INTRODUÇÃO
A instituição escolar caracteriza-se como um contexto essencial de desenvolvimento humano, onde são viabilizados os processos de aprendizagem e socialização de crianças e adolescentes (Dessen & Polonia, 2007). Nesse ambiente educativo, o clima escolar, por sua vez, é definido como o conjunto de percepções e expectativas resultantes das experiências vivenciadas pelos diferentes atores que compõem o contexto educacional (Santos & Adam, 2022). Essas percepções sobre o clima escolar estão vinculadas a aspectos inter-relacionados, como valores, normas, relações, estrutura, organização - desde física até administrativa -, entre outros. Nesse sentido, cada escola detém o próprio clima (positivo ou negativo), ou atmosfera psicossocial, que, relacionado mutuamente à dinâmica escolar de cada instituição, exerce influências na qualidade de vida e no processo de ensino-aprendizagem (Vinha et al., 2017).
O clima escolar positivo está associado à presença de suporte, segurança, pertencimento e qualidade nos relacionamentos interpessoais e no processo de ensino-aprendizagem (Vinha et al., 2018). Além disso, um clima positivo está vinculado ao desempenho acadêmico satisfatório, qualificando-se como um fator protetivo no contexto socioeconômico e educacional (Vinha et al., 2018). Já o clima escolar negativo está relacionado ao surgimento de problemas comportamentais, à elevação do estresse e dos conflitos, ao desempenho escolar insatisfatório (Vinha et al., 2017) e ao envolvimento em situações de intimidação entre pares (Wrege, 2017), além de associar-se à presença de violências, como o bullying, podendo ser caracterizado como um fator de vulnerabilidade à qualidade de vida na instituição escolar (Melim & Pereira, 2013).
A investigação acerca do clima escolar torna-se essencial diante dos seus impactos sobre o bem-estar, a qualidade de vida e o processo educacional dos estudantes. Em particular, o clima escolar tem implicações nas relações que se estabelecem na escola e é afetado por tais relações. Dessa forma, além de impactar o bem-estar dos atores escolares, o clima pode prevenir ou produzir violências. Portanto tornam-se relevantes o estudo, a avaliação e a intervenção no clima escolar, uma vez que, no Brasil, têm ocorrido mais ataques e ameaças de violência nesse contexto (BBC News Brasil, 2023; Félix & Franzão, 2023).
Desse modo, pesquisas desempenham um papel fundamental ao fazer o levantamento de produções científicas relacionadas ao clima escolar, buscando o entendimento do construto para que se possa, a partir da compreensão dos elementos, construir intervenções e políticas públicas de prevenção ao clima escolar negativo e promoção de clima escolar positivo, especialmente diante de um cenário em que ataques e ameaças se fazem presentes. Esses ataques podem ocorrer em contextos previamente afetados pela violência e ser realizados por indivíduos que, muitas vezes, experimentaram sentimentos de solidão, estresse e foram vítimas de bullying (Welter et al., 2022). É aqui que a relação com o clima escolar se torna relevante. Um ambiente escolar com um clima positivo tem o potencial de prevenir o surgimento de situações violentas (Alcantara et al., 2019). Por isso, o presente estudo objetivou mapear as produções científicas nacionais e internacionais referentes ao clima escolar.
MÉTODO
Caracterização do estudo
Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, que consiste em sintetizar pesquisas disponíveis sobre determinados temas, sendo fundamentada em conhecimento científico (Souza et al., 2010). A revisão integrativa seguiu oito etapas, a saber: delimitação da questão de pesquisa; escolha das fontes de dados; escolha das palavras-chave; busca e armazenamento dos resultados; seleção de artigos pelo título e resumo; seleção dos dados dos artigos; avaliação dos artigos selecionados; e síntese e interpretação dos dados (Costa et al., 2022).
Pergunta de pesquisa e ferramentas de busca
A pergunta norteadora foi elaborada por meio da estratégia PICOD, que representa as iniciais dos componentes essenciais da questão: paciente/problema, intervenção, comparação e resultado. Com base nesses elementos, podemos fazer a seguinte análise: P: principais conceitos, participantes, variáveis investigadas; I: não há uma intervenção específica mencionada na questão; C: não há uma comparação específica mencionada na questão; O: produções científicas sobre o construto clima escolar; D: delineamento dos estudos (Araújo, 2020). Assim, a questão do estudo foi: quais os principais conceitos, métodos (e.g., delineamento, participantes, instrumentos) e variáveis investigadas nas produções científicas sobre o construto “clima escolar”?
A busca dos estudos ocorreu entre maio e junho de 2023 nas seguintes bases de dados: Web of Science; Scientific Electronic Library Online (SciELO); American Psychological Association (PsycINFO); e SciVerse (Scopus). Foram utilizadas as seguintes combinações de palavras e os respectivos operadores booleanos: “clima escolar” OR “ambiente escolar” e seus respectivos nomes em inglês “school climate” OR “school environment”.
Os critérios de inclusão foram: recorte temporal dos últimos cinco anos (2019-2023); artigos nas línguas portuguesa, inglesa e/ou espanhola; artigos que tinham como participantes adolescentes (10 a 19 anos, seguindo o critério da Organização Mundial da Saúde - OMS), professores e/ou gestores; artigos que apresentavam no título e resumo as palavras “clima escolar” e/ou “ambiente escolar”; artigos empíricos de diferentes métodos (qualitativo, quantitativo ou misto); e artigos que foram revisados por pares. Já os critérios de exclusão foram: trabalhos duplicados; revisões; artigos com resumo indisponível; e artigos não disponíveis na íntegra. Também foram excluídos os estudos que abordaram somente a validação de instrumentos.
Extração dos dados, análise e interpretação dos resultados
Foram identificados nas bases de dados 374 estudos: 27 na PsycINFO; 76 na SciELO; 227 na Web of Science; e 44 na Scopus. Para a seleção dos trabalhos, primeiramente procedeu-se à leitura dos títulos e resumos, realizada por quatro pesquisadores independentes. Utilizou-se o software de uso livre Rayyan, que é um serviço computacional com a finalidade de ajudar os pesquisadores nas suas revisões (Ouzzani et al., 2016). Posteriormente, foram analisados os resumos e realizadas a triagem e a leitura de cada artigo na íntegra. Ainda nessa etapa, os artigos foram analisados integralmente, considerando aspectos como: objetivo do estudo, principais conceitos, principais resultados, instrumentos utilizados, método, país de origem e língua (português, inglês ou espanhol), autores e ano.
Além disso, para responder à questão da pesquisa, os principais resultados e conceitos dos artigos foram adicionados em um corpus para análise com apoio do software Iramuteq. Esse programa viabiliza diferentes tipos de análise textual, tais como análise hierárquica descendente, análise de nuvem de palavras, classificação hierárquica descendente, análise de correspondência simples, além de permitir uma exploração profunda dos dados textuais (Camargo & Justo, 2013). A Figura 1 ilustra o processo de seleção e exclusão dos artigos.
Os 16 artigos selecionados para a revisão final foram integralmente lidos e seus conteúdos foram analisados pelos pesquisadores, com o objetivo de ordenar, classificar e categorizar os resultados. Em uma tabela, buscou-se identificar dados como autores, ano, país, tipo de instrumentos, principais resultados, entre outros. Com base no conteúdo dos estudos e fazendo o alinhamento dos resultados e objetivos, foram criadas, a priori, as seguintes categorias: conceitos dos estudos sobre ambiente e/ou clima escolar; descrição dos participantes; delineamento dos estudos, análise dos resultados e idioma; descrição dos instrumentos; e nuvem de palavras que contemplam os principais resultados dos artigos.
Optou-se pela nuvem de palavras no que diz respeito aos principais resultados e pela análise de similitude no que concerne aos diferentes conceitos sobre clima escolar (Souza et al., 2018). A primeira retrata a frequência de palavras repetidas no texto, enquanto a segunda permite ao pesquisador compreender as coocorrências e a relação de conexão entre as palavras, auxiliando na identificação da estrutura do texto (Camargo & Justo, 2013).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados dos 16 artigos analisados na íntegra são apresentados por meio de cinco eixos previamente definidos. Para fins deste estudo, os artigos foram identificados com a letra “A” seguida de número sequencial: A1, A2, A3, A4, (...) A16, conforme apresentado na Tabela 1.
TÍTULO | AUTOR/ANO |
---|---|
A1 - Clima escolar como fator protetivo ao desempenho em condições socioeconômicas desfavoráveis | Melo e Morais (2019) |
A2 - La valoración de estudiantes acerca del clima escolar, convivencia y violencia en escuelas secundarias del noroeste de México | Calderón-González e Vera- -Noriega (2022) |
A3 - Clima escolar y factores asociados: Modelo predictivo de ecuaciones estructurales | Cuadra-Martínez et al. (2022) |
A4 - Sensibilidad intercultural, clima escolar y contacto intergrupal en adolescentes de escuelas municipales de la Región Metropolitana de Santiago de Chile | Lahoz i Ubach e Cuccia (2021) |
A5 - Clima escolar, autoconcepto académico y calidad de vida en alumnos/as de aulas culturalmente diversas | Lahoz i Ubach (2021) |
A6 - Tecnologias da informação e comunicação em adolescentes, práticas parentais e percepção de clima escolar: Uma abordagem multinível | Wendt et al. (2020) |
A7 - Estudio de un modelo predictivo del clima escolar sobre el desarrollo del carácter y las conductas de bullying | Montero Carretero e Cervelló Gimeno (2019) |
A8 - Estilo interpessoal docente. Un análisis de perfil según las diferenças en motivación necesidad psicológicas básicas, clima escolar y satisfacción con la enseñanza | Sánchez e Jiménez-Parra (2022) |
A9 - La dependencia a las redes sociales virtuales y el clima escolar en la violencia de pareja en la adolescencia | Muñiz-Rivas et al. (2020) |
A10 - Clima escolar e satisfação com a escola entre adolescentes de ensino médio | Coelho e Dell’Aglio (2019) |
A11 - Clima escolar y libertad de expresión en adolescentes | Campos Ancalle (2020) |
A12 - Exploración de las relaciones entre clima escolar, satisfacción con la vida y empatía en adolescentes costarricenses | Alvarado Calderón (2022) |
A13 - Efecto del clima social escolar en la satisfacción con la vida en estudiantes de primaria y secundaria | Leria-Dulčić e Salgado-Roa (2019) |
A14 - Contribución de la dimensión relacional del clima social escolar (CES) a la convivencia escolar para la no violencia (CENVI), desde la percepción de estudiantes de segundo ciclo y enseñanza media en escuelas y liceos municipalizados de Estación Central | Sánchez e Barría Ramirez (2021) |
A15 - Habilidades sociales y clima social escolar en estudiantes de educación básica | Araoz e Uchasara (2020) |
A16 - Violência entre pares, clima escolar e contextos de desenvolvimento: Suas implicações no bem-estar | Alcântara et al. (2019) |
Fonte: Elaboração dos autores com dados da pesquisa.
Conceitos dos estudos sobre ambiente e/ou clima escolar
Observa-se na Figura 2 que há quatro palavras que se destacam no discurso: “clima-escolar”, “percepção”, “relação” e “ambiente”. A partir dessas palavras-chave outras se ramificam, ampliando o espectro de análise e proporcionando um entendimento abrangente do tema em questão.
Com relação ao termo “clima escolar”, que liga todos os eixos e apresenta conexidade com as palavras “percepção”, “relação” e “ambiente”, pode-se compreendê-lo como o ambiente social que se vivencia no contexto escolar, cuja referência é influenciada pela percepção da relação entre os membros. Ao tentar entender esse movimento, os recortes a seguir retirados dos estudos analisados evidenciam o exposto: “O clima escolar pode ser definido como a percepção acerca das experiências no ambiente escolar, entendido como uma característica dos estabelecimentos educacionais que é produzida pelas relações sobre variáveis que influenciam o comportamento e a escola” (A7); “O Clima Escolar é entendido como espaço social vivenciado nos ambientes educativos, cuja qualidade estará condicionada às relações e percepções entre os integrantes da educação, à organização da instituição, ao contexto socioeconômico e político em que se está inserido” (A8).
É importante salientar que o conceito de clima escolar é multifacetado, ou seja, apresenta uma ampla gama de variações. Apesar de não ser um construto recente, não existe consenso entre os pesquisadores de diferentes países que se dedicam à investigação do tema (Moro, 2020). No mapeamento realizado, é possível encontrar diversos termos que são usados para a definição de clima/ambiente escolar (Moro et al., 2019), tais como ethos, atmosfera escolar, clima/ambiente escolar (Matos & Carvalhosa, 2001), entre outros. Contudo o comum é que os pesquisadores tentem definir esse conceito relacionando-o ao sentimento dos indivíduos dentro da instituição escolar, isto é, ao modo como percebem o espaço institucional, organizacional e de convivência, a compreensão dos relacionamentos entre os membros da comunidade escolar e as experiências educacionais (Moro et al., 2019).
Outra ramificação da análise de similitude diz respeito às palavras “clima-escolar”, “professor”, “apoio” e “negativa”. Essa conexão sugere a existência de uma associação entre esses termos no contexto escolar. Nesse sentido, compreende-se que o clima/ambiente escolar pode ser positivo ou negativo. O conceito de clima escolar negativo, conforme definido no estudo A8, está ligado à percepção adversa do ambiente escolar, caracterizada pela falta de apoio, interações falhas entre estudantes e professores e rejeição entre colegas em sala de aula. Por outro lado, o estudo A6 explora o conceito de “clima-escolar positivo”, associando-o à “aprendizagem”, o que inclui padrões, metas e ideais que promovam um ambiente “positivo”, assim como boas relações interpessoais e “satisfação”. Esse clima positivo também é marcado por relacionamentos sociais de alta qualidade, ambientes emocionais positivos, segurança física e satisfação geral.
É importante destacar que o clima escolar positivo exerce uma influência importante e significativa na qualidade de vida dos estudantes. Isso pode estar ligado ao sentimento de bem-estar, autoconfiança para realizar as tarefas escolares, motivação, aprendizado e desempenho acadêmico, atitude em relação aos estudos, identificação e sensação de pertencimento escolar, desenvolvimento emocional e social dos estudantes e professores (Vinha et al., 2018). O clima escolar negativo, por sua vez, pode ser considerado um fator de risco para a qualidade de vida escolar, impactando a confiança e gerando comportamentos violentos (Barreto Trujillo & Álvarez Bermúdez, 2017).
Outra ramificação representativa a respeito do clima escolar, presente nos fragmentos dos estudos A5 e A10, conecta as palavras “clima-escolar”, “ambiente”, “desenvolvimento”, “aluno” e “ambiente”, “desenvolvimento”, “aluno”, “indivíduo”, “educacional”, “social” e “escola”: “O clima escolar é um conceito que abarca as propriedades do ambiente escolar que afetam o comportamento do aluno e exerce um papel crucial no desenvolvimento ou não de problemas comportamentais” (A5); “O clima escolar é entendido como a qualidade das interações na escola que influencia o desenvolvimento cognitivo, social e psicológico do aluno. Outras definições incluem a importância de o indivíduo sentir-se psicológica e fisicamente seguro nesse ambiente educacional” (A10).
Posto isso, observa-se que o clima escolar pode afetar o desenvolvimento do estudante, o que pode estar relacionado à violência, significando que a violência física, verbal e/ou psicológica pode afetar a saúde, a qualidade de vida e o bem-estar subjetivo, físico e social de crianças e adolescentes. Essas ações são intencionais, repetitivas ao longo do tempo e ocorrem entre os pares, envolvendo uma relação desigual de poder e força, sem uma motivação aparente (Currie et al., 2012).
Em suma, a maioria dos autores relata que o clima escolar se refere ao ambiente que aborda questões sociais, emocionais e psicológicas em uma escola. Esse cenário está direcionado à qualidade dos relacionamentos interpessoais, à atmosfera emocional e ao suporte que é oferecido aos alunos. Isso significa que o clima escolar influencia diretamente o bem-estar dos estudantes, sua motivação, envolvimento nas atividades da escola e desenvolvimento socioemocional. No próximo tópico apresenta-se a descrição dos participantes dos estudos selecionados.
Descrição dos participantes
Com relação aos participantes dos estudos analisados, todos são adolescentes com idades de 10 a 19 anos (World Health Organization [WHO], 2013), conforme os critérios de inclusão estabelecidos pela referida revisão. Apenas um estudo (A1) apresentou, além dos adolescentes, professores e gestores como participantes. A amostra de adolescentes dos 16 estudos totalizou 12.241, enquanto a de professores e gestores (A1) foi de 599. O estudo que registrou menor número de participantes foi o A13, com 120 adolescentes, e aquele com o maior número de participantes foi o A1 (2.731 adolescentes). Quanto ao tipo de escola investigada, 8 estudos (A1, A2, A4, A5, A10, A12, A14, A15) foram realizados em escolas públicas municipais e/ou estaduais; e 4 estudos (A6, A7, A9, A16) investigaram adolescentes de escolas públicas e privadas. Já no que diz respeito à escolaridade dos estudantes, 6 estudos (A1, A2, A4, A5, A16, A14) pesquisaram adolescentes do ensino fundamental, com maior predomínio dos anos finais do ensino fundamental (do 7° ao 9° ano); 5 (A3, A8, A9, A10, A15) abordaram alunos apenas do ensino médio; e 3 estudos (A7, A11, A13) tanto estudantes do ensino fundamental quanto do ensino médio.
Sobre os critérios de seleção das escolas e dos participantes, 12 escolas (A1, A4, A5, A6, A7, A8, A10, A11, A12, A13, A14, A16) foram selecionadas por conveniência dos pesquisadores, sendo que não há maiores descrições de tais critérios; e uma escola (A2) foi escolhida devido ao grande índice de violência (roubo e vandalismo) na região onde está localizada. Quanto à seleção dos participantes, 12 estudos (A1, A6, A7, A8, A9, A10, A11, A12, A13, A14, A15, A16) selecionaram alunos de forma aleatória com amostras não probabilísticas; e 3 estudos (A3, A4, A5) escolheram apenas estudantes voluntários. No que se refere ao país de origem dos adolescentes, 4 estudos (A1, A6, A10, A16) foram realizados no Brasil; um (A2) no México; 4 (A3, A4, A13, A14) no Chile; um (A11) na Bolívia; um (A12) na Costa Rica; 3 (A7, A8, A9) na Espanha; um (A15) no Peru; e um (A5) englobou adolescentes de diferentes países - Chile, Venezuela, Peru e Haiti.
A partir da descrição dos participantes, pode-se perceber uma escassez de estudos que apresentam resultados de todos os agentes escolares em conjunto (professores, estudantes, gestores), considerando os descritores e as bases de dados utilizadas na referida revisão. Diante disso, estudos nacionais (Moro et al., 2019; Vinha et al., 2017; Santos & Adam, 2022) e internacionais (Umaña Altamirano, 2020; Vukičević et al., 2019) vêm apontando para a importância de pesquisas realizadas com clima/ambiente escolar que pudessem abarcar todos os agentes, possibilitando investigar a percepção da comunidade escolar em prol de um clima escolar positivo. Quanto à escolaridade dos adolescentes, houve uma maior concentração das pesquisas a partir do 7° ano do ensino fundamental, o que está em consonância com o estudo de Moro et al. (2018), o qual menciona que estudantes do 6° ano, por vezes, estão vivenciando muitas mudanças, tais como transferência de escola, aumento do número de professores e avaliações. Na próxima seção são detalhados os estudos.
Delineamento dos estudos, análise dos resultados e idioma
Quanto ao delineamento dos estudos, todas as pesquisas apresentaram delineamento quantitativo e apenas um estudo (A5) adotou delineamento misto quanti e qualitativo. Os 16 estudos são de corte transversal, ou seja, a coleta de dados foi realizada uma única vez. No que se refere às análises dos resultados, 9 estudos (A1, A2, A4, A5, A6, A11, A12, A14, A15) utilizaram procedimentos estatísticos com análises correlacionais; um estudo (A10) apresentou análise de regressão linear múltipla; um estudo (A13) empregou análise de associações e comparações; e, por fim, 2 estudos (A8, A11) mostraram análises descritivas dos resultados. Do total dos estudos, 4 (A1, A6, A10, A16) foram publicados em idioma português e 12 (A2, A3, A4, A5, A7, A8, A9, A11, A12, A13, A14, A15) em espanhol.
Diante da apresentação das características metodológicas dos estudos, pode-se perceber uma maior concentração de pesquisas que utilizaram métodos quantitativos e transversais. Tais pesquisas contemplam uma ampla investigação e têm como principal finalidade a busca por grandes amostras populacionais em um único recorte de tempo, uma vez que essa investigação permite a generalização dos resultados encontrados (Creswell, 2010). Ainda a partir da presente revisão, destaca-se que os países de língua espanhola são os que mais investem em pesquisa sobre clima/ambiente escolar, devido a uma compreensão global das influências desse clima no desenvolvimento dos estudantes. A maior evidência nas pesquisas realizadas no Chile pode-se dar em função do grande investimento em qualidade educacional nos níveis de educação básica e ensino superior, uma vez que o Chile está no ranking dos dez países que mais investem em educação (Organization for Economic Co-operation and Development [OECD], 2022). Na próxima seção apresenta-se a descrição dos instrumentos que avaliam o clima/ambiente escolar.
Descrição dos instrumentos
Foram encontrados diferentes instrumentos para a avaliação específica do clima/ambiente escolar. Os artigos selecionados não citavam os fundamentos teóricos compreensivos do clima escolar do instrumento. Foram identificados 14 instrumentos distintos dos 16 artigos analisados. Quatro foram construídos, validados e/ou adaptados no Brasil (Questionário do Clima Escolar, de Vinha et al. [2017]; Escala Delaware School Climate Survey - versão estudante, de Holst [2014]; Questionário Biossociodemográfico, de Genta et al. [2009]).
A Tabela 2 especifica o tipo de instrumento adotado para a coleta de dados (questionário, escala e a sua definição). Busca-se também explicar as definições analisadas por dimensões que são os componentes específicos que serão investigados ou mensurados pelos instrumentos, as definições do instrumento (formato, composição) e os valores de alpha de Cronbach. Esse valor representa uma medida de confiabilidade interna do instrumento, que avalia a consistência interna das respostas aos itens do instrumento, ou seja, o quanto esses itens estão correlacionados entre si. Um valor de alpha de Cronbach mais próximo de 1 indica uma maior consistência interna, ou seja, maior confiabilidade dos resultados obtidos com o instrumento (Quero Virla, 2010).
INSTRUMENTO/AUTOR/ANO E PAÍS | DEFINIÇÃO | DIMENSÕES ANALISADAS | CARACTERÍSTICAS DO INSTRUMENTO | OS VALORES DE ALPHA DE CRONBACH |
---|---|---|---|---|
Questionário do Clima Escolar Vinha et al. (2016) Brasil (A1) |
Destinado a estudantes, professores e gestores, o instrumento engloba oito dimensões abrangendo questões relacionadas à realidade das escolas brasileiras. Essas dimensões incluem relações com o ensino e a aprendizagem. | 1) As relações com o ensino e com a aprendizagem; 2) As relações sociais e os conflitos na escola; 3) As regras, as sanções e a segurança na escola; 4) As situações de intimidação entre alunos; 5) A família, a escola e a comunidade; 6) A infraestrutura e a rede física da escola; 7) Relações com o trabalho; 8) A gestão e a participação. | O modelo apresenta linguagem clara e objetiva, na qual as opções de resposta se adequam ao formato de uma escala Likert. Cada item apresenta quatro possibilidades de resposta, correspondendo a uma escala de 1 a 4 pontos. No que se refere aos itens, são 123 para estudantes, 137 para professores e 141 para gestores. Essa escala varia de menor concordância a maior concordância. | O coeficiente alpha de Cronbach variou para escala total entre 0,80 e 0,90. |
Cuestionario de Convivencia Escolar Caso Niebla et al. (2013) México (A2) |
A escala analisa as relações existentes entre alunos, aluno- -professor, relacionamento aluno- -diretor e ambiente escolar. |
1) Relação entre estudantes (convivência, comunicação, respeito e coesão); 2) Relação aluno- -professor (comunicação, confiança, convivência, apoio acadêmico e pessoal); 3) Relacionamento aluno- -diretor (convivência, comunicação e confiança); 4) Ambiente escolar (disciplina, condições físicas do campus e violência dentro do campus). |
A escala de clima escolar é composta de 24 questões, utilizando o formato Likert com cinco opções de resposta (1 = nunca, 2 = quase nunca, 3 = às vezes, 4 = quase sempre, 5 = sempre). As questões são organizadas em quatro dimensões com seus respectivos indicadores. | O coeficiente alpha de Cronbach para a escala total foi de 0,85. |
Escala de Clima Escolar - Adaptada para o Chile Chile López et al. (2014) (A3) |
Elaborada e adaptada no Chile para estudantes do ensino secundário, analisa as experiências dos alunos nas escolas. | 1) Regras claras; 2) Regras contra a violência; 3) Participação; 4) Apoio social. | É uma escala autorrelato do tipo Likert que mede clima escolar com base em 4 fatores e possui 18 itens | O coeficiente alpha de Cronbach para as quatro dimensões variou: de 0,84 a 0,85, para regras claras; de 0,86 a 0,88, para regras contra a violência; de 0,53 a 0,63, para participação e apoio social. |
Escala de Clima Escolar (Inventory of School Climate-Student ISC-S) Chile Brand et al. (2003) (A4) e (A5) |
A escala é destinada à comunidade escolar e busca compreender as relações, interações, apoio e pluralismo. | As dimensões são: 1) Apoio dos professores (6 itens); 2) Interação positiva entre os pares (5 itens); 3) Interação negativa entre os pares; 4) Apoio e pluralismo cultural (5 itens). |
Na avaliação das dimensões sociais do clima escolar, foram utilizadas quatro escalas do ISC-S (Brand et al., 2003). Os itens de cada uma das escalas seguem um formato de resposta do tipo Likert de 5 pontos, variando de 1 (nunca) a 5 (frequentemente). É composta de 21 itens. |
O alpha de Cronbach da escala total variou de 0,65 a 0,79. |
Questionário Biossociodemográfico Brasil Genta et al. (2009) (A6) |
O questionário possui oito perguntas sobre a percepção dos estudantes em relação ao clima escolar. | Sem dimensões. | Desenvolvido em uma escala de 3 pontos, variando de 1 (sim, sempre) a 3 (não). Pontuações mais altas indicam uma percepção pior do ambiente escolar (pontuação máxima possível = 24). | O alpha de Cronbach da escala total foi de 0,66. |
Questionário “What is Happening in this School?” (WHITS) Espanha Aldridge et al. (2015) (A7) |
O instrumento tenta capturar os fatores que correspondem a um ambiente favorável à prevenção de comportamentos agressivos na escola, em relação ao papel dos professores, colegas e estratégias educacionais e organizacionais, que favorecem, como comentamos, a prevenção desses comportamentos. | 1) Apoio dos professores (4 itens); 2) Conexão com colegas (3 itens); 3) Conexão com a escola (4 itens); 4) Afirmação na diversidade (4 itens); 5) Clareza das regras (4 itens); 6) Informar e pedir ajuda (4 itens). |
É composta de 48 itens, mas reduzimos a escala original para 23 itens. As respostas são formuladas em uma escala numérica Likert cujos valores variam de 1 (quase nunca) a 5 (quase sempre). | Quanto à confiabilidade do instrumento, todos os fatores do questionário apresentaram alpha acima de 0,70, exceto para os fatores conexão com a escola (0,66) e conexão com pares (0,68). |
Questionário Clima Social Escolar (CECSCE) Espanha Trianes Torres e Gallardo Cruz (2004) (A8) |
Busca entender o clima escolar e a relação com as instituições e o corpo docente e discente. | 1) Clima referente à instituição escolar (conforto adequado, tranquilidade na instituição, segurança, capacidade de ajuda...); 2) Clima referente ao corpo docente e discente (exigências acadêmicas, justiça, acessibilidade no tratamento...). | Foi utilizada uma escala tipo Likert com valor mínimo de 1 (discordo totalmente) a 5 (concordo totalmente). É composto de 14 itens. |
Os valores alpha de Cronbach foram de 0,78 para o clima da escola e 0,66 para o clima do corpo docente. |
Escala de clima escolar (CES; adaptação espanhola) Espanha Fernández-Ballesteros e Sierra-Díez (1989) (A9) |
A escala busca entender as relações entre a comunidade escolar e o envolvimento nas tarefas da escola. | 1) Percepção de ajuda do professor; 2) Afiliação: amizade e ajuda entre estudantes; 3) Envolvimento nas tarefas escolares. | Composta de 30 itens que medem a percepção do adolescente sobre a qualidade do clima escolar (verdadeiro-falso). |
Os valores do alpha de Cronbach foram: percepção de ajuda do professor (0,79); afiliação: amizade e ajuda entre estudantes (0,86); e envolvimento nas tarefas escolares (0,75). |
Escala Delaware School Climate Survey - versão estudante Brasil Holst (2014) (A10) |
A escala objetiva entender os relacionamentos na percepção do aluno. | 1) Professor-estudante; 2) Relacionamento estudante- -estudante; 3) Justeza das regras e clareza de expectativas; 4) Segurança na escola; 5) Bullying; 6) Engajamento estudantil. |
Instrumento composto de 28 itens (excluindo 2 itens de validade) distribuídos em 6 subescalas (relacionamento professor-estudante; relacionamento estudante-estudante; justeza das regras e clareza de expectativas; segurança na escola; bullying; e engajamento estudantil). Cada subescala é composta de 4 a 6 itens, respondidos por meio de uma escala Likert com quatro opções de resposta, variando de 1 (discordo muito) a 4 (concordo muito). | Alpha de Cronbach da escala total foi de 0,86. |
Questionário de Avaliação Climática Escolar para Estudantes Espanha Gutiérrez et al. (2011) (A11) |
O questionário avalia a percepção positiva ou negativa do clima escolar. | Sem dimensões. | Com base no questionário, apresentam- -se as percepções dos estudantes sobre o clima escolar (se positivo ou negativo), o clima de convivência geral dentro do recinto escolar (se positivo ou negativo) e a satisfação e cumprimento de expectativas (se positivo ou negativo). |
O alpha de Cronbach apresenta uma consistência interna de 0,78, o que indica uma adequada consistência interna na distribuição da escala. |
Escala de Clima Escolar numa versão resumida do instrumento. Costa Rica Aron et al. (2012) (A12) |
Conjunto de escalas com objetivo de compreender os professores, a satisfação com a escola e a avaliação da infraestrutura, entre outros. | 1) Meus professores; 2) Satisfação com a escola; 3) Avaliação da infraestrutura. | Consiste em 82 itens distribuídos em 5 subescalas. A escala propõe um formato de resposta tipo Likert, com 4 níveis, que se referem ao grau de acordo com cada uma das declarações de itens. Para a subescala “Meus professores”, os níveis são “todos”, “a maioria”, “poucos” ou “nenhum”. Para as subescalas “Meus colegas” e “Infraestrutura”, têm-se “sempre”, “quase sempre”, “raramente” ou “nunca”. Para a subescala “Minha escola”, há quatro níveis “de acordo”. | Alpha de Cronbach da escala total foi de 0,90. |
Escala de Clima Social Escolar (ECLIS) Chile Aron e Milicic (1999) (A13) |
Apresenta, a partir de uma escala, a percepção dos estudantes sobre o clima social da sala de aula. | 1) Professores; 2) Colegas de classe; 3) Percepção e satisfação da escola como instituição; 4) Satisfação com a infraestrutura. | Consistente em 82 itens organizados em 4 subescalas destinadas a avaliar a percepção dos pontos fortes e fracos em relação a 4 diferentes áreas: seus professores (30 itens); colegas de classe (15 itens); percepção e satisfação da escola como instituição (10 itens); e satisfação com a infraestrutura (27 itens). | Alpha da escala total variou de 0,63 a 0,89. |
School Social Climate (CES) Trickett e Moos (1974) Chile e Peru (A14) e (A15) |
A escala pode fornecer informações sobre como se relacionam os estudantes, como se envolvem nas atividades escolares e o nível de conexão social que experimentam na aula. | 1) Implicação; 2) Ajuda; 3) Afiliação. | Contém 45 itens dispostos em escala Likert, em que 1 significa discordo totalmente e 5 concordo totalmente. | Alpha de Cronbach: Implicação (0,71); Ajuda (0,68); Afiliação (0,60). O alpha total é de 0,76. |
Questionário de Clima Escolar Brasil Veiga et al. (2004) (A16) |
Analisa o clima/ambiente e as trocas no contexto escolar. | 1) Ambiente físico, pedagógico e social; 2) Regras; 3) Relações interpessoais. | Instrumento composto na forma original de 22 itens avaliados em escala de 6 pontos (1 = discordo totalmente; 6 = concordo totalmente). | A consistência interna ficou com alpha de Cronbach de 0,91 (Ambiente físico, pedagógico e social: 0,86; Regras: 0,73; Relações interpessoais: 0,76 - calculando-se cada fator pela soma aritmética dos valores de seus itens). |
Fonte: Elaboração dos autores com dados da pesquisa.
Após a análise das dimensões dos instrumentos que são utilizados nas pesquisas sobre o tema, verifica-se que aqueles que avaliaram o clima/ambiente escolar desempenham um papel significativo na compreensão e melhoria do contexto educacional. Isso porque tais instrumentos fornecem informações importantes sobre diferentes aspectos do clima/ambiente escolar, como relacionamentos interpessoais, suporte social, comunicação, segurança e organização. Permitem também identificar áreas específicas que precisam ser aprimoradas para criar um ambiente mais positivo e produtivo para os estudantes e funcionários da escola. Com essas informações, medidas podem ser implementadas para criar um ambiente mais seguro, inclusivo e saudável para todos (Parente et al., 2021). No próximo tópico é relatada a nuvem de palavras.
Nuvem de palavras que contemplam os principais resultados dos artigos
Para análise dos resultados utilizou-se o software Iramuteq, por meio do qual foi realizada a análise de nuvem de palavras, indicando um corpus de 1.252 palavras. Para chegar a esse total foi preciso selecionar as opções de análise relevantes para contagem das palavras. Isso envolve escolher a opção de “Frequência de palavras” na configuração da análise.
Após a exclusão de palavras sem significado (advérbios, conjunções, preposições e pronomes), foram identificadas 480 palavras. Com relação aos resultados dos artigos, foi utilizada a nuvem de palavras e identificou-se que as palavras que mais se repetiram foram “clima escolar” (n = 18); “percepção” (n = 17); “social” (n = 17); “aluno” (n = 15); “relação” (n = 14); “internet” (n = 9); “violência” (n = 9); “rede” (n = 6); “dependência” (n = 6); “qualidade” (n = 5); “desenvolvimento” (n = 5); “violento” (n = 5); “interpessoal” (n = 4); “autonomia” (n = 4); “convivência” (n = 4); “regra” (n = 4); “acadêmico” (n = 4); “autoconceito” (n = 4); “trabalho” (n = 4); “bullying” (n = 4); “apoio” (n=4); e “psicológico” (n = 3).
A análise revela que as principais palavras-chave encontradas nos resultados das pesquisas, com uma frequência superior a dez ocorrências, são: “clima-escolar”, “percepção”, “social”, “aluno” e “relação”. Ao avançar a compreensão acerca dessas palavras, fez-se uma relação dos objetivos com os resultados da pesquisa, como pode-se observar nos estudos abordados a seguir.
O estudo A14 objetivou relacionar os componentes do fator relacional do clima social escolar (implicação, afiliação e apoio) e os tipos de violência escolar (verbal, físico-comportamental, social de exclusão). Os resultados apontaram que, quanto melhores as relações de convivência escolar presentes no clima social escolar, menos eventos e tipos de violência ocorrem na escola. Já o estudo A11 determinou a relação da percepção do clima escolar com o exercício da liberdade de expressão, em adolescentes do ensino médio da Escola Nacional Juan Misael Saracho da cidade de Oruro, na Bolívia. A pesquisa indicou que os fatores associados ao exercício da liberdade e as dimensões do clima escolar estão substancialmente relacionados, pois foi constatado que, quanto melhor o clima escolar de convivência geral e quanto melhor o clima escolar de satisfação e cumprimento de expectativas, maior é o exercício da liberdade de expressão. Uma vez que a escola permite aos alunos uma participação democrática, com liberdade, tem-se que percepções dos adolescentes sobre o clima escolar são satisfatórias, pois a maioria percebe um ambiente positivo.
Esses estudos vão ao encontro da pesquisa realizada por Vinha et al. (2016), que defenderam que as relações positivas e a liberdade de expressão são importantes. Isso significa que, quando os estudantes são privados da oportunidade de tomar decisões e discutir problemas e situações nas quais estão envolvidos, torna-se mais desafiador o desenvolvimento de um ambiente que suporte o bem-estar coletivo e o comportamento responsável.
As palavras identificadas na faixa de 5 a 9 ocorrências são “violência”, “rede” e “internet”, “qualidade”, “desenvolvimento”, “violento”, “dependência”, “interpessoal”, “regra”, “autoconceito” e “trabalho”. Verificou-se que a violência é um resultado muito presente no clima/ambiente escolar, de forma que em alguns estudos está associada à tecnologia em geral. Essas palavras sugerem que os resultados das pesquisas podem estar relacionando violência e rede a um clima/ambiente escolar negativo e o desenvolvimento de habilidades sociais a um clima/ambiente escolar adequado.
O estudo A9 buscou analisar as relações entre a dependência de redes sociais, o clima escolar e a violência on-line entre parceiros (namorados) adolescentes a partir de uma perspectiva de gênero. Os resultados apontaram que a dependência de redes sociais e internet se relaciona significativamente com o grau de violência on-line exercida contra o parceiro. Quanto ao âmbito escolar, infere-se que a qualidade do clima percebido por meninos e meninas adolescentes se relaciona com o grau de violência entre parceiros exercida on-line, o que significa que, em um ambiente escolar positivo, no qual existem relações saudáveis, apoio emocional e políticas de prevenção da violência, é mais provável que haja um menor grau de violência on-line entre parceiros. Pode-se inferir, também, que a interação entre a violência de casal e o gênero do aluno não apresentou significância estatística. Esse resultado indica que, durante a fase da adolescência, a violência exercida no espaço virtual está igualmente relacionada a um baixo ajuste escolar tanto em meninos como em meninas.
Já o estudo A15 objetivou compreender a relação que existe entre as habilidades sociais e o clima escolar dos estudantes do nível secundário das instituições educativas públicas de Puerto Maldonado, Uruguai. Observou-se que existe uma correlação moderada, direta e significativa entre as habilidades sociais e o clima social escolar, pois, enquanto os estudantes apresentarem altos níveis de desenvolvimento de suas habilidades sociais, o clima social escolar será o mais adequado e propício ao desenvolvimento da aprendizagem. Por outro lado, ter um repertório limitado de habilidades sociais piora a relação interpessoal, gerando conflito, desrespeito e descumprimento de regras e acordos, o que dificulta o trabalho do professor.
Por fim, o recurso da nuvem de palavras identificou quatro ocorrências das palavras “autonomia”, “convivência”, “bullying”, “apoio psicológico” e “autoconceito”. Observou-se que a palavra bullying está relacionada à variável negativa do clima, enquanto o restante faz uma associação a variáveis positivas.
De fato, o estudo A16 visou a analisar as implicações da violência entre pares no contexto escolar, do clima escolar e da percepção dos contextos de desenvolvimento no bem-estar subjetivo de crianças e adolescentes. Concluiu-se que a tipologia “bullying” (verbal, psicológico, emocional) representa fator de risco/proteção mais associado ao bem-estar subjetivo. Nesse sentido, se o clima é favorável, ele se caracteriza por um ambiente seguro, acolhedor e de apoio, promovendo relações saudáveis e respeitosas. Por outro lado, o clima escolar desfavorável, no qual o bullying pode ser mais prevalente, pode afetar negativamente a saúde mental do adolescente. Nessa direção, destaca-se que as vítimas desses atos violentos podem sofrer efeitos negativos importantes, incluindo aversão a frequentar aulas, queda no desempenho acadêmico, ansiedade, depressão, isolamento social, baixa autoestima e até mesmo pensamentos suicidas (Valdés Cuervo & Carlos Martínez, 2014). O estudo A14 relacionou os componentes do fator relacional do clima escolar (implicação, afiliação e apoio) e os tipos de violência escolar (verbal, físico-comportamental, social de exclusão). Identificou-se que, quanto melhores são as relações de convivência escolar presentes no clima escolar, menos eventos e tipos de violência ocorrem na escola, melhorando a convivência, o apoio e a autonomia nesse contexto.
Quanto ao estudo A15, seu objetivo foi compreender a relação existente entre as habilidades sociais, o clima escolar dos alunos e o autoconceito acadêmico percebidos por estudantes dos ensinos fundamental e médio, de escolas e colégios da Região Metropolitana do Peru, matriculados em salas de aula culturalmente diversas. Identificou-se que a relação entre clima escolar, autoconceito acadêmico e qualidade de vida percebida, bem como o valor explicativo do clima escolar e a percepção de qualidade de vida no autoconceito acadêmico, também varia consoante à nacionalidade dos estudantes. Além disso, existe uma relação significativa entre as dimensões assertividade, comunicação, autoestima, tomada de decisão e a variável clima social escolar. Logo, percebe-se que existem correlações importantes entre as dimensões de habilidades sociais e o clima escolar.
No estudo acima citado, o autoconceito refere-se à percepção e avaliação que uma pessoa tem de si mesma, incluindo suas crenças, valores, habilidades, características físicas e traços de personalidade. Quando o autoconceito é positivo, uma pessoa tende a ter uma visão saudável e confiante de si mesma, o que pode manter sua motivação, emoção e ações voltadas para o autodesenvolvimento. Por outro lado, um autoconceito negativo pode levar a sentimentos de inadequação, baixa autoestima e comportamento autodestrutivo (Paiva & Lourenço, 2011).
Em resumo, esses estudos enfatizam a importância de um clima escolar positivo, das relações saudáveis e do apoio emocional para a promoção de um ambiente saudável para o adolescente. Também se destaca a associação entre um clima escolar negativo e a ocorrência de violência e os impactos negativos na saúde mental. Além disso, os estudos ressaltam a influência e importância de aspectos como habilidades sociais, autoconceito e percepção de qualidade de vida no contexto escolar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente revisão integrativa de literatura buscou mapear as produções científicas nacionais e internacionais referentes ao clima/ambiente escolar, indicando quais são os principais conceitos, métodos (instrumentos, participantes, delineamentos) e variáveis investigadas nas produções científicas sobre o referido construto, no período de 2019 a 2023.
Constatou-se que há uma maior concentração de pesquisas cujos métodos são quantitativos e transversais, as quais se caracterizam por uma investigação ampla a partir de grandes amostras populacionais em recorte único de tempo, o que viabiliza a generalização de resultados. Além disso, nessa pesquisa foi observado que os países de língua espanhola são os que mais investem em pesquisas envolvendo o clima/ambiente escolar, o que parte de uma compreensão global das influências do construto no desenvolvimento dos estudantes. Nos estudos, distintos instrumentos são utilizados pelos pesquisadores visando à avaliação do clima/ambiente escolar.
O clima/ambiente escolar pode ser entendido como a percepção da qualidade das interações na escola, com repercussões no desenvolvimento cognitivo, social e psicológico do discente, podendo ser positivo ou negativo. Como positivo, entende-se o clima/ambiente marcado por respeito e apoio aos indivíduos, capaz de proporcionar relacionamentos de alta qualidade nas dimensões social, ambiental e emocional, estando ligado à qualidade de vida proporcionada aos estudantes, na medida em que constrói um sentimento de bem-estar, autoconfiança, motivação, aprendizado, desempenho acadêmico, pertencimento, por exemplo. Já como negativo, tem-se o clima/ambiente escolar avaliado com uma percepção negativa, em virtude da falta de apoio, ou mesmo da ausência/inexistência de interações de qualidade entre discentes e seus pares, ou discentes e docentes.
Como limitações do estudo, vislumbrou-se a escassez de pesquisas envolvendo clima/ambiente escolar e instrumentos específicos que foram construídos e validados no Brasil, a exemplo do Questionário do Clima Escolar de Vinha et al. (2017), porém é importante ressaltar que esse instrumento contém um grande número de itens, fazendo com que o procedimento de resposta se torne cansativo para os participantes, especialmente quando combinado com outros questionários. Logo, sugere-se a realização de pesquisas futuras, com contornos longitudinais, acerca de intervenções eficazes, as quais pudessem inclusive abarcar todos os agentes escolares (estudantes, professores, gestores, funcionários de escolas), viabilizando a compreensão da percepção da comunidade escolar ampla. Sugere-se também a construção e validação de outros questionários para as pesquisas nacionais. A presente revisão, portanto, aponta para a importância de estudos envolvendo o clima/ambiente escolar, os quais poderão, a partir de diferentes delineamentos metodológicos, viabilizar a compreensão de diferentes dimensões do construto em prol de um clima/ambiente escolar positivo.
NOTA: Este artigo foi produzido colaborativamente pelos autores. Pâmela Schultz Danzmann, em particular, foi responsável por uma parte substancial do trabalho, que incluiu pesquisa, redação colaborativa, análise de dados, revisões e edições, além de se envolver em discussões, pesquisa bibliográfica detalhada, preparação para a publicação e colaborações com outros autores. Natan Daniel da Silva, Ana Claudia Pinto da Silva e Lenon Goulart Vargas se envolveram no processo da pesquisa bibliográfica detalhada, análise de dados e preparação para a publicação. As revisões e o acompanhamento da construção do artigo foram realizados pelas professoras Jana Gonçalves Zappe e Naiana Dapieve Patias.