupação com o estabelecimento de um conceito unânime que a definisse. Em sua revisão de literatura, Crooks (1988) apontou a pluralidade de termos e a inconsistência científica referente à AF. Na visão dele, a pesquisa experimental sobre avaliação formativa tinha, na década de 1980, “[...] validade muito limitada, devido a condições artificiais de experimentação, tratamentos muito breves ou outros fatores”1 (CROOKS, 1988, p. 439, tradução nossa). Algo que já havia sido identificado por Natriello (1987), que considerava as pesquisas sobre AF irrelevantes, principalmente por lacunas conceituais.

Ao longo dos anos, houve uma mudança no entendimento sobre a contribuição de alunos e de professores para a AF, o que marcou um novo patamar na construção do conceito. Allal (1991) buscou organizar o debate, separando avaliação educacional em três ramos: o prognóstico (de interesse da gestão escolar e quantitativo), o somativo (destinado à comunidade externa, com caráter também quantitativo) e o formativo (de interesse dos professores e alunos, qualitativo). Segundo ela, a AF é a avaliação que tem como objetivo o fornecimento contínuo de feedback concernente ao progresso do aluno, que serve para definir as adaptações de atividades e avaliar as relações entre os resultados da aprendizagem e o processo de ensino.

Os estudos publicados na década de 1990 são, na visão de Black e William (1998), os que melhor representam a mudança de foco na pesquisa sobre AF, que passa a analisar as relações entre os sujeitos, o ensino e a aprendizagem. Esse entendimento foi ampliado e aprofundado, formando o conceito de AF que norteia a discussão desta sistematização da literatura: compreensão sistêmica, com convergência de procedimentos e linguagens que serve para o professor identificar potencialidades e falhas no processo de ensino e para o aluno saber como pode melhorar a aprendizagem (HADJI, 2001; LUCKESI, 2013; FERNANDES, 2016).

Black e William (2018) apontam que a divergência de termos e compreensões é ainda mais grave quando consideradas as abordagens da AF, ou avaliação de desempenho do aluno, comumente caracterizadas como: avaliação da aprendizagem (AdA), avaliação para a aprendizagem (ApA) e, mais recentemente, avaliação como aprendizagem (AcA). Ressalta-se que, apesar do entendimento de que as três abordagens estão relacionadas à AF, cada autor as define de um modo distinto, especialmente a AcA (BENNETT, 2011; HAYWARD, 2015).

Neste texto, considera-se a definição de Earl (2003), que conceitua: i) a AdA como a avaliação cujos resultados são tornados públicos e servem como certificado de proficiência, destinados à comunidade escolar; ii) a ApA como a avaliação desenvolvida ao longo do processo de aprendizagem com propósito de adequação para que o professor decida o que pode fazer para ajudar o aluno por meio de feedback; e iii) a AcA, focada no estudante, com vistas a desenvolver o student agency e ênfase na avaliação como um processo de aprendizagem metacognitivo.

Pensar a AcA por perspectiva acima referida significa compreender que a aprendizagem é mais do que transferência de conhecimento, mas “[...] um processo ativo de reestruturação cognitiva que ocorre quando os indivíduos interagem com novas ideias”2 (EARL, 2006, p. 41, tradução nossa). Para que haja AcA, é preciso o estímulo a posturas autônomas nos alunos, que devem desenvolver comportamentos que culminem na formação de “[...] avaliadores críticos que dão sentido às informações, as relacionam com o conhecimento anterior e as utilizam para novas aprendizagens”3 (EARL, 2006, p. 41, tradução nossa).

A natureza da AcA encerra em si um caráter inovador, especialmente porque muda o eixo do processo de avaliação, conferindo ao aluno o papel de avaliador e destinatário principal de suas análises, algo que não ocorre nas demais abordagens com a mesma intensidade que na AcA. Essa característica pressupõe mudanças profundas na educação, mas a utilização do termo sem que haja clareza em sua natureza, conceito e procedimentos prejudica a concretização da inovação inerente à AcA.

A lacuna provocada pela falta de consenso relativo à AcA justifica o delineamento dos estudos sobre essa abordagem da AF e a clarificação do conceito. Propõe-se, portanto, essa sistematização da literatura, cujos objetivos foram: mapear a produção acadêmica sobre a AcA, considerando o período de surgimento do conceito e os estudos publicados até o presente, os autores de referência e as revistas em que os artigos foram publicados; e analisar a conceptualização da AcA. A partir desses objetivos, será possível responder às seguintes questões de investigação: i) quando surge o conceito de AcA?; ii) quais os autores considerados referências?; iii) quais as revistas que publicaram os artigos considerados referências?

O estudo foi desenvolvido como uma revisão sistemática da literatura sobre a avaliação como aprendizagem, complementada por pesquisas efetuadas em redes sociais acadêmicas, como o ResearchGate e nos perfis Google, tendo em conta autores de referência na área. Esta revisão sistemática da literatura considera os procedimentos metodológicos para coleta e análise de dados preconizados por Cardoso, Alarcão e Celorico (2010) e Faria (2016) e a estrutura de artigo científico sugerida por Figueiredo (2010). Foram considerados artigos publicados nos últimos 20 anos em periódicos científicos com processo de revisão por pares.

Nas próximas seções, damos conta das opções metodológicas do estudo e das etapas de coleta e análise dos artigos, assim como dos resultados e do mapeamento das publicações sobre AcA selecionadas. No final deste estudo, colocamos o foco nos contributos do estudo e evidenciamos a pertinência metodológica de uma sistematização da literatura no presente estudo.

DESENHO METODOLÓGICO: CONCEPÇÕES E PERCURSOS

Este estudo é de natureza qualitativa, por considerar a imersão em níveis mais pessoais por parte do pesquisador nas etapas de definições, busca e interpretação de resultados (BOGDAN; BICKLEN, 2013). Caracteriza-se como uma revisão sistemática da literatura, seguindo as recomendações de Cardoso, Alarcão e Celorico (2010) e de Faria (2016). É entendida, portanto, como um processo sistematizado com quatro momentos distintos de leitura para seleção, caracterização, categorização e interpretação de textos (CARDOSO; ALARCÃO; CELORICO, 2010) que devem “[...] empregar uma metodologia de pesquisa com rigor científico e de grande transparência” (FARIA, 2016, p. 20).

Para esta sistematização, foi adaptado um protocolo que sintetiza a busca e possibilita a aplicabilidade da pesquisa em outros contextos, servindo como guião de transferibilidade. O protocolo está disposto no Quadro 1.

QUADRO 1 Protocolo de esquematização da revisão de literatura 

OBJETIVOS
• Mapear a produção acadêmica sobre a AcA, considerando o período de surgimento do conceito e os estudos publicados até a presente, os autores de referência e as revistas em que os artigos foram publicados;
• Analisar a conceptualização da AcA.
EQUAÇÕES DE PESQUISA
• Avaliação como Aprendizagem
• Avaliação como Aprendizagem AND Conceptualização
• Avaliação como Aprendizagem AND Avaliação Formativa
• Assessment as Learning
• Assessment as Learning AND Conceptualization
• Assessment as Learning AND Formative Assessment
• Evaluación como aprendizaje
• Evaluación como aprendizaje AND conceptualización
• Evaluación como aprendizaje AND evaluación formativa
BASES DE DADOS E AGREGADORES
• Scopus
• Eric - Education Resources Information Center
• SciELO - Scientific Electronic Library Online
• RCAAP - Repositórios Científicos de Acesso Aberto de Portugal
CRITÉRIOS DE INCLUSÃO
• Artigos publicados em revistas científicas com processo de revisão por pares
• Artigos disponibilizados para download na íntegra e de forma gratuita
• Artigos publicados em inglês, espanhol ou português
• Artigos publicados entre 1998 e 2019
CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO
• Artigos que não foram publicados em revistas científicas com processo de revisão por pares, ou seja, artigos publicados em livros, dissertações, teses, relatórios, etc.
• Artigos não disponibilizados para download na íntegra e de forma gratuita
• Artigos publicados antes de 1998

Fonte: Adaptado de Faria (2016).

Uma vez definido o protocolo de sistematização da revisão de literatura, foram iniciadas as buscas nas bases de dados definidas, durante os meses de maio de 2018 e abril de 2020. Além dos termos que constam no protocolo, foram aplicados filtros de seleção relacionados aos critérios de inclusão e seleção da sistematização aqui descrita. Os resultados quantitativos compõem o Quadro 2, seguidamente disposto.

QUADRO 2 Quantificação dos artigos numa relação busca vs base de dados 

TERMOS SCOPUS ERIC SCIELO RCAAP
Avaliação como aprendizagem 6 18 0 3
Avaliação como aprendizagem + Avaliação formativa 8 1 0 2
Avaliação como aprendizagem + Conceptualização 0 0 0 1
TOTAL - 39

Fonte: Elaboração dos autores.

Os artigos obtidos foram submetidos ao processo de sistematização definido por Cardoso, Alarcão e Celorico (2010), que preconiza a realização de quatro etapas de leitura, cada uma com tipos e finalidades específicos. Na primeira etapa, de caráter exploratório e com a finalidade de sondagem, foram lidos os títulos e palavras-chave de cada um dos artigos. Esse primeiro trabalho possibilitou a exclusão de 23 artigos (textos repetidos, que não discutiam a AcA, publicados como capítulo de livro, tese, relatório de disciplina ou em eventos científicos).

Para a segunda leitura, de reconhecimento e identificação, foi realizado o ­download de cada um dos dezesseis artigos restantes. Uma leitura seletiva das introduções e conclusões dos textos possibilitou a exclusão de mais nove artigos, os quais não estavam completamente relacionados à proposta dessa revisão sistemática, por não tratarem da AcA, mas de AF num sentido mais amplo. Após a segunda rodada de leitura, restaram sete artigos que reuniam as características preconizadas pela sistematização proposta.

A considerar o marco temporal estabelecido para o estudo e o fato de o primeiro registro do termo AcA datar de 2002, esse total foi considerado como aquém da expectativa inicial. Iniciou-se então uma nova busca, dessa vez na rede social acadêmica ResearchGate, considerando os mesmos termos de busca e critérios estabelecidos no protocolo. Essa nova procura resultou em mais quatro artigos, comprovando que, de fato, a disponibilidade de artigos publicados que discutam o conceito ou que relatem experiências de AcA é escassa.

Uma vez finalizada a busca por artigos, a sistematização da literatura chegou a um total de onze textos, dispostos no Quadro 3.

QUADRO 3  Corpus de análise após etapas da leitura de sistematização 

SCOPUS ERIC SCIELO RCAAP RESEARCHGATE
4 2 0 1 4
TOTAL - 11

Fonte: Elaboração dos autores.

O corpus de análise foi então submetido a outras duas etapas de leitura, uma interpretativa, com vistas a compreender o texto, e outra crítica, com análise do conteúdo disposto. Esse procedimento traduz-se numa análise documental (CARDOSO; ALARCÃO; CELORICO, 2010), que considerou os seguintes aspectos em cada uma das publicações: i) ano; ii) país de origem do estudo; iii) revista responsável pela publicação; iv) conceito de AcA; v) autores de referência utilizados para conceituar a AcA.

Ressalta-se ainda que, depois de lidos e analisados os conteúdos dos estudos, foi feito um mapeamento dos autores e obras consideradas de referência, aquelas que mais foram citadas quando da conceptualização da AcA. Esse trabalho foi completado com uma busca nos perfis Google que permitiu visualizar o impacto das produções de cada um desses autores. As obras mais citadas foram também buscadas e lidas para uma melhor compreensão do surgimento e evolução do conceito de AcA. Os resultados dessas buscas foram sintetizados, sendo seguidamente descritos e discutidos.

DISCUSSÕES E RESULTADOS: A CONFIGURAÇÃO DOS DEBATES SOBRE AcA NA LITERATURA

Os artigos que foram obtidos com as buscas acima descritas foram listados e compõem o Quadro 4, com a caracterização do corpus de análise. De um modo geral, percebe-se que as experiências de AcA, bem como sua conceptualização e publicação estão concentradas no eixo Estados Unidos-Reino Unido. Além de serem estudos muito recentes (a maioria com menos de cinco anos), há uma predominância de pesquisas de levantamento bibliográfico.

A análise dos artigos levou ao entendimento de que há três autores de referência nos estudos sobre AcA, nomeadamente Harry Torrance, Ruth Dann e Lorna Earl. Além de serem os primeiros a descreverem e discutirem a AcA, são os autores mais citados nos demais artigos. Importante se faz destacar que Lorna Earl não publicou artigos que se enquadrassem no protocolo de busca desta sistematização. Seus contributos são, portanto, livros que trabalham o conceito, também discutidos nesta revisão.

Vale ressaltar que, conforme a sistematização proposta para este levantamento, a análise considera dois grupos: o primeiro composto pelos artigos que versam sobre experiências de AcA que foram encontrados com as buscas, e o segundo composto somente pelos trabalhos dos autores de referência, aqueles que são citados nos artigos na conceptualização da AcA (os textos que estão nos dois grupos aparecem sublinhados na tabela).

QUADRO 4 Caracterização dos artigos obtidos com a sistematização 

AUTORES/ANO TÍTULO REVISTA
Harry Torrance (2007) Assessment as learning? How the use of explicit learning objectives, assessment criteria and feedback in post-secondary education and training can come to dominate learning Assessment in Education
Carol Mutch (2012) Assessment for, of and as learning: developing a sustainable assessment culture in New Zeland schools Policy Futures in Education
Daniel T. Hickey; Gita Taasoobshirazi; Dionne Cross (2012) Assessment as Learning: Enhancing Discourse, Understanding, and Achievement in Innovative Science Curricula Journal of research in science teaching
Ana Jorge Balula (2014) Avaliação digital como aprendizagem Educação, Formação e Tecnologias
Ruth Dann (2014) Assessment as learning: blurring the boundaries of assessment and learning for theory, policy and practice Assessment in Education: Principles, Policy & Practice
Ricky Lam (2016) Assessment as learning: examining a cycle of teaching, learning, and assessment of writing in the portfolio-based classroom Studies in higher education
Ruth Dann (2016) Developing understanding of pupil feedback using Habermas’ notion of communicative action Assessment in Education: Principles, Policy & Practice
Karim Sadeghi; Teymour Rahmati (2017) Integrating assessment as, for, and of learning in a large-scale exam preparation course Assessing Writing
Cecilia Ferm Almqvist; John Vinge; Lauri Väkevä; Olle Zandén (2017) Assessment as learning in music education: The risk of “criteria compliance” replacing “learning” in the Scandinavian countries Research studies in music education
Ricky Lam (2018) Understanding Assessment as Learning in Writing Classrooms: The Case of Portfolio Assessment Iranian Journal of Language Teaching Research
Xiangdong Li (2018) Self-assessment as “assessment as learning” in translator and interpreter education: validity and washback The Interpreter and Translator Trainer

Fonte: Elaboração dos autores.

O primeiro aspecto a chamar atenção é referente à temporalidade das publicações. Conforme o protocolo de sistematização proposto para esta revisão, foi definido um marco temporal de duas décadas para a busca por artigos (considerando que a primeira ocorrência do termo AcA consta de um livro publicado em 2002). Apesar do largo espaço de tempo, só foram localizados artigos publicados a partir de 2007, conforme a composição da Figura 1, que mostra também a baixa ocorrência de publicações, um máximo de duas por ano.

Fonte: Elaboração dos autores.

FIGURA 1 Caracterização dos artigos quanto ao ano de publicação 

A considerar que os estudos não são publicados no mesmo ano em que são desenvolvidos (é preciso tratar e analisar dados, escrever e editar os artigos e submetê-los ao processo de avaliação por pares, além da edição das revistas), e que o primeiro artigo data de 2007, percebe-se uma sequência temporal de evolução do conceito. O primeiro registro do termo AcA é de um livro de Ruth Dann, publicado em 2002. O termo aparece novamente somente em 2006, em outro livro publicado por Lorna Earl, o qual baseou o primeiro estudo empírico sobre AcA, desenvolvido por Torrance e publicado em 2007.

Somente em 2012 o termo aparece em novas publicações; notadamente, nos artigos de Mutch (2012) e de Hickey, Taasoobshirazi e Cross (2012) e em outro artigo de Torrance (2012) que não está incluído neste corpus por não atender aos critérios de inclusão do protocolo de sistematização (o texto em questão não é de acesso livre nem foi disponibilizado pelo autor). A partir de 2012, houve uma disseminação discreta do termo e do conceito, o que aponta para uma divulgação e interesse dos estudos sobre a AcA.

A partir de 2012, e com uma influência forte dos trabalhos publicados por Torrance, começam a surgir mais pesquisas nessa área. Há, contudo, uma frequência estabelecida de publicações somente a partir de 2016, o que fortalece o argumento de que este é um objeto ainda recente na literatura e bastante concentrado em países de língua inglesa, o que pode ser percebido com a leitura da Figura 2.

Fonte: Elaboração dos autores.

FIGURA 2 Caracterização dos artigos quanto à origem dos estudos 

Há uma concentração de publicações em países de língua inglesa. Uma das justificativas para tal é o fato de que a primeira utilização do termo AcA foi feita por Dann (2002), professora da Manchester Metropolitan University, na Inglaterra, universidade onde Torrance, outro autor de referência, está alocado. A esse grupo, são somadas as pesquisas desenvolvidas nos Estados Unidos, na Indiana University (HICKEY; TAASOOBSHIRAZI; CROSS, 2012), e na Nova Zelândia, na University of Auckland (MUTCH, 2012). Há ainda os dois estudos desenvolvidos em Hong Kong, na Hong Kong Baptist University, região que tem o inglês como língua oficial (LAM, 2016, 2018). As pesquisas executadas em países de língua inglesa chegam a quase 64% do total.

As outras pesquisas estão divididas entre universidades da Escandinávia, a saber, Lulea University of Technology, Norway Academy of Music, Sibelius Academy of the University of the Arts Helsink e Linnaeus University (ALMQVIST et al., 2017); em Portugal, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Águeda (BALULA, 2014); no Irã, na Urmia University (SADEGHI; RAHMATI, 2017); e na China, na Xi’na International Studies University (LI, 2018).

As publicações advindas do espalhamento do conceito e aplicação em experiências fora dos países de língua inglesa só começam a surgir a partir de 2014. Esse é um dado importante, pois mostra que, além de a AcA ser um tema pouco explorado e sem pesquisas consolidadas, é ainda mais incipiente fora da comunidade de língua inglesa. Essa característica pode ter repercussão na caracterização teórica e desenho metodológico, que podem apresentar inconsistências, algo percebido por Crooks (1988), Natriello (1987) e Black e William (2018). Nesse sentido, percebeu-se a importância de verificar os objetos, os tipos e os níveis educacionais em que a AcA é aplicada nos estudos, verificação que está disposta no Quadro 5.

QUADRO 5 Caracterização dos artigos quanto aos objetos  

AUTORES/ANO OBJETO
Harry Torrance (2007) Pesquisa empírica sobre o impacto de diferentes modelos e métodos de avaliação na aprendizagem de alunos do ensino básico matriculados em cursos de preparação acadêmica.
Carol Mutch (2012) Análise documental que analisa os documentos oficiais da Nova Zelândia para discutir a cultura de avaliação do ensino básico predominante no país.
Daniel T. Hickey; Gita Taasoobshirazi; Dionne Cross (2012) Estudo empírico que descreve uma experiência de aplicação da AcA em cursos de Biologia, Astronomia e Ecologia no ensino superior.
Ana Jorge Balula (2014) Revisão de literatura sobre a utilização de ambientes virtuais para experiências de AcA e ApA como estratégia de ensino e de aprendizagem no ensino superior.
Ruth Dann (2014) Revisão de literatura sobre como estudantes utilizam o feedback para a autorregulação da aprendizagem no ensino básico.
Ricky Lam (2016) Revisão sistemática de literatura sobre a eficiência da AcA como suporte à aprendizagem de alunos do ensino básico.
Ruth Dann (2016) Revisão de literatura sobre as relações entre o feedback dos alunos do ensino básico, a Teoria do Agir Comunicativo e a AcA.
Karim Sadeghi; Teymour Rahmati (2017) Pesquisa empírica sobre os contributos da AcA na avaliação de alunos num curso de inglês preparatório para o teste de proficiência de Cambridge.
Cecilia Ferm Almqvist; John Vinge; Lauri Väkevä; Olle Zandén (2017) Pesquisa empírica sobre AcA como estratégia de avaliação e aprendizagem em aulas de música no ensino básico na Suécia e na Noruega.
Ricky Lam (2018) Revisão de literatura sobre os contributos da AcA para o desenvolvimento da escrita de alunos em cursos de segundo idioma.
Xiangdong Li (2018) Estudo empírico sobre a autoavaliação como recurso da AcA num curso de formação de tradutores.

Fonte: Elaboração dos autores.

Os artigos descrevem experiências que podem ser divididas em quatro categorias que se cruzam: i) estudos sobre a AcA no ensino básico; ii) estudos sobre AcA no ensino superior; iii) estudos empíricos; e iv) estudos teóricos. A maioria absoluta dos artigos relata experiências no ensino básico, um total de oito. Desses, três são relatos de estudos empíricos, e cinco são trabalhos de discussão teórica. A AcA no ensino superior é o foco de somente três artigos, sendo dois relatos de estudos empíricos e um trabalho teórico.

Percebe-se uma maior ocorrência de estudos (tanto de pesquisa empírica, como de revisão de literatura) com foco no ensino básico. São poucas as experiências desenvolvidas no ensino superior e, mais especificamente, na formação de professores. Em se tratando de ensino básico, há uma maioria de artigos sem experiências de campo, que só discutem trabalhos teóricos previamente publicados.

Por si, essa característica evidencia a lacuna já mostrada por Natriello (1987), Crooks (1988) e Black e William (1998, 2018), que relatavam a ausência de experiências com rigor metodológico nos estudos sobre AF. Considerando a AcA como uma modalidade da AF, é possível o entendimento de que boa parte desses trabalhos somente reúne conceitos que não são confrontados com os contextos e realidades do processo de ensino e aprendizagem. Com isso, muitos desses estudos não contribuem com avanços no campo da Avaliação Educacional.

Em se tratando das experiências no ensino superior, há uma inversão: uma maioria de estudos empíricos, um total de dois terços dos artigos. Ressalta-se, contudo, que, nesse grupo, encontram-se apenas três artigos, o que não compõe uma amostra que seja representativa de toda a realidade das pesquisas desenvolvidas sobre avaliação no ensino superior (é preciso levar em conta que muitos artigos não estão disponíveis na modalidade open access).

O dado que mais está destacado quando se analisa os objetos dos artigos é que nenhuma pesquisa está diretamente ou especificamente voltada para a atuação do professor na AcA. Há alguma discussão sobre a influência e a importância do docente nos processos, notadamente quando se fala no ensino como uma etapa da aprendizagem, mas a totalidade dos estudos tem foco no aluno. Isso prova o que é defendido por Dann (2002) e Earl (2003), quando discorrem que a AcA muda o eixo da avaliação tornando o aluno como principal elemento, mas também aponta para a necessidade de repensar e reconfigurar a formação e a prática docente para que haja a consolidação de um formato disruptivo de avaliação que privilegie a autonomia e reflexão do aluno.

Ainda em termos de caracterização do corpus de análise, a sistematização da literatura disponível considerou a verificação das revistas que publicaram os artigos. Essa etapa é importante para que seja possível visualizar quais revistas têm mais impacto, promovendo uma maior disseminação dos estudos sobre AcA. É possível verificar a concentração nos países de língua inglesa, notadamente o Reino Unido e os Estados Unidos. As únicas duas revistas de fora desse eixo são de Portugal e da Finlândia, tendo publicado artigos depois de 2014.

QUADRO 6 Caracterização dos artigos quanto às revistas 

REVISTA PAÍS FATOR DE IMPACTO QUALIS H INDEX Nº DE ARTIGO AUTORES
The Interpreter and Translator Trainer Reino Unido 0.38 XX 10 1 Li (2018)
Policy Futures in Education Reino Unido 0.34 A2 10 1 Mutch (2012)
Assessing Writing Reino Unido 2.04 XX 26 1 Hickey, Taasoobshirazi e Cross (2012)
Journal of Research in Science Teaching Estados Unidos 4.10 A1 104 1 Sadeghi e Rahmati (2017)
Iranian Journal of Language Teaching Research Finlândia 1.205 XX 3 1 Lam (2018)
Assessment in Education: Principles, Policy & Practice Estados Unidos 1.80 A2 16 2 Dann (2014, 2016)
Studies in Higher Education Reino Unido 1.27 XX 80 1 Lam (2016)
Research Studies in Music Education Reino Unido 0.60 XX 21 1 Almqvist et al. (2017)
Educação, Formação & Tecnologias Portugal XX B2 XX 1 Balula (2014)
Assessment in Education (Revista não encontrada) XX XX XX XX 1 Torrance (2007)

Fonte: Elaboração dos autores.

A configuração das revistas é um aspecto importante a analisar em termos de sistematização da literatura sobre AcA. Para além do fato de não haver uma publicação que concentre um número grande de trabalhos, servindo como referência para a área, o escopo de cada uma delas mostra em quais campos está inserida a pesquisa sobre essa abordagem da avaliação.

Apesar de ser um tema em que algumas revistas têm focagem específica, somente quatro artigos estão publicados em periódicos sobre avaliação educacional, notadamente os de Dann (2014, 2016), o de Torrance (2007) e o de Hickey, Taasoobshirazi e Cross (2012). Dos demais, seis artigos foram publicados em revistas sobre formação (profissional, em música e em ensino de línguas e ciências), mesmo considerando que boa parte desses artigos relatam experiências no ensino básico. Apenas uma pesquisa foi publicada numa revista sobre política educacional.

Essa é uma característica da pesquisa sobre avaliação educacional já verificada por Fernandes (2008, 2013): o tema carece de um arcabouço teórico-metodológico definido para que seja pensado como ciência e como transdisciplina. Esse fenômeno é comum na pesquisa sobre todas as abordagens da AF e, principalmente, nos estudos sobre AcA, por ser a mais recente delas, ainda sem uma compreensão definitiva, visto que apesar de haver uma linha temporal de evolução do conceito, muitos autores empregam o termo considerando apenas as necessidades de seus estudos (BLACK; WILLIAM, 2018).

A primeira referência a uma abordagem de avaliação totalmente centrada no aluno é de Allal (1984), que descreveu a necessidade de avanços no pensamento sobre a AF com vistas a desenvolver um modelo no qual a participação dos alunos seja mais ativa e contribua para a aprendizagem. Apesar de ser um diferencial num contexto em que a AF era compreendida como avaliação da aprendizagem ou para a aprendizagem, centrada na análise processual feita por professores, o pensamento não avançou no sentido de estabelecer-se como um conceito.

Quase duas décadas mais tarde, seria publicado o primeiro registro do termo e do conceito de AcA. Dann (2002) explica que a função do professor deve ser a de estimular uma aprendizagem que não seja pontual, mas que se concretize ao longo da vida, sendo intencional e considerando experiências pessoais dos alunos. Na visão da autora, elementos como o contexto e o ambiente são importantes para despertar o desejo de aprendizagem e devem ser considerados em todas as etapas do ensino, já que “[...] a menos que um indivíduo opte por interagir em termos cognitivos com o ambiente, a aprendizagem não ocorrerá”4 (DANN, 2002, p. 13, tradução nossa).

A ideia é executar uma avaliação como processo educacional, relacionada não apenas à aquisição de conhecimento curricular, mas à excelência humana, capaz de formar sujeitos “[...] que pensam e se envolvem com o conhecimento de maneiras imaginativas e criativas”5 (DANN, 2002, p. 15, tradução nossa). A AcA rompe com o modelo no qual o aluno é apenas um usuário das informações advindas da avaliação e passa a considerá-lo como ator de um processo que contribui para e faz parte integrante da aprendizagem. A reflexão e a autorregulação são, portanto, elementos essenciais da AcA.

A inversão do eixo de avaliação pressupõe uma quebra muito maior do que possa ser inicialmente percebido. Earl (2003) pontua que a AcA depende de um formato educacional que desenvolva no aluno as condições de autonomia para intervir, questionar e sugerir instrumentos, etapas e procedimentos da avaliação. Alguns anos mais tarde, a autora inclui em seu conceito a metacognição como elemento do processo para a AcA. Nas suas palavras, “[...] a avaliação como aprendizagem é baseada em pesquisas sobre como a aprendizagem acontece, e é caracterizada por alunos refletindo sobre sua própria aprendizagem”6 (EARL, 2006, p. 41, tradução nossa).

Para que isso ocorra, é necessário haver um processo negociado entre professores e alunos, pois a AcA considera a cooperação entre os envolvidos na aprendizagem, desde que haja um referencial de avaliação estabelecido, com critérios e indicadores previamente definidos e compartilhados. Torrance (2007), outro autor de referência com posicionamento significativamente crítico em relação à AcA, discute as armadilhas e problemas inerentes ao uso desses elementos. Para ele, a AcA é uma abordagem inovadora, com contributos na formação de sujeitos aptos à evolução do conhecimento para a vida e à aprendizagem em comunidades de prática, mas necessita de críticas e ajustes.

Torrance (2007) chama a atenção para o fato de que um processo educacional totalmente baseado em critérios e indicadores pode incorrer no erro do instrumentalismo, privilegiando objetivos e metas em detrimento das experiências e percursos pessoais que são da natureza da AcA. Para o autor, esse é um erro comum nos escritos sobre a AcA, que tendem a destacar a importância da definição e perseguição dos objetivos de aprendizagem, mesmo que consensuais. Segundo ele, esse aspecto da AcA, se não observado e controlado, pode aumentar o risco de instrumentalismo, “[...] removendo o desafio de aprender e reduzindo a qualidade e validade dos resultados alcançados”7 (TORRANCE, 2007, p. 282, tradução nossa).

Segundo Torrance (2007), o mais importante na AcA não é avaliar resultados nem percursos, mas assegurar que o aluno compreenda o que e como aprendeu. Esse posicionamento influenciou toda a pesquisa sobre AcA publicada e localizada nesta sistematização, inclusive escritos da própria autora do termo. Dann (2014) reformula o conceito acrescentando um debate sobre o feedback como principal recurso de empoderamento do aluno e fuga do instrumentalismo. A autora ainda define instrumentos a serem utilizados na AcA e estratégias como a autoavaliação e a avaliação por pares.

Em relação ao uso de feedback na AcA, Dann (2016) tece críticas ao que até então era apresentado tanto em artigos teóricos como nos poucos relatos de estudo empírico. Para ela, apesar de autores como Hattie e Timperley (2007) e Shute (2008) citarem vantagens do feedback na aprendizagem, não há uma exploração ampla e aprofundada desse recurso, que geralmente ocorre do professor para o aluno.

Dann (2016) defende que a utilização ideal do feedback na AcA pressupõe que o professor direcione e oriente a aprendizagem, não somente com comentários gerais, mas apontando correções necessárias para um melhor andamento de atividades e ações. O diferencial é que, para a autora, é necessário reflexão sobre o que os alunos apresentam em termos de respostas, quer seja sobre a própria evolução, quer seja sobre a dos pares, mas também do desempenho docente e andamento dos cursos. Isso consolidaria uma aprendizagem mais conectada a um modelo de educação que possibilite a autonomia e empodere os alunos.

A evolução do conceito é representada pelo esquema contido na Figura 3, que facilita a visualização de como o entendimento teórico sobre a AcA surge e se modifica.

Fonte: Elaboração dos autores.

FIGURA 3 Evolução do conceito de AcA 

Esses autores são considerados referências não somente por terem sido pioneiros na utilização do termo e por definirem os processos e instrumentos da AcA, mas por serem os autores que são utilizados por quase todas as pesquisas quando da definição teórica de AcA. Eles não são os únicos a serem referenciados (o que pode ser percebido com a leitura da Figura 4), mas suas ideias são as mais disseminadas e as que mais influenciam os debates.

Na Figura 4, estão dispostos todos os autores cujos artigos foram obtidos com a sistematização da literatura e também os que são utilizados por eles para referenciar a AcA numa composição de relação entre eles configurada da seguinte maneira: a partir do tema, são indicados os textos de referência, seguidos dos autores que os citam.

Fonte: Elaboração dos autores.

FIGURA 4 Configuração da relação entre os autores e a AcA 

O esquema mostra que, entre os autores considerados referências, o que mais é citado pelos pares é Torrance (2007, 2012). Para além do fato de ele ter o posicionamento mais crítico acerca da AcA, em alguns momentos até levantando dúvidas sobre sua eficácia na avaliação de desempenho de alunos, ele é o primeiro a desenvolver estudos empíricos, testando, comparando e descrevendo experiências de aplicação da AcA. Isso o coloca num patamar diferenciado em relação aos demais autores, posto que suas reflexões não são baseadas somente em interpretações da teoria já existente, algo que a própria literatura classifica como comum na pesquisa sobre avaliação educacional (BLACK; WILLIAM, 1998, 2018).

Harry Torrance, além da autorreferência, utiliza o estudo de Earl (2003) para discutir a AcA. Ressalta-se, contudo, que Torrance (2007) cita o trabalho dela não como referência teórica, mas numa análise crítica, já que para ele o entendimento sobre AcA disposto em Earl (2003) é errado, pois limita a abordagem à autoavaliação dos estudantes, estando presa a uma “[...] tradição de avaliação para a aprendizagem”8 (TORRANCE, 2007, p. 293, tradução nossa).

Apesar de ser a pioneira no uso do termo e ter a maior quantidade de artigos publicada, Ruth Dann não costuma ser citada pelos pares. Grande parte da referência ao conceito criado por ela está nos textos publicados por ela mesma (Dann, 2014, 2016). Dois dos motivos para a falta de citação dos trabalhos de Dann (2002, 2014, 2016) podem ser: as pesquisas são estritamente discussões teóricas sobre estudos prévios e teorias da aprendizagem relacionadas à AcA; e os estudos são focados na interação entre professores e alunos do ensino infantil. Essa percepção carece, contudo, de verificação.

O único autor que utiliza a pesquisa de Dann (2002) como referência é Lam (2016), pesquisador de Hong Kong que pode ser considerado referência em AcA na Ásia, já que dos artigos com resultados de pesquisas desenvolvidas naquele continente, ele é o mais publicado e citado por outros autores, notadamente Sadeghi e Ramati (2017). Sobre estes, destaca-se a informação de que têm o artigo publicado na revista com maior impacto científico, mesmo sem utilizar os autores considerados referências, apesar de estarem indiretamente inseridos no campo de influência de Dann (2002), visto que conceituam a AcA por Lam (2015, 2018).

Por fim, é necessário chamar atenção para o fato de que há autores que discutem a AcA, mas não estão relacionados a nenhum campo teórico validado. São os casos de Mutch (2012), que recorre ao relatório The collection and use of ­assessment ­information in school (EDUCATION REVIEW OFFICE, 2007) para descrever a AcA como “[...] o processo de estudantes monitorando o próprio desempenho e progresso de aprendizagem”9 (MUTCH, 2012, p. 375, tradução nossa); Hickey, Taasoobshirazi e Cross (2012), que utilizam o termo AcA, mas descrevem a AF; e Balula (2014, p. 85), que descreve a AcA como “[...] uma possibilidade interessante, uma vez que o conceito de ‘avaliação e ‘aprendizagem’ interagem de forma bidirecional e integrada”, sem citar referências.

Apesar das divergências, e considerando a evolução do conceito, a sistematização da literatura sobre AcA mostra que essa é uma abordagem da AF que promove um deslocamento da centralidade da avaliação. Se até o começo do século XXI a AF era entendida como processual e qualitativa (da e para a aprendizagem), com a AcA são somados à equação elementos como a interação, a autonomia e os contributos dos alunos em todas as etapas da avaliação.

A mudança advinda dessa abordagem está diretamente ligada a um modelo educacional de desenvolvimento do student agency, que culmina na formação de alunos que saibam estabelecer objetivos, agir de forma autônoma e aprender com a reflexão sobre processos de aprendizagem e avaliação. Os contextos socioculturais de cada sujeito também são levados em conta na avaliação, o que aproxima essa abordagem do socioconstrutivismo (VIGOTSKY, 2015a, 2015b) e da Teoria do Agir Comunicativo (HABERMAS, 2016a, 2016b).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como resultados desta sistematização, e a considerar uma análise geral do que foi proposto, conclui-se que a AcA é um objeto recente, surgido há menos de duas décadas, mas com uma tradição de cinco anos de investigações. No geral, é um conceito que carece de clarificação tanto em relação a sua descrição como a procedimentos. A maior parte da pesquisa e da publicação de artigos está concentrada nos países de língua inglesa, com algumas publicações e pesquisas sendo verificadas em outros países da União Europeia, sem ocorrência, nos termos deste levantamento, de textos publicados em espanhol.

No que tange à proposta de sistematização, considera-se que os dois objetivos foram alcançados, notadamente: mapear a produção acadêmica, considerando o surgimento do conceito e os estudos publicados até o presente, os autores de referência e as revistas em que os artigos foram publicados; e analisar a conceptualização da AcA. A concretização dos objetivos foi possível com a obtenção de respostas para as questões de investigação, seguidamente listadas:

  • i) Quando surge o conceito de AcA? O levantamento mostra que o primeiro registro do termo, bem como a primeira conceptualização, data de 2002, quando Ruth Dann, professora da Manchester Metropolitan University publica o primeiro livro sobre o tema.

  • ii) Quais os autores de referência? Considerando como os artigos tratam a AcA, foi possível identificar que os autores mais citados na teorização da AcA são Ruth Dann, Harry Torrance e Lorna Earl.

  • iii) Quais as revistas que publicaram os artigos considerados como referência? O levantamento mostra que não há uma revista que concentre a maioria dos artigos. As publicações são pulverizadas em revistas transdisciplinares, mas a considerar os artigos que servem como referência, pode-se listar os títulos Assessment in Education e Assessment in Education: Principles, Policy & Practice.

Dada a natureza do objeto, ainda incipiente e carente de clarificação teórica e de procedimentos, não é possível afirmar que este seja um estudo definitivo. Ressalta--se, contudo, que ele traz contributos importantes, por ser uma tentativa de sistematizar o que já foi produzido acerca da AcA, algo que não foi disponibilizado até o momento na literatura de especialidade.

Nesse sentido, é preciso destacar que há limitações no estudo relacionadas à opção pela sistematização da literatura aqui descrita. O levantamento considerou somente artigos publicados em inglês ou português e disponíveis em open access. Esses fatores limitam uma visão geral; no entanto, não invalidam os resultados. Há necessidade de ampliação da busca, considerando mais idiomas, artigos sem acesso aberto e outra literatura cinzenta, e aprofundamento das questões relativas à AcA, como, por exemplo, as estratégias e os instrumentos que são utilizados nessa abordagem da avaliação.

AGRADECIMENTOS

Aos autores, professores e pesquisadores que dedicaram tempo e responderam nossos e-mails com solicitações de textos clássicos da conceptualização da Avaliação Formativa, quando não encontrados em bibliotecas ou disponíveis na internet.

REFERÊNCIAS

ALLAL, Linda. Cours: evaluation pédagogique. Genebra: Universitá de Gèneve, 1984. (Fascicule I). [ Links ]

ALLAL, Linda. Vers une pratique de l’évaluation formative: matériel de formation continue des enseingnants. Bruxelas: De Boeck, 1991. [ Links ]

ALMQVIST, Cecilia Ferm; VINGE, John; VÄKEVÄ, Lauri; ZANDÉN, Olle. Assessment as learning in music education: the risk of “criteria compliance” replacing “learning” in the Scandinavian countries. Research Studies in Music Education, v. 39, n. 1, p. 3-18, 2017. DOI: 10.1177/1321103X16676649. [ Links ]

BALULA, Ana Jorge. Avaliação digital como aprendizagem. Educação, Formação & Tecnologias, v. 7, n. 1, p. 80‐88, 2014. Disponível em: https://eft.educom.pt/index.php/eft/article/view/426. Acesso em: 21 jun. 2020. [ Links ]

BENNETT, Randy Elliot. Formative assessment: a critical review. Assessment in Education: Principles, Policy & Practice, v. 18, n. 1, p. 5-25, 2011. DOI: 10.1080/0969594X.2010.513678. [ Links ]

BLACK, Paul; WILLIAM, Dylan. Assessment and classroom learning. Assessment in Education: Principles, Policy & Practice, v. 5, n. 1, p. 1-54, 1998. DOI: 10.1080/0969595980050102. [ Links ]

BLACK, Paul; WILLIAM, Dylan. Classroom assessment and pedagogy. Assessment in Education: Principles, Policy & Practice, v. 25, n. 6, p. 551-575, 2018. DOI: 10.1080/0969594X.20181441807. [ Links ]

BLOOM, Benjamin; HASTING, John Thomaz; MADAUS, George F. Handbook of formative and summative evaluation of student learning. Nova Iorque: McGraw-Hill Company, 1971. [ Links ]

BOGDAN, Robert; BICKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 2013. [ Links ]

CARDOSO, Tereza; ALARCÃO, Isabel; CELORICO, Jacinto Antunes. Revisão sistemática da literatura e sistematização do conhecimento. Porto: Porto Editora, 2010. [ Links ]

CROOKS, Terence. The impact of classroom evaluation practices on students. Review of Educational Research, v. 58, n. 4, p. 438-481, 1988. DOI: 10.3102/00346543058004438. [ Links ]

DANN, Ruth. Promoting assessment as learning: improving the learning process. Londres: Routledge Farmer, 2002. [ Links ]

DANN, Ruth. Assessment as learning: blurring the boundaries of assessment and learning for theory, policy and practice. Assessment in Education: Principles, Policy & Practice, v. 21, n. 2, p. 149-166, 2014. DOI: 10.1080/0969594X.2014.898128. [ Links ]

DANN, Ruth. Developing understanding of pupil feedback using Habermas’ notion of communicative action. Assessment in Education: Principles, Policy & Practice, v. 23, n. 3, p. 396-414, 2016. DOI: 10.1080/0969594X.2015.1056083. [ Links ]

EARL, Lorna M. Assessment as learning: using classroom assessment to maximize student learning. Thousand Oaks: Corwin Press, 2003. [ Links ]

EARL, Lorna M. Rethinking classroom assessment with purpose in mind: assessment for learning, assessment as learning, assessment of learning. Edmoton: Western and Northern Canadian Protocol for Collaboration in Basic Education, 2006. [ Links ]

EDUCATION REVIEW OFFICE. The collection and use of assessment information in schools. New Zeland: Education Review Office, 2007. [ Links ]

FARIA, Paulo M. Revisão sistemática da literatura: contributo para um novo paradigma investigativo. Santo Tirso: Whitebooks, 2016. [ Links ]

FERNANDES, Domingos. Para uma teoria da avaliação no domínio das aprendizagens. Estudos em Avaliação Educacional, São Paulo, v. 19, n. 41, p. 348-372, set./dez. 2008. Disponível em: http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/eae/arquivos/1454/1454.pdf. Acesso em: 28 set. 2021. [ Links ]

FERNANDES, Domingos. Avaliação em educação: uma discussão de algumas questões críticas e desafios a enfrentar nos próximos anos. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 21, n. 78, p. 11-34, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ensaio/a/874GnQznjYX5yvBjSG9g98m/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 28 set. 2021. [ Links ]

FERNANDES, Domingos. Ensino e avaliação no ensino superior: reflexões a partir da pesquisa realizada no âmbito do Projeto AVENA. Cadernos Cedes, Campinas, SP, v. 36, n. 99, p. 223-238, 2016. DOI: 10.1590/CC0101-32622016160370. [ Links ]

FIGUEIREDO, Antonio Dias de. Writing a research paper: from the parts to the whole. The International Journal of Research and Review, v. 4, p. 23-27, 2010. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/228257975. Acesso em: 21 jun. 2020. [ Links ]

HABERMAS, Jurgen. Teoria do agir comunicativo. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2016a. (Racionalidade da ação e racionalização social, v. 1). [ Links ]

HABERMAS, Jurgen. Teoria do agir comunicativo. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2016b. (Sobre a crítica da razão funcionalista, v. 2). [ Links ]

HADJI, Charles. A avaliação desmistificada. Porto Alegre: Artmed, 2001. [ Links ]

HATTIE, John; TIMPERLEY, Hellen. The power of feedback. Review of Educational Research, v. 77, p. 81-112, 2007. DOI: 10.3102/003465430298487. [ Links ]

HAYWARD, Louise. Assessment is learning: the preposition vanishes. Assessment in Education: Principles, Policy and Practice, v. 22, n. 1, p. 27-343, 2015. DOI: 10.1080/0969594X.2014.984656. [ Links ]

HICKEY, Daniel T.; TAASOOBSHIRAZI, Gita; CROSS, Dionne. Assessment as learning: enhancing discourse, understanding, and achievement in innovative science curricula. Journal of Research in Science Teaching, v. 49, n. 10, p. 1240-1270, 2012. DOI: 10.1002/tea.21056. [ Links ]

LAM, Ricky. Assessment as learning: examining a cycle of teaching, learning and assessment of writing the portfolio-based classroom. Studies in Higher Education, v. 41, n. 11, p. 1900-1917, 2016. DOI: 10.1080/03075079.2014.999317. [ Links ]

LAM, Ricky. Understanding assessment as learning in writing classrooms: the case of portfolio assessment. Iranian Journal of Language Teaching Research, v. 6, n. 3, p. 19-36, 2018. Disponível em: https://www.semanticscholar.org/paper/Understanding-Assessment-as-Learning-in-Writing-The-Lam/14a4d1153da197cabfa7c43c5c5018dee84a0bbc. Acesso em: 21 jun. 2020. [ Links ]

LI, Xiangdong. Self-assessment as “assessment as learning” in translator and interpreter education: validity and washback. The Interpreter and Translator Trainer, v. 12, n. 1, p. 46-67, 2018. DOI: 10.1080/1750399X.2017.1418581. [ Links ]

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. São Paulo: Cortez, 2013. [ Links ]

MUTCH, Carol. Assessment for, of and as learning: developing a sustainable assessment culture in New Zealand schools. Policy Futures in Education, v. 10, n. 4, p. 374-385, 2012. Disponível em: https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.2304/pfie.2012.10.4.374. Acesso em: 21 jun. 2020. [ Links ]

NATRIELLO, Gary. The impact of evaluation processes on students. Educational Psychologist, v. 22, n. 2, p. 155-175, 1987. DOI: 10.1207/s15326985ep2202_4. [ Links ]

SADEGHI, Karim; RAHMATI, Teymour. Integrating assessment as, for, and of learning in a large-scale exam preparation course. Assessing Writing, v. 34, p. 50-61, Oct. 2017. DOI: 10.1016/j.asw.2017.09.003. [ Links ]

SADLER, Royce. Formative assessment and the design of instructional systems. Instructional Science, v. 18, n. 2, p. 119-144, 1989. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007%2BF00117714. Acesso em: 21 jun. 2020. [ Links ]

SCRIVEN, Michael. The methodology of evaluation. West Lafayette: Purdue University, 1966. [ Links ]

SHUTE, Valerie. Focus on formative feedback. Review of Educational Research, v. 78, p. 153-189, 2008. DOI: 10.3102/0034654307313795. [ Links ]

TORRANCE, Harry. Assessment as learning? How the use of explicit learning objectives, assessment criteria and feedback in post-secondary education and training can come to dominate learning. Assessment in Education, v. 14, n. 3, p. 281-294, 2007. [ Links ]

TORRANCE, Harry. Formative assessment at the crossroads: conformative, deformative and transformative assessment. Oxford Review of Education, v. 38, p. 323-342, 2012. [ Links ]

VIGOTSKY, Lev Semyonovich. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2015a. [ Links ]

VIGOTSKY, Lev Semyonovich. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2015b. [ Links ]

1No original: “[…] very limited ecological validity, due to artificial experimental conditions, very brief treatments or other factors”.

2No original: “[...] an active process of cognitive restructuring that occurs when individuals interact with new ideas”.

3No original: “[...] critical assessors who make sense of information, relate it to prior knowledge, and use it for new learning”.

4No original: “[…] unless an individual choose to interact cognitively with the environment, learning will not occur”.

5No original: “[…] who thinks and engages with knowledge in ways that are imaginative and creative”.

6No original: “[…] assessment as learning is based in research about how learning happens, and is caracterized by students reflecting on their own learning”.

7No original: “[…] removing the challenge of learning and reducing the quality and validity of outcomes achieved”.

8No original: “[…] assessment for learning tradition

9No original: “[...] the process of students monitoring their own learning achievement and progress”.

Recebido: 01 de Julho de 2020; Aceito: 23 de Setembro de 2021

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons