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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.28 no.2 Florianópolis maio/ago. 2020  Epub 01-Maio-2020

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2020v28n270010 

Artigos

Na luta para mudar o mundo: mulheres, reprodução e resistência na América Latina

In the Struggle for Changing the World: Women, Reproduction, and Resistance in Latin America

Silvia Federici1 

Luciana Benetti Marques Valio2 
http://orcid.org/0000-0003-2795-1538

1New College Hofstra University, Hempstead, NY, USA. 11549-1000.

2Universidade Estadual de Campinas, Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais, Campinas, SP, Brasil. 13083-854 - ppgav@unicamp.br


Resumo:

Resistência e ação coletiva são características de mobilizações sociais organizadas por mulheres na América Latina desde a década de 70, muito embora os arranjos desse processo tenham alcançado notória visibilidade nos últimos anos. No momento em que suas comunidades foram submetidas ao poder de destruição do capitalismo, do patriarcalismo e da degradação do meio ambiente, as mulheres latino-americanas uniram-se e, por meio de seus esforços, traduzidos em ações coletivas pela transformação do trabalho cotidiano, social e reprodutivo, promoveram uma nova definição de política e democratização. Nesse contexto particular de espaço, tempo, vida e corpo humano, voltado a uma única perspectiva, surgiram o conceito de comum e a adoção de práticas organizacionais pautadas pelo princípio da horizontalidade. O ativismo dessas mulheres, cujo panorama é tecido no presente artigo, é, segundo as palavras da autora, Silvia Federici, uma força importante para a mudança social na América Latina e uma inspiração para as feministas e os outros movimentos ao redor do mundo.

Palavras-chave: mulheres; reprodução; resistência; América Latina

Abstract:

Resistance and collective action are characteristic of the social movements organized by women in Latin America since the 1970s, even though many of the arrangements of this process have reached high visibility only in recent years. When their communities were subjected to the destructive power of capitalism, patriarchy and environment degradation, latin-american women came together and, through efforts translated into collective action for the transformation of daily social and reproductive work, brought about a new definition of politics and democratization. In this particular context of space, time, life and human body aligned in the same perspective, the concept of commonality arose and, with it, the adoption of organizational practices based on horizontality. The activism of these women, as presented in this article, is an important force for social change in Latin America and an inspiration for feminists and other movements around the world.

Key Words: Women; Reproduction; Resistance; Latin America

O impeachment de Dilma Roussef no Brasil, a profunda crise política e econômica na Venezuela, e a vitória do candidato centro-direita, Mauricio Macri, nas eleições presidenciais de 2015 na Argentina, indicam que chega ao fim uma fase da política Latino-Americana.1 Chega ao fim a ilusão, acolhida por muitos, de que o surgimento dos “progressistas”, dos governos aprendizes de esquerda, poderiam transformar as políticas regionais, implementar as reformas pelas quais durante décadas os movimentos sociais têm lutado, e promover a justiça social. Em geral, esses objetivos não foram alcançados. Seguindo o exemplo da “Revolução Bolivariana” da Venezuela, os governos de Evo Morales, Rafael Correa, Néstor Kirchner e Cristina Fernández de Kirchner, e Luiz Inácio Lula da Silva transferiram parte das receitas de seus países para o setor público com programas assistenciais que subsidiaram a educação infantil e outras necessidades básicas. Graças a isso, as formas mais extremas de pobreza foram atenuadas. Contudo, tais medidas estão muito aquém das expectativas dos movimentos sociais. Tomando o Brasil como exemplo, calcula-se que pelo menos trinta milhões de pessoas foram beneficiadas com os programas assistenciais adotados pelo governo de Lula. Entretanto, as despesas com o bem-estar social representaram apenas um décimo do valor transferido para as mineradoras e para as indústrias do agronegócio que continuaram a desempenhar um papel hegemônico nas políticas do país. Como o extrativismo2 continuou sendo o modelo para o desenvolvimento econômico, a reforma agrária - defendida pelos movimentos que levaram o Partido dos Trabalhadores de Lula ao poder - não foi realizada. Em vez disso, continuou crescendo a concentração de terras em poucas mãos, uma das piores no continente, e as terras dos povos indígenas permaneceram sob ataque direto em nome da modernização.

Enquanto isso, a violência policial não foi refreada. De acordo com estatísticas oficiais, somente no Rio de Janeiro cerca de 5.130 pessoas, em sua maioria jovens negros moradores de rua, foram mortos pela polícia entre 2005 e 2014. Tais fatos talvez expliquem por que - apesar de o caráter inconstitucional e fraudulento da saída de Roussef ser amplamente condenado - relativamente poucas pessoas das classes mais baixas foram às ruas para exigir sua reintegração. Para citar uma membra do grupo brasileiro Mães de Maio (2016), cujo filho foi morto pela polícia em São Paulo em 2006, “eu não vou chorar pela Dilma, porque para nós, nas favelas, a ditadura nunca acabou”.3

Com variações locais, o modelo brasileiro de desenvolvimento “progressista”, com sua mistura de assistencialismo e extrativismo e sua dependência na economia orientada para exportação, como a base para a distribuição igualitária de riqueza, é o caminho que tem sido adotado pelos governos da Bolívia, do Equador e da Argentina. Como Alberto Acosta e Decio Machado (2012) apontam,

governos progressistas não são exceção. Enquanto articulam uma retórica anti-imperialista, populista e nacionalista, centrada no [em impulsionar] consumo interno, eles fomentam a expansão do capital extrativista internacional... Progresso, crescimento e desenvolvimento são os pilares em que os governos considerados mais radicais baseiam seus projetos para o futuro (p. 82).

O Chavismo também, apesar de maior apoio do poder popular, dependeu da extração do petróleo para subsidiar seus programas sociais, deixando de lhes dar uma base econômica em longo prazo não dependente dos caprichos do mercado global de commodities.

No entanto, embora o chamado progressismo tenha falhado em cumprir suas promessas, e agora testemunhamos uma tomada institucional pela direita no Brasil e na Argentina, pode ser um erro concluir que a mudança radical chegou ao fim na região. Na América Latina e em outros lugares, a mobilização social alcançou tal nível de intensidade que, conforme argumentou tão perspicazmente o teórico social uruguaio Raúl Zibechi (2012), “sociedades inteiras, não somente movimentos sociais, estão se mobilizando. Milhões de homens e mulheres das camadas mais baixas, impulsionados pela necessidade, mobilizaram-se por duas décadas e, ao fazê-lo, mudaram não somente o mundo, mas também a si mesmos” (p. 7). O mais importante é que, ao resistirem aos ataques causados pela expansão das relações capitalistas, criaram formas cooperativas de existência, propiciando uma visão de como seria uma sociedade não capitalista. As mulheres são as principais protagonistas nesta mudança. Enquanto escrevo, mais de 70 mil mulheres de toda a América do Sul se reúnem em Rosário, na Argentina, para o Encontro Nacional de Mulheres, que se realiza anualmente em outubro, e agora está em sua 31ª edição. Elas têm como objetivo discutir o que deve ser feito, e quais estratégias adotar para mudar o mundo. Tal mobilização em massa, surgindo no momento de realinhamento das políticas institucionais latino-americanas, não é apenas de um sinal da grande lacuna existente atualmente entre as políticas oficiais e as políticas dos movimentos sociais de base; é também a expressão do papel de liderança que as mulheres desempenham na resistência popular contra o capital nacional e global.

Embora a resistência das mulheres à opressão política e à exploração econômica tenha sido uma constante na história da América Latina desde os primórdios da dominação colonial, atingiu novos níveis desde 1970, a década quando a região foi exposta às consequências devastadoras da globalização e da agenda neoliberal. Por sofrerem diretamente as consequências das crises que afetam suas comunidades, as mulheres, por sua vez, criaram formas mais autônomas de reprodução social, ao refazerem a trama comunitária, rompida pelas políticas econômicas brutais e pelo terrorismo do estado. O ativismo das mulheres é atualmente uma força importante para a mudança social na América Latina e uma inspiração para as feministas e os outros movimentos ao redor do mundo. Ao desafiar as forças destrutivas do capitalismo, do patriarcalismo e da destruição ecológica, as mulheres estão construindo novas formas de existência que rejeitam a lógica de mercado e as políticas mais recentes sobre a reprodução da vida cotidiana, canalizando o poder das relações afetivas que tradicionalmente caracterizaram a esfera doméstica na produção da solidariedade social. Seus esforços redefinem aquilo que entendemos por “política” e “democratização” e recodificam o feminismo, transformando o trabalho cotidiano, social e reprodutivo em ação coletiva que converte os bairros em comunidades de resistência à exploração capitalista.

Mulheres rurais lutam por terra, por território e pelo bem comum

Como se sabe, o novo protagonismo político das mulheres surgiu em resposta à crise econômica que envolveu a América Latina desde a metade da década de 1970, após a reestruturação econômica imposta à maioria dos países latinos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pelo Banco Mundial, sob pretexto de um “ajuste estrutural”. Tanto no contexto rural como no urbano, as mulheres formaram uma resistência primária ao desemprego em massa e ao empobrecimento que se seguiu ao desmantelamento do setor público e à política de liberalização de importação, a qual destruiu as economias locais. Suas atividades moveram-se em duas direções diferentes. Por um lado, as mulheres engajaram-se em intensas lutas para defender o “bem comum” - as terras, as florestas e as águas, assim como os bairros ameaçados pela gentrificação - e, assim, defender o mundo dos valores culturais, sistemas de conhecimento e identidades sociais que são destruídos quando a terra é envenenada e as comunidades deslocadas. Por outro lado, saíram de suas casas em busca de novas formas de emprego e de renda, muitas vezes por meio da migração, para os centros metropolitanos, para outros países, ou para as ruas, onde deram origem a uma nova microeconomia de negociação e venda, incluindo a venda de sexo.

Tais desenvolvimentos não são surpreendentes. As mulheres desempenham um papel central nas lutas ecológicas por serem as mais afetadas pela desapropriação e pela degradação ambiental, por serem responsáveis pela reprodução de suas famílias. São as mulheres que cuidam dos que adoecem por causa da contaminação pelo petróleo, porque a água usada para cozinhar, lavar e limpar é tóxica, e porque a desnutrição é decorrência da perda da terra e da destruição da agricultura local. Por esses motivos, as mulheres hoje em dia permanecem na linha de frente contra as corporações transnacionais de mineração e do agronegócio que invadem áreas rurais e envenenam o meio ambiente. Segundo apontou a estudiosa e ativista equatoriana Lisset Coba Mejía (2016, p. 7), são as mulheres que, na região amazônica, lideram a luta em defesa da água. São também as principais oponentes contra a extração de petróleo, conscientes de que isso prejudica suas atividades produtivas e “exacerba o machismo”; pois os salários pagos aos homens pelas indústrias petrolíferas aprofundam as desigualdades de gênero, aumentam o consumo de álcool, e intensificam a violência contra as mulheres (Esperanza MARTÍNEZ, 2014, p. 42-45). “Nós não podemos alimentar nossas crianças com petróleo”, diz a líder quíchua Patricia Guallinga (2014), de Sarayaku, uma aldeia na floresta amazônica. “[N]ós não queremos alcoolismo, não queremos prostituição, não queremos homens que nos agridem. Nós não queremos essa vida, porque mesmo se nos dão escolas, banheiros, e casas de zinco, isso retira nossa dignidade” (GUALLINGA, 2014, p. 48-50).

Tal oposição levou as mulheres a um confronto direto com o presidente Rafael Correa, cujo auge foi em 16 de outubro de 2013, quando cem líderes de organizações de mulheres indígenas, com suas crianças nos braços, caminharam de suas terras na floresta tropical até Quito em resposta à decisão de Correa de abandonar seu plano de conservação e iniciar a extração de petróleo no Parque Nacional Yasuní, lar de um dos ecossistemas mais diversos da Terra. Seguiam o exemplo de milhares de outras mulheres que, um ano antes, haviam marchado para a capital para defender as águas de seus territórios contra um projeto de mineração contratado pelo governo de Correa com a empresa chinesa Ecua Corriente. Entretanto, numa demonstração de arrogância e desrespeito, consistente com sua reputação como o mais misógino dos presidentes equatorianos, Correa recusou-se a receber as protestantes contra o projeto petrolífero.4

Na Bolívia, também, as mulheres indígenas desmascararam o “progressismo” do governo, em especial, a proclamação de Morales em defesa da Pachamama (Mãe Natureza), liderando marchas em 2011 e 2012 contra a construção de uma rodovia que, de acordo com os planos do governo, atravessaria a Terra Indígena e o Parque Nacional Isiboro Sécure. Como sempre, as mulheres providenciam a infraestrutura de apoio necessária para as marchas, desde comidas a cobertores, e organizam a limpeza dos acampamentos construídos ao longo da estrada de maneira a garantir que os homens participantes fizessem sua parte (Helen VIERREIRA, 2012). Mulheres indígenas/camponesas, em conjunto com as redes feministas, como a Marcha Mundial das Mulheres, estiveram também no coração da Cumbre de los Pueblos, encontro dos movimentos sociais que se reuniram pela última vez no Rio de Janeiro em junho de 2012, na ocasião do Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável realizada vinte anos após a Cúpula da Terra da ONU de 1992.5

Uma característica dos novos movimentos de mulheres é o processo de radicalização política que eles refletem. Cada vez mais, as mulheres se conscientizam de que seu ativismo deve não apenas proteger as vidas de suas comunidades contra as atividades das companhias transnacionais e lutar - por exemplo, pela soberania alimentar ou contra a engenharia genética de sementes -, mas deve também transformar o atual modelo de desenvolvimento econômico em outro que respeite o ser humano e a terra. Elas consideram que os problemas enfrentados não provêm apenas de políticas ou de empresas específicas, mas estão enraizados na lógica mercenária da acumulação de capital, a qual, atualmente, com a promoção de uma “economia verde”, está tornando a limpeza do meio ambiente um novo recurso para a especulação e o lucro.

Outro aspecto dessa radicalização é a crescente assimilação pelas mulheres rurais/camponesas/indígenas das questões levantadas pelo feminismo popular, tais como: a desvalorização do trabalho doméstico, o direito das mulheres de controlarem seus corpos e suas capacidades reprodutivas, e a necessidade de resistirem à crescente violência contra a mulher. Esse processo foi desencadeado não por meio de considerações ideológicas, mas pelas muitas contradições que as mulheres experimentaram em suas vidas cotidianas, inclusive nas próprias organizações em que participam. As mulheres identificam uma completa conexão entre a mercantilização da natureza e a mercantilização de seus corpos, e reconhecem que o capitalismo estimula um modelo de desenvolvimento que gera violência contra elas. Um primeiro obstáculo encontrado por muitas mulheres em suas lutas foi a discriminação sofrida nas mãos dos homens de suas famílias, e até mesmo por seus próprios companheiros de lutas.

Típico é o caso das mulheres zapatistas, cujo papel crucial na despatriarcalização de suas comunidades torna-se cada vez mais aparente. Como bem documentado em Compañeras, de Hilary Klein (2015), e em Des-ordenando el géner/¿Des-centrando la nación?, de Márgara Millán (2014), o rumo do zapatismo desde o início de sua existência tem sido direcionado por mulheres que, ainda muito jovens, juntaram-se aos primeiros grupos que se reuniam nas montanhas dos Chiapas, a fim de mudar suas condições de vida, assim como lutar contra a opressão institucional. Por meio de suas iniciativas no movimento e com base em suas ideias e demandas, a Lei Revolucionária das Mulheres foi adotada em 1993, a qual, como Klein (2015) aponta, “dada a realidade das mulheres indígenas nos Chiapas rural naquele tempo... representava uma posição radical e... implicou uma série de mudanças dramáticas” (p. 72). Os dez pontos da lei estabeleceram o direto das mulheres de participar da luta revolucionária do jeito que elas desejavam, de acordo com suas capacidades; de decidir o número de filhos que têm e cuidam; de escolher seus parceiros e não serem obrigadas a se casar; de participar nos assuntos da comunidade e ocupar cargos de poder se livremente e democraticamente eleitas; e de ocupar posições de liderança na organização e manter postos militares nas forças armadas revolucionárias6 (p. 71). Nas palavras de Klein (2015), a adoção da lei foi um “momento divisor de águas” que “transformou a vida pública e privada nas comunidades Zapatistas” (p. 72). As mulheres entenderam, no entanto, que seu trabalho não havia acabado, e após a Lei Revolucionária das Mulheres ser publicada, algumas viajaram pelos territórios zapatistas para promover sua aplicação. Nas palavras citadas por Klein (2015):

Isso nunca parou - sabe? Continuamos trabalhando e continuaremos trabalhando com a próxima geração de crianças, de jovens, para deixar para trás as más ideias, os maus costumes de nossos avós... Podemos dizer que as mulheres zapatistas sabem quais são seus direitos. Elas sabem sobre a Lei Revolucionária [mas]... [n]ós ainda estamos transformando o que foi escrito, o que foi defendido e o que foi analisado em uma realidade (p. 73).

A luta para proibir o álcool, na verdade, é muito anterior à revolta de San Cristóbal, pois, anos antes, as mulheres zapatistas identificaram a embriaguez como a principal causa da violência contra elas.7 O significado dessa iniciativa é resumido por um grupo de mulheres entrevistado por Klein (2015) no Caracol, em Morelia, um dos cinco lugares do governo zapatista:

Quando as mulheres começaram a organizar isso foi porque sofremos muito com nossos maridos. Vimos muitas mulheres serem abusadas e agredidas por seus próprios maridos, e tínhamos que fazer alguma coisa sobre essa situação... Na organização, a vida das mulheres mudou e não somos mais tão oprimidas.

Antes, quando os homens bebiam, ser abusada era parte da vida das mulheres, mas agora não é mais assim... Marchamos levantando bandeiras e fomos à prefeitura para pressioná-los a promulgar a lei seca. Havia cerca de 250 mulheres de diferentes comunidades. Bradamos e gritamos (p. 62).

Após a proibição ser aprovada em 1994, postos de controle foram instituídos ao redor da região para evitar a entrada do álcool. As mulheres continuaram a organizar marchas para forçar a proibição e, em um caso, quebraram as janelas de um lugar onde os homens se reuniam para beber cerveja (KLEIN, 2015, p. 66).

Um outro sinal da crescente conscientização feminista é o surgimento da nova postura crítica entre as mulheres indígenas em referência às estruturas patriarcais que governam as relações de propriedade de suas comunidades e, principalmente, a transmissão de terras, que geralmente ocorre de maneira patrilinear. Essa “inclusão diferencial” (Gladys TZUL TZUL, 2016, p. 71-76) tem grandes consequências, segundo assinala Tzul Tzul (2016), acadêmica/ativista indígena da região de Totonicapán, na Guatemala, “no que diz respeito ao registro da propriedade da família, à tutela das crianças e ao significado simbólico de ter filhos fora do casamento” (TZUL TZUL, 2016, p. 168). Mulheres que se casam fora de seu grupo étnico correm o risco de suas crianças serem excluídas do acesso à terra compartilhada comum ao clã. Diante disso, as mulheres insistiram vigorosamente por seus direitos nas assembleias comunais, nas marchas e nas festas. O desafio, argumenta Tzul Tzul (2016), é como mudar esse costume sem recorrer à titulação individual da terra, estratégia defendida pelo Banco Mundial, desde a Quarta Conferência Mundial sobre as Mulheres em Pequim, em 1995, a qual legitima a tendência em direção à privatização da terra. Em seus esforços para construir relações mais igualitárias em suas comunidades, as mulheres de Totonicapán não estão sozinhas. As mulheres indígenas reconheceram que o patriarcalismo coloca em risco as sociedades comunitárias, porque a incapacidade da liderança masculina para mudar leva as mulheres ao êxodo da terra. Ironicamente, o que muitos homens podem interpretar como um ato de hostilidade, a rejeição da supremacia masculina em todas as suas formas, é a condição necessária para uma maior coesão na comunidade e um comprometimento mais forte com seu futuro. Uma estratégia utilizada pelas mulheres no movimento indígena para acabar com sua marginalização foi a criação de espaços autônomos para as mulheres. Um exemplo é o Hijas del Maíz, um espaço de encontros das mulheres equatorianas de comunidades camponesas e indígenas das regiões costeiras, das montanhas e da Amazônia. “Muito mudou na vida de nosso povo”, disse Blanca Chancosa (2014), uma das fundadoras. “Os homens migraram… [e] quem ficou […] são as mulheres. Isso significa que precisamos saber mais para continuar… É por isso que precisamos de um espaço para as mulheres onde possamos discutir nossas ideias” (p. 51-53). Uma estratégia similar de busca por autonomia para ampliar a participação social das mulheres tem sido a formação dos movimentos campesinos constituídos exclusivamente por mulheres. Um exemplo é o Movimento de Mulheres Camponesas do Brasil que, de acordo com Roxana Longo (2012), “vê a si mesmo como feminista e recupera a teoria e a prática do movimento feminista” (p. 151). Formado em 1983, quando as populações rurais começaram a sentir os efeitos negativos da “revolução verde”,8 essa aliança de mulheres envolvidas no trabalho agrícola lutou para transformar a identidade social das mulheres camponesas - para serem reconhecidas como trabalhadoras e como cidadãs (muitas não tinham carteira de identidade) e para obterem o direito à seguridade social. Em 1995, formou uma rede nacional de grupos de mulheres camponesas e de mulheres de movimentos camponeses mistos que conseguiram conquistar a licença maternidade remunerada e lutaram para defender os serviços públicos de saúde (LONGO, 2012, p. 156-157). Também se engajaram em uma variedade de ações de protesto contra as atividades das corporações transnacionais, pois sabiam que sua presença significava o fim de suas comunidades, uma vez que a terra é envenenada e morre por causa do uso de produtos químicos e da monocultura, a produção local desaparece, assim como a história e a cultura da comunidade.

Como as participações políticas aumentaram, as mulheres se conscientizaram sobre a necessidade de autoeducação e formação política. Trata-se, agora, de elementos comuns na maioria das organizações de mulheres, porque elas se confrontam com forças sociais cuja lógica é moldada a nível internacional, o que requer uma compreensão das políticas internacionais. Combinadas com a autoconfiança adquirida por meio do ativismo social, tais práticas criaram novas formas de subjetividade que contrastam com a imagem, ainda propagada pelas instituições internacionais, da mulher camponesa - ancorada no passado, conhecedor apenas de práticas em vias de extinção. As mulheres camponesas na América do Sul estão longe de se preocupar apenas com seus direitos locais de cultivo e do bem-estar de suas famílias. Elas participam das assembleias onde as decisões são tomadas, desafiam o governo e a polícia, e se veem como as guardiãs da terra, pois são menos facilmente cooptadas do que os homens, os quais frequentemente são seduzidos pelos salários prometidos pelos governos e pelas corporações transnacionais - salários que dão mais poderes a eles sobre as mulheres, alimentando a cultura machista que encoraja a violência contra elas (Mirabel ÁLVAREZ, 2014, p. 57).

Um fator que encoraja o papel das mulheres como guardiãs da terra e da riqueza comunal é que elas desempenham o papel principal na preservação e transmissão do conhecimento tradicional. As tejedoras de memoria, “tecedoras de memória”, segundo a teórica-ativista mexicana Mina Navarro (2015, p. 264), formam um importante dispositivo de resistência, porque o conhecimento que elas preservam e partilham produz uma forte identidade e coesão coletiva em face à desapropriação (p. 248). Crucial neste contexto é a participação das mulheres indígenas no novo movimento, pois trazem consigo uma visão de futuro profundamente moldada pela conexão com o passado e um forte senso de continuidade entre o ser humano e a natureza. É com referência às “cosmovisões” que caracterizam as culturas indígenas na América Latina, que algumas indígenas feministas cunharam o termo “feminismo comunitário”, em que o conceito de comum é entendido para expressar um único ponto de vista com uma concepção específica de espaço, tempo, vida e corpo humano. Segundo relata Francesca Gargallo (2013) em seu Feminismos desde Abya Yala, feministas comunitárias, tais como a feminista xinca, Lorena Cabnal, da Guatemala, têm contribuído com novos conceitos como corpo-território, o qual olha para o corpo como um continuum com a terra, com ambos possuindo memória histórica e ambos implicados igualmente no processo de liberação (GARGALLO, 2013, p. 227). No entanto, embora defendam suas origens ancestrais, as feministas comunitárias rejeitam o patriarcalismo de suas culturas indígenas tanto quanto aquele plantado pelos colonizadores, bem como o que descrevem como “fundamentalismo étnico” (GARGALLO, 2013, p. 230-237, 245). Rejeitam os elementos heterossexistas das crenças cosmogônicas indígenas, seu dualismo de gênero, e veem sua tarefa como construir novas cosmovisões liberadas que considerem os seres humanos e seus corpos vivendo em harmonia com as árvores, as pedras e as montanhas (GARGALLO, 2013, p. 249). Nesse sentido, o feminismo comunitário não é apenas a defesa de um mundo já estabelecido de valores culturais, mas, ao contrário, a produção de um vocabulário político diferente que podemos descrever como novos comuns, ou seja, novas formas de cooperação, divisão de riquezas e solidariedade.

A luta das mulheres e a produção dos comuns urbanos

A luta no campo continua na cidade, à medida que homens e mulheres que se deslocam da terra formam novas comunidades nas áreas urbanas, ocupando os espaços públicos, construindo abrigos, estradas, bodegas, tudo por meio do trabalho coletivo e da tomada de decisão em comum. Novamente, as mulheres assumiram um papel de liderança neste processo. Como escrevi em outro lugar (Silvia FEDERICI, 2017), é nas periferias das megacidades em expansão da América Latina, nas áreas ocupadas principalmente pela ação coletiva e diante da permanente crise econômica, que as mulheres estão criando uma nova economia política baseada em formas cooperativas de reprodução social, estabelecendo seus “diretos à cidade” e abrindo caminho para novas práticas de resistência e regeneração.9

O mais conhecido exemplo dessa “revolução silenciosa” foi a propagação da agricultura urbana, um fenômeno global iniciado em 1970 pelas mulheres na África que, expulsas das áreas rurais e forçadas a urbanizarem-se, começaram a cultivar em lotes vazios da terra pública, transformando as paisagens das cidades e borrando os limites entre rural e urbano.10

Igualmente importante tem sido a socialização das atividades socialmente reprodutivas, como fazer compras, cozinhar e costurar. Esse processo começou como um contraponto aos efeitos dos programas de austeridade que, já nos anos 1970, foram impostos pelos governos e pelas agências econômicas internacionais como o FMI e o Banco Mundial para as comunidades de classe trabalhadora em nome da recuperação econômica e reembolso da dívida nacional. Após o golpe militar de 1973 no Chile, por exemplo, as mulheres nos assentamentos proletários, paralisadas por medo e submetidas a um programa de austeridade brutal, reuniram seus trabalhos e recursos, começando a fazer compras e cozinhar em conjunto, em equipes de vinte ou mais pessoas nos bairros onde moravam. Criadas pela necessidade, essas iniciativas produziram muito mais do que uma expansão de recursos limitados. O ato de se reunirem, rejeitando o isolamento imposto pelo regime de Pinochet, transformou qualitativamente suas vidas, dando-lhes autoestima e rompendo com a paralisia induzida pela estratégia de terror do governo. Isso também reativou a circulação de informações e de conhecimentos essenciais à sobrevivência e à resistência, e transformou o conceito do que significa ser uma boa mãe e esposa, contribuindo para a sua redefinição ao sair de casa e participar nas lutas sociais.11 Por meio dessas iniciativas, o trabalho de reprodução social deixou de ser uma atividade puramente doméstica e individual; o trabalho de casa foi para as ruas ao lado das grandes ollas (panelas) e adquiriu uma dimensão política.

Tais políticas não evitaram a atenção das autoridades, que encaravam a organização das cozinhas populares como atividades comunistas subversivas. Em resposta a essa ameaça ao poder, a polícia iniciou um ataque às “panelas” nos bairros. Conforme algumas das mulheres envolvidas nas cozinhas populares recordaram-se:

Sara: Com 300 pessoas envolvidas era difícil esconder o que estava acontecendo. Eles vieram e viraram as mercearias de cabeça para baixo, nos mandaram parar de cozinhar e levaram todos os líderes como prisioneiros... Eles vieram muitas vezes, mas a cozinha continuou...

Olga: A polícia chegou: “O que está acontecendo aqui? Uma cozinha comunitária? Então por que vocês estão fazendo isso, se sabem que é proibido?”.

“Porque estamos com fome.”

“Parem de cozinhar!” Eles disseram que era político. Os feijões estavam quase cozidos e tivemos que jogá-los fora... A polícia veio muitas vezes, mas conseguíamos manter a cozinha funcionando, uma semana em uma casa, e na seguinte em outra (Josephine FISHER, 1993, p. 32-33).

É geralmente sabido que tais estratégias de sobrevivência impulsionaram o senso de solidariedade e identidade da comunidade e demonstraram a capacidade das mulheres de reproduzir suas vidas sem serem completamente dependentes do mercado, ajudando a manter vivo, após o golpe, o movimento popular que levou Salvador Allende ao poder. Na década de 1980, era forte o suficiente para montar uma resistência bem-sucedida contra a ditadura. O Chile não era um caso isolado. Iniciativas similares, criando novas formas autônomas e coletivas de reprodução social, proliferaram no Peru, Argentina e Venezuela. De acordo com Zibechi (2012), nos anos 1990, apenas em Loma havia 15 mil organizações populares, fornecendo copos de leite ou café da manhã para crianças e organizando cozinhas públicas e conselhos de bairro (p. 236-239). Na Argentina, as piqueteras - mulheres proletárias, juntamente com seus filhos e muitos outros jovens, tiveram um papel importante em resposta à catastrófica crise econômica de 2001 que durante meses paralisou o país - organizaram bloqueios nas estradas, construíram acampamentos, e montaram piquetes (barricadas) que às vezes duravam mais de uma semana.

Parafraseando o que Zibechi (2003) escreve a respeito das famosas Madres de Plaza de Mayo, podemos dizer que as piqueteras “entenderam a importância de ocupar o espaço público”. Elas reorganizaram suas atividades sociorreprodutivas na rua, cozinhando, limpando e cuidando das crianças e mantendo as relações sociais, no processo de comunicação da paixão que fortaleceu e enriqueceu a luta (Isabel RAUBER, 2002, p. 113). Significativo é o testemunho da pesquisadora em ciências sociais, a cubana Isabel Rauber (2002):

Desde o começo dos primeiros piquetes… a presença das mulheres e de seus filhos foi crucial. Determinadas a não voltar para casa sem algo para colocar em suas panelas, as mulheres iam para os piquetes para defender suas vidas com unhas e dentes. Determinadas a atingir seus objetivos, elas imediatamente participavam e garantiam a organização da vida diária nas barricadas, que muitas vezes duravam mais de um dia. Se as tendas tivessem que ser montadas, se fosse necessário o revezamento para cuidar da segurança dos piquetes, para preparar comida - certamente em conjunto com os homens - para construir as barricadas e defender as posições tomadas, lá estavam as mulheres.

O que Rauber (2002) ressalta - e, eu diria, se aplica às lutas de muitas das mulheres hoje em dia na América Latina e além - é que, como o neoliberalismo desencadeia um ataque genocida sobre os meios de subsistência das pessoas, o papel das mulheres na luta torna-se mais fundamental. As mulheres reconhecem que a luta contra isso deve estar enraizada nas atividades que reproduzem nossas vidas, porque, nas palavras de um militante (masculino), Rauber (2002) cita: “[T]udo inicia-se em nossa vida diária e depois é traduzido em termos políticos. Onde não há vida cotidiana, não há organização, e onde não há organização, não há política” (p. 115).

A visão de Rauber (2002) é confirmada pela consideração de Natalia Quiroga Díaz e Verónica Gago (2014) sobre o movimento das piqueteras, em que argumentam que a crise econômica de 2001 induziu “a feminização da economia e, com ela, uma desprivatização dos recursos necessários à reprodução” (p. 13). Assim que a economia oficial colapsou, quando muitas empresas e até mesmo os bancos faliram, e então as pessoas não puderam resgatar suas economias, uma economia diferente, “feminina”, surgiu. Esta foi inspirada pela lógica do trabalho doméstico, mas organizada coletivamente, no espaço público, e de um jeito que tornou visível o caráter político e o valor social do trabalho reprodutivo. Como as mulheres ocuparam as ruas, levando seus tachos e panelas para os bloqueios nas estradas e para suas assembleias de bairro; com o estabelecimento de redes de troca e vários tipos de cooperativas, emergiu uma economia de subsistência que permitiu a sobrevivência de milhares de pessoas e, ao mesmo tempo, redefiniu o valor e o local de produção.

Mesmo que o movimento das piqueteras tenha se desmobilizado desde então, sua lição não foi esquecida. Ao contrário, o que foi uma resposta imediata à crise se tornou em muitos bairros proletários argentinos uma ampla realidade social, parte de um tecido social mais duradouro. Como Marina Sitrin (2012) documentou, anos após a rebelião de 2002, as assembleias de bairro e as formas de ação coletiva e cooperação que nasceram com os piquetes continuam. É nas villas12 de Buenos Aires que vemos melhor como a recusa ao empobrecimento e à desapropriação que animava os piquetes pode se transformar na construção de um novo mundo. Ali se encontram mulheres que vivem numa situação em que cada momento de suas vidas cotidianas se torna uma instância de escolha política, pois nada é devido a elas e nada lhes é garantido; tudo é ganho por meio da negociação ou pela luta, e tudo deve ser continuamente defendido. A água potável e a eletricidade devem ser contratadas com o estado, assim como alguns dos materiais necessários para construir as estradas e evitar que a chuva transforme as ruas em rios de lama. Mas as mulheres que lutam para conquistar estes recursos não esperam e nem permitem, de fato, que o estado organize suas vidas. Cooperando umas com as outras, determinadas a não serem derrotadas e a escapar do empobrecimento social e econômico, elas estão criando novos espaços que não pertencem a ninguém, para coletivamente tomar decisões sobre a reprodução da vida cotidiana, incluindo a prestação de serviços a todos que contribuem. Zibechi (2015) descreve a situação na Villa Retiro Bis, uma das trinta e uma vilas de Buenos Aires:

Aqui tem vizinhos que almoçam nas cozinhas populares… à noite estudam numa escola primária, e socializam na casa das mulheres... Certamente são espaços precários que têm alguns laços com o estado e o mercado, mas esses são mínimos, marginais. O principal é que se trata de empreendimentos sustentados pela ajuda natural, autogestão, cooperação e confraternização (p. 108).

Quando visitei a mesma Villa, em abril de 2015, as mulheres estavam orgulhosas do que haviam conquistado. “Tudo o que você vê”, elas me disseram, “nós construímos com nossas próprias mãos”. E eu pude ver - andando pelas ruas que elas ajudaram a pavimentar, visitando os comedores populares (as cozinhas populares) onde, trabalhando em rodízio, elas serviam centenas de refeições por dia, assistindo a uma apresentação do Teatro do Oprimido que elas organizaram13 - que o espaço onde caminhavam era o espaço delas, não um território alienígena que normalmente percorremos, no qual não temos participação nem meios de controle. Antes da minha visita, quando a cidade de Buenos Aires construiu um muro para impedir a expansão da villa, as mulheres imediatamente derrubaram parte dele, porque disseram, “queremos poder nos mover livremente e recusamos ficar encerradas”.

Enquanto que essa crise da agricultura de subsistência produzida pelas políticas neoliberais resultou muitas vezes na formação dos acampamentos parcialmente autogeridos, tais como aqueles das villas, na Bolívia um fenômeno comum tem sido a proliferação dos vendedores de rua, os quais, em “números incalculáveis”, ocuparam as áreas urbanas e as transformaram em ciudades mercado, “cidades-mercado”, principalmente por meio do “trabalho incessante de milhares e milhares de mulheres” (Lucia LINSALATA, 2015, p. 64-65). Diante do deslocamento das terras rurais e do empobrecimento de suas comunidades, muitas mulheres proletárias assumiram seus trabalhos reprodutivos fora de suas casas e “transformaram os mercados em seu espaço de sua vida diária” onde “cozinham, cuidam de seus filhos, passam suas roupas, assistem TV, visitam-se umas às outras, tudo no alvoroço de comprar e vender” (LINSALATA, 2015, p. 65).

Segundo ressalta Maria Galindo (2011), da organização boliviana anarcofeminista Mujeres Creando, a luta das mulheres bolivianas pela sobrevivência rompeu o universo do lar e da domesticidade. Isso quebrou o isolamento característico do trabalho doméstico, de maneira que a figura da mulher trancada em casa é agora coisa do passado. Em resposta à precarização do trabalho e à crise nos salários masculinos, surgiu uma cultura da resistência. As mulheres se apropriaram das ruas, “convertendo a cidade em um espaço doméstico” (GALINDO, 2011, p. 111-112) onde elas passam a maior parte do tempo vendendo mercadorias (comida, artigos de contrabando, música pirateada etc.) que “barateiam o custo de vida para toda a população”, organizando-se com outras mulheres, confrontando a polícia e, nesse processo, “reinventando sua relação com a sociedade” (GALINDO, 2011, p. 114). Mujeres Creando contribuiu para essa nova apropriação feminina do espaço urbano, abrindo um centro social, a Virgen de los Deseos (Virgem dos Desejos) - a qual Galindo (2011) descreve como “uma máquina reprodutiva” devido a diversas atividades que ocorrem lá - e prestando serviços que são especialmente destinados às mulheres de rua, como creches, venda de comida, transmissão de rádio que as mulheres usam para transmitir notícias de suas lutas ou denunciar abusos que tenham sofrido, e a publicação de materiais político-educacionais.

Vender mercadorias nas ruas pode não parecer uma atividade radical. Mas quem está familiarizado com as intricadas relações sociais que devem ser criadas, especialmente em nosso tempo, para poder ocupar o espaço público de maneira não autorizada pelo estado, sabe que essa impressão está equivocada. Para as mulheres que compõem a maioria de vendedores ambulantes, criar tais condições que lhes permitam passar a maior parte de seu dia na rua, garantir a segurança de seus produtos - especialmente dos ataques da polícia - e trabalhar em paz umas com as outras, coordenando o uso compartilhado de espaço e de tempo, bem como as atividades de limpeza e precificação, é necessária uma quantidade substancial de negociação e elaboração de políticas. Uma vez atendidos, esses esforços criam um contrapoder que as autoridades não podem ignorar. É por esta razão que, ao redor do mundo, os governos montam campanhas de “limpeza”, usando pretextos de melhorias sanitárias e embelezamento para destruir as presenças que ameaçam seus planos urbanos e que, pela ocupação do espaço público, a própria visibilidade representa uma ameaça à sua autoridade.

Um exemplo de ameaça a qual os ambulantes estão expostos é a criminalização da União Popular de Vendedores Ambulantes “28 de Outubro” (UPVA), uma organização de vendedores de mercadorias, atualmente em sua maioria liderados pelas mulheres, situada na cidade mexicana de Puebla, que recentemente declarou-se inimiga pública do Presidente Enrique Peña Nieto.14 Com alguns de seus parentes do sexo masculino e líderes da organização na cadeia ou ameaçados de morte, num país tristemente famoso por seu alto número de assassinatos políticos, as mulheres da UPVA persistem em seu trabalho. Elas atuam como mães, esposas e vendedoras de rua, já que precisam cuidar daqueles que estão presos e de suas crianças, passando longas horas no trabalho, enquanto assumem também a organização política desse trabalho. Esse cenário gera uma vida difícil, de preocupação constante, sem tempo para descanso ou recreação. No entanto, como é comum nas organizações de mulheres, o que se escuta por meio de suas palavras é orgulho por aquilo que estão realizando, o crescimento individual e coletivo que experimentam em sua compreensão do mundo, sua capacidade de resistir à intimidação, e o respeito por si mesmas e por outras mulheres. É nas palavras de tais mulheres que se vê a possibilidade de um mundo diferente, onde o comprometimento com a justiça social e a cooperação se fundem em uma nova concepção de política que é a antítese daquela geralmente reconhecida. Uma grande diferença que existe são as práticas organizacionais adotadas pelas mulheres da UPVA, inspiradas pelo princípio da horizontalidad e na insistência da tomada coletiva de decisões, frequentemente realizada por meio das assembleias de bairro nas quais todos podem participar.

Será que esses novos poderosos movimentos das mulheres conseguirão resistir ao ataque da expansão das relações capitalistas? Será que elas terão o poder para contestar as tentativas de recolonizar suas terras e comunidades? As respostas a essas questões não estão claras ainda. O que é certo, todavia, é que nos momentos de crise aguda, quando os mecanismos constitutivos da economia política capitalista colapsaram, as mulheres deram um passo à frente e, por meio de seus esforços coletivos, garantiram as formas básicas de reprodução social e romperam a barreira do medo que aprisionou suas comunidades. Quando a crise política e econômica “se normaliza”, a economia alternativa que as mulheres criaram é muitas vezes desmantelada lentamente, mas nunca sem deixar para trás novas formas de organização comunitária e um sentido mais amplo de possibilidades.

Então, como Zibechi frequentemente observou, nas villas na Argentina, México, Peru, como nas comunidades camponesas/indígenas e afrodescendentes da América Latina, um novo mundo e novas políticas estão em formação, os quais, mesmo com o desencadeamento da violência genocida, especialmente contra as mulheres, não podem ser sufocados. É um mundo que dá nova vitalidade à atual noção, muito abusada, dos comuns, ressignificando-a não somente como uma riqueza a ser compartilhada, mas como o compromisso com o princípio que essa vida deve ser a vida digna de ser vivida. No seu centro, como escreveu Raquel Gutiérrez Aguilar (2015), estão a reprodução da vida material, seus cuidados e a reapropriação da riqueza produzida coletivamente, organizada de maneira subversiva, pois está fundamentada na possibilidade de “articulação da atividade humana e da criatividade para os fins autônomos” (p. 126-127).15

Referências

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1 Esse título foi inspirado na declaração da Sempreviva Organização Feminista (SOF), uma organização feminista com sede em São Paulo, que afirma: “a luta para mudar o mundo e para mudar a vida das mulheres faz parte do mesmo movimento”.

2 “Extrativismo” é um termo muito usado na Literatura Latino-Americana para se referir à política ainda agora dominante na região, onde o desenvolvimento econômico é centrado na extração e exportação de matéria-prima com consequências devastadoras para o meio ambiente e para as vidas das pessoas das áreas afetadas. Como escreveu Horacio Machado Aráoz, o extrativismo é “um legado da lógica colonial... a face dos imperialismos nos nossos dias... [uma] expropriação sistemática das energias vitais, da vida enquanto tal, em todas suas formas e dimensões... habituando as pessoas à dor, à fome e à morte” (ARÁOZ, Horacio Machado. “Los Dolores de Nuestra América y la condición neocolonial: Extractivismo y biopolítica de la expropriación”. Observatorio Social de América Latina, v. 13, n. 32, p. 53-56, 63, 2012. Disponível em https://www.clacso.org.ar/libreria-latinoamericana/contador/sumar_pdf.php?id_libro=717. Acesso em 09/2019).

3 O Mães de Maio é um grupo brasileiro formado após o incidente de 2006, no qual a polícia retaliou o assassinato de dois policiais pelo crime organizado, matando centenas de pessoas em uma favela em São Paulo; estatísticas oficiais apresentam o número de mortos em 600 pessoas, mas o Mães de Maio afirma que é o dobro disso. Em 2016, no aniversário do massacre, o grupo publicou um livreto, “Fala N. 3, Guerreira: Especial Mães de Maio, 10 anos, contra o terrorismo do estado” (MÃES DE MAIO, 2016).

4 Sobre a marcha das mulheres líderes amazônicas até Quito, veja “Conversatorio con Ivonne Ramos”, entrevista por Collectivo Miradas Criticas. In: La vida en el centro y el crudo bajo tierra, p. 82-85; veja também p. 69-76.

5 Sobre a participação das organizações de mulheres na Cumbre de los Pueblos, veja Sempreviva Organização Feminista. En lucha contra la mercantilización de la vida: La presencia de la Marcha Mundial de las Mujeres en la Cumbre de los Pueblos. São Paulo: SOF, 2012.

6Veja também Millán (2014, p. 74-81).

7 Sobre a mobilização das mulheres zapatistas contra o álcool, veja Millán (2014, p. 61-66).

8 A chamada revolução verde é um amplo esforço agrícola promovido pelas Nações Unidas, pelos Estados Unidos, e pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) como solução para o empobrecimento da agricultura no Terceiro Mundo. Assim, nos antigos territórios coloniais, consiste na extensão da agricultura industrializada, método já aplicado na Europa e nos Estados Unidos, o qual envolve a construção de barragens para ampliar a irrigação e a aplicação extensiva de fertilizantes, pesticidas e sementes geneticamente modificadas. Nos países que o adotaram (México e Filipinas), a revolução verde aprofundou as divisões de classes e levou a uma maior concentração de terra, bem como à expulsão das áreas rurais de muitos pequenos proprietários de terra, os quais não conseguiram administrar as despesas necessárias para a compra das novas tecnologias agrícolas. Sobre uma crítica da revolução verde, veja (entre outros) SHIVA, Vandana. Monocultures of the Mind: Biodiversity, Biotechnology and the Third World. Penang: Third World Network, 1993. p. 39-49; SHIVA, Vandana. Staying Alive: Women, Ecology and Development (1989). Repr. London: Zed Books, 1997. p. 96-98, 135-140, 143-145.

9 Aqui a referência é de HARVEY, David. Rebel Cities: From the Right to the City to the Urban Revolution. London: Verso, 2012. [N.T.: HARVEY, David. Cidades rebeldes: do direito à cidade à revolução urbana. São Paulo: Martins Fontes, 2014. 294p.]

10 É assim que o economista político etíope Fantu Cheru descreve esse fenômeno em referência aos centros urbanos africanos. Confira em CHERU, Fantu. “The Silent Revolution and the Weapons of the Weak: Transformation and Innovation from Below”. In: AMOORE, Louise (Ed.). The Global Resistance Reader. New York: Routledge, 2005. p. 74-85. Confira também em FEDERICI, Silvia. “Women, Land Struggle and Globalization” and “Feminism and the Politics of the Commons”. In: FEDERICI, Silvia. Revolution at Point Zero: Housework, Reproduction and Feminist Struggle. Oakland: PM Press, 2012. p. 132-133, 143-146. [N.T.: FEDERICI, Silvia. “Mulheres, lutas por terra e globalização: uma perspectiva internacional” e “Feminismo e a política do comum em uma era de acumulação primitiva”. In: FEDERICI, Silvia. O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista. Tradução do Coletivo Sycorax. São Paulo: Elefante, 2019. p. 277-302, 303-323].

11 Confira em Fisher (1993, p. 16).

12Villa é o nome dado na Argentina aos acampamentos urbanos criados geralmente por pessoas expulsas das áreas rurais, bem como pelos imigrantes.

13 O Teatro do Oprimido foi criado nos anos 1960 pelo ator, educador e diretor de teatro brasileiro Augusto Boal. Trata-se de um teatro político no qual os espectadores tornam-se protagonistas, ajudando a resolver os problemas colocados pelos atores para atuarem juntos.

14 O grupo levou o nome de 28 de Outubro para homenagear os feridos e mortos em um ataque violento conduzido pela polícia contra os vendedores do mercado de rua ao ar livre em 1973, o qual levou à queima de dezenas de barracas e queimou uma criança até a morte. Um relato do ataque e das atividades da organização é realizado por GARCÍA, Sandra C. Mendiola. “Vendors, Mothers and Revolutionaries: Street Vendors and Union Activism in 1970 Puebla Mexico”.Oral History Forum 33, p. 1-26, 2013.

15 Nota da tradutora: Silvia Federici escreveu este texto para o catálogo da Documenta 14. A Documenta é uma grande mostra de arte contemporânea com periodicidade a cada cinco anos na cidade de Kassel, Alemanha. FEDERICI, Silvia. “In Struggle to change the world: women, reproduction, and resistance in Latin America”. The documenta Reader Catalogue. Documenta e Museum Fridericianum gGmbH, Kassel: Prestel Verlag, p. 603-630, 2017.

Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: FEDERICI, Silvia. “Na luta para mudar o mundo: mulheres, reprodução e resistência na América Latina”. Tradução de Luciana Benetti Marques Valio. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 28, n. 2, e70010, 2020.

Financiamento: A presente tradução foi realizada com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001 - Programa Nacional de Pós-Graduação (PNPD/CAPES)

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica

Recebido: 13 de Novembro de 2019; Aceito: 09 de Dezembro de 2019

luvalio@yahoo.com

Silvia.Federici@Hofstra.edu

Silvia Federici (Silvia.Federici@Hofstra.edu) é Professora Emérita da Universidade de Hofstra, em Nova York, em Ciências Sociais. É autora de inúmeros artigos sobre feminismo, trabalho reprodutivo, comuns, entre outros. Coloca-se como feminista da tradição do movimento autônomo marxista. No Brasil, publicou os livros Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva (2017) e O ponto zero da revolução: trabalho doméstico, reprodução e luta feminista (2019).

Luciana Benetti Marques Valio (luvalio@yahoo.com) é artista, pesquisadora e professora, pós-doutoranda em Artes Visuais na UNICAMP, com financiamento pelo PNPD/CAPES. Doutora em Artes Visuais pela mesma instituição (com financiamento CAPES) e mestre em Ciência da Informação, Ação Cultural, na ECA/USP (com financiamento FAPESP). Tem artigos publicados em Revistas Acadêmicas e participação em eventos na área de Artes Visuais.

Contribuição de autoria: Silvia Federici: Elaboração completa. Concepção, coleta de dados e análise de dados, elaboração do manuscrito, redação, discussão de resultados. Luciana Benetti Marques Valio: tradução.

Conflito de interesses: Não se aplica

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