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Estudos em Avaliação Educacional

Print version ISSN 0103-6831On-line version ISSN 1984-932X

Est. Aval. Educ. vol.33  São Paulo  2022  Epub Jan 16, 2023

https://doi.org/10.18222/eae.v33.8675_en 

ARTIGOS

ÍNDICE DE NECESSIDADE DE CRECHES PARA OS MUNICÍPIOS BRASILEIROS, 2018-2020

IGoverno do Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre-RS, Brasil.

IIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre-RS, Brasil.

IIIUniversidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), Florianópolis-SC, Brasil.


RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar o Índice de Necessidade de Creches (INC) para municípios brasileiros entre 2018 e 2020. O INC é construído de acordo com critérios de priorização de atendimento, que englobam as crianças residentes em zonas urbanas pertencentes a famílias: pobres; monoparentais; e com mãe ou principal cuidador(a) economicamente ativo(a). A análise de 2018 mostrou que, nas regiões Norte e Nordeste, municípios com altos índices no componente de pobreza do INC foram mais prevalentes, enquanto monoparentalidade e mercado de trabalho tiveram maior importância nas demais regiões. Além disso, os maiores diferenciais entre INC e taxa de matrícula em creches foram encontrados, principalmente, no Norte e Nordeste em 2018.

PALAVRAS-CHAVE ESTATÍSTICAS EDUCACIONAIS; NECESSIDADES EDUCACIONAIS; OPORTUNIDADES EDUCACIONAIS.

ABSTRACT

This article aims to present the Daycare Need Index [Índice de Necessidade de Creches - INC] for Brazilian municipalities from 2018 to 2020. The INC is built according to priority criteria for daycare provision, which include children living in urban areas, from families who fall under the following categories: poor; single-parented; and with an economically active mother or primary caregiver. The analysis for 2018 showed that, in the North and Northeast regions, municipalities with higher rates in the poverty component of the INC were more prevalent, while single parenthood and labor market were more important in the other regions. In addition, the largest differentials between INC and daycare enrollment rate were found mainly in the North and Northeast regions in 2018.

KEYWORDS EDUCATION STATISTICS; EDUCATIONAL NEEDS; EDUCATIONAL OPPORTUNITIES.

RESUMEN

Este artículo tiene el objetivo de presentar el Índice de Necesidad de Guarderías [Índice de Necessidade de Creches - INC] para los municipios brasileños entre el 2018 y el 2020. El INC se construye según criterios que se destinan a priorizar la atención, que incluyen a los niños que viven en áreas urbanas pertenecientes a familias pobres; con padres o madres solteros; y con una madre o principal cuidador(a) económicamente activo(a). El análisis de 2018 mostró que, en las regiones Norte y Noreste, prevalecieron los municipios con elevados índices en el componente de pobreza del INC, mientras la monoparentalidad y el mercado laboral fueron más importantes en las demás regiones. Además, las mayores diferencias entre el INC y las tasas de matrícula en guarderías se encontraron sobre todo en el Norte y el Noreste en el 2018.

PALABRAS CLAVE ESTADÍSTICAS EDUCATIVAS; NECESIDADES EDUCATIVAS; OPORTUNIDADES EDUCATIVAS.

INTRODUÇÃO

A primeira infância e a educação infantil têm ganhado destaque na literatura em diversas áreas do conhecimento há algumas décadas. Em especial, aspectos educacionais da primeira infância passaram a receber maior atenção por volta dos anos 1990, o que se refletiu em políticas públicas voltadas ao tema. Com isso, diversos estudos passaram a enfatizar a importância de políticas públicas de qualidade na primeira infância, principalmente ao se tratar de crianças desfavorecidas ou vulneráveis (disadvantaged children) (CUNHA; HECKMAN, 2007; HECKMAN, 2000, 2006). Sabe-se que a primeira infância é uma fase crítica para o desenvolvimento de habilidades cognitivas e socioemocionais fundamentais, cujos efeitos são duradouros e importantes ao longo da vida.1 Há evidências de que políticas voltadas à primeira infância para grupos vulneráveis tenham efeitos positivos sobre vários indicadores de bem-estar, tais como a redução da pobreza, da desigualdade e da violência urbana (LOCHNER, 2011).

No Brasil, essa mudança de percepção sobre a educação infantil também ocorreu, principalmente, após a Constituição de 1988 (BRASIL, 1988). Antes disso, a educação infantil era considerada uma etapa anterior à educação formal. A Constituição instituiu a educação até os 5 anos de idade como direito social (art. 7o, inciso XXV) e dever do Estado (art. 208, inciso IV). A sequência de alterações legais nos anos seguintes é evidência da paulatina mudança de percepção a respeito do tema. Em 1996, a educação infantil (creche e pré-escola) foi integrada à educação básica (no mesmo patamar dos ensinos fundamental e médio). O pacto federativo já colocava a pré-escola sob a responsabilidade dos municípios (com cooperação técnica e financeira de União e estados), mas o texto constitucional passou a abranger as creches ao se substituir “pré-escola” por “educação infantil” em 2006 (BRASIL, 2006). Ao longo do período, passou-se também a exigir qualificações mínimas para a docência na educação infantil. Ademais, a pré-escola se tornou legalmente obrigatória em 2009 (BRASIL, 2009) e a obrigatoriedade da matrícula de crianças de 4 e 5 anos foi incluí- da na Lei de Diretrizes e Bases em 2013 (BRASIL, 2013). A partir do Plano Nacional de Educação (PNE), adotou-se também uma meta de atendimento em creches de 50% das crianças entre 0 e 3 anos em 2014 (BRASIL, 2014). Alguns anos depois, estabeleceu-se a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), incluindo a educação infantil, em 2017.

Apesar dessa evolução, o atendimento na educação infantil, que é gratuito no país, ainda constitui um desafio para muitos municípios. Embora seja um país de renda média, o Brasil é conhecido por seus altos níveis de pobreza e desigualdade, a despeito das quedas verificadas na década de 2000.2 Além disso, os indicadores de qualidade da educação em níveis posteriores de ensino são preocupantes, em que pese ter havido alguma melhoria nas últimas décadas.3 Por conta disso, é fundamental que haja políticas bem desenhadas de primeira infância, período em que intervenções são altamente eficazes a custos baixos.4

Pelas razões elencadas anteriormente, a frequência à creche e à pré-escola é um importante componente de uma política de desenvolvimento bem-sucedida (NÚCLEO DE CIÊNCIA PELA INFÂNCIA - NCPI, 2014). Especificamente em relação a creches, as transformações sociais também aumentaram a importância da etapa voltada às crianças com idade entre 0 e 3 anos. A taxa de participação das mulheres no mercado de trabalho, que era de 41,7% no Brasil em 1990 e chegou a 55,1% em 2019, é ainda maior entre mulheres jovens, alcançando uma proporção de quase três quartos do total (73,6% para mulheres de 25 a 34 anos em 2019) (INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION - ILO, 2021). Outra mudança social foi o significativo aumento de lares monoparentais: de acordo com a Pnad Contínua 2018, 7,6% das crianças brasileiras entre 0 e 3 anos viviam com apenas um adulto com idade igual ou superior a 18 anos, proporção que correspondia a 6,5% segundo a Pnad 2001. Portanto, houve uma elevação de 16% de crianças vivendo em lares monopa- rentais durante esse período. Tais mudanças sociais possivelmente ampliaram a demanda por creches.

Há consenso na literatura de que a pré-escola, de modo geral, tem efeitos positivos e significativos em termos de desenvolvimento cognitivo, aprendizado, escolaridade e renda. Já com relação às creches, os efeitos são heterogêneos e a qualidade da creche é um fator fundamental. A maior parte da literatura trabalha com dados de países desenvolvidos, principalmente Estados Unidos, onde diversos estudos já detectam um diferencial de desempenho (achievement gap) entre crianças pertencentes a diferentes grupos socioeconômicos e raciais antes da entrada na pré-escola (BEREITER; ENGELMANN, 1966; DEUTSCH; KATZ; JENSEN, 1968; FRYER; LEVITT, 2004; RUMBERGER; ANGUIANO, 2004). Fernald, Marchman e Weisleder (2013) mostraram que, aos 18 meses de idade, já há diferenças significativas entre crianças de diferentes estratos socioeconômicos em termos de proficiência linguística. Estima-se que o custo econômico desses diferenciais chegue a dois trilhões de dólares nos Estados Unidos (AUGUSTE; HANCOCK; LABOISSIERE, 2009). Tais achados já sugerem que as creches poderiam ter papel importante para a redução desses diferenciais. Entre os economistas, James Heckman e associados têm insistido, em inúmeros estudos, que políticas voltadas à primeira infância são menos custosas do que remediar os diferenciais de desempenho em fases posteriores da infância ou na adolescência (CUNHA; HECKMAN, 2007; HECKMAN, 2000).

Segundo alguns estudos, crianças que passam por creches de boa qualidade apresentam melhor desempenho escolar nos anos seguintes (BELSKY et al., 2007; VANDELL et al., 2010). Por outro lado, mais horas em creches foram associadas a problemas comportamentais no início do ensino fundamental e na adolescência nos Estados Unidos (BURCHINAL; VANDELL; BELSKY, 2013). Se, por um lado, os impactos positivos da creche tendem a desaparecer ao longo do tempo conforme alguns estudos, por outro, esses efeitos positivos são maiores para as crianças de famílias desfavorecidas (LOEB et al., 2007; MAGNUSON; RUHM; WALDFOGEL, 2007). Alternativamente, programas de menor escala implementados nos Estados Unidos, como os conhecidos Chicago Child-Parent Center, Perry Pre-School Program e Abecedarian, apresentam resultados positivos mais persistentes, mas são de difícil implementação em larga escala.

Os resultados da literatura nacional são semelhantes aos encontrados na literatura internacional. No Brasil, Curi e Menezes-Filho (2009) observaram que a creche está associada à conclusão dos ensinos médio e universitário. Correa, Comim e Tai (2014) indicam que crianças com baixo status socioeconômico se beneficiam mais da participação em creche, ainda que esses efeitos sejam menores quando o envolvimento dos pais é baixo. Pinto, Santos e Guimarães (2017) encontraram evidência de que a frequência à creche eleva a pontuação em testes de proficiência, ainda que em magnitude pequena (os resultados para pré-escola são maiores). A possibilidade de maior aprendizado ao longo de toda a educação básica, causada pela frequência em creches, se traduz em ganhos de produtividade e, consequentemente, maiores salários ao longo da vida adulta. Ou seja, as evidências, tanto nacionais quanto internacionais, indicam que a educação infantil pode ser muito benéfica para crianças de famílias vulneráveis. Além disso, o atendimento em creches auxilia as famílias desfavorecidas em outro aspecto: permite o aumento da participação da família no mercado de trabalho, reduzindo a pobreza - o que beneficia tanto as crianças quanto seus pais ou cuidadores.

Diante dos desafios da promoção de políticas voltadas à primeira infância no Brasil, este estudo propõe um Índice de Necessidade de Creches (INC) para os municípios brasileiros, cujo objetivo é orientar a distribuição de vagas em creches para crianças com idade entre 0 e 3 anos residentes em zonas urbanas no Brasil. O índice cobre projeções para o período de 2018 a 2020, mas a metodologia permite a atualização para anos posteriores. Além disso, esse indicador é construído de acordo com um critério de priorização de atendimento, a fim de que os recursos públicos sejam empregados de forma mais eficiente e justa. Sabe-se que há expressiva desigualdade espacial no país e, diante disso, é natural que certas localidades tenham necessidade maior de creches do que outras. Conforme uma série de critérios, este trabalho tenta estimar as vagas em creche necessárias em diferentes localidades no Brasil. Tais critérios, que serão definidos e justificados mais adiante, englobam as crianças residentes em zonas urbanas pertencentes a famílias pobres, famílias monoparentais e famílias em que a mãe ou principal cuidador(a) é economicamente ativo(a) ou o seria se tivesse acesso à creche.

A metodologia da pesquisa baseou-se, parcialmente, em estudo anterior direcionado somente ao estado do Rio Grande do Sul (RS) (BERNARDINI; KANG; WINK JUNIOR, 2016). O trabalho anterior sobre o Rio Grande do Sul foi motivado pela aprovação do Plano Nacional de Educação 2014-2024 (PNE), que levou o governo estadual a criar um grupo de trabalho para estudar o tema no estado.5 Entre os objetivos do PNE, estava atingir atendimento em creches de 50% das crianças de 0 a 3 anos de idade até 2024. A definição dessa meta reflete o baixo nível de atendimento até então e a crescente importância dada para a educação infantil no campo das políticas públicas. No presente artigo, estendemos a metodologia para o âmbito nacional.6

Como já mencionado, apresentamos aqui um índice de necessidade a partir de critérios estipulados ex-ante. Em que pese a meta de 50% estipulada pelo PNE, não estamos utilizando esse número como restrição neste trabalho, ainda que se possa empregar o INC para avaliar a adequação da meta. Tampouco estamos estimando uma medida pura de demanda por creches. Entre os três grupos populacionais considerados no índice, os dois grupos prioritários (crianças pobres e crianças em famílias monoparentais) foram escolhidos normativamente com base em critérios de vulnerabilidade. Quanto ao terceiro grupo, priorizamos aspectos da demanda por creche em famílias cujas mães ou cuidador(a) principal são ou seriam economicamente ativas(os). Os resultados apresentados, portanto, decorrem dessas opções metodológicas. Tais escolhas estão baseadas nos efeitos benéficos das creches para crianças de status socioeconômico mais baixo e nas mudanças sociais em termos de mercado de trabalho e estrutura familiar. Embora não se trate aqui diretamente da qualidade das creches, esse estudo é um passo importante para entender onde a creche é mais necessária.

Este artigo está estruturado em mais três seções, além desta introdução. A seguir são descritas as fontes de dados e a metodologia de construção do índice. Posteriormente apresentam-se os principais resultados e são analisados os gaps das taxas de atendimento atuais em relação à necessidade de creches estimada em cada município. Por fim, são tecidas as considerações finais. A base de dados contendo as estimativas do INC e do total de crianças de 0 a 3 anos nos municípios e em cada unidade federativa (UF) (2018-2020), além do total de crianças de 0 a 3 anos matriculadas em creches, também nos municípios e por UF (2018), pode ser obtida mediante contato com os autores.

DADOS E METODOLOGIA

A partir dos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para 2018 e 2019, bem como das projeções estaduais por faixa etária para 2020, foram feitas estimativas da população com idade entre 0 e 3 anos, por município, de 2018 a 2020. Em seguida, utilizando informações do Censo Demográfico de 2010 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), ambos do IBGE, no período de 2009 a 2018, identificou-se o contingente de residentes em zonas urbanas nessa faixa etária. A partir desse grupo, foram selecionadas as crianças pertencentes a:

  • famílias pobres;

  • famílias não pobres monoparentais;

  • famílias não pobres e não monoparentais, cujas mães*7 são economicamente ativas ou o seriam na presença de creches.

Em outras palavras, partiu-se do total de crianças de 0 a 3 anos de idade, residentes em zonas urbanas, por município de 2018 a 2020. Nesse conjunto, foram agrupadas as crianças pertencentes a famílias pobres. Entre as não pobres, calculou-se o número de crianças em famílias monoparentais. Consideramos que todas as crianças enquadradas nesses dois primeiros critérios necessitem de creche. Em seguida, entre crianças pertencentes a famílias não pobres e não monoparentais, ou seja, as remanescentes, estimamos o contingente cujas mães são economicamente ativas (ou o seriam na presença de creches acessíveis). Nesse contingente, apenas uma parte é selecionada, conforme estimativa de demanda por creches por parte das famílias. A soma das crianças selecionadas por meio desses critérios constitui o grupo alvo. A Figura 1 exemplifica graficamente o método. As seções seguintes justificam os critérios e detalham a metodologia de cálculo.

Critérios

Nos parágrafos seguintes, justificamos os critérios de composição do índice. Alguns desses argumentos foram apresentados em trabalho anterior (BERNARDINI; KANG; WINK JUNIOR, 2016). Em primeiro lugar, o índice contempla apenas uma parcela das crianças residentes em zona urbana, sendo que os critérios de priorização são relacionados à pobreza, monoparentalidade e inserção das mães* no mercado de trabalho.

Fonte: Elaboração dos autores.

Nota: As proporções indicadas pelas barras referem-se ao percentual sobre todas as crianças de 0 a 3 anos de idade (proporções fictícias apenas a título de exemplo). 100% corresponde a todas as crianças nessa faixa etária. O INC engloba apenas uma fração das crianças residentes em zona urbana. Os motivos estão explicados no texto.

FIGURA 1 Composição do Índice de Necessidade de Creches (metodologia) 

Famílias residentes em zona urbana

É direito da criança frequentar a creche, entretanto o INC não contempla as crianças residentes em zona rural pelos motivos elencados em Bernardini, Kang e Wink Junior (2016). Os critérios de priorização não excluem o atendimento em creches das crianças residentes em zona rural, cujo direito deve ser garantido, mas definem um patamar de necessidade mínimo baseado na zona urbana.8

Famílias pobres

As crianças pertencentes a famílias pobres são as que estão em situação de maior vulnerabilidade. Em geral, essas crianças estão expostas a ambientes precários em termos materiais, nutricionais e emocionais. Em estudo acerca de programas de primeira infância para crianças vulneráveis, Heckman e Masterov (2007) associam “baixos níveis de recursos financeiros” a ambientes adversos para o desenvolvimento das crianças.

Há diversas maneiras de se definir pobreza, mas, por se tratar de uma proposta de política pública, optamos pelo critério oficial utilizado pelo governo brasileiro - ainda que haja discussões válidas acerca de qual seria o melhor critério para tal definição.9 As famílias pobres foram identificadas conforme a referência do Programa Brasil Sem Miséria. De acordo com o Decreto n. 7492, de 2 de junho de 2011 (BRASIL, 2011), que instituiu o programa, a linha de extrema pobreza foi definida em R$ 70,00 (renda familiar per capita mensal). A linha de pobreza utilizada é o dobro da linha de extrema pobreza (R$ 140,00).10 Os valores foram então atualizados conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do IBGE.11

Famílias monoparentais

Incluídas as crianças pobres no grupo que mais necessita de creche, passamos ao segundo critério - as famílias monoparentais. Foram consideradas crianças pertencentes a famílias monoparentais aquelas que residiam em domicílios em que havia apenas uma pessoa com 18 anos ou mais. Como as famílias monoparentais pobres já foram incluídas de acordo com o primeiro critério, resta estimar as famílias não pobres monoparentais. Nesse caso, se não houver vagas disponíveis em creches, as crianças podem ficar desassistidas por conta dos compromissos de trabalho de seu (sua) único(a) cuidador(a). A vulnerabilidade está relacionada a famílias monoparentais, uma vez que aumenta a probabilidade de deterioração do ambiente familiar (HECKMAN; MASTEROV, 2007).

Famílias com mães* economicamente ativas

Há famílias que, embora não sejam pobres nem monoparentais, demandam creches porque a mãe ou o(a) principal cuidador(a) participa ativamente do mercado de trabalho. Existem também aquelas famílias em que a mãe ou cuidador(a) principal não está na população economicamente ativa (PEA) justamente porque não há creches disponíveis. Esses grupos também foram contemplados no presente estudo.

Vale destacar algumas observações sobre esse ponto, muitas das quais já foram explicitadas em trabalho anterior (BERNARDINI; KANG; WINK JUNIOR, 2016). Em primeiro lugar, esse critério não se limita apenas às crianças cujas mães* são economicamente ativas, sendo incluídas também aquelas que seriam economicamente ativas se houvesse creches acessíveis para suas crianças. Por conta de seu caráter contrafactual, essa informação precisa ser estimada. A fim de sanar esse problema, estimou-se a proporção de mães de crianças com idade entre 4 e 6 anos que são economicamente ativas, realizando o mesmo procedimento para a proporção de mães economicamente ativas de crianças com idade entre 0 e 3 anos. Por conta da existência de uma rede maior em nível pré-escolar (4 a 6 anos), diferenças significativas entre esses dois dados indicam falta de creches; se esses índices são semelhantes, supomos que não haja graves problemas de oferta. Trata-se de uma aproximação, uma vez que não se espera a presença de crianças nos seus primeiros meses de vida, em particular durante o período de licença-maternidade. Por esse motivo, pode haver uma ligeira superestimação sob esse critério, mas acreditamos que ainda assim é uma aproximação razoável para contemplar o problema contrafactual.

Etapas da metodologia

A metodologia para o cálculo do índice de necessidade de creche por município passou pelas etapas apresentadas a seguir.

Estimativa da proporção de crianças com idade entre 0 e 3 anos

Em primeiro lugar, empregamos a população total por município, conforme dados das estimativas populacionais do IBGE (versão validada pelo Tribunal de Contas da União), para 2018 e 2019, bem como das projeções estaduais do IBGE (atualização em 2018).12 Para a população total por município em 2020, utilizamos a previsão conforme o método AiBi, a partir dos dados de 2018 e 2019.13

De forma independente, calculamos a proporção de crianças com idade entre 0 e 4 anos por meio do conhecido método de Duchesne (1987).14 Por fim, os indicadores demográficos necessários à aplicação desse método, tais como taxas de fecundidade e razões de sobrevivência, foram aqueles divulgados juntamente com as projeções estaduais de população já mencionadas.

Como estamos interessados na população de 0 a 3 anos, aplicamos os coeficientes de Sprague (1880) aos resultados por faixa etária alcançados acima para obter a população por idade simples. Da aplicação dos percentuais por faixa etária, obtidos via aplicação dos métodos Duchesne e Sprague, aos totais populacionais municipais, chegamos à população de 0 a 3 anos por município.

Estimativa da proporção de crianças de 0 a 3 anos residentes em zonas urbanas e subgrupos vivendo em famílias pobres; não pobres monoparentais; não pobres e não monoparentais, cujas mães são economicamente ativas; e não pobres e não monoparentais, cujas mães não são economicamente ativas

Para o total de crianças residentes em zonas urbanas e para os três primeiros subgrupos, as estimativas para 2018 a 2020 foram obtidas da forma descrita a seguir. Em primeiro lugar, tomamos os dados municipais do Censo Demográfico de 2010. A evolução dos dados de municípios é feita utilizando dados do estado ao qual pertencem, conforme algumas edições da Pnad. A metodologia é construída dessa maneira porque as características dos municípios são observáveis apenas nos censos demográficos, enquanto a Pnad oferece informações amostrais em anos posteriores, mas apenas em nível estadual. O último subgrupo (crianças em famílias não pobres e não monoparentais, cujas mães não são economicamente ativas) é obtido por resíduo. O objetivo é estimar uma trajetória de crescimento dos dados estaduais, a fim de estimar a proporção de crianças residentes em zonas urbanas e segundo os quatro subgrupos para o período 2018-2020.

Há diversas maneiras de ajustar uma função de crescimento a partir dos dados estaduais. A fim de facilitar a implantação de políticas públicas ao longo do tempo, é importante garantir maior estabilidade nos dados preditos. Por essa razão, optou-se por uma função logarítmica dependente do tempo. Foram utilizados dois pontos de referência: a partir dos dados estaduais provenientes da Pnad 2009 e 2011, foi realizada uma interpolação, alcançando-se assim estimativas estaduais para 2010; e, a partir dos dados da Pnad Contínua 2018, foram obtidos os dados estaduais para 2018. A trajetória de crescimento é calculada a partir desses dois pontos por meio do ajuste de uma função logarítmica:

y2010+t=α+βlog(t) (1)

O indicador y2010+t trata das estimativas de população de crianças de 0 a 3 anos de idade residentes em zonas urbanas e também dos três primeiros subgrupos por estado. Como y2010 e y2018 são conhecidos, obtemos os parâmetros α e β. A partir disso, obtemos y2019 e y2020 por estado. Essa trajetória de crescimento é aplicada sobre os resultados dos municípios, alcançando assim os indicadores municipais para 2018, 2019 e 2020.

Vale destacar algumas observações:

  • Em primeiro lugar, nos casos de municípios que atingem marcas superiores a 100% conforme essa metodologia, truncamos a variável em 100%. Esse tipo de situação ocorreu 232 vezes no caso da estimativa das populações urbanas em 2018 (cerca de 4% dos municípios). O ato de truncar a variável em um valor não constitui problema, uma vez que esses municípios certamente não têm ou praticamente não têm população residente em zona rural. Não é surpreendente que esse número de municípios do país tenha população rural nula. Para as estimativas das populações urbanas pobres ocorreram apenas três situações de truncamento, em 2018, e quatro em 2019 e 2020. Esses casos apenas mostram que se trata de municípios com elevada incidência de pobreza.

  • Além disso, no caso das mães* economicamente ativas, trata-se na verdade da variável que identifica o(a) cuidador(a) principal no Censo Demográfico 2010 - que pode ser mãe, pai ou alguma outra pessoa adulta que cuide da criança. No entanto, utilizamos de fato a mãe economicamente ativa na Pnad 2009 e 2011 e na Pnad Contínua 2018. Portanto, apesar de se partir de dados censitários de cuidador(a), a trajetória de crescimento foi obtida com a informação sobre mães.

Estimativa do Índice de Necessidade de Creches por município, para o período de 2018 a 2020

Definidos os grupos populacionais de interesse na faixa etária de 0 a 3 anos de idade, o índice é formado da seguinte maneira:

INCi= pob i+monoi+μn(meai+φn mnea i) (2)

Em que: INCi é o índice de necessidade de creche do município; pobi é a proporção de crianças de zona urbana em famílias pobres; monoi corresponde à proporção de crianças residentes em zona urbana, não pobres em famílias monoparentais; meai refere-se à proporção de crianças residentes em zona urbana, não pobres, em famílias não monoparentais, cuja mãe ou principal cuidador(a) é economicamente ativo(a); e mneai é a proporção de crianças residentes em zona urbana, não pobres, em famílias não monoparentais, cuja mãe ou principal cuidador(a) não está no mercado de trabalho.

No caso das crianças pobres e das não pobres monoparentais, considerou-se que todas as crianças nessas condições entram na composição do índice. O coeficiente µn é aplicado sobre meai e mneai enquanto φn é aplicado sobre mneai. Esses coeficientes são obtidos por meio de informações para cada estado n. Uma vez que não consideramos que todas as crianças nessas condições necessitem de creches, µn 1 e φn 1.

Proporção de mães* economicamente ativas (ou seriam economicamente ativas) e que demandam creches (µ)

Para definir o valor dos coeficientes µn e φn, foram utilizados alguns critérios. No caso de mães (ou principal cuidador) economicamente ativas (ou que seriam eco- nomicamente ativas), nem todas essas pessoas buscam atendimento em creche para suas crianças com idade entre 0 e 3 anos. Algumas procuram como alternativa familiares ou babás, mesmo tendo creches ao alcance e dentro de suas possibilidades financeiras. Entretanto, restrições financeiras podem impedir crianças de receberem atendimento, mesmo entre famílias não pobres.

A fim de estimar a proporção de crianças nessas condições que necessitam de creches, optamos por verificar a frequência em creches das crianças pertencentes ao quintil de maior renda. Entendemos que não há restrição para que essas crianças frequentem creches caso suas famílias assim o desejem. O Gráfico 1 apresenta dados de frequência em creches por percentis de renda múltiplos de cinco (ou seja, observamos os dados dos percentis 5%, 10%, 15% e assim sucessivamente). Nota-se que as taxas de frequência ultrapassam a marca de 50% e são relativamente estáveis nas últimas quatro observações, ou seja, a parcela da população cuja renda está acima do percentil 80%. Isso sugere que essa parcela de crianças não sofre com restrições significativas.

Aplicamos então o percentual de crianças do quintil maior de renda com atendimento (µ) sobre o contingente de mães economicamente ativas (ou que seriam economicamente ativas se houvesse creche). Esse procedimento leva-nos a uma estimativa de demanda por atendimento em creches de mães que estão no mercado de trabalho sob conjuntos orçamentários maiores.

Fonte: IBGE. Pnad Contínua. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/trabalho/9171-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios-continua-mensal.html?=&t=destaques. Acesso em: out. 2022.

GRÁFICO 1 Frequência à creche conforme o percentil de renda (múltiplos de cinco), Brasil, 2018 

Proporção de mães* que seriam economicamente ativas se houvesse creche disponível (φ)

Entre as mães que não são economicamente ativas, há aquelas que apenas não estão no mercado de trabalho porque não têm acesso à creche. O objetivo aqui é estimar a proporção de crianças entre 0 e 3 anos de idade cujas mães ou cuidador(a) principal está nessa situação. Para tanto, utilizamos como aproximação a proporção de crianças de uma outra faixa etária (4 a 6 anos), que são residentes em zonas urbanas, pertencentes a famílias não pobres, não monoparentais e que têm suas mães* economicamente ativas. Em seguida, reescalonamos o dado para se adequar à estrutura demográfica da faixa etária de 0 a 3 anos (residentes em zonas urbanas, não pobres e não monoparentais). Com isso, se há uma proporção maior de mães* economicamente ativas de crianças entre 4 e 6 anos do que na faixa etária entre 0 e 3 anos, existem indícios de que a falta de creches está tirando a mãe ou potencial cuidador(a) da força de trabalho. Quando isso não ocorre, é um sinal de que não há um problema grave de oferta de creche.

RESULTADOS E ANÁLISE

Neste capítulo, apresenta-se a análise dos resultados atingidos com a metodologia descrita anteriormente. Iniciamos expondo os resultados do INC para 2018, 2019 e 2020. Na subseção seguinte, fazemos uma análise dos diferenciais entre o INC 2018 e as taxas de atendimento em creches conforme dados do Censo Escolar 2018.

Índice de Necessidade de Creches, 2018-2020

O número de crianças que necessitam de creche por estado é simplesmente a soma do número de crianças que precisam de creches nos seus municípios. O mesmo raciocínio vale para o cálculo do índice de necessidade nacional. Não se espera que 100% das crianças na faixa etária de 0 a 3 anos estejam matriculadas em creches pelos seguintes motivos: bebês em seus primeiros meses de vida ainda ficam sob os cuidados da mãe em licença-maternidade; e deslocar crianças pequenas residentes em locais mais retirados na zona rural pode ser inviável.

Apresentam-se na Tabela 1 alguns dados agregados em nível nacional e de re- giões geográficas. O Índice de Necessidade de Creches para o Brasil indica que 46,0% das crianças entre 0 e 3 anos necessitavam de atendimento em creches em 2018. Os números para 2019 e 2020 são semelhantes: 46,4% e 46,7%, respectivamente.

TABELA 1 Componentes do Índice de Necessidade de Creches em termos da porcentagem da população de 0 a 3 anos de idade, segundo a região geográfica, Brasil, 2018-2020 

Região 2018 2019 2020
Pob Mono MEA** INC Pob Mono MEA** INC Pob Mono MEA** INC
(a) (b) (c) (a+b+c) (a) (b) (c) (a+b+c) (a) (b) (c) (a+b+c)
Norte 31,6 1,1 9,3 42,0 31,8 1,1 9,4 42,2 31,9 1,0 9,6 42,5
Nordeste 29,6 2,0 12,6 44,2 29,7 2,0 12,8 44,5 29,8 1,9 13,0 44,7
Sudeste 22,1 3,0 25,0 50,1 22,4 3,0 25,2 50,6 22,7 3,0 25,3 51,0
Sul 11,0 4,0 31,1 46,1 11,1 4,0 31,4 46,5 11,1 4,0 31,7 46,8
Centro-Oeste 12,5 4,1 21,2 37,8 12,4 4,1 21,7 38,2 12,3 4,1 22,1 38,5
BRASIL 23,0 2,7 20,3 46,0 23,1 2,7 20,5 46,4 23,3 2,7 20,7 46,7

Fonte: Dados da pesquisa.

Nota: Pob = crianças pobres, Mono = crianças em famílias monoparentais, MEA** = demanda por creche das crianças cujas mães* são economicamente ativas e de crianças cujas mães* seriam economicamente ativas se houvesse creche acessível, INC = Índice de Necessidade de Creches.

Nas regiões Norte e Nordeste, a maior parte do Índice de Necessidade de Creches é determinada pela proporção de crianças pobres. Em contraposição, a situação é distinta nas regiões mais ricas. No Sudeste e Sul, a maior parcela desse índice é gerada pela demanda por creches de famílias com mães* economicamente ativas.15

Analisamos mais detidamente as informações de 2018, uma vez que esse ano permite comparações com dados de matrícula da edição mais recente do censo escolar (as comparações serão realizadas na próxima seção). A análise dos dados por UF mostra que há diversidade na composição do índice de necessidade, com os maiores para os estados de São Paulo (53,7%), Rio de Janeiro (52,1%) e Amazonas (52,0%), enquanto os menores referem-se a Rondônia (29,5%), Piauí (30,5%) e Mato Grosso (30,7%). A Tabela 2 traz os dados por componentes do INC e UF.16

No Gráfico 2, selecionamos um estado de cada região geográfica. No Acre, a maior parcela do INC é composta por crianças pertencentes a famílias pobres. No Piauí, a proporção de pobres também é expressiva, mas o índice total é relativamente baixo por ser o estado mais rural do país. São Paulo tem o mais alto INC do país, mas principalmente porque o grupo de crianças com mães* economicamente ativas (ou que seriam economicamente ativas) é notoriamente maior. Santa Catarina, na região Sul, tem baixos índices de pobreza, o que explica a participação pequena de crianças pobres no índice. Já o estado de Goiás registra um índice baixo e uma composição intermediária.

Analisamos também os municípios brasileiros com mais de 1 milhão de habitantes em 2018. Entre eles, Salvador apresenta o maior INC (63,3% em 2018), seguido pelos municípios de Maceió (59,0%), São Paulo (58,3%), Recife (57,0%) e Manaus (56,9%). Vale analisar comparativamente os perfis destes municípios conforme o INC 2018. Enquanto todos esses municípios atingiram altos níveis no INC 2018, o Gráfico 2 mostra que há evidentes diferenças entre eles quando se observa a composição do índice. Em Maceió e Manaus, por exemplo, grande parte do índice é explicada pelos altos indicadores de pobreza infantil. Entretanto, os resultados paulistanos mostram um índice alto, mas que é majoritariamente representado pelo grande número de mães* economicamente ativas que demandam creches (ou que demandariam se houvesse creches disponíveis). Os números não mudam substancialmente para 2019 e 2020.

TABELA 2 Componentes do índice de necessidade de creches em termos da porcentagem da população de 0 a 3 anos de idade, segundo a região geográfica e o estado, Brasil, 2018 

Região e
estado
Pob Mono MEA** INC Região e
estado
Pob Mono MEA** INC
(a) (b) (c) (a+b+c) (a) (b) (c) (a+b+c)
NORTE 31,6 1,1 9,3 42,0 Sergipe 33,4 1,5 10,1 45,0
Acre 32,7 2,0 8,1 42,8 CENTRO-OESTE 12,5 4,1 21,2 37,8
Amapá 41,0 2,0 8,1 51,1 Distrito Federal 12,6 7,8 27,9 48,4
Amazonas 43,6 0,6 7,8 52,0 Goiás 13,3 4,0 17,2 34,5
Pará 27,5 0,9 8,4 36,7 Mato Grosso do Sul 14,2 4,4 26,2 44,9
Roraima 28,1 2,4 16,8 47,3 Mato Grosso 9,6 1,5 19,7 30,7
Rondônia 16,8 1,5 11,3 29,5 SUDESTE 22,1 3,0 25,0 50,1
Tocantins 27,4 2,2 15,1 44,7 Espírito Santo 22,5 2,4 23,6 48,5
NORDESTE 29,6 2,0 12,6 44,2 Minas Gerais 16,0 3,2 21,4 40,6
Alagoas 38,8 1,3 9,0 49,1 Rio de Janeiro 28,4 4,0 19,7 52,1
Bahia 32,3 2,8 14,7 49,8 São Paulo 22,3 2,7 28,7 53,7
Ceará 26,4 2,7 14,0 43,1 SUL 11,0 4,0 31,1 46,1
Maranhão 28,9 1,1 9,3 39,3 Rio Grande do Sul 11,3 3,6 32,6 47,5
Rio Grande do Norte 21,1 1,4 13,4 35,9 Paraná 12,4 5,0 26,9 44,3
Paraíba 27,3 0,9 12,7 40,8 Santa Catarina 8,4 2,7 35,8 46,9
Pernambuco 31,7 2,6 13,8 48,1 BRASIL 23,0 2,7 20,3 46,0
Piauí 21,7 0,4 8,5 30,5

Fonte: Dados da pesquisa.

Nota: Pob = crianças pobres, Mono = crianças em famílias monoparentais, MEA** = demanda por creche das crianças cujas mães* são economicamente ativas e de crianças cujas mães* seriam economicamente ativas se houvesse creche acessível, INC = Índice de Necessidade de Creches.

A Figura 2 apresenta informações sobre a necessidade de creches por grupos de municípios definidos conforme dados de população. As informações são apresentadas em gráficos boxplot, que fornecem informações da distribuição de cada grupo. O número apresentado como rótulo é a mediana.17 Os municípios foram sepa- rados em nove grupos, começando pelo grupo dos municípios com menos de 5 mil habitantes até o último grupo, formado por municípios com mais de 1 milhão de habitantes. Nota-se que o INC mediano, de modo geral, cresce à medida que aumenta a população. Nos municípios menores (com menos de 5 mil habitantes), o INC mediano é de 31,0%, ao passo que nos municípios com 1 milhão de habitantes ou mais, a mediana do INC é de 53,8% em 2018.

Fonte: Dados da pesquisa.

Nota: Pob = crianças pobres, Mono = crianças em famílias monoparentais, MEA** = demanda por creche das crianças cujas mães* são economicamente ativas e de crianças cujas mães* seriam economicamente ativas se houvesse creche acessível.

GRÁFICO 2 Composição do índice de necessidade de creches em termos da porcentagem da população de 0 a 3 anos de idade para estados selecionados de cada uma das regiões geográficas, 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

Nota: Pob = crianças pobres, Mono = crianças em famílias monoparentais, MEA** = demanda por creche das crianças cujas mães* são economicamente ativas e de crianças cujas mães* seriam economicamente ativas se houvesse creche acessível.

GRÁFICO 3 Composição do Índice de Necessidade de Creches em termos da porcentagem da população de 0 a 3 anos de idade para os cinco municípios de maior índice, entre os que possuem mais de 1 milhão de habitantes, 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 2 Boxplot do Índice de Necessidade de Creches dos municípios do Brasil em 2018, segundo o grupo de municípios definidos conforme sua população em 2018 

Fonte: Dados da pesquisa e Pnad Contínua.

FIGURA 3 Boxplot do Índice de Necessidade de Creches dos municípios do Brasil em 2018, segundo grupos de municípios definidos conforme os decis de sua renda domiciliar per capita em 2010 

Fonte: Dados da pesquisa e IDHM.

FIGURA 4 Boxplot do Índice de Necessidade de Creches dos municípios do Brasil em 2018, segundo o grupo de municípios definidos conforme os decis de seu Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em 2010 

Foi realizada análise semelhante discriminando os municípios em grupos segundo outras variáveis. A Figura 3 relaciona o INC de 2018 a grupos de municípios de acordo com o nível de renda domiciliar per capita em 2010. Ainda que o padrão não seja tão claro nos grupos intermediários de renda por pessoa, aqui também se observa que municípios mais ricos (pertencentes aos grupos G9 e G10) apresentam índices de necessidade maiores do que os demais. O inverso ocorre nos municípios dos dois grupos mais pobres (G1 e G2). Um terceiro recorte mostra a relação entre o INC 2018 e grupos de municípios segundo o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 2010. Essas informações são apresentadas na Figura 4. Vale lembrar que o IDHM é um índice sintético que contém indicadores de renda, longevidade e educação. Nota-se que o padrão apresentado na Figura 4 não é muito distinto do observado na Figura 3, o que não é surpreendente por conta da correlação existente entre renda per capita e IDHM.18

Apesar de o índice também levar em conta a pobreza infantil, as Figuras 2, 3 e 4 mostram que, de maneira geral, municípios maiores e mais desenvolvidos apresentam maior necessidade de creches. Isso ocorre provavelmente devido à tendência de maior participação de mulheres no mercado de trabalho dos municípios com maiores população, renda per capita e IDHM.

A Figura 5 mostra os resultados do INC 2018 para todos os municípios do país. Em uma análise inicial, não se podem fazer outras afirmações sobre padrões geográficos. Conforme se observa, há expressiva variabilidade intraestadual de níveis de INC. Isso deve-se ao fato de que tanto os municípios com alta incidência de pobreza quanto aqueles urbanos e com grande número de mães* no mercado de trabalho tendem a apresentar alto INC, como os resultados por UF já mostravam. Além disso, municípios com expressivo contingente de população rural, mesmo sendo pobres, têm INC baixo. Isso explica por que não há um padrão geográfico muito claro no mapa apresentado na Figura 5.

Uma possibilidade alternativa de análise é calcular um INC considerando apenas a população de crianças residentes em zona urbana no denominador. Isso aumenta o valor do índice para todos os municípios, mas, quanto maior a população rural da localidade, mais expressiva é a elevação do índice. A Figura 6 apresenta o mapa com essas informações, o que resulta em um padrão mais evidente. De maneira geral, os menores índices estão na região Centro-Oeste e chegando a áreas do Sudeste, enquanto os maiores estão nas regiões Norte e Nordeste.

Por fim, as Figuras 7, 8 e 9 apresentam mapas separando os componentes do INC. Na Figura 7, o mapa mostra apenas o componente de pobreza do INC 2018. Sem dúvida, municípios das regiões Norte e Nordeste registram indicadores de pobreza mais altos. As Figuras 8 e 9, todavia, expõem um padrão oposto. A Figura 8 traz o componente referente a crianças em famílias não pobres monoparentais, enquanto a Figura 9 contém as informações de crianças cujas mães* são economicamente ativas ou o seriam, caso houvesse creches disponíveis. Nesses dois quesitos, os estados do centro-sul apresentam indicadores mais altos, uma vez que tanto a monoparentalidade quanto a maior participação de mulheres no mercado de trabalho estão associadas a níveis mais elevados de renda e urbanização. Esses mapas também ajudam a explicar a falta de padrão geográfico mais claro no mapa do INC completo (Figura 5).

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 5 Índice de Necessidade de Creches por município, Brasil, 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 6 Necessidade de creches como proporção apenas da população urbana, municípios, Brasil, 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 7 Componente referente à pobreza no Índice de Necessidade de Creches por município, Brasil, 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 8 Componente referente a famílias monoparentais no Índice de Necessidade de Creches por município, Brasil, 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 9 Componente referente à demanda das mães* economicamente ativas (ou que seriam economicamente ativas) no Índice de Necessidade de Creches por município, Brasil, 2018 

Diferenciais entre INC e taxa de atendimento em 2018

Com os dados de matrícula do Censo Escolar 2018 e as estimativas populacionais, é possível obter taxas de matrícula e compará-las com o INC 2018. No ano em questão, 30,2% das crianças com idade entre 0 e 3 anos estavam matriculadas em creches no Brasil. Essas taxas de atendimento variam de 6,1% no Amapá a 46,6% em Santa Catarina. Deve-se considerar que os dados de matrícula do censo escolar foram organizados conforme o endereço da creche. Essa não parece ser uma limitação grave, particularmente quando se trata de crianças na faixa etária de 0 a 3 anos. Embora existam obviamente exceções, não se espera que famílias tra- feguem por grandes distâncias para deixar crianças em creches localizadas em municípios vizinhos.

Como já mencionado anteriormente, o Índice de Necessidade de Creches para o Brasil aponta que 46,0% das crianças entre 0 e 3 anos necessitavam de atendimento em creches no país em 2018. Isso significa que o gap entre a taxa de atendimento e o INC foi de 15,9 pontos percentuais.

A Tabela 3 apresenta dados por unidade federativa de taxa de atendimento em creches, o INC e a diferença entre o INC e a taxa de atendimento (gap). Os dados foram dispostos em ordem decrescente conforme o gap. Os maiores diferenciais entre o INC e a taxa de atendimento estão em estados da região Norte: Amapá (45,0%), Amazonas (42,7%) e Roraima (32,5%). Os menores diferenciais, por sua vez, foram registrados nos estados de Mato Grosso (-0,1%), Santa Catarina (0,3%) e Piauí (4,2%).

Há padrões geográficos mais claros quando se avalia um mapa dos gaps entre o INC e a taxa de atendimento. A Figura 10 mostra que há notoriamente maiores gaps nos municípios da Região Norte. No entanto, deve-se levar em conta a baixa densidade demográfica e a extensão territorial dos municípios dessa região. De qualquer forma, os gaps são maiores em geral nos municípios mais ao norte vis-à-vis aqueles localizados mais ao sul do país. Algumas outras áreas geográficas chamam atenção, como a costa desde a Região Sudeste até o Nordeste, alguns pontos do interior do Nordeste e algumas áreas mais pobres do Rio Grande do Sul e do Mato Grosso do Sul. Mesmo com a ocorrência desses padrões, a Figura 10 mostra que há também desigualdades expressivas de diferenciais dentro dos estados. Isso mostra que não se deve apenas priorizar as regiões Norte e Nordeste, uma vez que há elevados diferenciais em áreas específicas de estados que apresentam, em média, diferenciais baixos.

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA 10 Diferenciais entre INC e taxa de matrícula em creches por município, Brasil, 2018 

TABELA 3 Taxa de atendimento em creches, Índice de Necessidade de Creches (INC) e diferencial entre taxa de atendimento e INC por UF, Brasil, 2018 

UFs Taxa de atendimento em creches 2018 (a) INC 2018 (b) Diferencial entre atendimento e INC 2018
(b - a)
Amapá 6,1 51,1 45,0
Amazonas 9,3 52,0 42,7
Roraima 14,8 47,3 32,5
Pernambuco 18,9 48,1 29,2
Distrito Federal 19,2 48,4 29,2
Sergipe 17,1 45,0 27,9
Bahia 22,2 49,8 27,6
Alagoas 22,9 49,1 26,2
Acre 17,4 42,8 25,4
Rio de Janeiro 27,7 52,1 24,4
Pará 13,1 36,7 23,7
Tocantins 23,5 44,7 21,2
Rondônia 10,8 29,5 18,8
Paraíba 23,4 40,8 17,4
Espírito Santo 32,1 48,5 16,4
Rio Grande do Sul 34,3 47,5 13,2
Maranhão 26,4 39,3 13,0
Paraná 33,4 44,3 10,9
Minas Gerais 29,8 40,6 10,8
Mato Grosso do Sul 34,1 44,9 10,8
Ceará 33,9 43,1 9,2
São Paulo 45,5 53,7 8,3
Rio Grande do Norte 30,0 35,9 5,9
Piauí 26,4 30,5 4,2
Santa Catarina 46,6 46,9 0,3
Mato Grosso 30,8 30,7 -0,1
BRASIL 30,2 46,0 15,9

Fonte: Censo Escolar 2018 e dados da pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há cada vez mais evidências científicas sobre a importância de intervenções na primeira infância para melhorar os indicadores de pobreza, desigualdade e desenvolvimento. Tendo em vista essas evidências, o presente trabalho traz uma proposta para políticas públicas no sentido de orientar a distribuição de vagas.

Entre as crianças residentes em zona urbana, a metodologia empregada procurou priorizar o atendimento daquelas em situação de maior vulnerabilidade (famílias pobres e famílias monoparentais) em conformidade com alguns resultados da literatura da área. Além disso, a metodologia incorporou medidas relacionadas à demanda por creches e à participação de mães ou cuidadores no mercado de trabalho.

Como é usual, algumas limitações metodológicas devem ser consideradas. Em primeiro lugar, a população rural não foi contemplada na análise, como explicado anteriormente (ver também Apêndice A1). Além disso, não foi possível apurar a precisão das projeções municipais das populações com as características elenca- das no INC para o período 2018-2020, uma vez que não há informações disponíveis para isso. Há outras limitações em apurar a precisão das estimativas munici- pais para 2010 (o que demandaria um estudo à parte) e das projeções demográficas (que utilizam métodos não paramétricos).

As estimativas do índice contemplaram os anos de 2018, 2019 e 2020, sendo realizada uma análise mais detalhada de 2018. Não encontramos um padrão claro que explique onde há valores maiores ou menores do INC. Isso deve-se à sua composição, que pode atingir níveis altos em municípios com alta incidência de pobreza ou naqueles com expressivo contingente de mães* no mercado de trabalho. Ou seja, municípios completamente distintos podem apresentar níveis semelhantes no INC. Os dados mostraram que, nas regiões Norte e Nordeste, foi mais comum encontrar municípios com altos índices no componente de pobreza do INC, enquanto os componentes de monoparentalidade e mercado de trabalho tiveram maior importância nas demais regiões. Ao se analisar um outro recorte (com apenas a população urbana no denominador), os índices apontaram maior necessidade de creches nas regiões Norte e Nordeste. Já a região Centro-Oeste e uma parte do Sudeste apresentaram menor necessidade de creches (considerando apenas percentuais em relação à população urbana).

Por fim, foram analisados os diferenciais entre INC e taxa de matrícula em creches em 2018. Também ali os mapas mostraram maiores diferenciais entre o índice e a taxa de matrícula em creches nas regiões Norte e Nordeste. Esses achados indicam que a política pública de expansão do atendimento em creches deve se voltar prioritariamente para essas regiões do país, além de outros municípios que apresentaram grandes distâncias entre a matrícula e a necessidade calculada.

Como mencionado na introdução deste trabalho, o mero aumento quantitativo de crianças atendidas em creche está longe de ser suficiente para que haja efetividade das políticas de primeira infância. A qualidade do serviço oferecido é fundamental. Não há espaço aqui para uma discussão mais aprofundada a respeito do tema, mas se sabe que é necessária a formação contínua de profissionais qualificados para lidar com essa fase da vida. Além disso, gestão dos recursos e atratividade da carreira são outros fatores (e que importam também para outros níveis educacionais). Esta proposta trata apenas de um pedaço do quebra-cabeças a ser resolvido para a efetividade de políticas públicas de primeira infância no país.

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1 O estudo do Núcleo de Ciência pela Infância (2014) resume a evidência disponível.

2 Um panorama geral sobre a atual situação do Brasil, elaborado pelo Banco Mundial, ressalta a questão da pobreza: https://www.worldbank.org/pt/country/brazil/overview. Acesso em: 17 nov. 2021.

3 Ver resultados do Pisa 2018 em: https://www.oecd.org/pisa/publications/pisa-2018-results.htm. Acesso em: 15 nov. 2021.

4 Heckman (2006) resume os principais argumentos.

6 Esta pesquisa foi realizada junto à Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal (FMCSV). Uma versão voltada ao público em geral pode ser encontrada em FMCSV (2020).

7 Daqui em diante, utilizaremos muitas vezes o termo “mãe*” (com o asterisco) para designar o principal cuidador da criança, muito embora esse papel seja cumprido não apenas pela mãe de fato em muitas situações.

8 O recorte das crianças em zona urbana como grupo prioritário foi estabelecido na criação da primeira versão do INC (BERNARDINI; KANG; WINK JUNIOR, 2016), após consulta com o Grupo de Trabalho (GT) Educação Infantil do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, composto por especialistas e gestores municipais. Ressalta-se aqui que todas as crianças têm direito a atendimento em creche. O INC é um índice para orientar a política pública e não interfere na obrigação do poder público em garantir direitos.

9 Um resumo da discussão pode ser encontrado em Ravallion (2016).

10 Em Bernardini, Kang e Wink Junior (2016), reservamos 20% das vagas para crianças pobres residentes em zona urbana, considerando o contexto do RS. Neste estudo, decidimos utilizar linhas oficiais de pobreza.

11 Esses valores não são exatamente iguais aos do programa Bolsa Família nos demais anos, uma vez que os reajustes do programa não seguiam estritamente as variações do INPC.

13 O método AiBi é consolidado em estudos demográficos. Ver o seguinte documento metodológico do IBGE: http://ftp.ibge.gov.br/Programa/PEQAR/Manuais/METODOLOGIA%20AIBI%20e%20COORTES.doc. Acesso em: 20 dez. 2020.

14 O método de Duchesne também é tradicionalmente usado em estudos demográficos. Para sua aplicação em nosso caso, consideramos como áreas menores as populações dos municípios brasileiros (por sexo e faixa etária) compatibilizadas em ambos os períodos para a divisão territorial de 2010. Como áreas maiores, utilizamos as populações (também desagregadas por faixa etária e sexo) dos censos de 2000 e 2010, bem como das Projeções Estaduais do IBGE (atualização 2018). Populações censitárias compatibilizadas estão disponíveis no Atlas do Desenvolvimento Humano, em: http://www.atlasbrasil.org.br/2013/data/rawData/atlas2013_dadosbrutos_pt.xlsx. Acesso em: 20 dez. 2020. Sobre o método, ver Duchesne (1987) e http://ftp.ibge.gov.br/Programa/PEQAR/Manuais/METODOLOGIA%20AIBI%20e%20COORTES.doc. Acesso em: 19 dez. 2020.

15 Nas tabelas, MEA** se refere à demanda por creche das crianças cujas mães* são economicamente ativas e de crianças cujas mães* seriam economicamente ativas se houvesse creche acessível.

16 Conforme justificativas apresentadas anteriormente, os critérios de necessidade não se aplicam à população residente em zona rural. Entretanto, os dados do INC 2018 (em nível nacional e por estado) incluindo a população rural podem ser encontrados no Apêndice A1.

17 Nos gráficos boxplot apresentados aqui, o número representado pela barra horizontal mais espessa é o segundo quartil, ou seja, a mediana. As linhas horizontais marcando a base e o topo da barra são o primeiro e o terceiro quartis, respectivamente. As linhas verticais mostram o restante da distribuição (abaixo do primeiro e acima do terceiro quartil).

18 No Apêndice A2, encontram-se outros gráficos que relacionam a taxa de atendimento em creches e a defasagem entre INC e atendimento com as variáveis população, renda domiciliar per capita e IDHM.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (FMCSV) pelo finan- ciamento do trabalho. E o autor Marcos Vinício Wink Junior agradece à Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc) pelo apoio.

APÊNDICE

A. INC com população urbana e rural

TABELA A1 Índice de Necessidade de Creches incluindo população rural (%), por componente, UF e Brasil, 2018 

UF Pob Mono MEA** INC
(a) (b) (c) (a+b+c)
Acre 71,5 1,6 6,5 79,6
Amapá 50,5 1,6 7,2 59,3
Amazonas 70,9 0,6 6,2 77,7
Pará 58,0 0,9 8,7 67,5
Roraima 47,2 2,4 13,7 63,2
Rondônia 27,7 2,0 13,6 43,3
Tocantins 40,0 2,2 16,5 58,7
Alagoas 69,0 1,1 8,2 78,3
Bahia 56,9 2,5 13,9 73,4
Ceará 48,3 2,8 14,0 65,1
Maranhão 66,1 1,4 9,3 76,7
Rio Grande do Norte 35,2 1,6 16,1 52,8
Paraíba 44,4 0,9 12,8 58,1
Pernambuco 51,6 2,6 12,5 66,7
Piauí 60,0 0,6 8,3 68,8
Sergipe 61,2 1,8 10,1 73,1
Distrito Federal 13,4 7,6 29,0 50,0
Goiás 15,9 4,0 18,7 38,6
Mato Grosso do Sul 16,0 4,5 26,6 47,2
Mato Grosso 15,1 1,8 20,0 36,9
Espírito Santo 30,8 2,6 22,6 56,0
Minas Gerais 24,1 3,2 23,0 50,4
Rio de Janeiro 30,6 4,1 19,1 53,8
São Paulo 24,0 2,6 29,6 56,3
Rio Grande do Sul 13,3 3,7 33,6 50,5
Paraná 17,6 5,4 27,1 50,1
Santa Catarina 10,0 2,8 38,0 50,8
BRASIL 35,0 2,8 20,7 58,4

Fonte: Dados da pesquisa.

Nota: Pob = crianças pobres, Mono = crianças em famílias monoparentais, MEA** = demanda por creche das crianças cujas mães* são economicamente ativas e de crianças cujas mães* seriam economicamente ativas se houvesse creche acessível.

A Tabela A1 apresenta uma versão alternativa do Índice de Necessidade de Creches com a aplicação dos critérios sobre a população urbana e rural. Apresenta- mos razões para não incluir a população rural como população-alvo do índice na seção metodológica. Ressaltamos novamente que a exclusão da população rural do índice não significa que as crianças residentes em zona rural não devam receber políticas públicas para primeira infância. Muito pelo contrário, devem ser encontradas maneiras eficazes de se atender a essa população - se possível em creches.

A Tabela A1 mostra que, aplicando-se os critérios do índice sobre toda a população de crianças, o INC nacional chegaria a 58,4% - acima, portanto, do índice de 49,0% na formulação original. Esse aumento decorre, principalmente, da alta incidência de pobreza infantil em zonas rurais. Quase toda a elevação do índice na zona rural resulta do componente de pobreza. Dado o acréscimo de 10 pontos percentuais apresentado por conta da inclusão do meio rural, é fundamental que se desenhem políticas públicas para a primeira infância que possam atender a essa população - substituindo por políticas alternativas quando o atendimento em creche for inviável.

B. Boxplot: defasagem

Nas Figuras B1 a B3, apresentam-se informações acerca da defasagem entre índice de necessidade e taxa de atendimento e sua relação com população, renda per capita e IDHM.

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA B1 Boxplot da defasagem de atendimento em creches dos municípios do Brasil em 2018, segundo grupos de municípios definidos conforme suas populações em 2018 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA B2 Boxplot da defasagem de atendimento em creches dos municípios do Brasil em 2018, segundo grupos de municípios definidos conforme os decis de suas rendas domiciliares per capita em 2010 

Fonte: Dados da pesquisa.

FIGURA B3 Boxplot da defasagem de atendimento em creches dos municípios do Brasil em 2018, segundo grupos de municípios definidos conforme os decis de seus Índices de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em 2010 

Recebido: 19 de Maio de 2021; Aceito: 29 de Julho de 2022

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