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Estudos em Avaliação Educacional

versión impresa ISSN 0103-6831versión On-line ISSN 1984-932X

Est. Aval. Educ. vol.34  São Paulo  2023  Epub 05-Jul-2023

https://doi.org/10.18222/eae.v34.8097 

Artigos

A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA FORMAÇÃO DOCENTE: REVELANDO HORIZONTES

LA EVALUACIÓN DEL APRENDIZAJE EN LA FORMACIÓN DOCENTE: REVELANDO HORIZONTES

THE EVALUATION OF LEARNING IN TEACHER TRAINING: REVEALING HORIZONS

ANTÔNIA EDIVANEIDE DE SOUSA GONZAGAI 
http://orcid.org/0000-0001-8036-9163

RAIMUNDO HÉLIO LEITEII 
http://orcid.org/0000-0002-1795-7250

LUCAS MELGAÇO DA SILVAIII 
http://orcid.org/0000-0003-4145-4036

WIRLA RISANY LIMA CARVALHOIV 
http://orcid.org/0000-0001-7057-3822

IInstituto Federal da Paraíba (IFPB), Cajazeiras-PB, Brasil; edivaneidesousa2012@gmail.com

IIUniversidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza-CE, Brasil; rhleite@terra.com.br

IIIUniversidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza-CE, Brasil; lucasmelgaco@alu.ufc.br

IVUniversidade Federal do Piauí (UFPI), Teresina-PI, Brasil; profawirlacarvalho@ufpi.edu.br


RESUMO

O presente artigo originou-se de uma pesquisa doutoral, realizada com professores dos cursos de Licenciatura em Matemática nos institutos federais do Ceará e da Paraíba. O objetivo era analisar as concepções e práticas avaliativas desses professores e sua relação com a formação docente. O estudo, de abordagem qualitativa, fez uso dos fundamentos filosóficos da fenomenologia hermenêutica, a partir das visões de Martin Heidegger e Hans-Georg Gadamer, para análise dos dados coletados em entrevistas semiestruturadas. As concepções e práticas de avaliação da aprendizagem abordadas sinalizaram o indicativo de que não há uma cultura de formação direcionada para os princípios de uma avaliação da aprendizagem, o que contribui para o fortalecimento de práticas avaliativas de reprodução.

PALAVRAS-CHAVE FORMAÇÃO DOCENTE; AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM; INSTITUTOS FEDERAIS DE EDUCAÇÃO; LICENCIATURA EM MATEMÁTICA.

RESUMEN

El presente artículo tiene su origen en una investigación de doctorado, realizada con los profesores de los cursos de licenciatura en matemáticas de los institutos federales de Ceará y Paraíba. El objetivo fue analizar las concepciones y prácticas evaluativas de eses profesores y su relación con la formación docente. El estudio, con un enfoque cualitativo, hizo uso de los fundamentos filosóficos de la fenomenología hermenéutica, a partir de la visión de Martin Heidegger y Hans-Georg Gadamer, para analizar los datos recogidos en las entrevistas semiestructuradas. Los conceptos y prácticas de evaluación del aprendizaje abordados señalaron el indicio de que no hay una cultura de formación dirigida para los principios de una evaluación del aprendizaje, lo que contribuye para el fortalecimiento de las prácticas evaluativas de la reproducción.

PALABRAS CLAVE FORMACIÓN DOCENTE; EVALUACIÓN DEL APRENDIZAJE; INSTITUTOS FEDERALES DE EDUCACIÓN; LICENCIATURA EN MATEMÁTICAS.

ABSTRACT

The present article originated from a doctoral research, carried out with the teachers of teaching degree courses in Mathematics in the federal institutes of Ceará and Paraíba. The objective was to analyze the conceptions and evaluative practices of these teachers and their relationship with teacher training. This is a qualitative study, based on the philosophical foundations of hermeneutic phenomenology from the views of Martin Heidegger and Hans-Georg Gadamer, to analyze the data collected in the semi-structured interviews. The conceptions and practices of learning assessment addressed indicated that there is no training culture directed to the principles of a learning assessment, which contributes to the strengthening of evaluative practices of reproduction.

KEYWORDS TEACHER TRAINING; LEARNING ASSESSMENT; FEDERAL INSTITUTES OF EDUCATION; TEACHING DEGREE IN MATHEMATICS.

INTRODUÇÃO

Na busca por ressignificação da função da escola, dos papéis assumidos pelos sujeitos educacionais e dos resultados oriundos das suas ações nas diversas instâncias (políticas, administrativas ou pedagógicas), as práticas educacionais se transformam continuamente, alicerçadas por concepções que também se modificam facilmente, em um sistema educacional marcado pela transitoriedade, pela busca constante de novos sentidos e práticas inovadoras, em contextos processuais, dialógicos, mas também contraditórios (Silva, 2013; Franco, 2016).

A respeito da avaliação, não é diferente. As práticas pedagógicas não são neutras, tampouco acontecem desarticuladas de outros aspectos da realidade escolar. Pensar a avaliação da aprendizagem como um componente do trabalho pedagógico, numa perspectiva de construção - de valorização do processo percorrido para chegar aos fins específicos de aprendizagem - requer concepções e práticas direcionadas para esse fim (Esteban, 2013; Fernandes, 2008; Hoffmann, 2013). E pensar nessas práticas exige que todos os envolvidos mudem seus olhares e perspectivas para que se vislumbrem outras possibilidades no que diz respeito à ação de planejar, desenvolver e avaliar as atividades cotidianas de intervenção em sala de aula.

Trazer para os espaços de discussão as práticas concernentes à avaliação da aprendizagem, numa tentativa de estabelecer relação direta com as abordagens de alguns teóricos, constitui uma importante estratégia de compreensão de fatores inerentes a essa prática tão significativa e, ao mesmo tempo, tão complexa. Com efeito, repensar essas práticas demanda um olhar mais direcionado para os contextos nos quais elas se desenvolvem, quais sejam intencionais, planejados e, ao mesmo tempo, imprevisíveis (Franco, 2016).

Nos cursos de formação de professores - no caso, dos cursos de licenciatura -, esses conhecimentos precisam ser mobilizados de maneira a favorecer uma abordagem mais específica sobre as práticas avaliativas, sob um prisma mais reflexivo, que considera a participação de diferentes sujeitos nesse processo (Gonzaga et al., 2020). Dessa forma, os discentes, futuros professores, ainda na formação inicial, podem interagir com as diversas possibilidades de articulação entre a teoria e a prática. Essas exigências independem da área de conhecimento na qual o docente atua, tendo em vista que a prática docente exige saberes que vão além do saber técnico específico da área de atuação.

Todavia, trabalhar todos esses aspectos sem estabelecer uma visão clara e objetiva do que seja o processo avaliativo, sem uma cultura de avaliação que subsidie satisfatoriamente uma prática crítica e reflexiva, é praticamente inviável, tendo em vista todas as articulações necessárias ao processo de ensino e, por conseguinte, da regulação consciente das aprendizagens (Perrenoud, 1999).

Conhecer de forma mais detalhada a epistemologia que embasa os modelos e as práticas de avaliação da aprendizagem, as funções de cada modalidade de avaliação, os instrumentos avaliativos que estão a serviço de cada momento da avaliação, os desenhos de cada processo avaliativo e suas finalidades no interior da sala de aula constitui uma demanda a ser encarada por todos aqueles que se propõem a participar do universo da profissão docente.

São muitas as concepções e referências utilizadas para conceituar as práticas de avaliação, mais especificamente de aprendizagem. Contudo uma prática de avaliação que esteja a serviço das aprendizagens exige dos educadores a clara noção de que todos os esforços empreendidos devem estar a serviço da melhoria das aprendizagens e orientados para ela, em vez de simplesmente classificá-las (Fernandes, 2009).

Nessa direção, a avaliação deve justificar-se não apenas pela busca de conhecer o que o aluno já aprendeu, mas principalmente o que ele não aprendeu ainda, para que se planejem as intervenções necessárias à sua aprendizagem (Villas Boas, 2004). Assim, a avaliação é pensada e desenvolvida na perspectiva de uma melhoria da prática educativa, para além da simples valoração dos resultados, não se resumindo ao uso de um instrumento específico (prova), o qual atua como sancionador de um veredito de aprovação ou reprovação do aluno de acordo com objetivos previstos para um período letivo.

O presente artigo é um extrato de uma pesquisa doutoral, realizada com professores da área específica de matemática, que atuam nos cursos de Licenciatura em Matemática no Instituto Federal do Ceará (IFCE) e no Instituto Federal da Paraíba (IFPB). A referida pesquisa teve como principal objetivo analisar as concepções e práticas avaliativas dos professores de matemática e egressos dos cursos de Licenciatura em Matemática do IFCE e do IFPB e sua relação com a formação docente. Nesse caso específico, levando em consideração a estrutura exigida na elaboração do artigo, optamos por abordar apenas os dados relativos à formação e às práticas avaliativas dos professores formadores.

METODOLOGIA

A pesquisa é do tipo descritiva, haja vista que “visa descrever e caracterizar fenômenos e populações, estabelecendo relações entre variáveis intervenientes e fatos” (Marques et al., 2006, p. 52).

A abordagem é qualitativa, na qual se faz uso da compreensão dos sujeitos e das suas relações com os objetos de estudo nos contextos em que estão inseridos. A proposta, portanto, foi fazer uso de abordagens associadas ao paradigma qualitativo, com base nos fundamentos filosóficos propostos pela fenomenologia hermenêutica, a partir das visões de filósofos ligados a essa corrente de pensamento, Martin Heidegger (1889-1976) e Hans-Georg Gadamer (1900-2002). Em decorrência dessa opção metodológica, a busca central do objeto de pesquisa ultrapassa a conjectura de definições e conceitos e centra-se na abrangência da vivência no domínio da investigação (Fazenda, 2018).

Para a devida compreensão de alguns dos conceitos utilizados por Heidegger e por Gadamer (especialmente “sentido”, “preconceitos” e “horizontes”), apresentamos uma breve exposição, articulando as formas como esses conceitos foram utilizados nas análises e na discussão dos dados coletados no campo empírico de investigação.

O conceito de sentido compreende tudo aquilo que pode articular-se na interpretação e, por conseguinte, mais originariamente na fala; “sentido”, consoante Heidegger (2005, pp. 222-223), é o que “pode ser articulado na interpretação e, por conseguinte, mais originariamente ainda, já na fala”. Dessa forma, as falas dos participantes desta pesquisa são agrupadas em unidades de sentido e interpretadas posteriormente.

Já o filósofo alemão Gadamer desenvolve a sua teoria com arrimo na descrição ontológica de Heidegger das estruturas prévias da compreensão, chamando-as, por seu turno, de preconceitos, ou seja, a posição prévia, a concepção prévia e a visão prévia. Esses preconceitos, no que lhes concerne, podem ser verdadeiros, levando à compreensão ou não.

Com efeito, faz-se necessário destacar o conceito de “horizonte”, fortemente empregado na abordagem gadameriana, sendo usado para indicar uma situação hermenêutica, isto é, o conjunto herdado de preconceitos do intérprete. Convém assinalar que esses preconceitos formam um horizonte de um contexto atual privado, uma vez que representam o que está depois do que é impossível perceber (Gadamer, 2015). Assim, “nosso próprio horizonte pode mudar através da adoção de outros preconceitos, pode se expandir através da inclusão de mais preconceitos, ou pode diminuir através da exclusão de alguns preconceitos” (Schmidt, 2012, p. 153).

Na ação de compreender, esses horizontes são perscrutados, visando a articular novos sentidos, bem como questionar as intencionalidades do autor, numa busca de projetar o seu sentido histórico. Dessa forma, é importante destacar que o intérprete projeta o horizonte do texto em seu próprio horizonte, o que equivale a dizer que compreende a partir da contração desses dois horizontes, os quais supostamente existem de forma independente (Gadamer, 2015).

Desse modo, vislumbrou-se a possibilidade de articular os fatores constituintes da identidade dos sujeitos pesquisados num viés de desvelamento das práticas constituídas nas realidades investigadas - neste caso específico, os cursos de Licenciatura em Matemática dos institutos federais da Paraíba e do Ceará, portanto, nosso universo de pesquisa.

Os participantes tratados nessa abordagem são os professores de matemática que atuam nos campi que oferecem o curso de Licenciatura em Matemática, a saber:

  • Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE): campi de Fortaleza e Juazeiro do Norte.

  • Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB): campi de Cajazeiras e Campina Grande.

Convém destacar que os participantes da pesquisa foram os professores que atuam nos cursos em questão, os quais, para preservar suas identidades, são mencionados na análise a partir do pseudônimo “D”, em referência ao termo “docente”, seguido de uma numeração, que varia de 1 a 22.

Os dados foram coletados por entrevista semiestruturada, o que nos deu os subsídios para compreensão de alguns aspectos relacionados às práticas ligadas à avaliação da aprendizagem. Oportunamente, foi realizada também uma consulta aos Projetos Pedagógicos de Cursos (PPC), com o fito de estabelecer a relação da formação docente com as práticas de avaliação elencadas nos documentos.

A seguir, são apresentados em cada bloco de análise as unidades de sentido, de acordo com Heidegger, e os horizontes presentes nas falas dos depoentes, conforme Gadamer. Os horizontes são apresentados a partir da subdivisão em horizontes positivos, aquelas concepções que mais se aproximam de uma concepção de avaliação formativa, e horizontes negativos, aquelas que mais se distanciam. No primeiro bloco, exposto a seguir, as unidades foram geradas a partir da pergunta: “Para você, o que é avaliar a aprendizagem?”.

A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM SOB A ÓPTICA DO PROFESSOR FORMADOR

Nesta seção são discutidas as concepções e práticas avaliativas dos professores e sua relação com a formação docente. Entre esses docentes, há diversas concepções que embasam seus posicionamentos sobre a avaliação da aprendizagem, que vão desde as práticas mais estanques, tradicionais, até o pensamento sobre a avaliação como uma prática de construção de conhecimentos, mais dinâmica e participativa.

Em relação à apresentação desta seção em “blocos” de sentido, faz-se necessário esclarecer que na unidade hermenêutica há uma compilação dos sentidos dados pelos participantes e alguns sentidos são compartilhados por mais de um participante da pesquisa. Isso posto, em cada “bloco” apresentado tem-se um conjunto de participantes que deram o mesmo sentido às indagações realizadas na pesquisa com trechos intrínsecos e concomitantes de falas.

O primeiro bloco direciona a avaliação a um conjunto de atribuições que denota o sentido de processo de construção, capaz de auxiliar tanto o aluno quanto o professor no contexto do ensino e aprendizagem. Dessa forma, as primeiras unidades hermenêuticas indicam um sentido positivo atribuído à avaliação da aprendizagem:

Unidades de sentido em Heidegger: sentido positivo

. . . algo muito complexo, e eu vejo a questão do subjetivo . . . uma concepção ampliada da prática de avaliação considera a diversidade de instrumentos e de propostas. . . . é um processo necessário, fundamental, que deve servir de parâmetro para o professor compreender os avanços dos alunos durante o processo de ensino e de aprendizagem e também o professor compreender a sua prática. . . . Eu acho que deveria servir muito mais para a tomada de decisões, planejamento da prática do professor, em vez de ser usado como um instrumento quantitativo. . . . quando você está avaliando, na verdade, embora você esteja avaliando o aluno, você também está fazendo uma autoavaliação. . . . busco ter a percepção do que foi positivo, do que foi negativo, estabelecer relação do que foi o aprendizado, do que o aluno conseguiu aprender, mas também relacionado à forma como eu ensinei, a metodologia que eu utilizei . . . essa reflexão contínua. (D2; D4; D5; D6; D7; D9; D14; D20; D21; D22).

Horizontes em Gadamer

Processo complexo e subjetivo; diversidade de instrumentos e propostas; parâmetro para a compreensão dos avanços dos alunos; tomada de decisões para planejamento; retorno do que foi trabalhado; autoavaliação do professor; percepção dos pontos positivos e negativos da prática; reflexão contínua; diagnóstico; acompanhamento dos percursos do aluno.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte positivo: avaliação como processo de construção da aprendizagem.

Partindo das unidades hermenêuticas destacadas nesse bloco, pode-se inferir que, para esses professores, a avaliação da aprendizagem é encarada sob a perspectiva mais formativa, na qual se valorizam os aspectos da complexidade e da subjetividade da ação de aprender, bem como as trajetórias percorridas pelo aluno e as variáveis constitutivas do que se convenciona chamar de aprendizado.

Dessa forma, a avaliação é pensada como uma prática mais interativa, mais situada nos contextos vividos por professores e alunos, mais centrada na regulação e na melhoria das aprendizagens; é participativa e, por sua vez, está integrada aos processos de ensino e aprendizagem, por isso é denominada formativa (Fernandes, 2009).

O segundo bloco das concepções de avaliação da aprendizagem indica um sentido negativo, mais limitado da ação de avaliar.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido negativo

Avaliar a aprendizagem é você verificar o que foi compreendido durante a aula, e não só codificar. . . . seria uma maneira de você mensurar ou medir o aprendizado do aluno. . . . é saber se o aluno adquiriu os conceitos que são passados em sala de aula. . . . se, a partir daquele conhecimento dado, ele consegue resolver problemas, que são problemas que, muitas vezes, aparentemente não têm nada a ver com a teoria abordada. . . . É fazer uma prova ou trabalho individual condizente com os conteúdos repassados. . . . é observar o que de cognitivo ficou para o aluno. . . . é você verificar se o aluno aprendeu realmente a parte teórica e também a parte prática. . . . Não tem como ele saber só a teoria, e não a prática. (D1; D3; D8; D10; D11; D12; D13; D15; D16; D17; D18; D19).

Horizontes em Gadamer

Verificar o que foi compreendido; mensurar ou medir o aprendizado; saber se o aluno adquiriu conceitos; fazer uma prova; observar o que ficou em termos cognitivos; verificar se aprendeu a teoria e a prática.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte negativo: cultura do exame, da mensuração.

De acordo com as unidades hermenêuticas mencionadas nesse bloco, pode-se inferir que alguns professores concebem a avaliação da aprendizagem como instrumento de medição atrelado diretamente aos aspectos da verificação, reduzindo o processo avaliativo ao uso do instrumento prova, algo perceptível em áreas mais tradicionais do conhecimento no âmbito do ensino superior (Irala & Mena, 2021). Outrossim, pensam a avaliação como um fim em si mesma, como determinante de um veredito sobre quem aprendeu ou deixou de aprender. A ação de avaliar é direcionada para os princípios da cultura do exame, que, por sua vez, é compatível com a Pedagogia Tradicional, visto que sua centralidade está na formação da mente lógico-discursiva do aluno, a partir da concepção de conhecimentos apresentados como verdades absolutas pelo educador, o qual se coloca como autoridade máxima do processo pedagógico (Luckesi, 2005, 2011).

A partir das concepções de avaliação destacadas, tanto no horizonte positivo quanto no negativo, intenciona-se estabelecer nas seções seguintes um paralelo com os processos de formação aos quais esses professores tiveram acesso, de modo especial, na formação inicial.

REFLEXOS DAS EXPERIÊNCIAS COM A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA FORMAÇÃO INICIAL

As experiências vivenciadas pelos professores como alunos no processo de formação inicial, na licenciatura ou no bacharelado, não fugiram muito ao padrão do que foi observado durante o processo de escolarização na educação básica. Entretanto, um aspecto em especial deve ser considerado, antes mesmo de trazer à tona as percepções desses professores sobre a avaliação: o nível de maturidade com que se deram as interações com o conhecimento nesse período formativo. Questionados sobre as suas experiências avaliativas durante a formação inicial, foi expressivo o número de professores que apontou um sentido negativo, como se pode observar nas unidades de sentido registradas adiante.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido negativo

. . . a lei é prova, é quantitativo mesmo . . . as propostas que os professores faziam não eram robustas, ampliadas, aplicação de provas, apresentação de seminários sem um direcionamento. . . . pouco era observado. . . . Se o resultado desse certo, beleza; se não desse, tchau. . . . Experiência horrível. . . . Existia um distanciamento muito grande do professor com o aluno . . . Era despejado sobre a gente o conteúdo, e a gente tinha que ter uma obrigatoriedade de dar uma resposta do ponto de vista quantitativo do que você tinha assimilado. . . . provas discursivas . . . e esse tipo de prova é o que eu replico na sala. . . . A avaliação, na minha formação docente inicial, ela realmente deixou bastante a desejar. . . . não via muita relação entre o que o professor abordava e o que era cobrado. (D1; D2; D3; D4; D5; D7; D8; D13; D14; D16; D17; D22).

Horizontes em Gadamer

Quantitativo; aplicação de provas; seminários sem direcionamento; pouca observação; distanciamento do aluno; conteúdos descontextualizados; provas discursivas; deixou muito a desejar; não havia relação do que era cobrado na prova com o conteúdo estudado em sala.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte negativo: quantitativo em detrimento do olhar qualitativo.

Nessas unidades de sentido que ilustram o horizonte negativo atribuído às práticas avaliativas, uma fala em especial chamou a atenção, por ter uma relação muito específica com o objeto de estudo abordado nesta pesquisa, demonstrando a influência, embora negativa, das experiências vivenciadas no processo de formação nas práticas docentes atuais. O docente relatou: “e esse tipo de prova é o que eu replico na sala”. Nessa fala fica claro que as práticas de avaliação às quais esse professor teve acesso, mesmo não tendo sido as mais positivas, as mais adequadas, correspondem ao tipo de instrumento que utiliza com mais frequência em sala de aula.

Todavia, para outro grupo de docentes, os olhares se apresentam em contextos distintos, nos quais as práticas de avaliação da aprendizagem assumem caráter diferenciado, numa abordagem mais próxima da prática docente inclusiva, como relatadas no seguinte excerto.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido positivo

. . . começaram a surgir coisas novas, outras possibilidades de avaliação que não fosse só essa coisa da prova escrita. . . . Eu comecei a ter consciência disso . . . na graduação havia muito a presença dos seminários, apresentação de conteúdos. . . . na licenciatura, a avaliação, ela teve mais essa parte de arguição e de exposição, além da prova escrita. . . . O professor pedia para você pegar aplicações daquele conteúdo . . . Na graduação, o cenário se modificou com relação a dois pontos: um é que algumas disciplinas específicas eram avaliadas em projetos . . . Eu fiz, a princípio, o bacharelado em Engenharia Mecânica, e depois eu fiz o curso de formação especial de professores, que é conhecido como “esquema”. No bacharelado, eu tive contato com a parte de matemática de algumas áreas mais ligadas à questão da avaliação; foi realmente no curso de formação de professores que a gente estudou uma disciplina de avaliação . . . (D6; D9; D10; D11; D12; D18; D19).

Horizontes em Gadamer

Novas possibilidades de avaliação; apresentação de seminários; consciência da necessidade de estudar; arguição e exposição; aplicações dos conteúdos; avaliação por projetos; forma de avaliação diferenciada; cursou disciplina de avaliação.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte positivo: avaliação da aprendizagem vista sob outras perspectivas, com novas possibilidades.

Ao analisar esse bloco de relatos, pode-se inferir que, no que concerne às experiências ligadas à avaliação da aprendizagem, há divergências de olhares, de concepções acerca dessas práticas. É possível observar que relatos de situações muito semelhantes assumem contextos ora positivos, ora negativos, e isso depende muito do ponto de vista de quem as analisa, da própria identidade que foi se delineando ao longo do processo de formação desses docentes e da forma como se articulam nas situações práticas do cotidiano docente.

A história de vida de cada sujeito e as relações que se estabelecem com os contextos formativos aos quais se teve acesso têm relação direta com as formas como se delineiam também as suas práticas. Dessa forma, não se pode considerar cada objeto de estudo de modo desvinculado do aspecto da sua historicidade, especialmente das relações estabelecidas, posto que não são simplesmente dados mensuráveis ou passíveis de constatação, mas sim têm a ver com o modo de ser de cada sujeito, com a interação e a compreensão estabelecidas nos processos formativos e na sua identificação em cada contexto de atuação (Gadamer, 2015).

ACESSO AOS CONHECIMENTOS SOBRE A AVALIAÇÃO NA FORMAÇÃO INICIAL COMO SUBSÍDIO PARA A PRÁTICA DOCENTE

O bloco de análise que se segue teve como ponto de partida as seguintes questões norteadoras: “a) Quais as possibilidades oferecidas pelo seu curso de graduação em relação ao conhecimento em avaliação da aprendizagem?”; “b) Como você analisa o seu grau de conhecimento em avaliação da aprendizagem?”; e “c) De onde você acha que veio o seu maior conhecimento/preparo em relação à avaliação educacional?”. Essas questões deram suporte ao entendimento das demandas relacionadas com o perfil do professor, com as oportunidades e com as práticas de formação em avaliação da aprendizagem às quais tiveram acesso durante a formação acadêmica.

O primeiro aspecto abordado neste bloco relaciona-se com um horizonte extremamente negativo, tendo em vista que a maioria dos professores entrevistados não teve acesso a nenhum tipo de formação específica ligada à avaliação, como pode ser observado nos relatos a seguir.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido negativo

No meu curso, acho que, por ser bacharelado, é muito voltado para a pesquisa, e aí essa parte da avaliação a gente não tem . . . Eu tenho dificuldade de encontrar outras maneiras que não sejam provas escritas para avaliar os meus alunos e também acho que fui avaliado dessa forma predominantemente quando era aluno e não achei que era um método assim ruim, não. . . . O curso ofereceu muito pouco. . . . Pouco, na parte de Didática, falava um pouco sobre avaliação. . . . Nas disciplinas de prática, dava-se mais ênfase a como você lecionar. . . . No geral, o curso foi muito preso ao modelo rigoroso de prova e tomando como parâmetro, assim, para poder discutir outras coisas, por exemplo, as provas, difícil elaboração, no aspecto de não estar em consonância com a prática do professor. . . . Na parte teórica de avaliação, fundamentos de fato do que é avaliar, de como avaliar, esse tópico foi muito superficial. . . . As disciplinas pedagógicas, outras disciplinas, sim, me deram esse ponto, essa nova visão de você avaliar, sem ser só no papel. . . . Eu acho que as licenciaturas brasileiras têm que mudar totalmente, porque você não sabe o que é uma avaliação qualitativa ou quantitativa; a gente não sabe nada: como elaborar uma prova, como corrigir uma prova, nada disso aí é transmitido. . . . o futuro professor de matemática, ele não é treinado, não são passadas essas informações de como avaliar, de como preparar uma aula e o treino mesmo . . . (D2; D3; D4; D6; D7; D8; D9; D10; D11; D13; D14; D15; D16; D17; D18; D19; D21; D22).

Horizontes em Gadamer

Voltado para a pesquisa; não contempla a avaliação; avaliação com provas, seminários e trabalhos; dificuldade de encontrar maneiras de avaliar diferentes daquelas a que teve acesso na formação inicial; curso ofereceu muito pouco; um pouco na parte de didática; provas mal elaboradas e divergentes da prática; teoria em avaliação abordada de modo superficial; necessidade de mudanças nas licenciaturas em relação à abordagem da avaliação; formação na prática; reprodução de modelos de avaliação.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte negativo: formação docente inicial não contempla o básico exigido para o exercício da docência em termos de avaliação.

Como se observa nesse extrato, a formação inicial deixou a desejar em muitos aspectos, especialmente em se tratando das práticas ligadas à avaliação da aprendizagem, tanto nos aspectos formativos, de preparação para práticas docentes futuras, quanto nas práticas avaliativas com as quais tiveram contato durante o seu processo formativo inicial. É importante destacar que essas deficiências não são específicas da formação em nível de bacharelado, elas se apresentam também no contexto das licenciaturas em Matemática, uma vez que os cursos analisados não apresentam em suas matrizes curriculares disciplinas específicas de avaliação educacional ou da aprendizagem. Estas, por sua vez, ficam restritas, na maioria das vezes, às disciplinas de didática e de práticas de ensino.

Ao serem questionados sobre o grau de conhecimento teórico em avaliação da aprendizagem, os professores sinalizaram a inexistência de um direcionamento mais específico no processo de formação inicial, balizado pelo conhecimento mais formal. Nessa perspectiva, é evidente que, na maioria dos casos, o docente recém-formado, ao se deparar com as exigências da prática, vê-se desnorteado, muito mais experimentando estratégias pedagógicas que não têm uma fundamentação teórica que as sustente, como se pode constatar nos relatos a seguir.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido negativo

Conhecimento teórico é quase zero, porque eu não tive experiências que me levassem a isso. . . . O grau de conhecimento é muito mais na parte prática da coisa do que na parte teórica. A gente sabe que o interessante é aplicar ferramentas distintas, ter avaliação continuada . . . mas, na parte teórica, de fato, profundamente, eu confesso que não houve tanta preparação, não. O que é utilizado é o que foi repassado para nós na prática, durante a graduação. . . . eu avalio os meus alunos da mesma maneira que eu fui avaliado. . . . Apenas eu cumpro as determinações que são estabelecidas pela instituição . . . Hoje, mesmo na condição de doutor, eu decidi cursar a Licenciatura em Pedagogia, pelo fato de que eu preciso ampliar o meu conhecimento . . . e me atualizar. . . . porque a avaliação da aprendizagem demanda competências multifuncionais . . . Eu faço, assim, de forma intuitiva. (D1; D2; D3; D4; D5; D6; D8; D10; D11; D12; D13; D14; D15; D16; D17; D18; D20; D21).

Horizontes em Gadamer

Pouco conhecimento teórico; o conhecimento se restringe aos saberes adquiridos na prática, baseia-se nas vivências; busca individual por formação; avaliação demanda competências; realiza as práticas de avaliação de forma intuitiva.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte negativo: as práticas de avaliação são realizadas de forma intuitiva, por não haver uma formação específica na área.

Com base nas falas desses profissionais, constata-se que a formação inicial não lhes propiciou um grau de conhecimento satisfatório, tendo em vista que muitas das práticas em avaliação da aprendizagem, conforme relatado, são realizadas de modo intuitivo, na perspectiva do erro/acerto. Desse modo, pode-se afirmar que os saberes da experiência têm grande relevância nesse contexto, pelo fato de serem, na maioria das situações, as únicas possibilidades de reflexão sobre as práticas de avaliação da aprendizagem desenvolvidas na educação básica.

Corrobora essa perspectiva a pesquisa realizada por Carvalho, que constata que, no que diz respeito ao olhar sobre as deficiências na formação ligada à avaliação, a prática da reprodução da “avaliação como cultura de exame” ainda é recorrente nas práticas docentes, por não haver um conhecimento científico que promova no professor “um processo de internalização do conceito de avaliação do ensino-aprendizagem baseado em uma cultura de avaliação” (2016, p. 236). Enfatiza ainda a importância desse conhecimento no processo de formação do conceito de avaliação do ensino e aprendizagem para uma prática de cultura de avaliação (Carvalho, 2016).

Os cursos de graduação, mesmo as licenciaturas, não dão ainda atenção especial à avaliação, não contemplando nas suas bases curriculares os estudos formais sobre essa prática tão complexa, tão exigida e, muitas vezes, tão equivocada.

Os docentes, ao refletirem sobre a origem do conhecimento sobre a avaliação, intensificaram a atribuição às práticas vivenciadas nos diversos espaços de formação, haja vista que demonstraram que se viram motivados a realizá-las também na educação básica. Revela-se, nesse sentido, a forma como elas foram articuladas a partir dos aspectos intuitivos, dos reflexos de práticas de alguns professores, as quais serviram de base, de modelo, para implementar as formas de avaliar os seus alunos.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido negativo

A maior parte é da experiência mesmo. . . . quando a gente vai para a prática, a gente realmente aprende, e evolui, e repensa, e inova. . . . O registro que eu posso fazer à memória está mais relacionado à minha prática do que à própria formação. . . . Tem uma parte das experiências, os saberes da experiência, mas tem uma parte também dos cursos de pós-graduação . . . Eu tenho buscado fazer leituras com relação à avaliação da aprendizagem na matemática. . . . Como eu via os professores, a forma como eles trabalhavam . . . porque de início eu tinha muitas ressalvas em relação às disciplinas didáticas, mas eu acabei pagando uma disciplina de didática . . . fez muito repensar o que a gente passa para os nossos alunos e o que eles podem aproveitar desse conhecimento. (D1; D2; D3; D4; D5; D6; D10; D12; D14; D15; D16; D18; D19; D20; D21; D22).

Horizontes em Gadamer

Conhecimento da experiência, mais ligado à prática do que à formação; pós-graduação; esforço próprio; não estudou pela profundidade, mas pela necessidade; reflexos de experiências/observações das formas como os professores trabalhavam.

Fusão de Horizontes em Gadamer

Horizonte negativo: inexistência de uma cultura de formação em avaliação na formação inicial.

Como destacado no bloco anterior, não há um direcionamento, uma cultura de trabalho dos fundamentos das práticas de avaliação da aprendizagem na formação inicial dos professores no contexto analisado. Foram revelados diversos fatores que impactam essa formação numa tentativa de preencher as lacunas deixadas nesse processo, que vão desde a observação direta, trazendo à memória as práticas vivenciadas por determinados professores no período em que cursavam a formação inicial, até as inúmeras tentativas de aplicação de instrumentos, que, por seu turno, dão conta ou não de todo o processo de avaliação e de formação de novos professores de matemática.

A FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES FORMADORES: POSSIBILIDADES OU DESAFIOS?

No universo da formação docente, entende-se que a formação inicial não dá conta de todas as exigências do processo de ensino e aprendizagem. Nessa perspectiva, é importante refletir também sobre a forma como esses professores se veem no processo de formação continuada, como se dá esse processo no contexto dos institutos federais analisados. Existe alguma iniciativa de formação continuada no âmbito dessas instituições?

Antes de explorar as percepções dos docentes acerca desse processo e a forma como ele acontece ou deixa de ocorrer no universo em questão, é indispensável refletir sobre a forma como tais práticas são concebidas. Para Pimenta e Anastasiou (2014), pensar práticas de formação docente continuada exige uma tomada de consciência de que não é algo que deva acontecer apenas de forma institucionalizada, numa relação verticalizada, de cima para baixo. Todavia, é necessário se perceber protagonista das mudanças que serão empreendidas, e que estas devem partir do diagnóstico da realidade educacional na qual se pretende implementar tais mudanças. Além disso, partindo dessa necessidade constatada, ainda é preciso que haja uma adesão voluntária dos docentes, dado que a formação continuada não se efetiva por meio de decreto.

Partindo do questionamento destacado anteriormente, a maioria dos professores direcionou suas falas para um horizonte negativo, apontando as dificuldades percebidas referentes às práticas de formação continuada, tanto no âmbito de oferta por parte da instituição quanto na disponibilidade de cada um deles. Pelos relatos a seguir, é possível constatar tais afirmações.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido negativo

Eu não tive nenhuma formação . . . Raramente ocorrem ou podem ocorrer palestras . . . para mim, é empírica . . . nós temos aqui uma cooperação pedagógica, mas me parece muito mais envolvida com trabalho burocrático do que necessariamente em fazer encontros. Meu contato com a avaliação, de estudar a avaliação, concepções, tipos, critérios, instrumentos foi na especialização em Gestão Escolar . . . já na especialização e no mestrado eu sigo o exemplo de alguns professores que eu vejo. . . . É importante, até porque a pessoa que está em sala de aula, muitas vezes, ela não está completamente formada, tem deficiências. Eu acho muito frágil. . . . os cursos de formação ainda deixam muito a desejar sobre essa discussão, o que é avaliado, como avaliar . . . (D2; D3; D4; D5; D7; D9; D10; D12; D14; D16; D17; D18; D19; D22).

Horizontes em Gadamer

Não há iniciativas da instituição em relação às estratégias de formação continuada; consciência da necessidade de formação continuada; acesso na pós-graduação e em encontros pedagógicos fora do instituto federal; ainda é muito restrito às disciplinas de formação pedagógica; saberes da prática como suporte à formação.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte negativo: não existem ações sistemáticas de formação continuada (em avaliação da aprendizagem) nos institutos pesquisados.

Como se pode observar, não há iniciativas mais sistematizadas de formação continuada que privilegiem diretamente os estudos sobre avaliação da aprendizagem. De acordo com os docentes consultados, não é uma temática que tenha recebido uma atenção especial por parte das instituições em questão, no sentido de aprofundamento teórico, tendo ficado muito mais atrelada às reflexões a partir das práticas desenvolvidas em sala de aula do que às ações formativas de base teórica.

Com uma expressividade bem inferior, alguns professores relataram a existência de algumas iniciativas de formação continuada nas instituições analisadas neste estudo, destacando a importância dos encontros pedagógicos realizados a cada início de semestre e a tentativa de se abordarem temáticas ligadas à avaliação e às práticas de ensino (D20). Contudo, essas iniciativas ainda se configuram como insuficientes, por não darem conta das demandas de formação continuada em avaliação da aprendizagem, tendo em vista o fato de que, por vezes, são atividades realizadas em paralelo aos horários de aula, impossibilitando que alguns professores participem delas (D21). Vale ressaltar que os dois docentes citados neste parágrafo (D20 e D21) foram trazidos fora do bloco de análise hermenêutica, pois apresentaram algum tipo de ação formativa em avaliação e a destacaram em suas falas, no entanto foram apenas esses dois, enquanto no bloco de sentido um conjunto maior de docentes não atestou essas ações formativas nas instituições investigadas.

A AÇÃO DE AVALIAR A APRENDIZAGEM DE FUTUROS PROFESSORES DE MATEMÁTICA

A formação docente inicial, na sua essência, precisa dar conta de uma série de fatores inerentes à prática pedagógica, subsidiando teoricamente as práticas que serão desenvolvidas na sala de aula, para o momento em que esses professores se deparam especialmente com a educação básica. Nesse contexto, compreender como os docentes pensam a avaliação e como articulam as práticas avaliativas no seu trabalho com seus alunos da licenciatura permite traçar um perfil, embora amplo, do tratamento dado às práticas avaliativas e a forma como são implementadas no processo de formação inicial do futuro professor de matemática.

Com base nos relatos destacados a seguir, buscou-se identificar a concepção que norteia o processo de avaliação desse grupo de professores, bem como as estratégias mencionadas com vistas à coleta de dados avaliativos.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido positivo

Na área de Exatas, é muito difícil se desvincular da prova na avaliação. . . . Geralmente eu divido a disciplina com prova, seminário, trabalho em grupo. . . . Pesquisa também. Busco uma avaliação que seja ampla e que atenda a todos; é subjetivo . . . eu avalio muito a partir do meu diálogo . . . Eu noto os avanços e me parece que isso tem-me feito repensar muitas coisas da minha prática. . . . costumo fazer atividades em classe . . . de modo relâmpago, e ali ele é convidado a pôr a mão na massa, a fazer os exercícios, e não só ficar na qualidade de espectador . . . . Infelizmente eu não posso fazer um registro dos avanços, das dificuldades que esses alunos apresentam, eu tenho que lançar no sistema um número, e é complicado . . . Oficinas em laboratórios. . . . softwares, eu também utilizo como ferramenta para avaliação . . . visitar algumas escolas da rede pública, levando esses materiais para que os alunos tenham esse encontro com os alunos da educação básica. . . . tipo de avaliação depende da disciplina. . . . disciplinas que a gente chama de disciplinas de formação do professor de matemática, e aí isso nos permite diversificar a forma de avaliar nossos alunos . . . Nas disciplinas técnicas, que são as disciplinas de cálculo, de álgebra, a avaliação não foge muito à regra do que foi feito na graduação. (D1; D2; D3; D4; D6; D7; D8; D10; D11; D12; D13; D14; D17; D18; D19; D20; D21; D22).

Horizontes em Gadamer

Dificuldade de se desvincular totalmente da prova; propõe atividades diversificadas, debates, trabalho com defesa; avaliação subjetiva; avalia a partir do diálogo, conjunção de atividades; avaliação relâmpago; registro de avanços e dificuldades; tipos de avaliação dependem da disciplina.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte positivo: busca de outras estratégias avaliativas para além da aplicação de provas.

Neste bloco de análise, fez-se a opção por atribuir às falas dos docentes um sentido positivo, embora alguns horizontes ainda apontem para uma ação restrita da prática de avaliar a aprendizagem. Percebe-se que o uso da prova prepondera sobre as demais estratégias de coleta de dados avaliativos, em que se utilizam de outras práticas mais subjetivas de avaliação, vinculadas às relações estabelecidas na sala de aula, ao acompanhamento mais sistemático dos alunos no cotidiano escolar.

O sentido positivo aqui atribuído se justifica pelo fato de outras práticas serem vislumbradas e de pontuarem momentos distintos daqueles em que se aplica uma prova como potencial subsídio para a coleta de dados para a avaliação. Situações vivenciadas em espaços como laboratórios, escolas de ensino básico, a própria sala de aula, em situações que vão além da aula convencional, refletem um olhar diferenciado sobre o processo avaliativo.

No entanto, entende-se que a simples afirmativa da adoção de estratégias diferenciadas para avaliar a aprendizagem, por si só, não é garantia de uma prática de avaliação formativa na qual se garanta ao aluno o espaço para a reflexão sobre seu processo de construção de conhecimento. É preciso ir além na capacidade de propor estratégias de aprendizagem baseadas na ação concreta do estudante, da consciência do agir sobre determinados contextos e transformá-los conscientemente. De acordo com Fernandes (2009), para que haja uma aprendizagem significativa, uma aprendizagem com compreensão, faz-se necessária a reflexão numa ação concreta e ativa dos educandos, na qual o aspecto da regulação também esteja presente. E não pode ser diferente com a avaliação. Os aprendizes, especialmente os que se preparam para o exercício da docência, precisam interagir com propostas de avaliação compostas a partir da definição de objetivos claros, nas quais se estabeleça relação direta entre os conteúdos trabalhados e objetivos de aprendizagem definidos previamente e de comum acordo entre professor e alunos.

De posse dessas informações sobre as maneiras como visualizam o processo de avaliação, foi perguntado aos docentes sobre os tipos de instrumentos que utilizam com maior frequência para avaliar os alunos da licenciatura. Nessa perspectiva, confirmaram-se as afirmações de que outras estratégias são consideradas no momento de avaliar e que vão além da prova escrita. A maioria desses professores reforçou a utilização de instrumentos diversos para avaliar os estudantes da licenciatura, enfatizando que o tipo de abordagem e seleção do que utilizar depende de vários fatores, entre eles o tipo de disciplina com a qual estão trabalhando. Na opinião desse grupo de profissionais do magistério, uma disciplina técnica exige uma abordagem totalmente diferente de avalição do que exige uma disciplina de caráter pedagógico, por exemplo. Essas abrem um leque maior de possibilidades de utilização de instrumentos avaliativos, nas quais o princípio dialógico se aplica mais facilmente, por também exigir meios de reflexão sobre a utilização de determinados conteúdos na docência.

Dentre os instrumentos avaliativos utilizados e que foram mencionados pelos professores, destacam-se os seguintes: provas escritas, listas de exercícios, testes relâmpago, portfólios, resenhas, fichamentos, entrevistas, estudos de caso, seminários, pesquisas, ferramentas da internet, oficinas, relatórios, aplicações, desenvolvimento de projetos, avaliações contínuas, desenvolvimento de aulas para os colegas (na análise de saturação das falas dos participantes, esses instrumentos foram os citados por este conjunto de docentes: D1; D2; D3; D4; D5; D6; D7; D9; D11; D12; D14; D15; D16; D17; D20; D22). Dessa forma, constitui um aspecto extremamente positivo o fato de se considerarem outras possibilidades de situações pedagógicas que sirvam à avaliação, capazes de fornecer os subsídios necessários para uma prática avaliativa formativa alternativa. Contudo, é importante destacar que o fato de terem sido mencionadas tais práticas não coincide com o retrato fiel da realidade, de como elas se constituem no universo pesquisado como um todo.

Se forem analisadas as falas anteriores no que concerne às concepções de avaliação desses professores, bem como aos modelos de formação em avaliação aos quais tiveram acesso na sua formação inicial e continuada, pode-se inferir que essas práticas necessitam de um olhar especial, mais diretivo. Isso se deve ao fato de que muitas delas não têm uma base teórica que as fundamente, tendo sido constituídas muito mais com base nos experimentos realizados às cegas do que propriamente a partir de conhecimentos científicos, de estudos mais formais sobre avaliação.

Desse universo, um percentual pequeno de professores atribuiu unicamente à prova as estratégias utilizadas para coletar os dados avaliativos, principalmente pelo fato de não considerarem outras possibilidades de avaliação. Para eles, embora a prova assuma outros formatos, sua utilização de forma prioritária é necessária, dada a sua eficácia em comparação a outros instrumentos (na análise de saturação das falas dos participantes, esse instrumento foi citado por este conjunto de docentes: D8; D10; D19).

Diante da importância das práticas que se desenvolvem na licenciatura, os docentes foram indagados sobre a forma como visualizam a sua atuação na formação de futuros professores, especialmente no que diz respeito à avaliação.

É notória a visão dos professores em relação à prática avaliativa, pois têm noção da complexidade que envolve o processo de ensino e aprendizagem como um todo. Embora não tendo a formação adequada que lhes tenha possibilitado desenvolver estratégias de avaliação embasadas teoricamente, em sua essência, procuram fornecer os subsídios necessários para uma prática pedagógica ética, crítica e responsável (na análise de saturação das falas dos participantes, essa compreensão foi citada por este conjunto de docentes: D6; D7; D11; D12; D13; D14; D17; D18; D19; D22).

Trazer para a sala de aula, ainda no processo de formação inicial, a reflexão sobre as práticas de avaliação que se desenvolvem na licenciatura e na educação básica pode ser um importante elemento constitutivo da identidade docente, especialmente no que diz respeito aos cuidados a serem tomados no momento de planejar e desenvolver as ações docentes no espaço escolar. Nesse contexto, convém destacar a visão de Ghedin sobre a importância dos saberes da experiência, uma vez que:

Os saberes da experiência e da cultura surgem como centro nerval do saber docente, a partir do qual os professores procuram transformar suas relações de exterioridade com os saberes em relação à interioridade de sua prática. Os saberes da experiência não são saberes como os demais, eles são formadores de todos os demais. É na prática refletida (ação e reflexão) que este conhecimento se produz, na inseparabilidade entre teoria e prática. (2012, p. 155).

Dessa maneira, o conhecimento vai-se constituindo muito mais a partir da própria experiência docente do que a partir de situações formais, teóricas, por exemplo. Esses professores relataram saber da importância dessas situações e das formas como tentam viabilizar uma aproximação das situações que envolvem a avaliação, seja por meio do diálogo sobre o que não devem fazer, dos cuidados no processo de elaboração das provas, dos olhares diferenciados sobre a prova ou dos resultados advindos delas, enfim, abordagens superficiais, sem muita elaboração ou sistematização. No entanto, o bloco de falas selecionado aponta para um horizonte positivo, pelo fato de esses docentes se perceberem no seu papel de formar futuros professores e, mais ainda, visualizarem o alcance de suas intervenções em práticas futuras, de modo especial, na educação básica.

Ainda quanto ao papel assumido por cada professor no processo de formação docente, um grupo de professores não se percebe assumindo de forma efetiva a abordagem relativa à avaliação da aprendizagem, ou por não se achar capacitado ou mesmo por achar que tal abordagem não é de sua competência. Nessa direção, sinalizaram um horizonte negativo referente ao papel assumido no processo de formação de professores de matemática, especialmente no tocante à avaliação (na análise de saturação das falas dos participantes, essa compreensão foi citada por este conjunto de docentes: D1; D2; D3; D4; D8; D9; D10; D16; D21).

Os professores ou não encaram como sua tarefa falar sobre avaliação da aprendizagem no contexto da licenciatura, ou não se sentem devidamente preparados para realizar tal ação. À avaliação é atribuído mais um peso do que a possibilidade de construção de conhecimento. Tal peso é atribuído à complexidade da ação de avaliar, mas também ao nível de alcance dessa formação em práticas futuras. O que se vê é que, mesmo diante dessa percepção, não se sentem convidados a desenvolver práticas que permitam aos futuros docentes interagir com as diversas possibilidades de abordagens avaliativas nas disciplinas específicas da matriz curricular de seus cursos.

Em sua maioria, os professores afirmaram estar mais preocupados com o tratamento dos conteúdos, com a sua abordagem e com a forma como são transmitidos do que com a definição com esses alunos das formas como pode ser acompanhado o processo de construção da aprendizagem. Nesses casos, as estratégias que empregam para avaliar os discentes, futuros professores, na maioria das vezes, não estão atreladas às reflexões que poderiam ser feitas sobre a epistemologia da avaliação, sobre os cuidados a serem considerados em cada tipo de prática avaliativa.

Nesse contexto, embora tenham afirmado ter consciência da grande responsabilidade de formar futuros professores de matemática, não são encarados todos os fatores intervenientes da prática pedagógica, nesse caso específico, as questões norteadoras de uma prática avaliativa formativa, as quais são deixadas de lado ou simplesmente atribuídas como função exclusiva das disciplinas pedagógicas, como a Didática e a Psicologia da Aprendizagem, por exemplo.

Para Ghedin (2012, p. 152), “o conhecimento é sempre uma relação que se estabelece entre a prática e as nossas interpretações da mesma [sic]; é a isso que chamamos de teoria, isto é, um modo de ver e interpretar o nosso modo de agir no mundo”. Nesse processo de reflexão sobre a formação docente e as práticas desenvolvidas, é de suma importância considerar todos os fatores envolvidos e como se relacionam a partir das dimensões teórica e prática.

Outro aspecto importante na subjetividade dos professores em relação às práticas de avaliação é a forma como eles encaram a ação de avaliar, na perspectiva de sinalizar as dificuldades encontradas em decorrência dessas práticas. Nessa direção, alguns entraves em decorrência da ação de avaliar foram identificados, entre eles:

  • problemas com a gestão da avaliação (interferências por parte das escolas);

  • particularidades das disciplinas;

  • alunos avaliando professores;

  • pouca valorização ou desconhecimento do processo de avaliação (por parte dos próprios professores);

  • falta de bibliografia que dê suporte à formação em avaliação;

  • resistência (por parte dos alunos) gerada a partir da cultura em avaliação tradicional (na análise de saturação das falas dos participantes, esses entraves foram citados por este conjunto de docentes: D3; D8; D16; D18; D19; D20; D22).

Como se pode observar, as dificuldades vão desde as limitações individuais dos professores, em relação à abordagem sobre a avaliação ou à prática da avaliação no contexto da sala de aula, até as dificuldades do sistema educacional como um todo. Algumas dessas dificuldades têm relação direta com o processo de formação inicial desses professores, pela inexistência de uma cultura de formação em avaliação que dê conta de todo o embasamento necessário para a realização de práticas avaliativas reflexivas e que sejam capazes de suprir as exigências a elas atribuídas.

Por se estar aqui tratando de concepções de avaliação da aprendizagem, foi solicitado aos professores participantes da pesquisa que apresentassem os modelos ideais de práticas avaliativas. O intuito era possibilitar-lhes a reflexão sobre os seus anseios em relação às práticas de avaliação desenvolvidas na licenciatura e sobre as mudanças que poderiam vir a ser implementadas nas suas formas de conceber e desenvolver os processos de avaliação da aprendizagem.

Nessa abordagem, serão tratadas como horizontes positivos dos professores as práticas mencionadas que estiverem mais próximas de uma concepção de avaliação formativa, reflexiva.

Unidades de sentido em Heidegger: sentido positivo

Tem que ter essa avaliação oral, . . . não pode ser só escrita . . . Conseguir organizar na mente deles os problemas matemáticos de um ponto de vista sobre o nível superior e, com os seminários, . . . avaliar se eles são capazes de passar esse conteúdo. . . . que eles aprendam a ensinar . . . Talvez aumentar um pouco mais essa prática e também já estudar a questão de como avaliar . . . deveria ser um processo que tenha como critério principal tornar o aluno crítico, consciente desse processo e de que o erro é um momento, é um caminho no processo de aprendizagem . . . o critério da vontade . . . o critério da socialização, se o sujeito é comunicativo . . . o critério da organização; o critério do estudo continuado . . . avaliação contínua. . . . ter em mente que o aluno pode ser avaliado de diferentes maneiras, não somente através de testes ou coisas escritas . . . Em matemática, eu acredito que a avaliação ela tem que ser processual. . . . de repente, repensar, fazer adaptações de procedimentos avaliativos para montar as futuras avaliações deles como professores. . . . discutir, entender as concepções de avaliação . . . quais são os critérios, como, quando, para quê, não necessariamente só aplicar . . . E não o quantitativo em detrimento do qualitativo. . . . Eu entendo que uma licenciatura ela precisa ser trabalhada em três dimensões. Você precisa ter disciplinas específicas dos conteúdos de matemática . . . de formação geral . . . e as disciplinas da formação do professor, da formação pedagógica do professor de matemática . . . (D1; D2; D3; D4; D6; D7; D10; D11; D14; D16; D17; D18; D19; D20; D22).

Horizontes em Gadamer

Avaliação oral e escrita; organização de problemas matemáticos para o nível superior; avaliar se aprendeu a passar o conteúdo; aumentar a prática de como avaliar; tornar o aluno crítico e consciente do processo; reflexão a partir do erro; observação de critérios diversificados; avaliação contínua; valorização de aspectos qualitativos em detrimento dos quantitativos; avaliação processual; respostas às perguntas como, quando e por que avaliar; trabalhar nas três dimensões da formação do professor; desenvolver no aluno a autocrítica; averiguar a capacidade comunicativa do aluno.

Fusão de horizontes em Gadamer

Horizonte positivo: avaliação contemplada a partir de momentos e olhares distintos na prática.

Com base nas afirmativas desses professores, a prática avaliativa considerada ideal deve ser baseada em princípios formativos, realizada em momentos distintos e de forma constante, permeando toda a prática docente. Nessa percepção, a avaliação deve ser realizada obedecendo a critérios específicos, tendo como fim o aprendizado do aluno.

Para que isso aconteça de forma efetiva, há que considerar uma diversidade de instrumentos, com fins específicos, a ser utilizada em diferentes momentos, de forma contínua, no cotidiano de sala de aula. É importante destacar que, nessa concepção de avaliação, as práticas devem ser pensadas como busca de respostas às questões: como, quando e por que realizar a avaliação? Para esse grupo de professores, as práticas ideais de avaliação devem levar em consideração esses pontos de reflexão, tendo consciência, de fato, dos propósitos da prática avaliativa.

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM SOB A ÓPTICA DOS PROFESSORES FORMADORES

Os horizontes sinalizados a partir das falas dos professores participantes da pesquisa direcionam para um entendimento de que a avaliação da aprendizagem é concebida sob dois contextos distintos: o primeiro atribui à avaliação as características de um processo complexo, contínuo, no qual se deve fazer uso de uma diversidade de instrumentos que servirá como parâmetro para uma tomada de decisão; já o segundo atribui à avaliação a função do exame, da mensuração, reduzindo a ação avaliativa a um momento pontual, como fim em si mesma, em que a prova se sobrepõe aos demais instrumentos de avaliação.

Com base nas declarações desses professores, as experiências vivenciadas na educação básica e na sua formação inicial exerceram (e ainda exercem) forte influência nas práticas que desenvolvem com os seus licenciandos, de modo específico nas aulas de matemática e nos momentos em que se veem impelidos a avaliar a aprendizagem desses estudantes. Dentre os fatores destacados como motivadores ou responsáveis pela formatação dada às atuais práticas avaliativas, os mais enfatizados foram os seguintes:

  • práticas enraizadas na pedagogia tradicional;

  • uso preponderante da prova escrita como meio utilizado para avaliar a aprendizagem;

  • cobranças em avaliações tradicionais, fechadas, com provas orais (arguição);

  • experiências de memorização, questões das provas muito específicas e desconexas da realidade dos alunos;

  • supervalorização dos aspectos cognitivos e da questão disciplinar;

  • velha e conhecida “semana de prova” (citada como uma experiência traumática).

Nesse sentido, é evidente o fato de que as práticas avaliativas dos professores formadores não têm fundamentação teórica baseada em conhecimentos formais em avaliação, e que muitas situações são reflexos de práticas vivenciadas tanto na educação básica quanto na graduação em Matemática, seja licenciatura ou bacharelado. Essa afirmação é reforçada pelo fato de nenhum dos professores consultados ter tido, em seu processo de formação, acesso a uma disciplina específica que abordasse de forma exclusiva a avaliação da aprendizagem. A formação acadêmica mostra-se deficiente nesse aspecto e reforça ainda mais a questão: como trabalhar os aspectos ligados à avaliação da aprendizagem em matemática com futuros professores se não foram devidamente preparados para tal função?

Dessa forma, a construção desses conhecimentos segue restrita às situações vivenciadas na prática, aos saberes da experiência, uma vez que os cursos de graduação aos quais tiveram acesso não ofereceram o suporte necessário para uma prática consciente e fundamentada teoricamente. Soma-se a essa situação o fato de as instituições às quais estão ligados atualmente não oferecerem oportunidades de estudos e de reflexão que contemplem diretamente a avaliação da aprendizagem nas suas atividades de formação continuada.

Nesse ínterim, são levantadas algumas dificuldades em avaliar a aprendizagem dos alunos na licenciatura, tendo em vista o fato de terem a consciência da complexidade dessa ação e dos seus impactos em práticas futuras, por se tratar do processo de formação de professores. É notória a dificuldade de se desvincular totalmente da prova no seu formato padrão, apesar das diversas tentativas de estabelecer uma prática avaliativa mais voltada para a função formativa, que esteja mais a serviço da aprendizagem dos educandos.

Como se pode observar, em algumas categorias são sinalizados tanto horizontes positivos quanto negativos, isso porque são olhares diferentes sobre o assunto no grupo consultado, de acordo com a identificação feita na análise apresentada.

As concepções e práticas de avaliação da aprendizagem discutidas indicam que muita coisa precisa ser retomada quando se trata de formação docente e especialmente da relação desses professores com a formação de futuros professores de matemática. Em alguns momentos, há o indicativo muito claro de que não há uma cultura de formação direcionada para os princípios de uma avaliação da aprendizagem, e esses professores, ao se depararem com a prática em sala de aula, veem-se reproduzindo, muitas vezes, aquelas práticas que julgam adequadas, sem nenhum embasamento teórico que as fundamente.

NOTA: A autora Antônia Edivaneide de Sousa Gonzaga realizou a estruturação da pesquisa e a produção e edição das análises e do texto. Os autores Raimundo Hélio Leite, Lucas Melgaço da Silva e Wirla Risany Lima Carvalho fizeram a edição e a revisão do artigo.

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Recebido: 05 de Janeiro de 2021; Aceito: 27 de Abril de 2023

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