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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.27 no.2 Florianópolis  2019  Epub 01-Jun-2019

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2019v27n254549 

Artigos

Representação e estereótipos de mulheres negras no cinema brasileiro

Marcia Rangel Candido1 
http://orcid.org/0000-0003-3466-000X

João Feres Júnior1 
http://orcid.org/0000-0002-5830-0458

1Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 22260-100


Resumo:

O objetivo deste artigo é contribuir à crítica feminista do cinema a partir da análise da representação das mulheres negras nos longas-metragens brasileiros de maior público dos últimos anos. Este esforço se divide em três partes: em primeiro lugar, revisamos os estudos sobre o tema, mostrando que a articulação entre raça e gênero tem sido tratada de maneira marginal e com falhas metodológicas; em seguida, apresentamos dados quantitativos sobre o perfil dos elencos principais dos filmes nacionais; e, por fim, desenvolvemos uma tipologia dos estereótipos atribuídos às protagonistas de cor preta ou parda. Os resultados permitem concluir que perdura a sub-representação da mulher negra e a criação predominante de imaginários negativos, que as reduzem a ícones do espaço doméstico e a objetos de sexualização e de dissimulação.

Palavras-chave: mulheres negras; cinema brasileiro; racismo; representação; estereótipo

Abstract:

This article presents a feminist critique of the Brazilian film industry through the analysis of the representation of black women in the highest-grossing movies over the last years. Our effort is divided in three parts: first, we review the literature on gender and race in Brazilian film, showing that the interplay between these categories has been seldom explored and the few works that do it suffer from methodological flaws; then we make a descriptive quantitative analysis on the profile of the top-grossing movies produced in Brazil; and, finally, we propose a typology of stereotypes associated with black and brown female protagonists. The results allow us to conclude that black women are still severely underpresented and predominantly represented by negative stereotypes that convey oversexualization, mischievousness, and domesticity.

Key-words: black women; Brazilian cinema; racism; representation; stereotype

O crescimento da indústria cinematográfica brasileira nos últimos anos ocorreu em paralelo ao aumento das críticas feministas à sua produção.1 O número de filmes realizados ampliou consideravelmente, assim como a frequência do público e o montante de recursos estatais direcionados ao setor (ANUARIO ESTATISTICO DO CINEMA BRASILEIRO, 2015, 2016). O país figurou entre os doze selecionados para análise no levantamento Gender Bias Without Borders, que definiu seu recorte de pesquisa de acordo com a rentabilidade dos mercados audiovisuais ao redor do mundo. Publicado em 2015 a partir da parceria de importantes instituições internacionais, centros de pesquisa e universidades, o estudo apurou dez obras cinematográficas de maior bilheteria em cada uma das regiões escolhidas e lançou luz a um padrão global negativo de representação das mulheres nos filmes: o gênero feminino protagoniza proporção minoritária de tramas, obtém poucas falas, raramente é associado a profissões prestigiosas, é mais sexualizado e tem maior probabilidade de ser vinculado a comentários sobre aparência (Stacy SMITH; Marc CHOUEITI; Katherine PIEPER, 2015).

As críticas feministas elaboradas em âmbito nacional seguem critérios metodológicos variados. Por um lado, são concebidos trabalhos qualitativos que selecionam aleatoriamente filmes em função de preferências pessoais das autoras ou de um viés primário, qual seja, o fato de uma narrativa possuir características que são consideradas relevantes para temas de investigação (Sônia MALUF, 2002; Debora BREDER, 2013; Paloma COELHO, 2013; Fabián NUNES, 2015). Por outro lado, estudos sistemáticos que busquem delimitar as desigualdades de gênero em um âmbito mais geral da estrutura produtiva do cinema, como o Gender Bias Without Borders, ainda são raros. Em 2015 e 2016, o Anuário Estatístico do Cinema Brasileiro, divulgado pelo Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual da Agência Nacional do Cinema (Ancine), acrescentou a variável gênero nos dados sobre direção, mas não apresentou descrições sobre o elenco e a representação de personagens. No âmbito acadêmico, a contribuição de Paula Alves et al. é uma exceção e mostra, com metodologia quantitativa e um amplo corpus de análise, que as mulheres são minoria nas funções de direção, roteiro, fotografia, produção e atuação como protagonistas (Paula ALVES; José ALVES; Denise SILVA, 2011; Paula ALVES; Paloma COELHO, 2015; Paula ALVES DE ALMEIDA; José Eustáquio ALVES, 2016).

Contudo, esses escassos exemplos de tentativas abrangentes de captar as desigualdades de gênero deixam de lado um aspecto importante: a interação com a variável raça. Este artigo tem como objetivo contribuir à crítica feminista do cinema a partir de considerações sobre a participação e a representação das mulheres negras nos longas-metragens brasileiros. Entendemos que análises unidimensionais, atentas apenas às variáveis gênero ou raça, acabam não levando em consideração aspectos cruciais do cruzamento entre esses dois modos de discriminação, reponsáveis simultaneamente por assimetrias severas em nossa sociedade.

Há algumas décadas o feminismo negro critica a utilização da categoria “mulher” como referência homogênea a um grupo que é atravessado por inúmeras diferenças internas. Segundo esse argumento, ao não verificarem as conexões entre raça e gênero, autores apreendem uma visão deturpada da realidade, que subestima as particularidades contextuais das mulheres negras (Angela DAVIS, 1981; bell hooks, 1982, 1992; Audre LORDE, 1984; Lélia GONZALEZ, 1984; Kimberle CRENSHAW, 1991; Patricia COLLINS, 2000; Sueli CARNEIRO, 2003; Claudia CARDOSO, 2014). Ana Carolina Escosteguy e Márcia Messa (2008), Tania Montoro (2009) e Montoro e Ceiça Ferreira (2014) enfatizam a ausência de centralidade da questão racial e das conexões com gênero nos estudos sobre comunicação. Em direção semelhante, Giselle Santos (2016) constata no campo de estudos feministas do Brasil a marginalização de perspectivas interseccionais, ou seja, que levem em conta a associação entre distintas variáveis - raça, gênero, classe etc.

Merecem atenção duas perspectivas que analisam a situação das mulheres negras em uma amostra bastante ampla de filmes: uma pesquisa do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA-IESP-UERJ), e o livro O Negro Brasileiro e o Cinema, de João Carlos Rodrigues. No primeiro caso, as publicações divulgadas apresentam, a partir de estatísticas descritivas, a participação dos diversos grupos da população nas principais ocupações do audiovisual - direção, roteiro e atuação -, bem como algumas características atribuídas às/aos personagens. Com um recorte temporal que abarca a década mais recente do cinema brasileiro e uma seleção de filmes restrita aos que obtiveram maior público, os resultados mostram que, dentre os outros perfis, as mulheres negras são excluídas das atividades de direção e roteiro e são o grupo menos representado nos elencos (Marcia CANDIDO; Gabriella MORATELLI; Verônica DAFLON; João FERES JÚNIOR, 2014; CANDIDO, Luiz Augusto CAMPOS; FERES JÚNIOR, 2016). Já o trabalho de João Carlos Rodrigues, jornalista e pesquisador, intenta reconstituir a história da representação do negro no cinema nacional e fornece críticas a uma extensa filmografia (João Carlos RODRIGUES, 2011).

Todavia, é ausente nessas abordagens a união entre dados quantitativos, que se referem ao mapeamento da participação das mulheres negras nos elencos dos filmes nacionais, e qualitativos, que descrevem a maneira como esse grupo tem sido representado nas narrativas fílmicas. Para preencher essa lacuna, começamos com uma discussão sobre estereótipos e críticas ao estudo de Rodrigues (2011). Em seguida, expomos a metodologia empregada em nossa pesquisa. Por fim, apresentamos dados sobre a participação das mulheres negras em elencos principais e propomos uma tipologia de classificação de estereótipos, a partir da que foi elaborada por Rodrigues, mas orientada especialmente às protagonistas negras - de cor preta e parda.

O problema dos estereótipos

A análise de representações é um terreno pantanoso: os sentidos associados a imagens são frequentemente múltiplos, quando não aparentemente desconexos ou mesmo contraditórios. Isso não quer dizer, contudo, que imagens sejam ininteligíveis e que não possamos explorar e tentar organizar os sentidos que encerram. Os estereótipos são práticas de representação e, portanto, adquirem sentido no interior dos contextos culturais, sociais e políticos em que são produzidos. Mesmo que os estudos de mídia assiduamente tematizem os estereótipos, quase nunca abordam a articulação entre os eixos da produção - como são formados e com quais características - e o da circulação - de que maneira se difundem. Existe, ainda, o eixo da recepção, que busca avaliar as reações que uma determinada produção cultural suscita no público. No presente texto priorizamos a conexão entre produção e circulação, uma vez que buscamos descrever as representações das mulheres negras difundidas nos filmes de maior público.

Cabe, por outro lado, ponderar que nem todas as representações recaem em estereótipos, o que nos leva a questão: o que é um estereótipo? Stuart Hall chama atenção para a distinção elaborada por Richard Dyer sobre “tipos” e “estereótipos”. Se de um lado os “tipos” são caraterizações que ajudam as pessoas a darem significados ao mundo social, a partir de esquemas classificatórios gerais e não fixos, os estereótipos funcionam por meio de simplificações exageradas (Stuart HALL, 1997, p.258). Para o autor, os estereótipos são formatados a partir de quatro lógicas: (1) essencialização (2) reducionismo; (3) naturalização das diferenças; e (4) formação de oposições binárias. A representação de grupos humanos por meio de poucas e simples características envolve sua essencialização e redução. A naturalização, por sua vez, consiste em afirmar a diferença como algo pertencente à vida cotidiana, intrínseca à realidade e, nesse sentido, pouco suscetível à contestação, tal como a representação de uma “verdade” universal e fixa. Ao contrário do que se inscreve no campo da cultura, que é passível de modificação, a construção de algo como “natural” normatiza as diferenças e estabiliza imaginários sobre papeis sociais relacionados aos grupos. A demarcação dessas posições não é uma prática neutra, envolve relações de poder que fixam oposições binárias: negros e brancos, mulheres e homens, racionais e passionais etc (HALL, 1997). A crítica feminista salienta como a representação das mulheres é associada sempre ao mundo privado, às atividades de cuidado e à vida familar. Tal caracterização se constrói como o “Outro” do masculino, que aparece dedicado às tarefas de prestígio e ao desfrute do espaço público (Simone BEAUVOIR, 1967).

Como os estereótipos envolvem posições assimétricas, nas quais situam-se o enunciador e o enunciado, em sociedades com desigualdades agudas a reprodução desses esquemas representativos tende a ser mais presente (HALL, 1997). Estereótipos não podem ser reduzidos à mera irrealidade: as experiências cotidianas das pessoas influenciam na formação de estereótipos, do mesmo modo que estes afetam as percepções e identidades (Flávia BIROLI, 2011; Verônica DAFLON, 2014). Além disso, a conexão dos estereótipos com as relações de poder não é restrita à dicotomia dominados/dominadores: as pessoas em posições de desvantagem podem mobilizar estereótipos como instrumentos de luta política e resistência (Antônio Sérgio GUIMARÃES, 2002; Paulo NEVES, 2005 apud. BIROLI, 2011), e há quem identifique nos personagens estereotipados a possibilidade de subversão dos papeis negativos (Noel CARVALHO, 2005).

Ainda que existam formas de utilização estratégica dos estereótipos e resistência aos mesmos, é importante considerar que essas práticas de representação também são atravessadas por desigualdades no que se refere a sua capacidade de circulação (BIROLI, 2011). As produções cinematográficas apoiadas pelas Organizações Globo, por exemplo, são difundidas através de uma extensa estrutura de propaganda, que não pode ser equiparada às possibilidades de divulgação de filmes independentes. Daí nossa escolha de estudar os filmes de maior público, pois seu impacto social é potencialmente maior.

Em vista da dificuldade de aferir a circulação de filmes nos mais diversos espaços em que eles são difundidos - internet, locadoras etc -, utilizamos os dados de público fornecidos pela Agência Nacional do Cinema (Ancine). A seleção das narrativas de maior público busca captar se o cinema brasileiro populariza para as mulheres negras o que Iris Young (1990: 58) caracteriza como “imperialismo cultural”, uma forma de opressão que dissemina significados estabelecidos de modo exterior ao grupo representado, invisibilizando suas próprias narrativas ao mesmo tempo em que reproduz estereótipos.

Os estereótipos não são sempre imaginados como negativos: a representação das mulheres pardas ou “mulatas” como símbolo sexual faz parte de uma iconografia festejada dentro de uma concepção de nação brasileira miscigenada. Não obstante, essas representações encobrem a violência sofrida pelas mulheres como fruto da hiperssexualização dos seus corpos (DAFLON, 2014). A figura da “mulata” costuma ser apresentada como um objeto sexual ao qual não é creditado a possibilidade de reconhecimento mútuo em relações de amor e afeto (FERES JÚNIOR, 2006). Trata-se de um tipo de preconceito racial que inscreve no corpo marcas de inferioridade, nesse caso, a não aptidão a relações mais profundas. É esta faceta dos estereótipos que pretendemos observar: em síntese, buscamos examinar a regularidade de representações que confinam as mulheres negras - pretas e pardas - a posições singulares de alteridade em relações sociais diversas.

Em O Negro Brasileiro e o Cinema, João Carlos Rodrigues utiliza a noção de “arquétipo”, inspirada “no sentido junguiano de símbolos que exprimem sentimentos de apelo universal” (RODRIGUES, 2011, p. 22). Com inspiração no trabalho do antropólogo Pierre Verger, que descreveu características das divindades afro-brasileiras, o autor elabora uma tipologia dos papeis exercidos por atores/atrizes negros/as no cinema brasileiro cujos significados seriam forjados pela imaginação e os sentimentos ambivalentes dos brancos; alguns oriundos da escravidão e outros não. A literatura e os personagens de programas de televisão orientam, em conjunto com o protagonismo do cinema, a apresentação de 13 arquétipos sobre os/as negros/as: “preto velho” (simpáticos, bondosos, religiosos, transmitem sabedoria), “mãe-preta” (sofredora, conformada e abnegada), “mártir” (forte, resistente aos infortúnios da vida), “negro de alma branca” (consegue se desvencilhar de condições adversas, bem-educado, busca integração com os brancos), “nobre selvagem” (digno, batalhador), “negro revoltado” ou “militante politizado” (belicoso, rebelde, revolucionário), “negão” (sexualizado, pervertido, insaciável), “malandro” (ambivalente, instável, violento, sincero), “favelado” (honesto, trabalhador, sambista, humilde, amedrontado, marginal), “crioulo doido” ou “nega maluca” (ingenuidade, infantilidade, simpática, comicidade), “mulata boazuda” (beleza, vaidade, irritabilidade, vulgaridade, deboche, prostituição), “musa” (pudica, respeitável) e “afro-baiano” (negro que procura reafirmar seus traços culturais). Além da oscilação dentro de cada arquétipo - o favelado, por exemplo, pode ser trabalhador ou marginal - Rodrigues também evidencia outras derivações, como o “pivete”, que transita entre as características do “malandro” e do “crioulo doido”.

A edição mais recente do livro apresenta uma filmografia lançada até 2010 e totaliza 229 casos. No entanto, ficam de fora algumas produções de grande público em que figuraram protagonistas negras (Amarelo Manga (2003), Amor por Acaso (2010), As Alegres Comadres (2003), Baixio das Bestas (2007), Flordelis (2009), Mulheres do Brasil (2006), Narradores de Javé (2004), Saneamento Básico (2007),Mais Uma Vez Amor (2005)). Se a quantidade de personagens masculinos negros na história do cinema já é maior do que a de mulheres negras, essas ausências injustificadas aumentam a desproporção entre os grupos de gênero e, ademais, excluem produções que obtiveram destaque no mercado audiovisual. Uma pesquisa que intenta construir a história do negro no audiovisual nacional não pode, ou ao menos não deveria, menosprezar a participação feminina. Adelia Sampaio é um caso notório do problema desse descuido, uma vez que ela foi a primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem no país -Amor Maldito (1984) - e não é sequer mencionada. Este filme é um marco tanto pelo gênero e raça da diretora, como por representar um tema raro no cinema brasileiro: a relação amorosa entre duas mulheres.

Embora ao longo de seu texto Rodrigues narre episódios de resistência e contestação, tais como a experiência do Teatro Experimental do Negro, de Abdias Nascimento, ou as reivindicações de artistas e intelectuais negros pela presença de personagens mais individualizados, o autor parece sugerir, a título de conclusão, que a responsabilidade pela situação de subalternidade no mundo das artes é da própria população negra, ou seja, acaba por reduzir uma questão social mais ampla aos mesmos estereótipos identificados em sua obra: a imagem do negro associada ao samba e à cerveja - aspectos centrais na figura do malandro.

Invocar apenas a falta de dinheiro não esclarece nada, pois muitos eventos sobre negros continuam a ter uma maioria de brancos na plateia, enquanto as rodas de samba e cerveja seguem repletas. Na realidade, parece existir ainda um profundo desinteresse do negro brasileiro por qualquer atividade intelectual reflexiva sobre si próprio (sic) . Contenta-se em “ser negro”, o que vem a ser mais um típico sintoma neocolonial do nosso subdesenvolvimento. Essas questões cruciais podem ser respondidas apenas pela própria comunidade, e isso só acontecerá quando ela tiver de si mesma uma visão menos idealizada e autocomplacente, sem cair na armadilha isolacionista do multiculturalismo e mantendo suas características sincréticas e antropofágicas (RODRIGUES, 2011, p. 151).

Não deixa de ser sintomático que uma das principais obras brasileiras a reunir a filmografia de tramas com participantes negras/os redunde em afirmações tão desconexas em relação ao caráter estrutural das desigualdades sociais que atingem as pessoas em virtude de sua raça. Pretendemos, nas próximas linhas, oferecer uma análise com recorte metodológico mais bem delimitado e com especial atenção ao grupo social mais atingido pelas desigualdades no cinema, as mulheres negras.

É importante ressaltar que o intuito deste trabalho é abordar as possíveis recorrências de papeis sociais específicos relacionados ao grupo e não instituir julgamento moral sobre tais papeis ou acerca das críticas sociais vigentes nas tramas. A noção de que o cinema representa a realidade pode servir de base para justificar que a maioria dos personagens em situação de pobreza sejam negros, uma vez que estes são os mais atingidos por desigualdades sociais. No entanto, a representação de uma realidade não pode servir para ignorar as outras. A repetição de poucas características para grupos amplos da sociedade sugere mais a reprodução de preconceitos, do que uma correspondência clara com a população.

Metodologia: fontes, critérios e período

O escopo dos filmes apreciados foi feito com base nos dados do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA) da Agência Nacional do Cinema (Ancine). Devido à concentração de público em poucas obras, selecionamos os 20 primeiros colocados em listagens anuais, em um espaço temporal que cobre 13 anos (de 2002 a 2014). Em 2014, por exemplo, foram lançados 114 filmes, mas os 20 mais exitosos em quantidade de espectadores foram responsáveis por 94% do total de pessoas que compareceram às salas de exibição. Já em 2002, ao excluirmos os longas-metragens documentais e infanto-juvenis, sobraram apenas 18 lançamentos. Vale notar que desconsideramos esses dois gêneros cinematográficos (documentário e infanto-juvenil) por acreditar que eles requerem marcos analíticos diferentes. A amostra totalizou 257 produções audiovisuais, pois retiramos também o filme 5x Favela. Em virtude da grande quantidade de diretores, roteiristas, personagens e narrativas, que, contudo, são ambientadas no mesmo tipo de espaço urbano - a favela - e compõem curta-metragens, acreditamos que se trata de um caso desviante.

Os estudos quantitativos que observaram a diversidade no cinema brasileiro seguiram dois padrões na seleção de personagens: de um lado a delimitação em protagonistas (ALVES; ALVES; SILVA 2011; ALVES; COELHO, 2015; ALVES DE ALMEIDA; ALVES, 2016) e de outro a consideração daquelas que obtiveram falas ou foram nomeadas (SMITH, CHOUEITI e PIEPER, 2015). Na tentativa de expandir a análise para além dos protagonistas, nosso critério inicial foi apurar todas/os as/os personagens que apareciam de três modos nos meios de divulgacão dos filmes: (1) destaque relevante no trailer, (2) menção nas sinopses disponíveis no site do Cineclick (www.cineclick.com.br) e (3) presença nos cartazes oficiais. Essa fase totalizou 1.181 personagens que, em seguida, foram analisadas segundo o seu protagonismo nas narrativas.

Além da distribuição por gênero, computamos a identidade racial das atrizes, que foi atribuída pelo método da heteroclassificação, isto é, a partir do exame de fotografias encontradas em sites de busca. Dúvidas acerca da identificação de alguns personagens foram submetidas a seguidos turnos de classificação por mais de uma codificadora. As categorias utilizadas correspondem àquelas adotadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): branca, preta, parda, amarela e indígena (Rafael OSÓRIO, 2003, p.7). Esse meio de aferição de cor não é destituído de problemas, mas também tem vantagens, como apontam Campos e Machado (2015): classificações raciais são fluídas e há o problema ético de impor identidade a outro ser humano, no entanto, quando este esforço é feito coletivamente, a classificação tem maior probabilidade de corresponder às percepções consensuais vigentes numa dada sociedade. Ademais, pesquisas recentes têm mostrado que os dados resultantes do processo de heteroclassificação se assemelham aos provenientes da autodeclaração (DAFLON, 2014). Por fim, é praticamente impossível obter a autodeclaração racial de atrizes e atores, o que nos força a escolher entre determinar tal identidade ou não fazer a pesquisa.

Resultados: sub-representação e estereótipos

Três tipos de publicidade são muito frequentes na indústria audiovisual: trailer, sinopse e cartaz de divulgação. Com o intuito de mensurar a participação das mulheres negras no cinema brasileiro de modo mais abrangente, exibimos no Gráfico 1 a distribuição de personagens constatadas nesses meios, de acordo com gênero e raça. Os dados explicitam a intensa desigualdade racial no elenco dos filmes, uma vez que 79% dos personagens foram interpretados por atrizes e atores de cor branca. Por outro lado, o cruzamento entre gênero e raça demonstra que as mulheres negras (2% de cor preta e 3% de cor parda) têm a menor representatividade, perfazendo apenas 5% do total de 1.181 personagens classificados. A exclusão racial é mais evidente quando comparamos a presença dos distintos grupos na população: no censo demográfico de 2010, pretos e pardos somados são 50,7% (43,1% se autodeclara de cor parda e 7,6% de cor preta). Já os indivíduos de cor branca são 47,7%, os autodeclarados de cor amarela 1,1% e os indígenas 0,4%.

Gráfico 1: proporção de personagens no elenco principal dos filmes de maior público segundo gênero e raça. Fonte: Elaboração própria a partir de dados da Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA). 

Ao olharmos para os filmes, por sua vez, encontramos protagonismo de mulheres negras em apenas 7% das narrativas (n=257). A definição de protagonismo das atrizes levou em conta o significado literal do termo no dicionário. O Houaiss (www.houaiss.uol.com.br) define que protagonista é o “principal personagem de uma peça de teatro, de um livro, de um filme, uma telenovela etc”. Desse modo, produções como Noel, o Poeta da Vila (2007) e Garrincha - Estrela Solitária (2003), apesar de darem destaque significativo, respectivamente, às personagens Ceci, de Camila Pitanga, e Elza Soares, de Thaís Araújo, ficaram de fora da quantificação por terem no cerne das suas estórias personagens masculinos. Outros casos emblemáticos foram Na Quebrada (2014) e S.O.S Mulheres ao Mar (2014). Em ambos, personagens negras têm visibilidade, mas Jerson, papel de Jorge Dias, e Adriana, papel de Giovanna Antonelli, são as referências centrais nas tramas. De qualquer forma, à exceção de Elza Soares, que é um personagem biográfico, esses filmes não destoam do lugar comum dado às protagonistas negras. Ceci é prostituta, Na Quebrada tem a periferia como cenário e problematiza a escassez de oportunidades profissionais dadas às/aos jovens, e S.O.S Mulheres ao Mar retrata a sua única personagem negra de relevância como empregada, pouco instruída, com falas em mal português, abordadas por um viés de comicidade.

Nos filmes em que mulheres negras (pretas e pardas) foram personagens com protagonismo, a classe social predominante é a baixa. No entanto, em alguns casos foi possível verificar narrativas que destoam de estereótipos, ainda que isso represente uma proporção marginal do total de produções classificadas na pesquisa. Das obras selecionadas, seis tinham protagonistas de cor preta, onze de cor parda e uma tinha duas protagonistas, uma preta e outra parda. O protagonismo desse grupo foi encontrado nas seguintes narrativas: Made in China (2014), de Estêvão Ciavatta; Totalmente Inocentes (2012), de Rodrigo Bittencourt Ramos; Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios (2012), de Beto Brant; Capitães de Areia (2012), de Cecília Amado; Amor por Acaso (2010), de Márcio García; Flordelis (2009), de Marco Antonio Ferraz; Antônia (2007), de Tata Amaral; Baixio das Bestas (2007), de Cláudio Assis; Saneamento Básico (2007), de Jorge Furtado; Ó Pai Ó (2007), de Monique Gardenberg; Mulheres do Brasil (2006), de Malu de Martino; Filhas do Vento (2005), de Joel Zito Araújo; Mais uma Vez Amor (2005), de Rosane Svartman; Quanto Vale ou É por Quilo (2005), de Sérgio Bianchi; Bendito Fruto (2005), de Sérgio Goldenberg; Narradores de Javé (2004), de Eliane Caffé; As Alegres Comadres (2003), de Leila Hipólito; e, Amarelo Manga, (2003) de Cláudio Assis. Vale destacar que nos anos de 2002, 2008 e 2013 nenhuma produção de maior público foi protagonizada por uma mulher negra.

Além da baixa participação nos elencos e da ausência nas atividades de direção e roteiro, o grupo feminino de cor preta ou parda só figura em dois filmes do gênero romance. Nos demais estilo de ficção, é predominantemente acompanhado por estereótipos.

A fim de explicitar a maneira como essas representações são construídas, propomos a seguir uma tipologia de estereótipos das mulheres pretas e pardas: (1) mulata; (2) favelada; (3) crente; (4) trombadinha; (5) revoltada ou militante; (6) empregada; e, (7) batalhadora. Além disso, mostramos os poucos casos desviantes, nos quais não foram encontrados papeis estereotipados. Acreditamos que a posição de subalternidade das mulheres negras no cinema brasileiro de grande público requer dedicação especial às particularidades de descrição dos papeis sociais desenvolvidos às personagens. Por isso, a tipologia proposta por nós neste artigo difere da de Rodrigues (2011), uma vez que o autor não dá destaque à participação feminina na reconstituição da história dos negros no audiovisual do país.

“Mulata”

O papel simbólico da mulata como ícone nacional foi difundido por diferentes meios culturais, da literatura à televisão (Mariza CORRÊA, 1996; RODRIGUES, 2011). E no cinema não é diferente: este perfil foi o mais recorrente entre as personagens de cor preta ou parda. Por um lado, trata-se de um estereótipo que festeja a sensualidade, por outro, a mulata aparece como produtora de dissenso social, marcada pela imoralidade e afastada do reino da conjugalidade. Enquanto a versão da identidade nacional baseada em uma suposta harmonia racial confere ao mulato a possibilidade de agência na construção do país e, até certo ponto, de seu próprio destino, a mulata é restrita a figurar como objeto de desejo principalmente para brancos. Em seu estudo pioneiro, Corrêa (1996) já destacava o processo de invenção da mulata brasileira, que é duplamente exposta a questões de gênero e raça. Sônia Giacomini (2006) define a figura da mulata como presa entre dois polos, o de dançarina e o de prostituta. A autora também captura a reificação da mulata na cultura popular.

Tal processo de estereotipação das mulheres negras não é restrito ao Brasil. bell hooks identifica o emprego de estereótipos desumanizadores nas representações estadunidenses, associados à imagem da mulher negra como selvagens sexuais, prostitutas, desleais e amorais (hooks, 1982). Mas o caso brasileiro parece apresentar peculiaridades. A mulata, em particular, devido à ambiguidade de sua representação, às vezes aproximada do padrão de beleza da branquitude, serviu para operar a rejeição à negra preta (CORRÊA, 1996). A década de 1950 ofereceu abertura para que as mulatas se transformassem em símbolos sexuais e em referências de beleza. Não obstante, esse processo foi bastante incompleto, uma vez que diversos papéis abertos a serem representados por mulheres negras acabaram sendo interpretados por mulheres brancas (RODRIGUES, 2011).

As pornochanchadas da década de 1970 contém alguns exemplos extremos da construção de um imaginário hiperssexualizado acerca das mulheres mulatas. Filmes como Amulata que queria pecar (1977) e A gostosa da gafieira (1981) expressam, em seu próprio título, os papéis sociais definidos para essas mulheres, tanto no que toca à sexualidade, como aos tipos de profissão ou lugares de frequência (RODRIGUES, 2011). Nossa pesquisa mostra que no cinema brasileiro da atualidade esse estereótipo se encontra em 50% das obras que incluem protagonistas classificadas na cor parda.

A repetição de tal estereótipo associado às mulheres negras é acompanhada também da recorrência da atuação das mesmas atrizes. Camila Pitanga interpreta prostitutas, ou o estereótipo da “mulata”, em grande parte das produções das quais faz parte. Em Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios, a personagem Lavínia é salva da prostituição e das drogas por um pastor evangélico, de cor branca, que se casa com ela. A trama não acaba por aí e gera mais substância ao estereótipo da “mulata”, infiel que não se prende ao reino da conjugalidade, quando expõe o caso de Lavínia com o amante Cauby, personagem de Gustavo Machado. O marido descobre a traição, agride Lavínia e se mata. Com o ocorrido, a protagonista resvala para a loucura. Assim como havia ressaltado Rodrigues (2011), as raras representações de relacionamentos interraciais no cinema brasileiro quase sempre incorrem em finais trágicos. Outro filme em que Camila Pitanga assume o papel de “mulata” é Saneamento Básico. Nesta produção, ela não é prostituta, mas tem a beleza como sua principal característica e é objeto de desejo de praticamente todos os homens da trama. Nas duas narrativas, ela aparece sem roupa.

A última personagem de Camila Pitanga a se encaixar nesse estereótipo está no filme Mulheres do Brasil, de Malu de Martinho. Esmeralda, interpretada pela atriz, é voluptuosa, moradora de uma cidade de interior, filha de uma família tradicional e mimada pelo pai. Desde cedo ela namora escondido e não demonstra inclinação para se envolver de maneira apaixonada com os homens. Ao se mudar para a cidade grande afim de estudar, a trama sugere que a personagem passa a sobreviver como acompanhante de políticos e homens importantes. O desfecho de Esmeralda é o retorno à casa da mãe após longa depressão, fruto da perda do filho que esperava, após apanhar e ser xingada pelo pai da criança, um político de quem era amante. Pitanga ainda atuou no papel de prostituta como coadjuvante nos filmes Redentore - conforme referido acima -, em Noel, o Poeta da Vila.

Dira Paes, classificada como de cor parda, é outra atriz que interpreta recorrentemente personagens que se encaixam no estereótipo de “mulata”. A personagem Psilene de Ó Pai Ó retorna ao seu local de nascimento, a cidade de Salvador, depois de passar anos no exterior tentando ganhar a vida como prostituta. O seu destino é morar de favor no cortiço em que a irmã vive. Já a Bela de Baixio das Bestas enfrenta um final pior. Ao ir se prostituir com três homens, é violentada sexualmente, aparece sem roupa e aparentemente assassinada, em uma das cenas mais fortes do cinema nacional. A personagem dizia gostar de safadeza e não manifestava nenhuma empatia por suas companheiras profissionais, hostilizando as mulheres que não gostavam de se prostituir e, inclusive, comemorando a agressão sofrida por uma delas. Este caso mostra, mais do que todos os outros, o teor desumanizador, tal como menciona bell hooks, presente na construção de estereótipos (hooks, 1982). Sentimentos complexos não fazem parte do papel de Bela, que parece restrito à sexualidade e à misoginia.

Por fim, em Totalmente Inocentes, Gildinha, personagem de Mariana Rios, interpreta uma mulher cobiçada por todos da comunidade em que mora. Ainda que não seja uma prostituta, ela utiliza sua condição de objeto do desejo para conseguir uma entrevista com o bandido chefe do morro e assim ficar famosa no meio jornalístico. Ao mesmo tempo que figura como batalhadora, Gildinha é impetuosa e aproveitadora. O estereótipo de “mulata” nessa personagem se cruza com o de “favelada”: ela tem personalidade forte, é moradora de favela e se relaciona com os traficantes da região. Contudo, trata-se de uma comédia “água com açúcar” e o seu final é a felicidade amorosa.

“Favelada”

Os estereótipos relacionados à favela envolvem temáticas como pobreza, criminalidade, violência, drogas, trabalho e samba. Em geral, o estereótipo do “favelado” é atribuído aos homens, como mostram filmes relevantes na produção cinematográfica nacional, tais como Rio 40 Graus e Cidade de Deus (RODRIGUES, 2011). No entanto, a seleção das protagonistas negras mostrou que, dentre as poucas personagens de cor preta, o estereótipo da “favelada” foi o único a se repetir. Além de Gildinha, mencionada anteriormente e que é classificada como parda, o filme Antônia expõe o cotidiano de um grupo de mulheres de cor preta que buscam viver do rap. Moradoras de periferia, as personagens têm que lidar com a violência local e com as dificuldades de sobrevivência em termos de ganhos de trabalho. Apesar do grupo de rap ser composto por quatro amigas, duas personagens têm maior protagonismo: Preta, interpretada por Negra Li, e Barbarah, representada por Leilah Moreno. Preta é batalhadora e sustenta a filha sozinha, enquanto o marido perfaz o estereótipo do malandro. Barbarah, também batalhadora, é presa por envolvimento em um assassinato, ao agredir o jovem que bateu em seu irmão. O final da trama narra sua saída da prisão, o reencontro das amigas e o sucesso musical do grupo. O filme é construído com ênfase na força das mulheres, que se empenham no dia-a-dia e não se intimidam perante provocações. Na linguagem popular, a característica associada às personagens poderia ser descrita pelo termo “barraqueira”.

O samba é pano de fundo para outra protagonista que se encaixa no estereótipo da “favelada”. No já mencionado, Mulheres do Brasil, a personagem Telma, interpretada por Roberta Rodrigues, mora em uma casa pequenina no alto da favela, junto com a mãe. O objetivo que norteia a vida de Telma é ser porta-bandeira de uma escola de samba vitoriosa no carnaval. Ambientada em cenário de pobreza, a personagem trabalha dia e noite costurando a fantasia que vai usar, sem se importar com a perda do emprego que garantia o próprio sustento. Após tentar suicídio, motivada pela decepção com um incidente no dia do desfile, Telma sobrevive e termina feliz com a notícia de que sua escola foi campeã do carnaval.

A última personagem entre as atrizes pretas e pardas que se encaixa no papel de favelada” está em uma produção de teor biográfico e interage com outro estereótipo, o de “crente”. O filme Flordelis narra a história real de uma pastora, cujo nome é o título do filme. A personagem é moradora de favela e se envolve em situações conflituosas, a fim de ajudar as pessoas da comunidade. Relações com tráfico, prostituição e adoção de crianças abandonadas são temas abordados no filme, que termina com a carreira bem-sucedida de Flordelis como líder religiosa. Mesmo que a narrativa da película exiba situações verídicas, a repetição de personagens negras em cenários de pobreza, drogas, prostituição e enfrentamento de criminalidade confirma mais uma vez a abertura limitada que a produção audiovisual concede para a representação dessas mulheres. Uma observação importante é que das 16 mulheres que integram o filme, apenas 4 são negras, uma de cor parda e três de cor preta.

“Crente”

O estereótipo da mulher “crente” reproduz a religião evangélica como aspecto principal das vivências e diálogos de uma personagem. É assim com Flordelis, classificada como de cor preta; com Kika, interpretada por Dira Paes em Amarelo Manga; e com Dona Joana, personagem de Luciana Souza em Ó pai Ó, ambas de cor parda. O moralismo com apelo à religião conduz a narrativa de Kika e Dona Joana. Kika é casada e fiel ao marido. No entanto, ao descobrir que é traída, muda seu comportamento, se envolve sexualmente com outro homem e se vinga da amante do marido. Do estereótipo da “crente”, que é passiva e subserviente aos desejos do marido, se converte na imagem de uma mulher com agência, impetuosa, mais próxima do estereótipo da “mulata”. Em semelhança a outros filmes interpretados por Dira Paes - como o referido acima, Baixo das Bestas -, esta trama apresenta a atriz em cenas de nudez explícita. Já Dona Joana conserva o estereótipo de “crente”, fortemente moralista e, por vezes, um pouco sonsa. O final trágico que acomete a personagem envolve a morte de seus dois filhos, crianças de cor parda que, ao brincarem na rua, são confundidas com “trombadinhas” e, assassinadas por um policial corrupto e justiceiro.

“Trombadinha”

Carvalho (2011) sugere que a fobia dos brancos é uma das motivações das construções estereotipadas do “outro” racializado. Um exemplo disso é a figura do “pivete”, usualmente associado a personagens masculinos, ou do “trombadinha”, que caracteriza menores de idade, frequentemente moradores de rua, que efetivam pequenos delitos. Inspirado na obra de Jorge Amado, o filme Capitães de Areia conta a estória de crianças de rua em situação de marginalidade social. Dora, interpretada por Alessandra Storch, vivencia a pobreza com seu irmão e cuida de todos a sua volta. É importante notar que se trata da única criança parda a protagonizar um filme de maior público nos últimos anos, e que a sua trajetória é associada ao sofrimento, à criminalidade e a um final trágico: a morte violenta.

“Revoltada” ou “militante”

Não raro, escritores excluem as mulheres de papéis sociais mais agressivos ou com poder de agência forte. João Carlos Rodrigues (2011), ao formular sua listagem de arquétipos no cinema brasileiro, defende que há uma evolução do “negro revoltado” ao “militante politizado”. O primeiro é vinculado ao contexto da escravidão e da revolta perante à privação de direitos, enquanto o segundo é situado na dinâmica política do presente. Essa caricatura, conforme o autor, seria associada apenas a personagens masculinos, que vislumbram utopias, reagem a situações opressoras e são usualmente destinados ao fracasso. No cinema brasileiro de maior público, encontramos uma versão feminina desse estereótipo, a personagem Arminda, interpretada por Ana Carbatti, atriz de cor preta, em Quanto Vale ou é Por Quilo. Militante e batalhadora, ao acompanhar a atuação corrupta de organizações da sociedade civil e de políticos, ela se revolta e denuncia a exploração cínica dos problemas sociais. O filme termina com o assassinato de Arminda e a impunidade dos mandantes.

“Empregada”

A “mãe preta” é um estereótipo oriundo da escravidão, que é comum tanto no Brasil, quanto nos Estados Unidos. A mammie ou “mãe preta” é o papel da mulher negra inquestionavelmente subserviente, que abdica de interesses pessoais para cuidar da família dos brancos (hooks, 1982; HALL, 1997; RODRIGUES, 2011). O sofrimento e a conformidade frente a determinadas posições sociais acompanham essa representação, atualmente vinculada à figura da “empregada”. No filme Bendito Fruto, o único da nossa amostra do gênero romance a conter uma mulher de cor preta como protagonista, é narrada a história de Maria, interpretada por Zezeh Barbosa. O longa-metragem retrata o romance do patrão branco com a empregada e não deixa de imputar a Maria as características usuais da “mãe preta”. A personagem é apaixonada por Edgar, seu patrão, que a trata com carinho apenas às escondidas. Edgar tem vergonha de assumir sua relação com Maria por ela ser negra. A insatisfação de Maria com o tratamento concedido por Edgar só é expressa quando o personagem começa a flertar com um amor do passado, uma mulher branca. No final do filme, descobrimos que Edgar é pai do filho de Maria, mas não o reconheceu como tal. A despeito de todo o racismo explícito na trama, ela tem um “final feliz”, com a união dos dois.

“Batalhadora”

O estereótipo de “batalhadora” não aparece na literatura usual sobre o assunto. Mas, além de integrar uma série de estereótipos já listados, ele também define outra personagem parda que aparece como protagonista. Esses casos representam lutas cotidianas por sustento e constante busca de soluções para adversidades da vida. Mesmo que não constitua um estereótipo negativo, ele é quase lugar comum na representação de mulheres de cor preta e parda, trabalhadoras e de classe social baixa. Na recente produção Made in China, Regina Casé interpreta Francis, vendedora de uma loja no Saara - principal zona de comércio popular do Rio de Janeiro -, humilde, esperta, com pouco dinheiro e de bom coração. Fora o personagem da atriz, o filme retrata os chineses de forma bem estereotipada e reafirma o imaginário da “popozuda” como representante da mulher brasileira ideal.

Outros casos

Os sete estereótipos listados até agora, quando ponderados apenas do ponto de vista das questões raciais, apresentam a regularidade do que Stuart Hall (1997) chamou de “regime racializado de representação”, que consistena repetição de imagens que atribuem significados aos grupos em virtude de sua raça. Os estereótipos de revolta, relacionados à favela ou aos pequenos delitos - furtos e roubos - costumam ser associados aos homens negros, mas também podem ser aplicados às mulheres (CANDIDO, CAMPOS e FERES JÚNIOR, 2016). Por outro lado, os estereótipos de “mulata”, “crente” e “empregada” sugerem um “regime generificado de representação”, que designa desde a hiperssexualização da mulher negra, até a moralização do seu comportamento e a restrição de suas atividades a funções do âmbito privado.

Nem todos os filmes apresentam estereótipos tão claros. Alguns, na verdade, trabalham para romper com esse tipo de construção essencializada, fato que demonstra que tais representações não são naturais ou inevitáveis. Entre todas as produções analisadas, destacam-se nesse quesito: Filhas do Vento, As Alegres Comadres e Narradores de Javé. Em Amor por Acaso e Mais uma Vez Amor, por sua vez, nos deparamos com a figura da mulher romântica.

Filhas do Vento, de Joel Zito Araújo, tem a particularidade de tematizar as dificuldades impostas pelo racismo à inclusão das mulheres negras nas novelas. É um filme dirigido por um militante pela participação dos negros nos meios de comunicação. A construção de personagens mais complexas e a maior participação de protagonistas negras e negros são aspectos destacados em estudos sobre a obra (Cláudia LAHNI; Nilson ALVARENGA; Mariana PELEGRINI; Maria PEREIRA, 2006). As personagens Maria da Ajuda e Maria Aparecida, protagonistas de Filhas do Vento, e de cor preta, têm suas trajetórias de vida acompanhadas desde a juventude até a maturidade. Quatro atrizes são responsáveis pela interpretação das duas personagens principais em seus diferentes períodos de vida. Maria da Ajuda é representada por Talma de Freitas na juventude e Léa Garcia na maturidade, e Maria Aparecida é interpretada por Thaís Araújo e Ruth de Souza, respectivamente.

O filme As Alegres Comadres, outra produção com uma protagonista preta, carrega um teor particular por narrar a amizade entre duas mulheres que partilham da mesma posição social, uma de cor branca e outra de cor preta. Elisa Lucinda interpreta a senhora Rocha, esposa de um rico comerciante. O papel destinado às amigas é igual não só na classe, como também nas relações pessoais. Ambas são mulheres decididas e fiéis aos maridos. Os estereótipos comuns das mulheres negras não integram essa narrativa. Entretanto, em relação aos papéis de gênero, o filme reitera o lugar das personagens femininas no âmbito privado, preocupadas apenas com aspectos de vida sentimental e doméstica.

Em Narradores de Javé, a personagem Deodora foge às representações comuns concedidas às mulheres pardas, pois é apresentada de forma complexa e não estereotipada. No filme dirigido por Eliane Caffé, os personagens formulam histórias sobre a pequena cidade em que vivem, com o objetivo de criar um imaginário de relevância social para evitar a desapropriação do território. Dentre outros protagonistas, a personagem de Luci Pereira, Deodora, mulher de personalidade marcante, conta uma versão da história da vizinhança que concede destaque à atuação feminina.

Por fim, Juliana Paes, atriz cuja classificação de cor foi ambivalente - às vezes definida como branca e às vezes como parda -, é um caso particular por reforçar em dois filmes o o papel da “mulher ideal”. Márcia, de Amor por Acaso, é independente e exerce cargo de chefia. Também independente, Lia, de Mais uma Vez Amor, é uma mãe representada como “encalhada”. Trata-se, respectivamente, de filmes do gênero comédia e comédia romântica. Mais uma Vez Amor é o único romance com alta comercialização na produção nacional dos últimos anos a retratar uma protagonista de cor “parda”. A ambivalência com que Paes é identificada em exercícios de percepção racial pode explicar sua entrada em papeis usualmente designados a atrizes brancas. Além disso, o fato de não corresponder a um estereótipo racial não isenta essas representações de evidenciarem preconceitos de gênero.

Considerações Finais

O presente artigo teve como objetivo apresentar um panorama da representação das mulheres negras no cinema brasileiro e contribuir para a crítica feminista por meio da proposta de uma tipologia de estereótipos atenta exclusivamente ao grupo. Apesar de diversos estudos nacionais buscarem discutir desigualdades no audiovisual, eles não costumam examinar a interação entre raça e gênero, nem considerar um corpus abrangente de filmes. O esforço de João Carlos Rodrigues (2011) em reconstituir a história do negro nos longas-metragens produzidos no país é extenso, mas padece de um evidente viés de gênero, excluindo importantes participações de mulheres negras.

Este trabalho combinou dados quantitativos com análises qualitativas e buscou mapear a presença e os tipos de representação destinados às mulheres negras. Inicialmente localizamos as produções que continham mulheres negras (pretas e pardas) em seus elencos principais, o que nos levou somente a 2% de personagens interpretadas por atrizes de cor preta e 3% de cor parda. Entre os anos de 2002 e 2014, 22 personagens protagonizaram 18 filmes. Vale, mais uma vez, mencionar que nos anos de 2002, 2008 e 2013, nenhuma mulher de cor preta ou parda exerceu tal função.

Não bastasse a sub-representação, a análise das personagens encontradas ressalta narrativas pouco diversas e, muitas vezes, trágicas. Quase 1/3 das protagonistas tiveram desfechos bastante distintos do tradicional “final feliz” dos filmes. Mais da metade das personagens de cor preta foi representada por meio de estereótipos, sendo eles, o da “favelada”, da “crente”, da “militante”/“revoltada” e da “empregada. Para as mulheres de cor parda, o imaginário da “mulata” sexualizada foi o que mais se repetiu, na maioria das vezes, em associação à prostituição. O estereótipo da “crente” também esteve presente. E, por fim, o da “trombadinha” e o da “batalhadora”.

As posições associadas às mulheres negras (pretas e pardas) nos filmes foram em grande maioria de subalternidade e falta de reconhecimento social. Atividades precárias e vivência em comunidades pobres são características comuns direcionadas a elas. No outro extremo, em filmes nos quais as protagonistas encontraram representações positivas, como em Filhas do Vento e Alegres Comadres, as personagens desfrutavam de condições sociais melhores. Contudo, a existência dessas exceções não altera o fato do uso corrente de estereótipos derrogatórios e de profunda sub-representação: as mulheres negras (pretas e pardas) protagonizam apenas 7% do total das tramas estudadas.

Embora o cinema brasileiro tenha passado por transformações consideráveis ao longo dos últimos anos, o padrão estrutural de representação das mulheres negras ainda não evidenciou mudanças significativas. Os estereótipos, fontes de preconceitos e discriminações, mostraram-se recorrentes quando as protagonistas pertenciam ao grupo. Qualquer sugestão de que o audiovisual espelha a realidade, ao invés de ser fonte de discriminação e sexismo, esbarra na limitação dos resultados: as mulheres negras no mundo real estão longe de terem sua existência inscrita exclusivamente no espaço doméstico, ou reduzida a objetos de sexualização e agentes de dissimulação.

A estereotipação, o insulto e a negação do reconhecimento são também formas de expressão humana. Alguns podem até argumentar que elas não devem ser banidas pois sem transgressão e alguma violência simbólica a arte se torna agente normalizador e moralista. Nada impede, contudo, que identifiquemos a ocorrência dos estereótipos e tentemos determinar quais os grupos sociais atingidos por eles - isso só contribui para uma maior consciência crítica individual e coletiva acerca de tais práticas de representação e para aguçar o debate em torno delas. Por fim, a maior parte dos estereótipos identificados aqui não tem nada de transgressivos. Pelo contrário, eles redundam na reafirmação de preconceitos tradicionais com os quais a sociedade brasileira tem historicamente tratado aqueles que não passam em seu teste de branquitude.

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MADE in China. Direção: Estêvão Ciavatta. Brasil, 2014. Gênero: Comédia. 96min. [ Links ]

MAIS uma Vez Amor. Direção: Rosane Svartman. Brasil, 2005. Gênero: Romance/ Comédia. 82min. [ Links ]

MULATA que Queria Pecar. Direção: Victor Di Mello. Brasil, 1977. Gênero: Comédia. 82min. [ Links ]

MULHERES do Brasil. Direção: Malu de Martino. Brasil, 2006. Gênero: Drama. 113min. [ Links ]

NA Quebrada. Direção: Fernando Andrade. Brasil, 2014. Gênero: Drama: 94min. [ Links ]

NARRADORES de Javé. Direção: Eliane Caffé. Brasil, 2004. Gênero: Drama. 100min. [ Links ]

NOEL, o Poeta da Vila. Direção: Ricardo Van Steen. Brasil, 2007. Gênero: Drama. 99min. [ Links ]

Ó Pai Ó. Direção: Monique Gardenberg. Brasil, 2007. Gênero: Comédia/ Comédia Musical. 96min. [ Links ]

QUANTO Vale ou É por Quilo. Direção: Sérgio Bianchi. Brasil, 2005. Gênero: Drama. 110min. [ Links ]

SANEAMENTO Básico. Direção: Jorge Furtado. Brasil, 2007. Gênero: Comédia. 112min. [ Links ]

S.O.S Mulheres ao Mar. Direção: Cris D’Amato. Brasil, 2014. Gênero: Comédia. 96min. [ Links ]

TOTALMENTE Inocentes. Direção: Rodrigo Bittencourt Ramos. Brasil, 2012. Gênero: Comédia. 90min. [ Links ]

1Agradecemos aos comentários de Luiz Augusto Campos, Graziella Silva e Verônica Toste à primeira versão deste texto.

6Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: CANDIDO, Marcia Rangel; FERES JÚNIOR, João. “Representação e estereótipos de mulheres negras no cinema brasileiro”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 27, n. 2, e54549, 2019.

Financiamento: FAPERJ; Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação (INCT/CAPES), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES), Processo n. 88887.352809/2019-00.

9Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

10Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica

2Translated into English by Filipe dos Santos Avila and Meggie Rosar Fornazari (Universidade Federal de Santa Catarina).

3We would like to thank Luiz Augusto Campos, Graziella Silva, and Verônica Toste for their comments on the first draft of this text.

Recebido: 15 de Dezembro de 2017; Revisado: 24 de Julho de 2018; Revisado: 11 de Outubro de 2018; Aceito: 01 de Novembro de 2018

marciarangelcandido@gmail.com

jferes@iesp.uerj.br

Marcia Rangel Candido (marciarangelcandido@gmail.com) é doutoranda e mestra em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ). Foi pesquisadora visitante na Universidade de Cambridge - com bolsa CAPES/PDSE -, na Universidade de Coimbra (UC), na Universidad Nacional de Cuyo (UNCuyo) e na Universidad Nacional de San Martín (UNSAM), respectivamente no Reino Unido, em Portugal e na Argentina. No Brasil, é vinculada ao Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação (CAPES/Brasil-INCT) e atua como pesquisadora associada no Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP), assim como subcoordenadora de pesquisas no Observatório das Ciências Sociais (OCS) e no Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (GEMAA), todos sediados no IESP-UERJ. É colaboradora da Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) em pesquisas sobre desigualdades e produção intelectual; integra o Comitê Executivo da Rede de Pesquisas em Feminismos e Política. No âmbito da editoração, foi assistente do periódico DADOS - Revista de Ciências Sociais, integrou durante quatro anos o comitê editorial da Cadernos de Estudos Sociais e Políticos (CESP) e é idealizadora do site Horizontes ao Sul. Trabalha principalmente em quatro áreas, com especial atenção às desigualdades de gênero, raça e região geográfica: (1) análise da produção e circulação do conhecimento em ciência política e sociologia; (2) mídia e política; (3) cinema brasileiro; e (4) divulgação científica.

João Feres Júnior (jferes@iesp.uerj.br) possui graduação em Ciências Sociais e mestrado em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas (1988 e 1997) e mestrado e doutorado em Ciência Política pela City University of New York, Graduate Center (1998, 2003). Foi professor de Ciência Política do IUPERJ de 2003 a 2010 e da UNIRIO de 2010 a 2012. É, desde 2010, professor de Ciência Política do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da UERJ. É coordenador do GEMAA - Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (http://gemaa.iesp.uerj.br/), do LEMEP - Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública, do OLB, Observatório do Legislativo Brasileiro, e do OCS - Observatório das Ciências Sociais. Tem publicações nas áreas de teoria política, história dos conceitos, políticas públicas, relações raciais e estudos de mídia. Trabalha atualmente com os seguintes temas: mídia e esfera pública, mídia e eleições, teoria política, políticas de ação afirmativa, relações raciais e teoria da história conceitual.

Contribuição de autoria: Marcia Rangel Candido - A autora elaborou o primeiro manuscrito do artigo e formatou a versão final. Contribuiu na concepção do argumento, elaborou a revisão bibliográfica, a coleta e a análise de dados. João Feres Júnior - O autor contribuiu substantivamente na concepção dos argumentos do artigo, na elaboração do manuscrito e discussão de resultados.

Conflito de interesses: Não há conflitos

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