INTRODUÇÃO
A pesquisa apresentada1 neste artigo teve como objetivo analisar as dinâmicas de participação na condução do monitoramento e avaliação do Plano Municipal de Educação de Macapá (PME/MCP) de 2015-2025. O estudo lançou um olhar sobre o objeto de investigação, delimitando sua análise às relações de participação dos atores envolvidos nos processos de monitoramento do PME/MCP. Além disso, buscou verificar os relatórios de monitoramento, com ênfase nas percepções sobre os resultados alcançados.
O estudo também procurou destacar o planejamento de um sistema educacional, o qual envolve a análise de diversos fatores que impactam o sistema de ensino, visando a identificar desafios e sugerir soluções alternativas. A partir dessa compreensão, levando em consideração os aspectos mensurados pela Constituição de 1988 (art. 214) e pela Lei n. 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases [LDB], art. 9º), é possível estabelecer prioridades, metas e estratégias para desenvolver o sistema educacional, bem como definir formas de participação do governo e da sociedade, além de prever custos para o desenvolvimento do ensino. “O planejamento de um sistema é feito a nível sistêmico, isto é, a nível nacional, estadual e municipal” (Haydt, 2011, p. 71).
Nesse sentido, o planejamento educacional deve ser um mecanismo de articulação que sistematiza os elementos coerentes e eficazes das propostas de um governo democrático. Assim, construir instrumentos que encaminhem a gestão para uma ação democrática é relevante, pois envolve a sociedade na tomada de decisões. A Lei n. 13.005 (2014), que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE), representa um novo direcionamento para a educação brasileira, visto que o documento é constituído por 20 metas e 254 estratégias.
Além disso, na perspectiva de superar a descontinuidade das políticas públicas a cada mudança de administração político-partidária, o PNE 2014-2024 tem duração de dez anos, logo, ultrapassa diferentes gestões de governo. Contudo, o plano representa um grande desafio para os entes federados, os gestores da área educacional e toda a sociedade civil em geral, pois eles necessitam trabalhar de forma articulada e em regime de colaboração para que os planos estaduais, distrital e municipais sejam construídos e implantados de acordo com as metas e estratégias estabelecidas pelo PNE.
O PNE 2014-2024 também destacou a necessidade dos referidos planos passarem por um contínuo processo de monitoramento e avaliação. Esses dois processos são de grande relevância para assegurar a efetividade da política educacional local. Com o intuito de assegurar tal prerrogativa, os planos de educação devem instituir as entidades que assumirão o papel de monitorar e avaliar a política educacional em voga. Estas representam diferentes segmentos da sociedade, como pais, alunos, professores, organizações não governamentais, entre outros. Sua participação assegura a representação plural de interesses e perspectivas na avaliação do PME.
Assim, as atribuições da comissão responsável pelo monitoramento e avaliação envolvem questões como: assegurar a qualidade da educação ao monitorar se as metas estabelecidas no plano estão sendo cumpridas e se as políticas implementadas estão surtindo os efeitos esperados; fiscalizar e questionar as ações da gestão municipal e suas políticas educacionais; acompanhar o andamento das metas estabelecidas pelo PME, permitindo ajustes e correções, caso seja necessário; promover a democracia participativa, possibilitando que diferentes grupos sociais influenciem na política educacional local.
As perspectivas de políticas públicas e as soluções para os desafios da educação brasileira são muitas. Nesse sentido, a elaboração e o acompanhamento dos planos municipais de educação necessitam do envolvimento e comprometimento de todos, pois devem ser elaborados ou adequados ao Plano Nacional de Educação e ao Plano Estadual de Educação. “O plano municipal de educação, quanto à sua abrangência, deve traduzir todas as aspirações dos munícipes” (Bordignon, 2009, p. 100).
O ESTADO DO CONHECIMENTO
Para compreender o objeto de estudo, realizamos um levantamento dos estudos voltados ao processo de monitoramento e avaliação dos planos municipais de educação para entendermos de que forma a temática vem sendo discutida nos trabalhos científicos, tais como teses, dissertações e artigos produzidos pelos meios acadêmicos das universidades brasileiras. Essa etapa nos oportunizará conhecer o campo educacional do país, no que concerne às ações de monitoramento e avaliação do referido documento.
Para isso, utilizamos como fonte de pesquisa a Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) - banco de trabalhos acadêmicos que usa o mecanismo de busca do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT). O sistema on-line da plataforma permite acessar teses e dissertações das universidades brasileiras, e os textos são disponibilizados na íntegra, o que facilita a pesquisa e o acesso aos documentos.
O Catálogo de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) também foi utilizado no processo de pesquisa. Trata-se de um portal on-line oficial do governo brasileiro, vinculado ao Ministério da Educação (MEC), que disponibiliza teses e dissertações brasileiras. É através do portal que os programas de pós-graduação fornecem informações à Capes.
Quanto ao levantamento dos artigos, fizemos uso da plataforma on-line de periódicos Capes, por meio do acesso à Comunidade Acadêmica Federada (CAFe) provida pela Rede Nacional de Ensino e Pesquisas (RNP). Nesse portal é possível ter acesso aos artigos acadêmicos utilizando login e senha da instituição federada.
Para termos acesso aos trabalhos nos bancos citados, usamos os seguintes descritores: “Plano Municipal de Educação”, “Avaliação do PME” e “Monitoramento do PME”. Para o refinamento das buscas nos referidos portais, utilizamos o período de 2014 a 2021 e a área de concentração “Educação e Ciências Humanas”. Obtivemos 43 resultados.
Após a leitura dos resumos desses trabalhos, verificamos que a maioria trata dos planos decenais. De forma geral, os temas das pesquisas têm relação com os processos de monitoramento e avaliação. No entanto, selecionamos somente as produções que tinham como foco de pesquisa a esfera municipal. Dessa forma, escolhemos sete trabalhos, descritos na Tabela 1.
AUTOR | TÍTULO | OBJETO DE ESTUDO |
---|---|---|
Corrêa (2019) | Avaliação e monitoramento dos Planos Municipais de Educação na Região Cone Sul/MS (2015-2017) (dissertação) | A autora analisa os procedimentos e orientações legais do monitoramento e da avaliação em relação aos planos municipais de educação da região Cone Sul do estado de Mato Grosso do Sul. |
Figueredo (2020) |
Conselho Municipal de Educação: Um estudo sobre a participação dos conselheiros na gestão do Plano Municipal de Educação no município de Paço do Lumiar/MA (dissertação) |
Analisa a participação dos conselheiros (representantes) do CME na gestão do Plano Municipal de Educação (PME), considerando os processos de execução, acompanhamento e avaliação no período de 2018-2020. |
Moraes (2015) |
O Plano Municipal de Educação de Benevides-PA: Processo de monitoramento e avaliação (dissertação) |
Apresenta uma análise do Plano Municipal de Educação (PME) de Benevides, sob a ótica do processo de monitoramento e avaliação, como mecanismos indispensáveis à implementação e revisão do plano. |
Cabral et al. (2016) | “Plano Municipal de Educação: elaboração, acompanhamento e avaliação no contexto do PAR” (artigo) |
Os autores discutem o papel dos planos municipais de educação (PMEs) na organização do Sistema Nacional de Educação (SNE). Considera o Plano de Ações Articuladas (PAR) em municípios norte- -rio-grandenses, na dimensão da gestão educacional. |
Raimann (2020) | “Avaliando o plano municipal de educação: Monitoramento e controle social” (artigo) |
Faz uma análise das ações do Conselho Municipal de Educação e da Secretaria Municipal de Educação, considerando o monitoramento e a avaliação do Plano Municipal de Educação (PME), que culminaram na Conferência Municipal de Educação no município de Jataí, em Goiás. |
B. Santos (2020) | Políticas públicas para a educação de jovens e adultos: Uma análise do monitoramento e avaliação do Plano Municipal de Educação do município de Cascavel (2016-2019) (dissertação) | Analisa o monitoramento e avaliação do Plano Municipal de Educação de Cascavel, no que se refere às políticas públicas para a educação de jovens e adultos (EJA) - fase I. |
R. Santos (2020) | A participação social no monitoramento e avaliação dos planos de educação dos municípios da Zona da Mata Mineira (dissertação) | Analisa como vem se delineando a participação dos sujeitos sociais coletivos no monitoramento e avaliação dos planos municipais de educação (PMEs) da mesorregião da Zona da Mata Mineira. |
Fonte: Elaboração das autoras com base nos dados da pesquisa coletados nas plataformas BDTD, Capes e Periódicos Capes.
Os resultados das pesquisas que fundamentaram os trabalhos apontaram que as instâncias hierárquicas dificultam a participação da sociedade nas ações do sistema municipal de ensino, e isso interfere no princípio democrático relacionado às decisões em políticas públicas, especificamente na política educacional. A dissertação de mestrado de Corrêa (2019), por exemplo, enfatiza que no processo de monitoramento e avaliação dos planos municipais de educação os procedimentos e orientações são norteados por instâncias federais que definem os indicadores, parâmetros e instrumentos para todo o percurso, através da Comissão de Apoio Técnico e das orientações da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sase) do MEC.
A autora faz uma crítica ao protagonismo dado à União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e ao Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), pois as tomadas de decisão partem deles, enquanto aos sujeitos da esfera municipal, a serviço de poucos e com tímida participação social, cabe o mero preenchimento de formulários.
O trabalho faz uma abordagem dos conceitos de controle social, monitoramento e avaliação, compreendendo que essas categorias são carregadas de significados com base em diferentes correntes de pensamento; no âmbito da educação, o controle social está voltado para as “relações entre as instâncias do poder público e a comunidade, entretanto é impossível tratar da qualidade de ensino sem relacioná-la à discussão de controle social” (Corrêa, 2019, p. 33).
Figueredo (2020) dialoga com Corrêa (2019) ao destacar os desafios na implantação de uma gestão democrática do PME; além disso, reflete sobre o papel dos conselhos municipais de educação (CME) enquanto órgãos de Estado e mecanismos de participação no processo de democratização do ensino municipal, constatando que a participação dos CMEs é limitada, pois sua organização, estrutura e financeiro dependem, em muitos casos, da Secretaria Municipal de Educação (Semed). A autora defende que a participação “é condição imprescindível para que processos democráticos, o controle social e as mudanças necessárias à educação e à sociedade aconteçam” (Figueredo, 2020, p. 56).
Moraes (2015), por sua vez, traz uma reflexão sobre a importância de elaborar mecanismos avaliativos que conduzam ao fortalecimento da prática do planejamento em educação, levando em consideração uma concepção de desenvolvimento de políticas que visem ao combate das desigualdades educacionais para os que vivem à margem da sociedade.
A pesquisa de Moraes constata a importância de adotar uma posição comprometida com a perspectiva do monitoramento e avaliação do PME, tais elementos estão relacionados com o planejamento da política pública.
No artigo de Cabral et al. (2016), os autores fazem uma abordagem sobre o papel dos PMEs na organização do Sistema Nacional de Educação (SNE), e levam em consideração o Plano de Ações Articuladas (PAR) em municípios norte-rio- -grandenses na dimensão da gestão educacional. Ao verificar a atuação do PAR na organização do PME, o texto alerta sobre uma forte centralização das políticas sob a égide do governo federal, enfraquecendo, desse modo, as ações dos municípios na construção e idealização de suas políticas educacionais. As imposições da instância federal interferem na administração municipal, minimizando “os mecanismos de gestão democrática, como a autonomia e a participação” (Cabral et al., 2016, p. 62).
Raimann (2020), ao fazer uma análise das ações do Conselho Municipal de Educação e da Semed, considerando o monitoramento e a avaliação do PME, observou que as categorias de monitoramento e controle social podem ser entendidas na perspectiva de duas concepções, a primeira como forma de controle estatal ou gerencialista e a segunda como efetiva forma de participação social nas tomadas de decisão no que a população anseia como bem social.
A autora observa que na democracia liberal, ao problematizar as categorias de monitoramento e controle social no movimento dialético, há um conflito entre dois projetos educacionais: de um lado, o ensino é voltado para o mercado de trabalho e, do outro, para a formação humana plena. No que concerne ao PME, na visão do estado gerencial, o seu processo de implementação e avaliação apresenta um discurso democrático, porém, em sua essência, tem como foco a responsabilização dos sujeitos envolvidos. Já no controle social, o envolvimento da sociedade no processo de monitoramento e avaliação do PME é o fator principal e “almeja uma qualidade socialmente referenciada” (Raimann, 2020, p. 822).
Em análise sobre o monitoramento e avaliação do PME de Cascavel, no que se refere às políticas públicas para a educação de jovens e adultos (EJA), fase I, B. Santos (2020) observou que os documentos resultantes do monitoramento e avaliação não são informados às demais secretarias, universidades com cursos de licenciatura e pedagogia, ou seja, os documentos circulam internamente na própria Semed, são publicados no portal do município e no portal do MEC e encaminhados ao Poder Legislativo como cumprimento de prerrogativas legais.
A pesquisa concluiu que os documentos estudados visam apenas a cumprir as metas sem levar em consideração estudos, análises e parcerias entre outras instituições. A autora critica a falta de diálogo entre a comunidade e a gestão municipal. O estudo sugere que haja documentos condensados sobre processo de monitoramento e avaliação do PME, apresentando possíveis causas e soluções, bem como espaço para a participação dos diversos segmentos sociais nas ações do ensino municipal.
Para concluir este quadro teórico, citamos R. Santos (2020), que analisou como vem se delineando a participação dos sujeitos sociais coletivos no monitoramento e avaliação dos PMEs da mesorregião da Zona da Mata Mineira. A pesquisa constatou que poucos relatórios descreveram como ocorreu a participação da sociedade civil no processo de monitoramento e avaliação dos PMEs. Com base nisso, as comissões coordenadoras têm desenvolvido apenas o cumprimento de uma exigência legal. A dissertação reflete sobre a necessidade de compreender o contexto local em relação às transformações estruturais na organização do Estado brasileiro, bem como fortalecer a participação da sociedade nas decisões políticas.
Percebemos através das leituras dos estudos mencionados, que tratam dos processos de monitoramento e avaliação dos PMEs, a importância da participação social nas ações e articulações das políticas educacionais. No que tange à participação social, é fundamental ampliarmos as discussões acerca de processos que garantam a participação da sociedade nas tomadas de decisões políticas. Nesse sentido, o presente estudo visa a compreender como ocorreram as dinâmicas de participação das entidades instituídas para a condução dos processos de monitoramento e avaliação do Plano Municipal de Educação de Macapá no período de 2017 a 2019, levando em conta o grau de participação dos envolvidos nessas ações. É importante considerar que estes são representantes da sociedade civil e têm como atribuição promover o envolvimento da sociedade nos referidos processos para garantir a efetividade da política educacional local.
TRILHAS METODOLÓGICAS
Para atender ao objetivo do estudo, tendo em vista identificar as dinâmicas de participação das entidades instituídas na condução do monitoramento do Plano Municipal de Educação de Macapá (2015-2025), bem como verificar os relatórios de monitoramento, com ênfase nas percepções sobre os resultados alcançados, optamos por realizar uma abordagem qualitativa do objeto de estudo. Sendo que este é intrinsecamente ligado às relações, às representações e às intencionalidades e “dificilmente pode ser trazido em números e indicadores quantitativos” (Minayo, 2001, p. 21).
O locus da nossa pesquisa foi a Semed de Macapá, situada na cidade de Macapá, capital do estado do Amapá. A cidade de Macapá ocupa uma extensão territorial de 6.563,849 km2, com população estimada em 512.902 pessoas (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2020). Atualmente, no cenário educacional, o município de Macapá conta com 275 escolas da rede pública de ensino, entre as quais 90 pertencem à rede municipal de ensino e 184 à rede estadual de educação. Das 90 escolas pertencentes à rede pública municipal, 25 estão localizadas na zona rural e 27 oferecem exclusivamente o ensino infantil. As demais ofertam ensino infantil e ensino fundamental concomitantemente.
De acordo com o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb),2 em 2019 o município conseguiu melhorar seu índice (alcançando a nota 5,0) em relação à edição anterior, de 2017 (quando atingiu 4,6). Apesar de não conseguir atingir a meta, que era 5,4, o município de Macapá obteve a melhor nota em comparação com outros municípios do estado do Amapá. Segundo os dados do MEC, disponíveis no site do PNE,3 os 16 municípios do estado do Amapá já possuem planos de educação de 2014-2014 sancionados. Todos os referidos municípios aderiram à assistência técnica da Sase/MEC.
Quanto aos instrumentos de pesquisa, foram subsidiados pela pesquisa documental, sendo que o foco da análise foram os documentos oficiais produzidos a partir dos processos de monitoramento e avaliação do PME de Macapá (2017-2019), bem como documentos que o MEC disponibilizou para orientar os municípios na promoção de um processo democrático e participativo.
Para compreender a dinâmica de participação das entidades instituídas na condução dos processos de monitoramento e avaliação do PME de Macapá e identificar nos relatórios de monitoramento padrões, sucessos e desafios, utilizamos como técnica de análise de dados a análise de conteúdo. Para isso, elegemos as seguintes categorias de análise: gestão democrática, participação e controle social.
Segundo Rosenthal (2014), a análise qualitativa de conteúdo tem como propósito construir um sistema de categorias que subsidie a reorganização do texto, colocando segmentos do material em categorias de maneira que o texto seja organizado em unidades, para então ser trabalhado.
Independente de as categorias terem sido desenvolvidas antes da análise ou a partir do corpus do texto disponível, os segmentos do texto são destacados do contexto de seu surgimento e submetidos em estruturas de sentido construídas pelo pesquisador, e isso antes da reconstrução de forma integral do material. Nesse processo, o texto não chega a ser reconstruído em sua estrutura sequencial, mas antes, reorganizado. Assim, parte-se do princípio de uma maior ou menor equivalência entre significado das categorias utilizadas por quem analisa o conteúdo. (Rosenthal, 2014, pp. 255-256).
A partir dessa perspectiva, na fase da conclusão, verificamos os dados da pesquisa, avaliamos o significado dos dados, harmonia, categorias e explicações, observando se as conclusões obtidas dos dados são corretas e apresentam defesas e garantias. Nesse sentido, as respectivas análises do material documentado possibilitaram maior clareza e organização na conclusão do estudo.
PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE MACAPÁ: ANÁLISE DOS RELATÓRIOS DE MONITORAMENTO (2017-2019)
O PNE 2014-2024, instituído pela Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014, difere dos planos anteriores por ser um plano decenal, ultrapassando governos. O referido plano estabeleceu o cumprimento de 20 metas, a partir de suas 254 estratégias, o que o torna um desafio para os estados, Distrito Federal e municípios, tendo em vista que ele determinou que os entes federados adequassem ou elaborassem seus planos em conformidade com o Plano Nacional, conferindo um prazo de até um ano após a data de sua publicação. Conforme a mencionada lei:
Art. 8º Os estados, o Distrito Federal e os municípios deverão elaborar seus correspondentes planos de educação, ou adequar os planos já aprovados em lei, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas neste PNE, no prazo de um ano contado da publicação desta lei. (Lei n. 13.005, 2014, p. 4).
No caso do município de Macapá, o PME foi aprovado no dia 22 de junho de 2015, por meio da Lei Municipal n. 2178/2015, em conformidade com o prazo exigido pelo PNE 2014-2024, que era até 24 de junho de 2015. As discussões acerca do processo de elaboração do PME de Macapá iniciaram-se no mês de janeiro de 2015, período em que a gestão do município, através da Secretaria Municipal de Educação da Prefeitura Municipal de Macapá (Semed/PMM), convidou as seguintes representações sociais para participarem do processo de elaboração do PME: Secretaria Municipal de Assistência Social e do Trabalho (Semast/PMM); Coordenaria Municipal de Mobilidade e Acessibilidade Urbana (CMMAU/PMM); Conselho Tutelar Norte; Polícia Militar do Amapá; Fundação Municipal de Cultura de Macapá (Fumcult/PPM); Fundo Nacional da Juventude (Funjovem/LGBT); Sindicato dos Servidores Públicos Federais Civis no Estado do Amapá (Sindsep); Associação de Amigos do Autista (AMA/AP); Centro de Apoio Operacional às Promotorias da Infância, Juventude e Educação (CAOP-IJE); Ministério Público do Amapá; Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (Mieib); Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai/AP); Coordenadoria Municipal de Esporte e Lazer (Comel/PMM); Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq/AP); Sindicato dos Servidores Públicos em Educação no Amapá (Sinsepeap); Conselho de Alimentação Escolar (CAE/AP); Conselho Estadual de Educação (CEE/AP); Serviço Social do Comércio (Sesc/AP); Instituto Municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Improir/PMM); Conselho Tutelar Sul; Universidade Federal do Amapá (Unifap); Grupo das Homossexuais Thildes do Amapá (Ghata); Rede das Associações das Escolas Famílias do Amapá (Raefap); Comissão do Plano de Carreiras da Educação (CGPC/PMM); Central Única dos Trabalhadores (CUT); Fórum Municipal de Educação (FME); Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Idosa (CEDPI/AP); Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae/AP); Movimento Afrodescendente do Amapá (Mocambo); Conselho do Fundeb/PMM; e Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semam/PMM).
Segundo o primeiro relatório de monitoramento do PME de Macapá (2015- -2017), o processo de elaboração teve apoio de uma equipe técnica da Semed/PMM. Porém, é importante destacar que não foi encontrada nos documentos analisados qualquer referência a um ato legal para a instituição tanto da comissão coordenadora quanto da equipe técnica de elaboração do plano. Além disso, não há menção ao número de representantes das instituições na composição da comissão coordenadora e da equipe técnica.
Além da elaboração dos planos decenais, o PNE estabeleceu a necessidade de os planos passarem por um periódico processo de monitoramento e avaliação, considerando que as políticas públicas precisam passar por um percurso contínuo e não linear de avaliação a partir de sua elaboração. Nessa perspectiva, os planos municipais de educação devem conceber instrumentos que orientem as práticas educativas no município e deem subsídios à realização das avaliações sobre o andamento das ações e ao estabelecimento de políticas públicas para a educação.
Para alcançar as metas municipais, estaduais e nacional, constantes no PNE, será preciso, para além do já bem-sucedido esforço colaborativo para construção dos planos de educação, a definição e a implantação de sistemáticas próprias e, ao mesmo tempo, articuladas para o monitoramento e a avaliação permanente dos respectivos planos, tendo em vista corrigir rumos e buscar novas estratégias e meios para o alcance das metas estabelecidas. (Oliveira et al., 2016, pp. 13-14).
Nessa direção, Oliveira et al. (2016) assinalam que os processos de monitoramento e avaliação são mecanismos importantes para a execução dos planos, porém, além das instâncias e das ações previstas, é necessária a implementação de sistemáticas que levem em consideração a relevância de ações articuladas entre os sistemas de ensino no contexto da institucionalização e efetividade do SNE. Para esse intento, os principais responsáveis pela elaboração, implantação e acompanhamento do plano precisam ter clareza do seu papel nesses processos, tendo em vista que a tomada de decisão, a revisão de estratégias e os caminhos a seguir devem visar ao alcance das metas previstas.
O monitoramento contínuo das metas e estratégias do plano é de suma importância, pois através desse processo é possível verificar se as metas estão sendo atingidas e se as estratégias estão realmente contribuindo para tal ação, assegurando a transparência e controle social do plano, ou seja, é uma maneira de informar a sociedade acerca do andamento da política educacional. Conforme análise dos relatórios obtidos, a equipe técnica realizou o monitoramento das metas e estratégias do PME/MCP 2015-2025 no período de 2015 a 2019, resultando em dois relatórios bienais: primeiro biênio de 2015-2017 e segundo biênio de 2017-2019.
O primeiro relatório de monitoramento do PME foi elaborado em 2017, o qual apresentou os dados obtidos em relação às 20 metas e 276 estratégias do PME, no período de 2015 a 2017. Contudo, antes de adentrarmos os resultados dessa investigação, é importante compreendermos o momento em que o plano começou a ser monitorado.
No ano de 2016, a aprovação da Emenda Constitucional n. 95 mudou o cenário econômico, pois previu a redução de gastos públicos e estimulou as parcerias público-privadas, diminuindo a atuação do Estado na promoção de melhorias em setores como saúde, educação e outras áreas sociais. A emenda determinou o congelamento de investimento nas áreas sociais até 2036, tendo como justificava a economia de gastos públicos.
No âmbito educacional, a medida contrapôs o que a Constituição Federal de 1988 determinou para a aplicação de recursos destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, com o percentual de 18% da receita de impostos da União e 25% da receita de impostos e transferências para estados e municípios.
Diante desse cenário, a aprovação da emenda também comprometeu a execução do PNE, pois o plano previu que em 2019 os investimentos em educação deveriam atingir o índice de 7% do produto interno bruto (PIB), e no ano de 2024 esse índice seria elevado a 10%. Sem a previsão de tais recursos, tanto o governo federal quanto os entes federados não puderam executar metas que dependiam de financiamento/investimentos para o desenvolvimento da educação nacional.
Apesar do contexto, o primeiro ciclo de monitoramento do PME/MCP foi realizado, e a equipe técnica, em conjunto com a Semed, conseguiu monitorar 11 das 20 metas e 71 das 276 estratégias. As 11 metas monitoradas foram: 1, 2, 4, 5, 7, 8, 9, 10, 11, 17 e 19.
A Meta 1, que versa sobre a educação infantil, tem 31 estratégias, e, destas, 8 foram monitoradas, sendo que 3 foram executadas e 5 estavam andamento. Na Meta 2, que dispõe sobre o ensino fundamental, foram monitoradas 5 das 19 estratégias, tendo em vista que 1 foi executada e 4 estavam em andamento. Acerca da educação especial, de que dispõe a Meta 4, foram monitoradas 16 estratégias das 31, das quais 4 foram executadas e 12 estavam em andamento. No que concerne à Meta 5, sobre a alfabetização na idade certa, das 10 estratégias, 7 foram monitoradas, sendo que, destas, todas estavam em andamento.
No que tange à Meta 7 que trata da qualidade da educação, apresentam-se 41 estratégias e, destas, 8 foram monitoradas, e todas estavam em andamento. Já a Meta 8, que versa sobre a elevação do nível de escolaridade média, conta com apenas 5 estratégias, sendo possível monitorá-las em sua totalidade, e elas estavam em andamento. A Meta 9 dispõe sobre a educação de jovens e adultos e tem 14 estratégias; destas, 2 foram monitoradas, e ambas estavam em andamento. No caso da Meta 10, que trata da educação de jovens e adultos integrada à educação profissional, das 12 estratégias, 2 foram monitoradas, e ambas também estavam em andamento. Quanto à Meta 11, que trata da educação profissional técnica de nível médio, das 10 estratégias, somente 1 foi monitorada e encontrava-se em andamento. No que concerne à formação continuada e pós-graduação, sobre a qual trata a Meta 17, das 7 estratégias, todas foram monitoradas e estavam em andamento. A última meta apresentada no relatório foi a 19, que dispõe sobre a gestão democrática nas escolas; desta, todas as 10 estratégias foram monitoradas e encontravam-se em andamento.
O primeiro relatório destacou que algumas metas não puderam ser acompanhadas, pois suas estratégias não tiveram condições de serem executadas. Isso está ligado a questões como ausência de planejamento e previsão de recursos financeiros e pedagógicos, elementos sem os quais fica difícil implementar o plano. Demonstrando, portanto, falta de compromisso com o próprio plano.
Como foi ressaltado, o orçamento público não priorizou a educação; quando o PNE e o PME de Macapá foram construídos, o cenário econômico era outro. Diante da falta de recursos para a execução dos planos, as estratégias ficaram comprometidas, o que dificultou o alcance das metas. Essa condição mostra que o debate do ciclo de políticas do planejamento não teve relação com a realidade do município de Macapá. Acerca desse contexto, o primeiro relatório do PME de Macapá destaca o seguinte:
É importante frisar, que vivemos um novo cenário político e econômico, diferente daquele, onde foi elaborado o Plano Nacional de Educação e o Plano Municipal de Educação. Esse novo cenário tem comprometido a execução de algumas metas, em especial aquelas financiadas ou em parceria com o Governo Federal, a exemplo da estratégia 1.23 que trata da construção e ampliação das escolas de educação infantil. (Secretaria Municipal de Educação de Macapá [Semed], 2018, p. 149).
Sobre esse aspecto, conforme informações do segundo relatório de monitoramento, no ano de 2019, para atender à estratégia 1.23, assegurando a construção de reformas de escolas urbanas e rurais, “a Prefeitura Municipal de Macapá utilizou recursos do tesouro municipal para a construção e reforma das escolas de educação infantil, creches e pré-escolas” (Semed, 2020, p. 32).
Além das limitações orçamentárias, cabe destacar também a condução do acompanhamento do PME/MCP, sendo este realizado por apenas uma instância, no caso a Semed. A referida instância somou esforços com a equipe técnica para que o monitoramento fosse efetivado: “o Plano Municipal de Educação de Macapá vem sendo efetivado, por meio da Semed/PMM e unidades escolas, que somam esforços para executar as Metas e estratégias direcionadas a melhoria da Educação Básica” (Semed, 2018, p. 149).
No que tange à lei do PME, segundo seu art. 8, o plano deverá ser um instrumento de acompanhamento contínuo e de avaliação periódica. Para tanto, cinco instâncias foram definidas para o processo de acompanhamento: Secretaria Municipal de Educação (Semed), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime/AP), o Conselho Municipal de Educação de Macapá, o Fórum Municipal de Educação de Macapá (FME) e a Câmara Municipal de Macapá. Contudo, o monitoramento não envolveu a participação de todas as instâncias, tal como definida na lei. O papel dessas instituições, conforme reforça o inciso primeiro do referido artigo, é “assegurar a implementação das Estratégias e o cumprimento das Metas do PME” (Lei n. 2.178, 2015, p. 3).
Através das leituras do relatório do primeiro ciclo de monitoramento do PME/ MCP, são perceptíveis as dificuldades que a equipe de acompanhamento encontrou para a realização do processo; tendo em vista que o processo de monitoramento envolveu a equipe técnica e a Semed (ambas representantes do Poder Executivo municipal), a falta de envolvimento das demais instâncias resultou em um processo com tomada de decisões unilaterais.
Dado o contexto, a defesa de um monitoramento mais participativo é pertinente, pois, quando envolve a participação de diferentes atores sociais, o plano tem mais chances de alcançar as metas previstas para o decênio. No caso do primeiro ciclo de monitoramento, a falta de envolvimento das demais instâncias refletiu nos resultados, sendo que, das 20 metas estabelecidas pelo PME/MCP, só 11 foram monitoradas.
Quando o processo de monitoramento de uma política educacional, como é o caso do PME, inclui representantes de diferentes segmentos sociais, estes podem apontar as lacunas, as limitações e as contradições que o plano apresenta e o impedem de ser efetivado, bem como encontrar possíveis alternativas para os problemas identificados, pois conhecem a realidade local e as demandas educacionais da comunidade. Outro fator é o compartilhamento de responsabilidades, tornando o processo menos sobrecarregado.
O segundo relatório bienal de monitoramento das metas e estratégias do PME, que compreende o período de 2017 a 2019, foi elaborado pela equipe técnica instituída por meio da Portaria n. 0319, de 10 de julho de 2019, a qual contou com 25 membros. Assim, o segundo relatório monitorou, além das metas e estratégias anteriores, três novas metas: 15, 16 e 18.
O contexto em que se insere esse segundo período de monitoramento é marcado pela desarticulação da Sase em 2019, por meio do Decreto n. 9.665, no governo de Jair Messias Bolsonaro. Tal medida desestruturou as dinâmicas de monitoramento dos entes federados, pois a secretaria dava assistência e suporte técnico ao processo de acompanhamento dos planos decenais de estados e municípios. A ausência de um órgão responsável por contribuir com a articulação entre os sistemas de ensino, que era a finalidade da Sase, comprometeu a efetivação das metas e estratégias dos planos decenais de estados e municípios, e estes ficaram sem direção na continuidade do monitoramento.
Apesar do contexto, o processo de monitoramento foi realizado. Observe a Figura 1.
Conforme a Figura 1, durante os dois biênios de monitoramento, seis metas não foram monitoradas, no caso: Meta 3 (ensino médio), Meta 6 (educação em tempo integral), Meta 12 (educação superior), Meta 13 (titulação de professores da educação da educação superior), Meta 14 (qualidade da educação superior) e Meta 20 (financiamento da educação).
No tocante à Meta 3, é importante destacar o desafio que o município assumiu quando estabeleceu elevar a taxa líquida de matrículas no ensino médio para o percentual de 100% até o final do período de vigência do plano. Em comparação com o PNE 2014-2014, o percentual estabelecido em sua Meta 3 é menor, isto é, prevê elevar a taxa líquida de matrículas para a referida modalidade de ensino em 85%.
Outro fator que inviabilizou o cumprimento dessa meta foi o fato de a modalidade de ensino não depender da esfera municipal, salvo o firmamento de parcerias com as Escolas Famílias Agrícolas. A esse respeito, a Lei Orgânica do Município de Macapá, no que se refere à educação, destaca o seguinte:
Art. 319. O Município não manterá escolas de Ensino Médio até que estejam atendidas todas as crianças de idade até catorze (14) anos, bem como, não manterá nem subvencionará estabelecimentos de ensino superior, salvo firmar convênios e/ou parcerias com as Escolas Famílias Agrícolas que trabalham com a pedagogia de alternância, instaladas no Município de Macapá. (Lei n. 2.178, 2015, p. 145).
O segundo relatório de monitoramento do PME/MCP reforça essa prerrogativa ao afirmar que “a meta do Ensino Médio não estar sendo monitorada, devido a rede municipal não atender esse segmento de ensino” (Semed, 2020, p. 232). Ficam claras as contradições entre a meta que o plano previu e a sua inviabilidade de execução, ou seja, a meta extrapola os limites da rede municipal de ensino.
Em relação às metas 12, 13, 14 e 20, o referido relatório justifica que o monitoramento não foi realizado pois não houve firmamento de parcerias (conforme se define em seus objetivos) com o governo federal através do MEC, com as universidades públicas do Amapá e com o governo estadual. O documento considera importante verificar tais prerrogativas, tendo em vista o alcance das referidas metas, uma vez que “uma ação, muitas vezes, foge da esfera administrativa e da gestão do Município, o que compromete a sua execução” (Semed, 2020, p. 229). Em relação à Meta 6, o relatório não cita o motivo que impediu o seu monitoramento.
Quanto às metas 8, 9, 10 e 11, conforme assinala o relatório, estas merecem uma atenção maior nos próximos anos, pois, apesar de terem sido monitoradas, não atingiram os objetivos básicos, como a profissionalização dos jovens e adultos. As metas esbarraram no quesito financeiro para a promoção de programas voltados para a educação de jovens e adultos. Dessa forma, o documento sugere a “adoção de políticas educacionais municipais, de modo a qualificar o discente para o mundo do trabalho” (Semed, 2020, p. 228).
Assim como no primeiro relatório, o segundo relatório reafirma que o PME vem sendo efetivado através da Semed/PMM para atingir as metas previstas no referido plano: “o Plano Municipal de Educação de Macapá vem sendo efetivado, por meio da Semed/PMM e as unidades escolares, que somam esforços para cumprir os objetivos propostos” (Semed, 2020, p. 228). Esse posicionamento evidencia a ausência das demais instâncias nos dois ciclos de monitoramento.
O monitoramento é um mecanismo importante, pois possibilita rever estratégias que não avançam e não contribuem com o alcance da meta. Para tanto, quando o processo se torna mais participativo, as responsabilidades do trabalho são compartilhadas, e isso favorece um processo mais democrático e contribui com o aperfeiçoamento da política. Centralizar o processo dificulta ainda mais o desafio que é o cumprimento das metas estabelecidas no PME/MCP.
Portanto, o papel das instâncias de monitoramento é fundamental para aproximar a sociedade acerca do debate público em torno do plano, bem como promover espaços de estudos e discussões. Pois não basta só informar os resultados do monitoramento, o trabalho vai além: a população precisa conhecer a política em questão e os rumos da educação municipal para que sua atuação no debate político ocorra de maneira mais qualificada, contribuindo com o aperfeiçoamento do plano.
Conforme o documento A construção e a revisão participativas dos planos de educação (2013), por meio da comparação dos diagnósticos da situação da educação do município no começo do processo e na avaliação, é possível acompanhar as metas para verificar se estas alcançaram os objetivos propostos ou não, possibilitando corrigir as estratégias que não tiveram êxito:
Para garantir que as metas sejam cumpridas é fundamental que o Plano seja constantemente avaliado. Deve-se verificar quais metas foram alcançadas, quais não o foram e os motivos por não terem sido alcançadas, visando aprimorar as estratégias de implementação do Plano. (A construção e a revisão participativas…, 2013, p. 40).
No caso do PME/MCP, conforme a agenda de trabalho de 2018 da coordenação do plano, só consta uma reunião para apresentação do relatório à equipe de avaliação, realizada em junho desse ano. Na apresentação do primeiro relatório, destaca o seguinte:
O presente documento é fruto da avaliação técnica realizada em torno do Plano Municipal de Educação de Macapá (PME), aprovado pela Lei Municipal nº 2.178/2015/PMM. Tais avaliações foram coordenadas pela Secretária Municipal de Educação, que por meio de uma Comissão Técnica, monitorou às 20 metas e as 267 estratégias o que possibilitou desenhar o presente Relatório Bienal. (Semed, 2018, p. 8).
O processo de avaliação também consiste em informar a sociedade sobre os resultados do acompanhamento do plano. Esse momento possibilita que todos sejam informados sobre o andamento das metas, além de poder participar dos debates, apontando as lacunas e limitações do plano com o objetivo de trazer soluções coerentes para atender à demanda educacional local. Para tanto, o PME/MCP 20152025 deixou a cargo das instâncias de monitoramento e avaliação a ampla divulgação dos resultados do seu monitoramento e avaliação.
Os resultados do acompanhamento das metas e das avaliações do PME/MCP foram apresentados somente em dois momentos. O primeiro ocorreu no início do decênio, em 2016, através de um seminário e uma audiência pública, ambos intitulados Planos de Educação: avanços, desafios e cumprimento de metas; os dois eventos foram promovidos pelo Ministério Público do Estado do Amapá, através do seu Centro de Apoio Operacional da Infância, Juventude e Educação (Caopije). O segundo momento ocorreu por meio da IV Conferência Municipal de Educação de Macapá (Comed), em 2022, evento promovido pela coordenação e mobilização do FME-MCP com o apoio da Semed/PMM.
AS DINÂMICAS DE PARTICIPAÇÃO NA CONDUÇÃO DO MONITORAMENTO: O QUE FOI EFETIVADO?
A gestão da educação não deve ser apenas responsabilidade do Estado, ao contrário, sua organização e planejamento devem envolver toda a sociedade. Fundamentada no princípio constitucional da gestão democrática, a educação deve propor políticas públicas que incentivem o diálogo entre o Estado e os cidadãos. No entanto, implementar uma gestão verdadeiramente democrática ainda é um desafio, dada a história de governos autoritários no Brasil, que deixaram uma administração pública elitista, limitando a participação popular nas decisões políticas.
Conforme o documento A construção e a revisão participativas dos planos de educação (2013), em muitos casos, a participação apresenta uma perspectiva que compromete seu sentido mais amplo, pois a participação passa a ser entendida como uma concessão do poder, e não um direito dos cidadãos. Tal perspectiva dificulta a intervenção de mudança da realidade social, tendo em vista que só com a efetiva participação de todos é possível assegurar os princípios da igualdade, da autonomia e do respeito às diferenças.
Em relação à Meta 19 do PME/MCP 2015-2025, o sentido da gestão democrática ficou restrito ao âmbito escolar, divergindo do PNE 2014-2014, que determina a gestão democrática da educação, ou seja, efetivá-la em todos os aspectos educacionais, tais como o planejamento e a organização das políticas educacionais. Vejamos o que diz a Meta 19 do PME/MCP 2015-2025:
Meta 19 - Assegurar, até o final da vigência do PME, condições para a plena efetivação da gestão democrática nas Escolas Municipais, inclusive com eleição direta para a equipe gestora, usufruindo tanto de recursos financeiros quanto de apoio técnico disponibilizado pela União. (Lei n. 2.178, 2015, p. 37).
Em contrapartida, o art. 10 da mesma lei atribui ao município a aprovação de uma lei específica para que seu sistema de ensino adote a gestão democrática da educação pública e, para tanto, estabeleceu o prazo máximo de três meses a partir da data de publicação do PME/MCP 2015-2025, ou seja, são perceptíveis incoerências na própria lei.
No sentido de favorecer uma gestão democrática em educação mais atuante na execução do plano municipal de educação, é fundamental que este evidencie uma política educacional pautada na transparência, na publicidade dos resultados do monitoramento e da avaliação do plano e na abertura para o diálogo com a sociedade, com vistas à transformação da educação local.
Apesar de a gestão democrática se constituir em princípio constitucional e estar explícita na legislação educacional do país, fruto da conquista social, efetivá-la é um grande desafio para um país marcado por uma história de cultura autoritárias, aonde a noção de que todos e todas têm direito ainda encontra-se em pleno processo de construção. Um processo em nada linear: com avanços, com retrocessos, com permanências e estranhas simultaneidades onde a conquista efetivada para alguns convive com a violação mais anacrônica de direitos para outros. (A construção e a revisão participativas…, 2013, p. 47).
O documento A construção e a revisão participativas dos planos de educação (2013) defende a ruptura dessa tradição autoritária, marcada por desigualdades, discriminações e hierarquias sociais. Para isso, o Estado precisa atuar na defesa de direitos e superação de injustiças sociais, medos, resistências, concentração de poder, fortalecendo a cidadania e o bem do coletivo. Contudo, alertam:
Concretizar a gestão democrática em educação como um processo permanente representa um grande passo nesse sentido. Concretizá-la como algo sistêmico, que articule as mudanças de relações de poder no cotidiano e nas instituições rumo à efetivação do “quadrado” (composto por processos participativos periódicos, instâncias de controle social, Planos de Estado e fortalecimento da sociedade civil) constitui um grande desafio. (A construção e a revisão participativas …, 2013, p. 48).
Esse desafio pode ser superado através do estímulo à participação da sociedade nos processos de elaboração e acompanhamento dos planos decenais de educação; por meio de tais ações é possível oportunizar a efetivação da gestão democrática nos sistemas de ensino. Isso só é possível quando a lógica de participação nos processos citados não for entendida como um obstáculo para a gestão que está à frente da pasta educacional. Por isso, é importante que o Estado promova mudanças em suas ações políticas que deem condições para “impulsionar, apoiar e sustentar processos participativos, como parte da institucionalidade, que impactem a tomada de decisão da política pública” (A construção e a revisão participativas…, 2013, p. 48).
De acordo com os dados apresentados acerca dos processos de monitoramento e avaliação do PME/MCP 2015-2025, observa-se que houve pouco espaço para o diálogo com as instâncias participativas, as quais são responsáveis por compartilhar informações dos resultados dos processos com a sociedade, buscando mudanças efetivas para o alcance das metas. Acerca desse posicionamento, classificam-no como uma participação burocrática:
A partir dessa noção, realiza-se e cumpre-se os rituais participativos de forma burocrática, “como exige a lei”, sem sentido político ou consequência prática na tomada de decisões. A abertura é mínima para dialogar com os resultados dos processos e incorporá-los no diagnóstico ou traduzi-los em mudanças políticas públicas. Também não há compromisso com a continuidade e nem com a articulação de tais processos com o fortalecimento de instâncias participativas. (A construção e a revisão participativas…, 2013, p. 47).
Em relação à periodicidade dos processos participativos, como evidenciamos, houve apenas dois momentos em que a comunidade pôde ter acesso às informações do monitoramento e avaliação das metas do PME, no caso, a audiência pública (2016) e a Conferência Municipal de Educação (2022). O plano está chegando ao fim da década e pouco foi feito para que a sociedade macapaense fosse estimulada a conhecer, debater e acompanhar o PME.
Como vimos, das instâncias de controle social descritas no PME/MCP 2015-2025 para o seu acompanhamento contínuo e avaliação periódica, apenas a Semed/PMM teve espaço para participar de tais processos; quanto às demais, como Undime/AP, o Conselho Municipal de Educação de Macapá (CMEM), o FME e a Câmara Municipal de Macapá, sua participação não foi evidenciada nos documentos levantados.
É possível destacar as incoerências entre o que foi pensado e o que está sendo realizado; o próprio plano, em seu art. 4, inciso 3º, destaca que “o sistema de ensino do Município criará mecanismos para o acompanhamento local da consecução das Metas do PME” (Lei n. 2.178, 2015, p. 2). Contudo, isso não vem ocorrendo, e, além disso, até o momento as instâncias não foram instituídas por ato legal, o que as distanciou ainda mais dos processos. O mesmo artigo da referida lei, em seu inciso 1º, destaca como papel do gestor municipal adotar as medidas necessárias ao alcance das metas previstas no PME. Ou seja, cabe ao gestor disciplinar a gestão democrática para uma participação mais atuante das instâncias descritas na lei.
À GUISA DE CONCLUSÃO
Observamos que, apesar de alguns avanços educacionais, o Brasil ainda enfrenta grandes desafios para estabelecer uma educação de qualidade e efetivamente democrática. Pois, enquanto o Estado ainda tentar se eximir da responsabilidade total do ensino público e gratuito, reduzindo investimentos na educação e compartilhando esses serviços com entidades privadas, o ensino continuará sendo permeado por ideologias neoliberais e mercadológicas, centrando ações na produção do capital.
No que tange ao planejamento educacional, a Lei n. 13.005 (2014), que aprova o PNE, representa uma conquista para a educação brasileira, visto que evidencia uma tomada de consciência política sobre a importância da educação para o desenvolvimento do país. Entretanto, a referida lei lançou um grande desafio aos entes federados, pois precisam atuar em consonância e em regime de colaboração para que os planos estaduais, distrital e municipais sejam construídos e implantados de acordo com as metas e estratégias estabelecidas pelo PNE. Além disso, a lei do PNE determinou um prazo de um ano a partir da data de sua publicação para que cada ente federado elaborasse/adequasse seu plano de educação em conformidade com o nacional.
Além disso, considerando que as políticas públicas precisam passar por um percurso contínuo e não linear de avaliação a partir de sua elaboração, o PNE determinou a necessidade de os planos passarem por um periódico processo de monitoramento e avaliação. Sobre esse aspecto, observamos que os estudos de avaliação de programas sociais, bem como propostas de diagnósticos para intervenções e sistemas de indicadores de monitoramento, são importantes mecanismos que contribuem com as ações dos gestores públicos, pois por meio de tais etapas é possível entender se a implementação da política pública atende a determinada demanda social, dando a possibilidade de rever a continuidade ou mudança da proposta de intervenção.
O acompanhamento dos planos de educação também é uma forma de controle social, o qual fortalece a gestão democrática da educação. Tanto a elaboração quanto o monitoramento e avaliação dos planos de educação são processos que necessitam ser realizados com a participação da sociedade. Para tanto, os gestores precisam elaborar estratégias que promovam espaços de diálogos e debates acerca dos planos para que a sociedade compreenda a importância desse documento e passe a acompanhar a implementação de suas metas, bem como sugerir e opinar sobre estratégias que não lograram êxito na execução de determinada meta.
Diante disso, destacamos que a educação não deve ficar somente a cargo do Estado, pelo contrário, sua organização e planejamento deverão envolver a participação de toda a sociedade. Corroborando com esse entendimento, o art. 206 da Constituição Federal, capítulo VI, prevê o princípio da “gestão democrática do ensino público, na forma da lei” (Constituição da República Federativa do Brasil, 1988). Logo, conforme o texto constitucional, a gestão democrática do ensino público é entendida como um princípio, ou seja, para a proposição e formulação de políticas públicas para a educação, o diálogo entre o Estado e a sociedade passa a ser fundamental.
No que se refere à gestão democrática da educação, a Constituição Federal de 1988 estabelece, em seu art. 211, que os sistemas de ensino brasileiros deverão ser organizados e estruturados sob o regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios. Todavia, a redação não prevê quais instâncias poderão dar suporte à organização do ensino dos entes federados, bem como à proposição de políticas públicas educacionais.
O PNE também evidenciou, na Meta 19, a gestão democrática do ensino público, determinando um prazo de dois anos para a sua efetivação. Contudo, compreende a gestão com base em critérios técnicos de mérito e desempenho e na consulta pública à comunidade escolar. Tal proposta de gestão democrática segue um modelo de gestão gerencial, o que contraria o princípio da gestão democrática, pois a participação da comunidade escolar é entendida de maneira genérica. Conforme Peroni e Flores (2014), a concepção de gestão, nesse sentido, está relacionada a princípios gerenciais.
Diante dessa observação, é importante entender que a Meta 19 articula duas concepções antagônicas de gestão, ou seja, uma gestão com base nos princípios democráticos e outra relacionada ao modelo gerencial. Nesse sentido, surge um desafio aos estados, Distrito Federal e municípios para “implementar em conjunto critérios tão distintos” (Peroni & Flores, 2014, p. 160).
Outra contradição levantada refere-se aos poucos mecanismos ofertados pelo Estado para a garantia da democracia; eles estão relacionados à própria concepção de democracia do Estado, baseada em aspectos que não dão conta de todas as demandas sociais. Ainda é pequena a participação da sociedade na luta pelos seus direitos e pela aquisição da cidadania. Por isso é tão importante que as estratégias de controle do Estado sejam fortalecidas por organizações civis, atuando diretamente nas propostas e planejamentos de políticas públicas educacionais, participando também da fiscalização e da avaliação de tais políticas.
No que tange aos resultados de nossa investigação, primeiramente, refletimos acerca de como ocorreu o processo de elaboração do PME/MCP 2015-2025. Os achados de pesquisa apontam que o processo de elaboração do PME de Macapá possibilitou poucos momentos de participação da sociedade na construção do documento - o pouco tempo destinado à elaboração do documento reduziu a possibilidade de uma participação mais efetiva.
Quanto às dinâmicas de participação nos processos de monitoramento do PME/MCP 2015-2025, observa-se que houve pouco espaço para o diálogo com as instâncias instituídas pelo PME/MCP; estas são responsáveis por compartilhar informações dos resultados do processo com a sociedade, buscando mudanças efetivas para o alcance das metas. A instância que esteve mais atuante no processo foi a Semed/PMM.
Apesar de o PME/MCP estabelecer, em seu art. 4, inciso 3º, que “o sistema de ensino do Município criará mecanismos para o acompanhamento local da consecução das Metas do PME” (Lei n. 2.178, 2015, p. 2), tal prerrogativa não vem ocorrendo. Além disso, até o momento as instâncias não foram instituídas por ato legal, o que distanciou ainda mais estas dos processos. O mesmo artigo da referida lei, em seu inciso primeiro, destaca como papel do gestor municipal adotar as medidas necessárias ao alcance das metas previstas no PME. Ou seja, cabe ao gestor disciplinar a gestão democrática para uma participação mais atuante das instâncias descritas na lei.